Abastecidos, continuamos nossa viagem até o Arroio
Sangradouro, local de pernoite e limite entre a Lagoa Mirim e o Canal São
Gonçalo. Desembarcamos os caiaques numa praia na margem oposta ao arroio,
montamos a barraca, jantamos no veleiro e fomos dormir cedo, pois no dia
seguinte começaria de fato a jornada de caiaque.
Do
Arroio Sangradouro ao Farol da Ponta Alegre
1ª
ETAPA: ARROIO SANGRADOURO – FAROL DA PONTA ALEGRE
28/12/2014
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Local
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Distâncias
(Km)
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Paradas
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Arroio Sangradouro (prainha em frente) (32°08’44’’S 52°37’27’’W)
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0,00
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|
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Ponta com praia (32°09’48’’S 52°40’21’’W)
|
5,15
|
5,15
|
|
Ponta Luís dos Pobres (32°13’13’’S 52°44’23’’W)
|
9,34
|
14,49
|
|
Mata próximo Arroio Chasqueiro (32°14’29’’S 52°46’44’’W)
|
4,33
|
18,82
|
1ª
|
Arroio Chasqueiro (32°16’05’’S 52°47’05’’W)
|
3,16
|
21,98
|
|
Pontal da Praia do Pontal (32°20’05’’S 52°48’03’’W)
|
7,60
|
29,58
|
|
Arroio Grande (32°20’43’’S 52°47’22’’W)
|
1,66
|
31,24
|
2ª
|
Ponta Alegre (32°22’23’’S 52°43’23’’W)
|
7,12
|
38,36
|
3ª
|
Farol da Ponta Alegre (32°24’59’’S 52°45’20’’W)
|
6,39
|
44,75
|
4ª
|
Na manhã do dia 28 de dezembro às seis horas e trinta
minutos, com o sol começando a raiar no horizonte, nos encontrávamos prontos
para iniciar a grande travessia. Tivemos que fazer uma saída apressada, sem tomar
café nem arrumar direito as coisas de viagem para conseguir fugir dos mosquitos,
que nesta região são terríveis, e até falamos brincando que esse local se
denominava “Sangradouro” em decorrênciado sangue que os mosquitos nos tiravam e
não por ser o único ponto que a Lagoa Mirim sangra em direção a Laguna dos
Patos.
O vento estava fraco a moderado e vindo do quadrante oeste,
ou seja, teríamos de remar contra. Despedimo-nos da equipe do veleiro que faria
uma rota diferente da nossa e partimos rumo à Ponta Luís dos Pobres, local formado
por uma área de banhado com predomínio de sarandis submersos e sem praias para
desembarque, fato constatado talvez pelo nível da lagoa se encontrar muito alto
para essa época do ano. Seguimos então para uma mata próxima ao Arroio
Chasqueiro composta por uma belíssima vegetação nativa, onde se destacavam
figueiras, grandes cactos e muita bromélia. Neste local fizemos nossa primeira
parada para descanso e lanche.
Após fotografar este refúgio silvestre partimos em
direção ao Arroio Grande, local de encontro com o veleiro. O vento havia
aumentado vindo agora do quadrante sul tornando nossa remada mais lenta e
penosa. Seguíamos próximos da margem, uma grande capivara mergulhou na frente
de nossos caiaques, cruzamos o Arroio Chasqueiro, o Pontal da Praia do Pontal e
entramos na foz do Arroio Grande, que de acordo com Emygdio (1997, p. 93) nasce
na serra de São João do Herval, próximo da cidade, a uma altitude aproximada de
280 metros e depois de percorrer 36,7 milhas deságua nesse ponto onde o veleiro
já nos aguardava com uma deliciosa refeição servida pelo Cel. Pastl.
Bem alimentados e agora sem o vento para atrapalhar seguimos
viagem passando por diversas ilhas de sarandis submersos e, após um pouco mais
de sete quilômetros, alcançamos a Ponta Alegre numa praia de areia fina e
clara, local da terceira parada do dia. Na ponta, onde um pirupiru passeava e
um martim-pescador descansava em um galho, se visualizava a margem leste do
outro lado da Lagoa Mirim. Após contornar a Ponta Alegre rumamos direção
sudoeste, sempre próximo da margem, passando por diversos bandos de
talha-mares, biguás, gaivotas e trinta-réis até chegarmos ao Farol da Ponta
Alegre, local de pernoite.
O belo, imponente e histórico Farol, construído na
primeira década do século XX e que orientou a navegação noturna até por volta
dos anos cinquenta é, conforme Emygdio (1997, p. 98), o “símbolo” da Lagoa
Mirim, pois mesmo desativado serve como ponto de referência, principalmente
para os barcos que navegam do sul para o norte, que o avistam a uma distância
de oito milhas.
Desembarcamos em frente ao farol e fomos conhecê-lo de
perto. Subimos sua centenária escadaria para admirar o belo visual panorâmico
lá de cima, de onde avistamos umas emas percorrendo os campos. A ema, segundo
Belton (1993, p. 22), também conhecida por nhandu ou, impropriamente, avestruz,
é a maior ave do continente americano e sua plumagem é cinzenta no dorso,
esbranquiçada no ventre e negra na base do pescoço. Depois montamos acampamento
em um local protegido por capim santa-fé e pequenos cômoros de areia por onde
passeava um graxaim, lanchamos e fomos dormir.
Do
Farol da Ponta Alegre ao Rio Jaguarão
2ª
ETAPA: FAROL DA PONTA ALEGRE – RIO JAGUARÃO
29/12/2014
|
Local
|
Distâncias
(Km)
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Paradas
|
Farol da Ponta Alegre (32°24’59’’S 52°45’20’’W)
|
0,00
|
|
|
Canal de irrigação (32°27’08’’S 52°49’47’’W)
|
8,26
|
8,26
|
|
Canal de irrigação (32°27’31’’S 52°52’44’’W)
|
4,77
|
13,03
|
1ª
|
Canal de irrigação (32°28’00’’S 52°55’02’’W)
|
3,73
|
16,76
|
|
Arroio Bretanha (32°29’17’’S 52°58’08’’W)
|
5,47
|
22,23
|
2ª
|
Arroio Arrombados (32°32’27’’S 52°59’57’’W)
|
6,64
|
28,87
|
3ª
|
Ponta Negra (canal de irrigação) (32°36’11’’S 53°00’45’’W)
|
7,61
|
36,48
|
4ª
|
Arroio Juncal (32°38’32’’S 53°05’13’’W)
|
8,36
|
44,84
|
5ª
|
Ponta do Juncal (32°39’07’’S 53°05’16’’W)
|
1,35
|
46,19
|
|
Rio Jaguarão (foz) (32°39’13’’S 53°10’38’’W)
|
8,62
|
54,81
|
6ª
|
Casa de bombas em canal de irrigação (32°38’15’’S 53°11’51’’W)
|
2,70
|
57,51
|
|
Canal errado (32°37’19’’S 53°13’30’’W)
|
3,24
|
60,75
|
7ª
|
Casa de bombas em canal de irrigação (32°38’15’’S 53°11’51’’W)
|
3,22
|
63,97
|
8ª
|
No dia 29 acordamos cedo, o céu apresentava algumas
nuvens e o vento estava fraco, perfeito para uma boa remada, desmontamos a
barraca, arrumamos as tralhas, fizemos um lanche e às seis horas começamos
nossa viagem.
O primeiro trecho a ser percorrido era uma costa quase
reta, composta por uma praia interminável formada por pequenas dunas de areia e
gramíneas, tornando a paisagem um tanto monótona. A distração ficava por conta
da observação de grandes bandos de aves, principalmente trinta-réis, pirupirus,
gaivotas, irerês e outras marrecas, batuíras e biguás concentrados
principalmente nas entradas de canais. Assim remamos por treze quilômetros até
um canal de irrigação próximo de uma pequena mata de eucaliptos, onde paramos
para um breve descanso.
Após comermos umas barras de cereal e nos hidratarmos
seguimos em direção ao Arroio Bretanha, o qual segundo Emygdio (1997, p. 133), nasce
num lugar denominado Porteiras, percorre um trajeto de aproximadamente vinte e
oito milhas e divide os municípios de Jaguarão e Arroio Grande. Um pouco antes da
sua foz avistamos uma camionete com duas pessoas pescando na praia, que por
curiosidade eram os primeiros seres humanos avistados em dois dias de remada.
Chegando à boca do Arroio Bretanha, que tem como ponto de
referência uma grande casa branca de alvenaria localizada na margem sul e que
funciona como estação de recalque d’água, fizemos nossa segunda parada. Fotografamos
o local e prosseguimos a jornada passando por uma mata de eucaliptos e,
aproximadamente um quilometro após, por uma plantação de pinus. O pinus
conforme já havíamos descrito em nossas viagens anteriores é um vilão que não
obedece aos limites de matas e cercas, se prolifera através do vento e invade
os santuários ecológicos juntos das lagoas, modificando assim sua bela flora e
fauna.
Um pouco tristes pela constatação da invasora vegetal prosseguimos
até o Arroio Arrombados, onde paramos para nos refrescar, pois o calor havia
aumentado bastante. Na margem sul do arroio havia uma pequena mata nativa,
formada principalmente por grandes salsos, onde um carcará descansava à sombra
de uma árvore e junto da foz de água límpida, diversas aves nadavam tranquilamente.
Após um breve descanso neste belo local continuamos nossa jornada em direção à
Ponta Negra.
Bem sobre a Ponta Negra tem um vasto bosque de
eucaliptos, formado por uma espécie que tem a folha mais escura. Então quem
passa navegando longe, enxerga um grande bosque preto que imagina a Ponta ser
Negra devido a esse bosque. Acontece que o eucalipto (Eucalyptus Robusta) ainda
não havia saído da Austrália, seu país de origem, e esta ponta já tinha o nome de
Negra, devido as grandes ondas que aqui se formam. (EMYGDIO, 1997, p. 130)
Junto à ponta paramos próximos a um canal de irrigação
para novamente nos refrescarmos nas águas da lagoa e assim suavizar o intenso
calor. Nesta praia, a areia branca e fina contrastava com diversos blocos de
sedimentos negros e, de um ponto mais elevado, podia se avistar ao longe os
altos cômoros de areia da Ponta do Juncal, localizada um pouco mais de um quilômetro
do arroio de mesmo nome.
O céu continuava apenas com algumas nuvens a leste no
horizonte e o vento fraco deixava a lagoa quase sem ondas, não dificultando o
desempenho da remada. Assim rumamos para sudoeste por mais de oito quilômetros
até a foz do Arroio Juncal, local da quinta parada do dia.
A grande boca do arroio medindo aproximadamente trezentos
metros, com água bastante transparente, e a Ponta do Juncal com suas altas
dunas de areia branca, entrecortadas por mata nativa, formam um belo cenário.
Em terra, caminhamos e fotografamos esse encantador local e depois partimos
contornando a ponta e seguindo rumo oeste, numa linha reta de um pouco menos de
nove quilômetros, em direção à foz do Rio Jaguarão.
O calor continuava como sendo o único contratempo do dia.
Prosseguimos a remada numa velocidade de sete quilômetros e meio por hora e, na
boca do Rio Jaguarão, passamos por um centenário marco de fronteira desembarcando
a seguir, numa praia de areia na margem leste.
O Rio Jaguarão nasce na Coxilha da Arvorezinha ou
Arbolito, como se referiam os antigos, a 5,3 milhas ao norte da pequena
localidade do Seival, situada na RS 89, que liga Bagé a Pinheiro Machado.
Percorre uma distância de 107 milhas, aproximadamente, até a sua desembocadura
na Lagoa Mirim. Próximo do Seival, na cabeceira do Arroio Candiota, afluente da
margem esquerda, deu-se o memorável combate do Seival, a 10 de setembro de
1836, onde 430 republicanos, comandados por Antônio de Souza Neto, derrotaram
560 imperiais. (EMYGDIO, 1997, p. 138/139)
Caminhando próximo dos marcos históricos que dividem o
Brasil do Uruguai, recebemos a notícia que teríamos que subir pelo rio até a
cidade de Jaguarão para nos reencontrar com o grupo do veleiro. O combinado
inicial era de esperarmos nossos amigos na foz, para seguir na manhã do dia seguinte
pela Lagoa Mirim, mas devido a um contratempo o veleiro teve que permanecer em
Jaguarão por mais um dia. Assim resolvemos adiantar viagem e procurar local
para acampamento alguns quilômetros rio acima. Passamos por uma casa de bombas
abandonada e prosseguimos sem perceber que havíamos entrado em um canal errado.
Remamos por mais de três quilômetros quando a passagem desse canal ficou
bloqueada por uma densa vegetação aquática e percebemos o nosso erro. Como já
era tarde e estávamos cansados, retornamos até a casa de bombas e lá montamos
acampamento após ter percorrido aproximadamente sessenta e quatro quilômetros nesse
quente dia.
Referências
Bibliográficas
BELTON,
William. Aves silvestres do Rio Grande
do Sul. Porto Alegre: Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul, 1993.
EMYGDIO,
Décio Vaz. Lagoa Mirim – um paraíso
ecológico. Pelotas: Editora Livraria Mundial, 1997.
HILSDORF,
Luis Vitor. Canoagem, aventura e
ecologia, fluindo com a natureza. São Paulo: EPIL, 1997.
NÚCLEO
DE EDUCAÇÃO E MONITORAMENTO AMBIENTAL – NEMA. Taim, banhado de vida. Rio Grande: NEMA, 2004.
RUAS,
Tabajara e ACHUTTI, Luiz Eduardo. Uma
aventura no sul do Brasil. Porto Alegre: Grupo Ipiranga, 2000.