"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música"
Friedrich Nietzsche

quinta-feira, maio 31, 2007

Instituto Humanitas Unisinos - 25/05/07

Indivíduo, política e niilismo. Questões inquietantes sobre a autonomia.

Após ministrar o minicurso A moral após o individualismo, dentro da programação do Simpósio Internacional O Futuro da Autonomia. Uma sociedade de indivíduos? encerrado na tarde de ontem na Unisinos, Paul Valadier proferiu a última conferência do evento. Intitulada O futuro da autonomia do indivíduo, política e niilismo, Valadier iniciou sua conferência afirmando a gratificação por fechar um evento tão importante para a sociedade, mas também lembrou da dificuldade de ter nas mãos esta responsabilidade. “A grande dificuldade, para mim, nesta tarde, é não repetir as propostas e discursos já proferidos neste evento”, comentou.

Ao falar do título de sua conferência, relatou que sua pretensão é mergulhar, de forma rápida, na perplexidade da consideração filosófica. “Perplexidade em relação ao futurismo que o título implica, pois como prever o futuro em tal campo? Quem pode dizer qual é o real futuro da autonomia?”, questionou. Explicou, então, que dividiria suas considerações em três partes: na primeira parte, que durou cerca de uma hora e vinte minutos, apresentou a lógica da autonomia que, segundo ele, é cada vez mais invasora do indivíduo. Nela, Valadier descreveu e mostrou qual é a lógica que se desenvolveu nessa sociedade autônoma. Assim, disse que a autonomia do indivíduo é uma lógica insensível. “Essa lógica tem efeitos inesperados e inevitáveis para toda a sociedade. Ela tem raízes longínquas que não fáceis de perceber”, contou. Nessa primeira parte, Valadier utilizou-se do pensamento de Alexis Tocqueville. “Em ‘Democracia na América’, Tocqueville fala que a democracia é uma revolução tranqüila e irresistível, mas essa democracia é uma fato gerador que engendra progressivamente. Essa descrição também pode ser utilizada para descrever o individualismo, ou seja, a astúcia da razão, como diria Hegel”, apontou Valadier. O sociólogo francês explicou ainda que Tocqueville diferencia individualismo de egoísmo. Individualismo é pacífico, segundo seus relatos, e desinteressado da massa, já o egoísmo é um vício. No entanto, acentuou Valadier, o individualismo pode correr o risco de se tornar egoísmo, pois as novas igualdades são combatidas pela massa.

Na primeira parte, ainda, Valadier citou Hannah Arendt e Pasquali. Para Arendt, o problema do individualismo é que “o homem moderno foi rejeitado dentro de si mesmo”. Já Pasquali afirma que o desespero do homem é remetido a sua solidão e angústia”. Para finalizar esta etapa, Valadier nos deixou uma pergunta: "Será que estamos diante de uma autonomia inevitável?".

Na segunda parte, com duração menor do que a primeira, Valadier tentou explicar quais serão as conseqüências dessa invasão da autonomia na vida do indivíduo. Para ele, a autonomia atualmente é um capricho em beneficio próprio. “Medir a minha vontade em relação à autonomia do outro diminui, recua a autonomia verdadeira”, descreveu Valadier, emendando: “O indivíduo pode voltar-se contra si próprio, acabando com os suportes sociais”. Valendo-se do legado de Nietzsche, Valadier disse que essa autonomia a que estamos chegando é uma decadência da sociedade, ou seja, a perda do todo. Um exemplo disso seria os movimentos em nome da democracia que levaram à guerra o Iraque. Para o sociólogo, só seremos indivíduos autônomos se aprendermos a nos submeter.

Na terceira e última fase da palestra, Valadier indagou sobre a contribuição do cristianismo para essa lógica. Além disso, ele nos forneceu informações, e muitas outras indagações, para discutirmos se o cristianismo possui princípios para reparar esta lógica. “Aliás, a lógica da autonomia é algo que abalou o cristianismo”, salientou.

Valadier é professor de filosofia moral e política na Faculdade Jesuíta de Paris. É licenciado em Filosofia pela Sorbonne, mestre e doutor em Teologia pela Faculdade Jesuíta de Lyon. Sobre Nietzsche escreveu obras como: Nietzsche et la critique du christianisme (Paris: Cerf, 1974); Essais sur la modernité, Nietzsche et Marx (Paris: Cerf, 1974); Nietzsche, l’athée de rigueur (Paris: DDB, 1989); e Nietzsche l'intempestif, Beauchesne (Paris, 2000). Entre suas obras publicadas em português, destacam-se: Elogio da consciência (São Leopoldo: Editora Unisinos, 2001); Um cristianismo de futuro: para uma nova aliança entre razão e fé (Lisboa: Instituto Piaget, 2001); e A moral em desordem: um discurso em defesa do ser humano (São Paulo: Loyola, 2003).

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