"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música"
Friedrich Nietzsche

sábado, dezembro 20, 2008

VEJA, ÉPOCA, O MARIDO DA ATRIZ, MAINARDI, OBAMA E A INTERNET

Site do Azenha - Atualizado em 16 de dezembro de 2008 às 20:50 | Publicado em 16 de dezembro de 2008 às 10:54

O Rodrigo escreveu:

Azenha,

Primeiramente gostaria de lhe agradecer por ter publicado meu texto intitulado " Miriam me mata de rir ". É muito legal saber que nós cidadão comuns, trabalhando em escritórios e empresas somos ouvidos e nossas opiniões são respeitadas. Mesmo que meus emails não sejam publicados fico satisfeito por saber que são lidos com respeito.

Gostaria de aproveitar esta correspondência e citar um texto que li no observatório da imprensa e que se possível você escrevesse algo a respeito. O texto vem muito ao encontro do que penso. O texto foi intitulado "CASO MARCELO SILVA: Época, Veja e o dramalhão de novela".

Pra me fazer entender vou voltar à eleição de Obama. Estava eu assistindo no Manhatan Conection o ilustre Diogo Mainardi desdenhando a possível vitória de Obama.

No meu modesto entendimento trata-se de um dos grandes fatos do século XXI. Mesmo que matem Obama amanhã ou que ele renuncie por corrupção , ou seja, não importa o que ocorrá, a eleição de Obama por si só é um fato histórico.

Fiquei a noite inteira assistindo a CNN pra ver o fato e um dia poder contar aos meu filhos. E o Mainardi desdenha. Foi aí que eu disse a um amigo meu que é diplomata :" o mundo acontecendo e o cara perdendo a oportunidade de ver. Ele não é míope, é cego".

Pois bem, vamos "linkar" Obama com o texto do Observatório da Imprensa. Tanto Veja como Época publicaram em sua capa "a morte do ex-marido da atriz da Globo". Só leio Veja em consultório médico, barbeiro e fila de supermercado. Ontem, na fila do mercado quando vi a capa da revista pensei "o mundo acontecendo e os caras perdendo a chance de noticiar". Confesso que pratiquei o típico "não li e não gostei". Mas achei um absurdo as revistas de maior circulação trocarem notícias, em momentos de turbulência e mudanças, por fofoca. Que eu saiba, as duas editoras já tem revistas para o assunto.

Eu, Azenha, respondo:

1. Diogo Mainardi é um caso à parte. Trata-se de um "personagem" que Mainardi encarnou para se auto-promover. Aquele que desdenha tudo. Mainardi, presumo, se imaginava como futuro romancista, gênio de sua geração. Acabou como prestador de serviços de assessoria a um banqueiro. Certa vez eu via TV na estação rodoviária de Bauru. Entrou o Paulo Francis no Jornal da Globo. Um matuto olhou e começou a rir. Quando acabou o comentário de Francis sobre algum assunto de política o cara disse: "Esse Chico Anysio tem cada uma!". Na época o humorista tinha um personagem em um programa de humor chamado Paulo Brasilis, imitação de Francis. Mainardi ainda não mereceu ser copiado em programa de humor. Fracassou também nesse ramo.

2. Colocar o marido de uma atriz na capa de revista se explica do ponto-de-vista comercial. Os assinantes receberão a revista todas as semanas independentemente da capa. A capa funciona como propaganda da revista na banca. É o que impulsiona as vendas avulsas. Por isso é preciso fazer capas chamativas.

3. Uma nova classe média está ascendendo no Brasil. Gente que ainda não consome informação impressa. Os editores presumem que essa população é mais vulnerável ao apelo das capas sensacionalistas. O mesmo se dá na televisão, quando os editores escolhem assuntos "populares" para alavancar a audiência. Isso explica a multiplicação dos programas policiais. Digo a você, caro Rodrigo, que trata-se de uma formulação intelectual dos editores, que subestimam o público.

4. A sociedade brasileira está em transição. Tivemos nas últimas décadas uma grande migração do campo para a cidade. Mas a tradição oral das sociedades rurais ainda não se desfez. É a tradição do "causo", da "fofoca", do "ouvi dizer". Do papo de botequim e de manicure. Estamos em transição para uma sociedade midiática: a mídia como elemento comum à nacionalidade. Note o recente fenômeno das doações para os flagelados pelas enchentes de Santa Catarina. Foi um esforço nacional, espontâneo, uma reação às imagens e informações distribuídas pela mídia. Todo mundo queria "fazer parte". As capas de Veja e Época ao mesmo tempo alimentam e tiram proveito deste fenômeno.

5. A mídia impressa está em crise nos países centrais. A internet está mudando com uma rapidez incrível o mercado da informação. Por ser instantânea, por permitir que gente como você se manifeste e seja ouvida, por custar uma fração do custo do papel e da tinta. No Brasil, quando os classificados migrarem de vez do impresso para o eletrônico será o fim da Folha de S. Paulo e do Estadão. É só uma questão de tempo. Isso explica o desespero dos editores, sob pressão dos patrões, para vender jornal e revista.

6. Voltamos ao Mainardi, à Veja e à Epoca. Acabou o compromisso com a informação ou com a opinião pública. Ou quase. É preciso criar controvérsia a qualquer custo, chamar atenção. Que é o papel do Mainardi no "circo". Um malabarista midiático. Sempre na corda bamba. É assim que o público se acostumou a vê-lo. Tenho pena de vê-lo tentando cumprir essa "tarefa" dia após dia. Foi tragado pelo personagem. Com a perda relativa de poder comercial, qual é a alternativa dos patrões? Colocar seus veículos cada vez mais a serviço de interesses comerciais explícitos que lhes rendam grandes contas de publicidade. Caso recente: a defesa do banqueiro Daniel Dantas assumida por parte da mídia corporativa brasileira.

Fiquem com o artigo do Luciano Martins Costa:

http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=515IMQ010

CASO MARCELO SILVA
Época, Veja e o dramalhão de novela


Por Luciano Martins Costa em 15/12/2008

As duas principais revistas de informação do Brasil, pelo menos aquelas que alcançam mais leitores, escolheram para suas capas o episódio da morte de
um ex-policial que foi casado com uma atriz de televisão.

As duas publicações dedicam ao tema páginas e páginas relatando o relacionamento conturbado entre a mulher famosa e o típico galã de subúrbio, quase trinta anos mais jovem. E é assim mesmo que a revista Época trata o ex-policial que morreu de overdose de cocaína no estacionamento de um hotel: "galã de subúrbio". Chama-o também de "anônimo que tirou a sorte grande casando-se com uma estrela da TV".

Não é o caso de se gastar o tempo com análises sobre o evidente preconceito presente nas afirmações, mas observar como a imprensa que se pretende relevante gasta papel com temas de importância duvidosa, em detrimento das questões que poderiam contribuir para melhorar o nível de suas relações com
o público.

Banalidade pura

O relacionamento entre publicações que se pretendem influentes e seu público se constrói pela partilha dos temas relevantes, que ajudam esse público a fazer escolhas e formar opiniões.

Para se ter uma idéia, Época dedica quatro vezes mais espaço para a morte do ex-policial do que para o caso de assassinato que envolve o empresário Constantino de Oliveira, dono da empresa aérea Gol. Outro tema relevante, o caso que envolve magistrados acusados de vender sentenças mereceu apenas
uma página.

Veja também preferiu dar amplo espaço para a psicologia ligeira sobre o relacionamento entre a atriz famosa e o anônimo suburbano do que a questões como o pacote do governo contra a crise econômica, ou a pesquisa que mostra o hábito de empresários brasileiros de distribuir propinas a agentes públicos.

As chamadas revistas semanais de informação são supostamente importantes pela capacidade de resumir os principais fatos do período e oferecer aos
leitores a oportunidade de refletir sobre questões importantes para suas escolhas do dia-a-dia. Quando dedica a capa e muitas páginas a temas que são a marca das revistas de banalidades, a imprensa que pretende ser influente está apenas afirmando que não quer ser levada a sério.

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