"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música"
Friedrich Nietzsche

terça-feira, julho 30, 2013


resistir info - 30 jul 2013

por Thierry Meyssan [*]

Ao classificar o ramo militar do Hezbolá como organização terrorista, a União Europeia manifesta a sua incompreensão da Resistência libanesa. O Hezbolá não é e não quer tornar-se um partido político, ainda que participe no jogo político libanês. Bruxelas exprime a sua vassalagem ao bloco anglo-saxão (incluindo Israel) em detrimento de seus próprios princípios.

Foi com três dias de atraso, que o Conselho europeu publicou a sua decisão relativa à inscrição do ramo militar do Hezbolá na sua lista de organizações terroristas. Contrariamente ao costume, a notícia já deu a volta ao globo e o Hezbolá já respondeu.

O documento oficial foi acompanhado de uma declaração comum do Conselho e da Comissão sublinhando que isto "não impede a continuação do diálogo com o conjunto dos partidos políticos do Líbano e não afecta o fornecimento de assistência a este país". Este comentário visa explicitar a distinção entre os ramos civil e militar do Hezbolá que permite à União Europeia discutir com o primeiro ao mesmo tempo que condena o segundo. 

Dentro desta onda, a embaixadora da União Europeia, Angelina Eichhorst, foi a Beirute visitar o responsável das relações internacionais do Hezbolá, Ammar Moussaoui, para lhe dizer que esta decisão não mudava nada nas relações bilaterais. O problema, é que esta decisão não tem nenhum sentido.

Mascarar a aspiração mística do Hezbolá 

Por definição, o Hezbolá não é um partido político, mas sim uma rede de resistência à invasão israelense, constituída por famílias xiitas baseada no modelo dos basidjis iranianos, do qual adoptou a bandeira (amarela). Progressivamente, a Resistência incorporou não-xiitas no seio de uma estrutura ad-hoc, e substituiu o falhanço do Estado libanês tanto para vir em socorro às famílias dos seus feridos e mártires como para reconstruir o Sul do país, inteiramente arrasado pela aviação israelense. Esta evolução levou-o a apresentar candidatos às eleições e a participar no governo. 

O seu secretário-geral, Sayyed Hassan Nasrallah, não cessou de exprimir as suas reticências face à política, que para ele não é nada mais que uma actividade corruptora. Pelo contrário, ele aproveitou todas as ocasiões para reafirmar o seu ideal de morrer com mártir no campo de batalha, como o seu filho mais velho Muhammad Hadi, seguindo assim a via traçada pelo imã Hussein na batalha de Kerbala. 

Na essência, o Hezbolá é o fruto de uma atitude mística e não poderia ser comparado a um partido político europeu. Os seus soldados nada têm a ganhar ao baterem-se, mas apenas a perder incluindo a sua vida. Eles vão à guerra porque a sua causa é justa e é uma ocasião para o sacrifício, o quer dizer de desenvolvimento humano. Era o sentido da revolução do aiatolá Rouhollah Khomeini e é o seu. 

Apesar da ambiguidade que decorre da tradução do seu nome, Hezbollah, como o "Partido de Deus", esta rede não é uma formação política e não pensa tornar-se em tal. O seu nome, extraído do Corão, figura sobre a sua bandeira: "Quem tomar por aliados Deus, Seu mensageiro e os crentes, [triunfará], pois é o partido de Deus é que sairá vitorioso". É preciso compreender aqui o significado da expressão "partido de Deus" no sentido escatológico: será em definitivo Deus quem triunfará do Mal no fim dos tempos. 

Muito estranhamente, os europeus — que maioritariamente consideram como um dado democrático a separação entre poderes temporal e religioso — reprovam ao Hezbolá a sua essência espiritual, e querem "normalizá-lo" em partido político. No seu espírito, os resistentes libaneses não são afectados pela colonização da Palestina e da Síria. Eles deveriam antes ocupar-se da sua carreira política do que a arriscar a sua vida em combate. 

A decisão do Conselho europeu terá pouco alcance prático. Ela consiste, sobretudo, em proibir aos membros do "ramo militar" viajarem na União Europeia e em congelar os seus depósitos bancários: mas não se vê porque clandestinos, lutando contra as potências coloniais, iriam abrir contas bancárias nesses estados. 

Porquê portanto esta barulheira? A inclusão do Hezbolá na lista europeia das organizações terroristas é uma velha reivindicação de Telavive, apoiada pelo império anglo-saxónico. É um esforço de propaganda visando afirmar que os "Bons" são os israelenses e os "Maus" os que recusam aceitar o roubo das suas terras. A proibição foi apresentada pelo presidente israelense Shimon Peres aos dirigentes da UE, depois ao Parlamento Europeu, em 12 de Março último. Foi levada ao Conselho Europeu pelos ministros britânico e francês dos Negócios Estrangeiros, William Hague e Laurent Fabius. Eles foram secundados pelos seus colegas holandês e austríaco, Frans Timmermans e Michael Spindelegger, após uma intensa mobilização dos sionistas estado-unidenses, dentre os quais o antigo governador da Califórnia, Arnold Schwarzeneger. 

Mascarar o fracasso israelense na Argentina 

Havia urgência em agir para os comunicadores israelenses. Com efeito, desde 1994, eles acusam o Hezbolá e o Irão de terem feito explodir o imóvel da mutualista judia de Buenos Aires, causando 85 mortos. Esta versão dos factos é apresentada como uma certeza, em numerosas enciclopédias e manuais escolares. Contudo, desde há muitos anos que a justiça argentina a desmentiu. Em Janeiro de 2013, a Argentina e o Irão criaram uma comissão de juristas independentes para esclarecimento total sobre o assunto. Desde logo, ficou claro que o atentado foi uma maquinação urdida pelo antigo ministro do Interior, o israelo-argentino Vladimir Corach. 

Como este caso não vinga, Telavive acusou o Hezbolá e o Irão de terem feito explodir um autocarro israelense na Bulgária, causando sete mortos (incluindo um kamikaze), a 18 de Julho de 2012. Logo de início, o governo de centro-direita búlgaro apoiou a acusação, antes de ser contraditado pelo seu sucessor de centro-esquerda. Pouco importa, para o Conselho Europeu o Hezbolá é politicamente o autor de um atentado no território da UE, embora não o seja do ponto de vista judicial. 

De modo geral, Israel acusa o Hezbolá de ter fomentado, e por vezes executado, uma vintena de atentados contra civis um pouco por todo o lado, no mundo inteiro, em trinta anos, o que a Resistência nega. 

Ainda aqui, muito estranhamente, os europeus — que consideram a presunção de inocência como um dado adquirido em democracia — condenam o suspeito antes mesmo que ele tenha sido julgado, ou sequer submetido a provas. 

Mascarar o fracasso europeu na Síria 

No fundo, não escapou a ninguém que a verdadeira novidade neste dossiê não figura ali: é a intervenção do Hezbolá na guerra da Síria. Uma vez que traímos nosso compromisso de derrubar o presidente Bachar el-Assad, levemos ao menos o nosso apoio aos "rebeldes" condenando o Hezbolá, pensa-se em Bruxelas. Foi este argumento que, parece, levou à decisão do Conselho Europeu. Isto mostra, pelo contrário, a incapacidade dos britânicos e franceses em influenciarem o que quer que seja, num conflito que eles deliberadamente desencadearam a fim de se apoderarem da Síria, brandindo a bandeira da colonização, que se tornou a mesma do chamado exército sírio livre. Acima de tudo esta condenação tem o mérito de clarificar os campos: de um lado a resistência à opressão colonial, do outro as potências colonialistas. 

Se a atitude britânica não é espantosa, com o Reino Unido reivindicando o seu estatuto colonial, ela ainda é mais no que se refere à França, que alternou na sua história períodos revolucionários e os imperiais. 

Assim, a Declaração dos Direitos do homem e do cidadão, adoptada em 1789, enuncia no seu artigo 2 quatro direitos fundamentais, dos quais um é a "resistência à opressão". Foi com esta base que em 1940, Charles De Gaulle se opôs ao armistício entre a França e o Reich nazi, pondo-se à frente da Resistência. 

Em contrapartida, no decurso dos anos 1880, Jules Ferry encarnou a expansão francesa desejada por uma fracção do patronato que com isso pretendia maior rentabilidade para os seus investimentos pois em França era o contribuinte e não o patronato que pagava o exército colonial. Para arregimentar o país, Ferry tornou a escola pública gratuita e obrigatória. Os professores, chamados "hussardos negros da República" deviam convencer os jovens a alistarem-se nas tropas coloniais. E foi sob os auspícios de Jules Ferry que o actual presidente francês, François Hollande, consagrou o seu quinquénio. 

Se a França moderna é Charles De Gaulle, ela teria podido ser Philippe Pétain; um marechal razoável, que considerava a submissão ao Reich vitorioso tanto mais desejável quanto ele aí via um meio de acabar com a herança de 1789. É certamente demasiado cedo para que as elites francesas o reabilitem, mas condenar a Resistência libanesa é condenar Charles De Gaulle à morte uma segunda vez, por terrorismo. 

Definitivamente, os ideais que fizeram a glória da França são actualmente mais bem defendidos em Beirute do que em Paris.[*] Editor de Reseau Voltaire 

O original encontra-se em www.voltairenet.org/article179620.html . Tradução de Alva (com pequenas alterações). 


Brasil: O capitalismo extractivo e o grande salto para trás

resistir info - 30 jul 2013
por James Petras
O Brasil testemunhou um dos mais gritantes retrocessos sócio-económicos da moderna história mundial:  de uma dinâmica nacionalista de industrialização para uma economia exportadora primária. Entre meados da década de 1930 e meados da década de 1980, o Brasil cresceu a uma taxa média de cerca de 10% no seu sector manufactureiro, em grande medida com base em políticas intervencionistas do estado, subsídios, protecção e regulação do crescimento de empresas públicas nacionais e privadas. Mudanças no "equilíbrio" entre o capital nacional e estrangeiro (imperial) começaram a verificar-se a seguir ao golpe de 1964 e aceleraram-se após o retorno da política eleitoral nos meados da década de 1980. A eleição de políticos neoliberais, especialmente com a eleição do regime Cardoso em meados da década de 1990, teve um impacto devastador sobre sectores estratégicos da economia nacional: a privatização generalizada foi acompanhada pela desnacionalização dos altos comandos da economia e a desregulamentação maciça de mercados de capitais [1] . O regime Cardoso preparou o cenário para o fluxo maciço de capital estrangeiro nos sectores agro-mineral, financeiro, seguros e imobiliário. A ascensão das taxas de juro, como exigido pelo FMI, o Banco Mundial e o mercado especulativo imobiliário elevaram os custos da produção industrial. A redução de tarifas de Cardoso acabou com subsídios à indústria e abriu a porta a importações industriais. Estas políticas neoliberais levaram ao declínio relativo e absoluto da produção industrial [2] .

A vitória presidencial do auto-intitulado "Partido dos Trabalhadores", em 2002, aprofundou e expandiu o "grande retrocesso" promovido pelos seus antecessores neoliberais. O Brasil reverteu para tornar-se um exportador primário de commodities, como soja, gado, ferro e minérios que se multiplicaram, as exportações de material de transporte e manufacturas declinaram [3] . O Brasil tornou-se uma dos principais exportadores de commodities extractivas do mundo. A dependência do Brasil das exportações de commodities foi ajudada e compensada pela entrada maciça e a penetração de corporações imperiais multinacionais e de fluxos de financeiros por bancos além-mar. Os mercados além-mar e os bancos estrangeiros tornaram-se a força condutora do crescimento extractivo e da morte industrial.

Para ter um melhor entendimento da "grande reversão" do Brasil de uma dinâmica nacionalista-industrializante para uma vulnerável dependência imperial conduzida pela extracção agro-mineral, precisamos resumidamente rever a economia política do Brasil ao longo dos últimos cinquenta anos a fim de identificar os "pontos de viragem" decisivos e a centralidade da política e da luta de classe.

Modelo militar: Modernização a partir de cima 

Sob a ditadura militar (1964-1984) a política económica era baseada numa estratégia híbrida enfatizando uma tríplice aliança do estado, do capital estrangeiro e do capital privado nacional[4] centrada primariamente em exportações industriais e secundariamente e commoditiesagrícolas (especialmente produtos tradicionais como o café).

Os militares rejeitaram o modelo nacionalista-populista baseado em indústrias do estado e cooperativas camponesas do deposto presidente Goulart e puseram em vigor uma aliança de capitalistas industriais e agronegócio. A cavalgar uma onda de mercados globais em expansão e beneficiando da repressão do trabalho, a compressão de salários, subsídios abrangentes e políticas proteccionistas, a economia cresceu a dois dígitos desde o fim da década de 1960 até meados da de 1970, o chamado "Milagre brasileiro" [5] . Os militares, se bem que afastando quaisquer ameaças de nacionalizações, puseram em vigor um certo número de regras de "conteúdo nacional" e ampliaram a dimensão e âmbito da classe trabalhadora urbana, especialmente na indústria automotiva. Isto levou ao crescimento dos sindicatos de trabalhadores metalúrgicos e posteriormente do Partido dos Trabalhadores. O "modelo exportador" baseado na indústria leve e pesada, de produtores estrangeiros e internos, tinha base regional (Sudeste). A estratégia de modernização aumentou desigualdades e integrou os capitalistas "nacionais" a multinacionais imperiais. Isto preparou o terreno para o início das lutas anti-ditatoriais e o retorno da democracia. Partidos neoliberais ganharam hegemonia com a viragem para políticas eleitorais.

Políticas eleitorais, a ascensão de neoliberalismo e a ascendência do capitalismo extractivo 

A oposição eleitoral que sucedeu aos regimes militares esteve inicialmente polarizada entre uma elite liberal, adepta do livre mercado agro-mineral e aliada a multinacionais imperiais e, por outro lado, um bloco nacionalista de trabalhadores, camponeses, trabalhadores rurais e classe média baixa. Trabalhadores militantes constituíam a CUT, camponeses sem terra o MST e ambos juntaram-se à classe média para constituir o PT. [6]

A primeira década de política eleitoral, 1984-94, foi caracterizada pelo puxa e empurra entre o capitalismo estatista residual herdado do regime militar anterior e a emergente burguesia do "livre mercado" liberal. As crises de dívida, hiper-inflação, corrupção sistémica maciça, o impedimento do presidente Collor e a estagnação económica enfraqueceram gravemente os sectores capitalistas estatais e levaram à ascendência de uma aliança do capital agro-mineral e financeiro, tanto de capitalistas estrangeiros como locais, ligada a mercados além-mar. Esta coligação retrógrada encontrou o seu líder politico e o caminho do poder com a eleição de Fernando Henrique Cardoso, um antigo académico de esquerda que se converteu em fanático do mercado livre.

A eleição de Cardoso levou a uma ruptura decisiva com as políticas nacionais estatistas dos sessenta anos anteriores. As políticas de Cardoso deram um impulso decisivo à desnacionalização e privatização da economia, elementos essenciais na reconfiguração da economia do Brasil, e à ascendência do capital extractivo [7] . De acordo com quase todos os indicadores, as políticas ultra-liberais de Cardoso levaram a um precipitado grande salto para trás, concentrando rendimento e terra, e aumentando a propriedade estrangeiro de sectores estratégicos. A "reforma" da economia de Cardoso a expensas do trabalho industrial, da propriedade pública, dos trabalhadores sem terra provocou greves generalizadas e ocupações de terra [8] . A "economia extractiva", especialmente a abertura de sectores lucrativos na agricultura, mineração e energia, ganhou espaço a expensas das forças produtivas: a posição relativa da manufactura, tecnologia e serviços avançados declinou. Em particular, os ganhos do trabalho como um todo declinaram como percentagem do PNB [9] .

A taxa de crescimento médio da indústria declinou para uns magros 1,4%. O emprego no sector industrial caiu em 26%, o desemprego subiu para mais de 18,4%, o "sector informal" subiu de 52,5% em 1980 para 56,1% em 1995 [10] .

A privatização de empresas públicas como a Telebrás, firma gigante e lucrativa de telecomunicações, levou ao despedimento maciço de trabalhadores e à subcontratação de trabalho com salários mais baixos e sem benefícios sociais. Sob Cardoso, o Brasil tinha as mais altas taxas de desigualdade (coeficiente de Gini) entre todos os países do mundo.

Cardoso utilizou subsídios do estado para promover o capital estrangeiro, especialmente nos sectores da exportação agrária e mineral, enquanto pequenos e médios agricultores ansiavam por crédito. O seu programa de desregulamentação financeira levou à especulação com divisas, lucros maciços e inesperados para bancos da Wall Street quando o regime elevou as taxas de juro em mais de 50% [11] . A bancarrota de agricultores levou ao seu despojamento pelos capitalistas agro-exportadores. A concentração de terra assumiu uma viragem decisiva quando 7% dos grandes proprietários que possuíam fazendas de mais de 2000 hectares aumentaram a dimensão das suas terras de 39,5% para 43% das terras agrícolas brasileiras [12] .

Durante os oito anos de Cardoso no governo (1994-2001) houve um tsunami de investimento estrangeiro: mais de US$50 mil milhões entraram no país só nos primeiros cinco anos – dez vezes o total dos 15 anos anteriores [13] . Companhias agro-minerais de propriedade estrangeiras entre as principais companhias estrangeiras (em 1997) representavam mais de um terço e continuavam a crescer. Entre 1996-1998 multinacionais estrangeiras adquiriram oito grandes firmas de alimentos, mineração e produção metálica [14] .

As políticas neoliberais de Cardoso abriram a porta amplamente para a tomada de indústrias críticas e sectores bancários pelo capital estrangeiro. No entanto, foram os presidentes do "Partido dos Trabalhadores" que vieram a seguir, Lula da Silva e Rousseff, que completaram o Grande Salto para Trás da economia brasileira ao se voltarem decisivamente para o capital extractivo como a força condutora da economia.

Do neoliberalismo ao capital extractivo 

As privatizações de Cardoso foram apoiadas e aprofundadas pelo regime Lula. A ultrajante privatização de Cardoso da mineradora Vale do Rio Doce por uma fracção do seu valor foi defendida por Lula; o mesmo se passou com a privatização de facto da companhia petrolífera estatal Petrobrás. Lula abraçou as políticas monetárias restritivas, acordos de excedente orçamental com o FMI e seguiu as prescrições orçamentais dos directores do FMI [15] .

O regime Lula (2003-2011) adoptou as políticas neoliberais de Cardoso como um guia para promover a reconfiguração da economia do Brasil em benefício do capital estrangeiro e interno, agora assente no sector primário e de exportação de matérias-primas. Em 2005 o Brasil exportou US$55,3 mil milhões em matérias-primas e US$44,2 mil milhões em bens manufacturados; em 2011 o Brasil triplicou suas exportações de matérias-primas para US$162,2 mil milhões enquanto suas exportações de manufacturas aumentaram para uns meros US$60,3 mil milhões [16] .

Por outras palavras, a diferença entre o valor das exportações de matérias-primas e de manufacturas aumentou de US$13 mil milhões para mais de US$100 mil milhões nos últimos cinco anos do regime Lula. A desindustrialização relativa da economia, o desequilíbrio crescente entre o sector extractivo dominante e o sector manufactureiro ilustra a reversão do Brasil para o seu "estilo colonial de desenvolvimento".

O capitalismo agro-mineral, o estado e o povo 

O sector exportador do Brasil beneficiou-se enormemente com a ascensão dos preços dascommodities . O principal beneficiário foi o sector exportador agro-mineral. Mas o custo para a indústria, transporte público, condições de vida, investigação e desenvolvimento e educação foi enorme. As exportações agro-minerais proporcionarem grandes receitas para o estado mas também extrairam-lhe grandes subsídios, benefícios fiscais e lucros.

A economia industrial do Brasil foi afectada desfavoravelmente pelo boom da commoditiesdevido à ascensão no valor da sua divisa, o real, em 40% entre 2010-2012, a qual aumentou o preços das exportações de manufacturas e diminuiu a competitividade dos produtos manufacturados [17] . As políticas de "mercado livre" também facilitaram a entrada de bens manufacturados mais baratos da Ásia, particularmente da China. Enquanto as exportações primárias para a China deram um salto, o sector manufactureiro do Brasil, particularmente bens de consumo como têxteis e calçados, declinou entre 2005 e 2010 em mais de 10% [18] .

Sob os regimes Lula-Rousseff, a extrema dependência de um número limitado de commoditieslevou a um declínio agudo nas forças produtivas, medido pelos investimentos em inovações tecnológicas, especialmente aqueles relacionados com a indústria [19] . Além disso, o Brasil tornou-se mais dependente do que nunca de um único mercado. De 2000 para 2010 a importações chinesas de soja – a principal exportação agrícola – representaram 40% das exportações do Brasil; as importações chinesas de ferro – a exportação mineira chave – constituem mais de um terço do total das exportações daquele sector. A China também importa cerca de 10% das exportações brasileiras de petróleo, carne, celulose e papel [20] . Sob os regimes Lula e Rousseff, o Brasil reverteu para uma economia quase mono-cultural dependente de um mercado muito limitado. Em consequência, o arrefecimento da economia da China levou como era de prever a um declínio no crescimento do Brasil para menos de 2% de 2011 para 2013 [21] .

Brasil: Paraíso económico do capital financeiro 

Sob as políticas de mercado livre do Partido dos Trabalhadores, o capital financeiro entrou a jorros no Brasil, como nunca antes. O investimento directo estrangeiro saltou de cerca de US$16 mil milhões em 2002, durante o último ano do regime Cardoso, para mais de US$48 mil milhões no último ano do governo de Lula [22] . A carteira de investimento – na maior parte de tipo especulativo – subiu de US$5 mil milhões negativo em 2002 para US$67 mil milhões em 2010. Entradas líquidas de investimento directo estrangeiro (IDE) e investimentos de carteira totalizaram US$400 mil milhões durante 2007-2011, a comparar com os US$79 mil milhões durante o período anterior de cinco anos [23] . Investimentos de carteira em títulos de altos juros retornaram entre 8% e 15%, o triplo e o quádruplo das taxas na América do Norte e Europa. Lula e Dilma são presidentes poster da Wall Street.

De acordo com os indicadores económicos mais importantes, as políticas dos regimes Lula-Dilma foram as mais lucrativas para o capital estrangeiro além-mar e os investidores nos sectores agro-minerais primários na história recente do Brasil.

O modelo agro-mineral e o ambiente 

Apesar da sua retórica política em favor da família agricultora, os regimes Lula-Dilva têm estado entre os maiores promotores do agro-negócio na história política brasileira. A maior fatia de recursos do estado foi concedida à agricultura, finanças e grandes proprietários rurais. De acordo com um estudo, em 2008/2009 pequenos proprietários receberam cerca de US$6,35 mil milhões, ao passo que o agro-negócio e grandes proprietários rurais receberam US$31,9 mil milhões em financiamento e crédito [24] . Menos de 4% dos recursos do governo e de investigação foi destinada à agricultura familiar e explorações agro-ecológicas.

Sob Lula, a destruição das florestas tropicais verificou-se a um ritmo acelerado. Entre 2002 e 2008 a vegetação da região do Cerrado foi reduzida em 7,5% ou mais de 8,5 milhões de hectares, principalmente por corporações do agro-negócio [25] . O Cerrado brasileiro é uma das regiões de savana mais biologicamente ricas do mundo, concentrando-se na região centro-leste do país. De acordo com um estudo, 69% da terra de propriedade de corporações estrangeiras está concentrada no Cerrado do Brasil [26] . Entre 1995 e 2005 a fatia de capital estrangeiro no sector cerealífero agro-industrial saltou de 16% para 57%. O capital estrangeiro capitalizou com as políticas neoliberais sob Cardoso, Lula e Dilma deslocando-se para o sector do agro-combustível (etanol), controlando cerca de 22% das companhias brasileiras de cana-de-açúcar e etanol [27] – e rapidamente invadindo a floresta amazónica.

Desflorestação da Amazónia.Entre Maio de 2000 e Agosto de 2005, graças à expansão do sector exportador, o Brasil perdeu 132 mil quilómetros quadrados de floresta devido à expansão de grandes proprietários de terra e multinacionais dedicados à criação de gado, soja e madeira [28] . Entre 2003 e 2012, mais de 137 mil quilómetros quadrados foram desflorestados, crime ajudado por multibilionários investimentos do governo em infraestrutura, incentivos fiscais e subsídios.

Em 2008 o dano à floresta tropical amazónica aumentou 67%. Sob pressão de indígenas, camponeses, trabalhadores rurais sem terra e movimentos ecológicos o governo entrou em acção para restringir a desflorestação. Ela declinou de um pico de 27.772 quilómetros quadrados em 2004 (o segundo, apenas inferior ao de 1995, sob Cardoso, com 29.059 km2) para 4.656 km2 em 2012 [29] .

A criação de gado é a principal causa da desflorestação na Amazónia brasileira. Estimativas atribuem mais de 40% a grandes capitalistas e corporações multinacionais de processamento de carne [30] . Os principais investimentos em infraestrutura dos regimes Lula-Dilma, principalmente estradas, haviam aberto anteriormente terras florestais inacessíveis a empresas corporativas de gado. Sob Lula e Dilma, a agricultura comercial, especialmente a soja, tornou-se o segundo maior contribuidor para a desflorestação da Amazónia.

Acompanhando a degradação do ambiente natural, a expansão do agro-negócio foi acompanhada pelo despojamento, assassínio e escravização de povos indígenas. A Comissão Pastoral da Terra, da Igreja Católica, informou que em 2004 a violência latifundiária atingiu o seu mais alto nível em pelo menos 20 anos – o segundo ano do mandato de Lula. Os conflitos subiram de 1.801 em 2004, quando em 2003 foram 1.690 e em 2002 foram 925 [31] .

Segundo o governo, corporações de gado e soja exploram pelo menos 25 mil brasileiros (principalmente índios despojados da sua terra e camponeses sem terra) sob "condições análogas à escravidão". As principais ONGs afirmam que o número verdadeiro poderia ser dez vezes superior àquele. Mais de 183 fazendas foram inspeccionadas em 2005 libertando 4.133 escravizados [32] .

Mineração: A fraude da "privatização" da Vale, agora poluidora número um 

Cerca de 25% das exportações do Brasil são constituídas por produtos minerais – o que destaca a crescente centralidade do capital extractivo na economia. O minério de ferro é o minério de maior importância, representando 78% do total das exportações mineiras. Em 2008, o ferro representou US$16,5 dos rendimentos da indústria, num total de US$22,5 mil milhões [33] . A vasta maioria das exportações de ferro está dependente de um único mercado – a China. Quando o crescimento da China diminui, a procura declina e a vulnerabilidade económica do Brasil aumenta.

Uma firma, privatizada durante a presidência Cardoso, a Vale, através de aquisições e fusões controla quase 100% da produção das minas de ferro do Brasil [34] . Em 1997 a Vale foi vendida pelo estado neoliberal por US$3,14 mil milhões, uma pequena fracção do seu valor. Ao longo da década seguinte ela concentrou seus investimentos na mineração, estabelecendo uma rede global de minas e mais de uma dúzia de países na América do Norte e do Sul, Austrália, África e Ásia. O regime Lula-Dilma desempenhou um papel importante para facilitar a dominância da Vale no sector mineiro e o crescimento exponencial do seu valor. O valor líquido da Vale hoje é de mais de US$100 mil milhões mas ela paga uma das mais baixas taxas de imposto do mundo, apesar de ser a segunda maior companhia mineira do mundo, o maior produtor de minério de ferro e o segundo maior de níquel. Os royalties máximos sobre a riqueza mineral subiram de 2% para 4% em 2013 [35] . Por outras palavras, durante a década do governo "progressista" de Lula e Dilma, a taxa fiscal era um sexto daquela da conservadora Austrália, que mantém uma taxa de 12%.

A Vale tem utilizado os seus enormes lucros para diversificar operações mineiras e actividades relacionadas. Ela liquidou negócios como o aço e a celulose vendendo-os por US$2,9 mil milhões – aproximadamente o preço pago por todo o complexo mineral. Em vez disso concentrou-se na compra de minas de ferro de competidores e literalmente na monopolização da produção. A Vale expandiu-se no manganês, níquel, cobre, carvão, potassa, caulim, bauxita; comprou ferrovias, portos, terminais de contentores, navios e pelo menos oito centrais hidroeléctricas; dois terços das suas centrais hidroeléctricas foram construídas durante o regime Lula [36] .

Em suma, o capitalismo floresceu durante o regime Lula com lucros recorde no sector extractivo, perigo extremo para o ambiente e deslocamento maciço de povos indígenas e produtores em pequena escala. A experiência mineira da Vale sublinha as poderosas continuidades estruturais entre o regime neoliberal de Cardoso e o de Lula: o primeiro privatizou a Vale a preço de saldo, o último promoveu a Vale como o produtor e exportador monopolista dominante de ferro, ignorando totalmente a concentração de riqueza, lucros e poderes do capital extractivo.

Em comparação com o crescimento geométrico dos lucros de monopólio do sector extractivo, os miseráveis dois dólares por dia de Lula e Dilma, dados como subsídio para reduzir a pobreza, dificilmente permitem classificar este regime como "progressista" ou de "centro-esquerda".

Se bem que Lula e Dilma estejam embevecidos com o crescimento do "campeão mineiro" do Brasil (a Vale), outros não estão. Em 2002, a Public Eye, um grupo de direitos humanos e ambientais, deu à Vale um "prémio" como a pior corporação do mundo: "A Vale Corporation actua com o maior desrespeito pelo ambiente e direitos humanos no mundo" [37] . Os críticos citaram a construção da barragem de Belo Monte, da Vale, no meio da floresta tropical amazónica como tendo "consequências devastadoras para regiões com biodiversidade única e tribos indígenas" [38] .

O sector mineiro é capital intensivo, gera poucos empregos e acrescenta pouco valor às suas exportações. Ele tem degradado á água, a terra e o ar; afectado desfavoravelmente comunidades locais, despojado comunidades índias e criado uma economia de altos e baixos.

Com o acentuado arrefecimento da economia chinesa, especialmente o seu sector manufactureiro em 2012-14, os preços do ferro e do cobre caíram. As receitas de exportação do Brasil declinaram, minando o crescimento geral. É especialmente importante que a canalização de recursos para infraestruturas destinadas aos sectores agro-minerais resultou no esgotamento de fundos para hospitais, escolas e transporte urbano – os quais estão de deprimidos e proporcionam um serviço fraco a milhões de trabalhadores urbanos.

O fim do "mega ciclo" extractivo e a ascensão de protestos em massa 

O modelo de orientação extractiva do Brasil entrou num período de declínio e estagnação em 2012-2013 quando a procura mundial – especialmente na Ásia – declinou, sobretudo na China[39] . O crescimento flutuou em torno dos 2%, mal acompanhando o crescimento populacional. A classe baseada neste modelo de crescimento, especialmente o estrato reduzido de investidores estrangeiros de carteira, mineração monopolista e grandes corporações do agro-negócio, os quais controlam e arrecadam a maior parte das receitas e lucros, limitou os "efeitos gotejamento" ("trickle down effects") que os regimes Lula-Dilma promoveram como a sua "transformação social". Se bem que alguns programas inovadores tenham sido iniciados, o acompanhamento e a qualidade dos serviços realmente deteriorou-se.

O número de camas para pacientes em hospitais declinou de 3,3 por 1000 brasileiros em 1993 para 1,9 em 2009, o segundo mais baixo da OCDE [40] . As admissões em hospitais financiados pelo sector público caiu e as longas esperas e baixa qualidade são endémicos.

O gasto federal no sistema de saúde tem caído desde 2003, quando ajustado à inflação, segundo o estudo da OCDE. A despesa pública em saúde é baixa: 41%, a comparar com 82% no Reino Unido e 45,5% nos EUA [41] . A polarização de classe inerente ao modelo extractivo agro-mineral estende-se às despesas do governo, impostos, transportes e infraestrutura: financiamento maciço para rodovias, barragens, centrais hidroeléctricas para o capital extractivo, contra gastos inadequados e em declínio para transportes públicos, saúde pública e educação.

As raízes mais profundas dos levantamentos em massa de 2013 estão localizadas na política de classe de um estado corporativo. Os regimes Cardoso e Lula-Dilma, ao longo das últimas duas décadas, seguiram uma agenda elitista e conservadora, amortecida pela política clientelista e paternalista que neutralizou a oposição em massa durante um período de tempo extenso, até que a rebelião em massa e os protestos à escala nacional desmascararam a fachada "progressista".

Publicistas de esquerda e sabichões conservadores que saudaram Lula como um "progressista pragmático" ignoraram o facto de que durante o seu primeiro mandato o apoio do estado à elite do agro-negócio foi sete vezes maior do que a oferecida aos agricultores familiares que representavam aproximadamente 90% da força de trabalho rural e proporcionavam a maior parte dos alimentos para consumo local. Durante o segundo mandato de Lula, o apoio financeiro do Ministério da Agricultura ao agro-negócio durante a safra 2008.09 foi seis vezes maiores do que os fundos concedidos ao programa de redução da pobreza de Lula, o altamente publicitado programa "Bolsa Família" [42] . Ortodoxia económica e demagogia populista não são substitutos de mudanças estruturais substantivas, envolvendo uma reforma agrária ampla que abranja 4 milhões de trabalhadores rurais sem terra, assim como uma renacionalização de empresas extractivas estratégicas como a Vale a fim de financiar agricultura sustentável e preservar a floresta tropical.

Ao invés disso, Lula e Dilma saltaram em força para o boom do etanol: "açúcar, açúcar por toda a parte" mas sem nunca perguntar, "Que bolsos enchem?" A crescente rigidez estrutural do Brasil, sua transformação numa economia capitalista extractiva, potenciou e ampliou o âmbito da corrupção. A competição por contratos mineiros, concessões de terra e projectos gigantes de infraestrutura encoraja as elites dos negócios agro-minerais a pagarem ao "partido no poder" a fim de assegurar vantagens competitivas. Isto se verificou particularmente com o "Partido dos Trabalhadores" cuja liderança executiva (destituída de trabalhadores) era composta de profissionais em ascensão, aspirando a posições na classe da elite que encarava os subornos nos negócios para o seu "capital inicial" como uma espécie de "acumulação inicial através da corrupção".

O boom das commodities, durante quase uma década, encobriu as contradições de classe e a extrema vulnerabilidade de uma economia extractiva dependente de exportações de bens primários para mercados limitados. As políticas neoliberais adaptadas à promoção de exportações de commodities levaram ao influxo dos bens manufacturados e enfraqueceram a posição do sector industrial. Em consequência, os esforços de Dilma para renovar a economia produtiva a fim de compensar o declínio das receitas de commodities não funcionaram: estagflação, excedentes orçamentais em declínio e enfraquecimento da balança comercial praguejaram a sua administração precisamente quando a massa de trabalhadores e da classe média estão a pedir uma redistribuição de recursos em grande escala, de subsídios ao sector privado para investimentos em serviços públicos.

As fortunas politicas de Rousseff e do seu mentor, Lula, foram construídas sobre os frágeis fundamentos do modelo extractivo. Eles falharam em reconhecer os limites do seu modelo, muito menos em formular uma estratégia alternativa. Uma colcha de retalhos de propostas, reformas políticas, retórica anti-corrupção face aos protestos de milhões de pessoas que se estendem a todas as grandes e pequenas cidades do país não resolve o problema básico de desafiar a concentração de riqueza, propriedade e poder de classe da elite agro-mineral e financeira. As suas aliadas multinacionais controlam as alavancas do poder político, com e sem corrupção e bloqueiam quaisquer reformas significativas.

A era do "Populismo Wall Street" de Lula está acabada. A ideia de que altas receitas provenientes das indústrias extractivas podem comprar lealdades populares através do consumismo, financiado pelo crédito fácil, está ultrapassada. Os investidores da Wall Street já não louvam mais os BRICs como um novo mercado dinâmico. Como é previsível eles estão a transferir seus investimentos para actividades mais lucrativas em novas regiões. Quando a carteira de investimentos declina e a economia estagna, o capital extractivo intensifica sua pressão dentro da Amazónia e com terrível preço por parte da população indígena e a floresta tropical.

O ano de 2012 foi um dos piores para os povos indígenas. Segundo o Conselho Indigenista Missionário, filiado à Igreja Católica, o número de incidentes violentos contra as comunidades índias aumentou 237% [43] . O regime Rousseff deu aos índios o menor número de títulos legais à terra do que qualquer presidente desde o retorno da democracia (sete títulos). A esta taxa, o estado brasileiro levará um século para titular os pedidos de terra das comunidades índias. Ao mesmo tempo, em 2012, 62 territórios índios foram invadidos por latifundiários, mineiros e madeireiros, 47% mais do que em 2011 [44] . A maior ameaça de despojamento vem de projectos como a mega barragem de Belo Monte e centrais hidroeléctricas gigantes promovidas pelo regime Rousseff. Quando a economia agro-mineral vacila, as comunidades índias estão a ser esmagadas ("genocídio silencioso") a fim de intensificar o crescimento agro-mineral.

Os maiores beneficiários da economia extractiva do Brasil são os principais traders decommodities do mundo os quais, à escala mundial, embolsaram US$250 mil milhões ao longo do período 2003-2013, ultrapassando os lucros das maiores firmas da Wall Street e cinco das maiores companhias automobilísticas. Em meados de 2000, alguns traders desfrutaram retornos de 50 a 60 por cento. Mesmo em 2013 eles estavam numa média de 20-30% ( Financial Times , 4/15/13, p. 1). Especuladores de commodities ganharam mais de 10 vezes o que foi gasto com os pobres. Estes especuladores lucram com flutuações de preços entre localizações, com oportunidades de arbitragem proporcionadas pela abundância de discrepâncias de preços entre regiões. Traders monopolistas eliminaram competidores e os impostos baixos (5-15%) aumentaram a sua mega riqueza. Os maiores beneficiários do modelo extractivista Lula-Dilma, ultrapassando mesmo os gigantes agro-minerais, são os vinte maiores traders -especuladores de commodities. 

Capital extractivo, colonialismo interno e o declínio a luta de classe 

A luta de classe, especialmente sua expressão em greves conduzidas por sindicatos e trabalhadores rurais localizados em acampamentos que lançam ocupações de terras, declinou drasticamente ao longo do último quarto de século. O Brasil durante o período que se seguiu à ditadura militar (1989) foi um líder mundial em greves, com 4000 em 1989. Com o retorno da política eleitoral e a incorporação e legalização dos sindicatos, especialmente na estrutura de negociações colectivas tripartidas, as greves declinaram para uma média de 500 durante a década de 1990. Com o advento do regime Lula (2003-2010) as greves declinaram ainda mais, para 300-400 por ano [45] . As duas maiores centrais sindicais, CUT e Força Sindical, aliadas ao regime Lula, tornaram-se adjuntas virtuais do Ministério do Trabalho: sindicalistas asseguravam posições no governo e as organizações recebiam grandes subsídios do estado, ostensivamente para treino e educação do trabalhador. Com o boom das commodities e a ascensão das receitas do estado e rendimentos de exportações, os governos formularam uma estratégia do gotejamento, aumentando o salário mínimo e lançando novos programas anti-pobreza. Nas zonas rurais, o MST continuava a pedir uma reforma agrária e empenhado em ocupações de terras mas a sua posição de apoiar criticamente o Partido dos Trabalhadores em troca de subsídios sociais levou a um declínio agudo nos acampamentos a partir dos quais lançar ocupações de terras. No arranque da presidência de Lula (2003) o MST tinha 285 acampamentos, em 2012 tinha 13 [46] .

O declínio da luta de classe e a cooptação dos movimentos de massa estabelecidos coincidiram com a intensificação da exploração capitalista extractiva do interior do país e o violento despojamento das comunidades indígenas. Por outras palavras, a exploração acrescida do "interior" pelo capital agro-mineral facilitou a concentração de riqueza nos grandes centros urbanos e nas áreas rurais estabelecidas, levando à cooptação de sindicatos e movimentos rurais. Portanto, apesar de algumas declarações retóricas e protestos simbólicos, o capital agro-mineral encontrou pouca solidariedade organizada entre o trabalho urbano e os índios despojados e trabalhadores rurais escravizados na Amazónia "arrasada". Lula e Dilma desempenharam um papel chave na neutralização de qualquer frente unida nacional contra as depredações do capital agro-mineral.

A degeneração das principais confederações trabalhistas é visível não só com a sua presença no governo e com a ausência de greves como também na organização dos comícios anuais de trabalhadores no 1º de Maio. Os mais recentes virtualmente não incluíram qualquer conteúdo político. Há espectáculos de música, temperados com lotarias oferecendo automóveis e outras formas de entretenimento consumista, financiados e patrocinados por grandes bancos privados e multinacionais [47] . Esta relação entre a cidade e a Amazónia lembra com efeito uma espécie de colonialismo interno, no qual o capital extractivo subornou uma aristocracia do trabalho como aliado cúmplice para a sua pilhagem das comunidades do interior.

Conclusão: Com movimentos de massa, o modelo extractivista está sob sítio 

Se a CUT e a Força Sindical estão cooptadas, o MST está enfraquecido e as classes de baixo rendimento receberam aumentos monetários, como e por que movimentos de massa sem precedentes emergiram em simultâneo numa centena de grandes cidades e outras menores por todo o país?

O contraste entre os novos movimentos de massa e os sindicatos foi evidente na sua capacidade para mobilizar apoio durante os dias de protesto de Junho-Julho/2013: os primeiros mobilizaram 2 milhões, os últimos 100 mil.

Manifestação em S. Paulo.O que precisa ser esclarecido é a diferença entre os pequenos grupos locais de estudantes ( Movimento Passe Livre , MPL) que detonaram os movimentos de massa com base num aumento em tarifas de autocarros e os gastos faraónicos do estado com a Copa do Mundo (campeonato de futebol) e as Olimpíadas e os movimentos de massa espontâneos que questionaram as políticas orçamentais do estado e as prioridades na sua totalidade.

Muitos publicistas dos regimes Lula-Dilma aceitam sem questionamento as verbas orçamentais atribuídas a projectos sociais e de infraestrutura, quando de facto apenas uma fracção é realmente gasta na medida em que são roubadas por responsáveis corruptos. Exemplo: entre 2008-12 foram destinados R$6,5 mil milhões para transporte públicos nas cidades principais mas só 17% foi realmente gasto ( Veja, 17/07/2013). Segundo a ONG "Contas Abertas", ao longo de um período de dez anos o Brasil gastou mais de R$160 mil milhões em obras públicas que não estão concluídas, nunca deixaram a prancheta de desenho ou foram roubadas por responsáveis corruptos. Um dos mais notórios casos de corrupção e má administração é a construção de 12 quilómetros de metro em Salvador, com a condição estabelecida de que seria completado em 40 meses ao custo de R$307 milhões. Treze anos depois (2000-13) as despesas aumentaram para cerca 1000 milhões de reais e escassos 6 km foram completados. Seis locomotoras e 24 carruagens compradas por 100 milhões de reais decompuseram-se e a garantia dos fabricantes expirou ( Veja, 17/07/2013). O projecto foi paralisado por acções de sobrefacturação corrupta envolvendo responsáveis federais, estaduais e municipais. Enquanto isso, 200 mil passageiros são forçados a viajar diariamente em autocarros decrépitos.

A corrupção profunda que infecta toda a administração Lula-Dilma conduziu a um vasto fosso entre os apregoados feitos do regime e a deteriorada experiência diária da grande maioria do povo brasileiro. O mesmo fosso existe em relação às despesas para preservar a floresta tropical amazónica, as terras dos índios e para financiar os programas anti-pobreza: responsáveis corruptos do PT desviam fundos para financiar suas campanhas eleitorais ao invés de reduzir a destruição ambiental e reduzir a pobreza.

Se a riqueza do boom no modelo extractivo agro-mineral "filtrou-se" para o resto da economia e elevou salários, isso fez-se de um modo muito irregular, desigual e distorcido. A grande riqueza concentrada no topo encontrou expressão numa espécie de novo sistema casta-classe no qual transporte privado – helicópteros e heliportos – clínicas privadas, escolas privadas, áreas de recreação privadas, exércitos de segurança privada para os ricos e abastado foram financiados por subsídios promovidos pelo estado. Em contraste, as massas experimentaram um agudo declínio relativo e absoluto em serviços públicos nas próprias experiências essenciais da vida. A ascensão no salário mínimo não compensada por 10 horas de espera em apinhadas salas públicas de emergência, transportes irregulares e sobrelotados, ameaças pessoais diárias e insegurança (50 mil homicídios). Pais que recebem a esmola anti-pobreza enviam seus filhos para escola decadentes onde professores mal pagos correm de uma escola para outra mal atendendo suas classes e proporcionando um fraco aprendizado. A maior indignidade para aqueles que recebem esmolas de subsistência foi dizerem-lhes que, nesta sociedade de classe-casta, eles eram "classe média"; que faziam parte da imensa transformação social que retirou 40 milhões da pobreza, quando se arrastavam para suas casas com horas de tráfego, retornando de empregos cujo salário mensal pagava uma partida de ténis num clube de campo da classe alta. A economia extractiva agro-mineral acentuou todas as desigualdades sócio-económicas do Brasil e o regime Lula-Dilma acentuou esta diferença pela elevação das expectativas, ao afirmar o seu cumprimento e a seguir ignorar os impactos sociais reais na vida diária. As verbas orçamentais em grande escala do governo para transporte público e promessas de projectos para novas linhas de metro e comboio foram adiadas durante décadas pela corrupção em grande escala e a longo prazo. Os milhares de milhões gastos ao longo de anos renderam resultados mínimos – uns poucos quilómetros completados. O resultado é que o fosso entre as projecções optimistas do regime e a frustração das massas aumentou amplamente. O fosso entre a promessa populista e o aprofundamento da clivagem entre classes sociais não será encoberto por lotarias sindicais e almoços VIP. Especialmente para toda uma geração de jovens trabalhadores que não estão presos às antigas memórias do Lula "metalúrgico" um quarto de século antes. A CUT, a FS, o Partido dos Trabalhadores são irrelevantes ou são percebidos como parte do sistema de corrupção, estagnação social e privilégio. A característica mais gritante da nova onda de protesto de classe é a divisão geracional e organizacional: trabalhadores metalúrgicos mais velhos ausentes, jovens trabalhadores não organizados dos serviços presentes. Organizações locais e espontâneas substituem os sindicatos cooptados.

O local de confrontação é a rua – não o lugar de trabalho. As reivindicações transcendem salários monetários – as questões em causa são o salário social, padrões de vida, orçamentos nacionais. Em última análise os novos movimentos sociais levantam a questão das prioridades de classe nacionais. O regime está a despojar centenas de milhares de residentes em favelas – um expurgo social – para construir complexos desportivos e acomodações de luxo. As questões sociais permeiam os movimentos de massa. A sua independência organizativa e autonomia sublinham o mais profundo desafio a todo o modelo extractivista neoliberal; muito embora nenhuma organização ou liderança nacional tenha emergido para elaborar uma alternativa. Mas a luta continua. Os mecanismos tradicionais de cooptação fracassam porque não há líderes identificáveis para subornar. O regime, a enfrentar o declínio dos mercados de exportações e dos preços das commodities, e profundamente comprometido com investimentos não produtivos de muitos milhares de milhões de dólares nos jogos, tem poucas opções. O PT perdeu há muito a sua vanguarda anti-sistémica. Seus políticos estão ligados a e financiados por bancos e elites agro-minerais. Os líderes sindicais protegem seus feudos, suas deduções mensais automáticas e seus estipêndios. Os movimentos de massa das cidades, tal como as comunidades índias da Amazónia, terão de encontrar novos instrumentos políticos. Mas ao tomarem o caminho da "acção directa" eles deram o primeiro grande passo.
[1] James Petras and Henry Veltmeyer Cardoso's Brazil: A land for Sale (Lanham, Maryland: Rowman and Littlefield 2003/Chapter 2.
[2] ibid Chapter 1.
[3] James Petras, Brasil e Lula – Ano Zero (Blumenau: EdiFurb 2005) Chapter 1.
[4] Peter Evans, Dependent Development: The Alliance of Multinational State and Local Capital in Brazil (Princeton NJ : Princeton University Press 1979).
[5] Jose Serra "The Brazilian Economic Miracle" in James Petras Latin America from Dependence to Revolution (New York: John Wiley 1973) pp. 100 – 140.
[6] Brasil e Lula op cit. Ch. 1
[7] Cardoso's Brazil Ch. 5
[8] ibid, Ch.3 and 6
[9] ibid, Table A.12, p. 126
[10]iIbid, Ch. 3.
[11] ibid, Ch. 1, 2.
[12] ibid, Ch. 5
[13] ibid, Ch. 2.
[14] ibid, Table A. 6.
[15] Brasil e Lula, Ch. 1.
[16] Brazil Exports by Product Section (USD) www.INDEXMUNDI.com/trade/exports/Brazil
[17] Peter Kingstone "Brazil 's Reliance on Commodity Exports threatens its Medium and Long Term Growth Prospects"www.americasquarterly.or/icingstone .
[18] Brazil Exports op cit.
[19] Kingstone op cit.
[20] Kingstone op cit. World Bank Yearbook 2011.
[21] Financial Times, 3/26/13, p. 7.
[22] Brazil's Surging Foreign Investment: A Blessing or Curse? VSITC Executive Briefing on Trade Oct. 2012.
[23] ibid
[24] rainforests:mongabay.com/amazon_destruction
[25] Ibid.
[26] Bernard Mancano Fernandes and Elizabeth Alice Clements "Land Grabbing, Agribusiness and the Peasantry in Brazil and Mozambique " Agrarian South (April 2013).
[27] Rainforests op cit.
[28] Rainforests op cit.
[29] Rainforests op cit.
[30] ibid
[31] Jose Manual Rambla "La agonia de los pueblos indigenas, buera de la agenda reivindicativa de Brasil" rebellion.org/notice, 5/7/13.
[32] Rainforests ibid p. 8
[33] Brazil Mining, www.e-mj.com/index.php/reatures/850-Brazil-,mining .
[34] Wikipedia Vale, en.wilkipedia.org/wiki/vale_miningcompany .
[35] The Economist, June 2, 2013.
[36] Wikipedia, p. 9.
[37] Guardian, Jan. 27, 2012.
[38] ibid
[39] Financial Times, July 13, 2013, p. 9.
[40] Financial Times, July 1, 2013.
[41] ibid
[42] Rainforest op cit.
[43] ibid
[44] ibid
[45] Raul Zibechi, "El fin del consenso lulista" rebellion 7/7/13
[46] Ibid.
[47] Ibid. 


O original encontra-se em http://petras.lahaine.org/?p=1945 

Francisco: o nascimento de um estadista


Autor: 
 
Coluna Econômica


O Rio de Janeiro assistiu o nascimento de um estadista, o Papa Francisco. Foi inesquecível sua atuação na Jornada Mundial da Juventude. Poucas vezes um estadista conseguiu ser tão preciso nos discursos, redesenhando um organismo milenar como a Igreja Católica através da identificação das ideias básicas a nortear o novo rumo.

Não ousou investir contra alguns dogmas, ainda que anacrônicos - como o celibato ou a condenação das relações homossexuais. Mas verbalizou a volta da tolerância ao se indagar: "Se um gay busca Deus, quem sou eu para julgar?".

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Mais que isso.

No período em que o mundo conviveu com o maior processo de inclusão da história - das grandes massas miseráveis nos países do terceiro mundo - a Igreja se afastou dos pobres. Na era das quebras de tabu, da condenação a toda forma de preconceito, a Igreja se esmerou na condenação moral para fora e no acobertamento para dentro.

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O Papa foi preciso ao identificar nas massas pobres e na juventude a seiva do revigoramento da Igreja. E no enclausuramento da Cúria, no Vaticano, seu maior problema.

Há muito tempo a vocação religiosa deixou de atrair os melhores quadros. A maneira de enfrentar a contemporaneidade dos movimentos evangélicos foi estimular os padres-show, atuando na mesma piscina rasa dos pastores. Ao propor a volta do espírito da catequese, em contraposição à banalização da vida moderna e ao consumismo e busca de status que caracterizam os tempos atuais.

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O Papa fugiu da polarização Teologia da Libertação x conservadores que marcou a Igreja brasileira. Ambas estão debaixo da mesma organização e buscando o mesmo fim: o fortalecimento da Igreja. Criticou tanto os que tentaram subordinar a Igreja ao marxismo como ao neoliberalismo.

E é essa a estratégia: pairar acima das quizilas, das disputas internas, e apresentar o objetivo maior, para o qual toda a organização deverá convergir: os seguidores da Teologia da Libertação atuando junto às regiões pobres; os conservadores preservando o espaço junto a uma elite algo anacrônica; e a Igreja empenhada em conquistar novos territórios junto aos jovens através do chamamento ao jovem.

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A falta de estadistas na Igreja - e nem se venha considerar João Paulo 2o como tal - produziu lutas intestinas terríveis, especialmente na América Latina.

Grande parte da liderança política atual fez-se sob a inspiração da Igreja: no PT, Lula e os movimentos sociais; no PSDB, os egressos da Ação Popular (AP), que se originou da ação católica, da Juventude Estudantil Católica (JEC), Juventude Universitária Católica (JUC) e Juventude Operária Catolica (JOC). Lula saiu dos movimentos populares, José Serra da AP, Dilma Rousseff do GGN (Grupo Gente Nova), de inspiração católica.

***
Tudo isso se perdeu nas últimas décadas. A Igreja perdeu o encanto para os jovens, para os ativistas e mesmo para os místicos. Manteve-se nos movimentos populares, sob boicote da Cúria. Conservou influência apenas nas zonas rurais e junto aos remanescentes da elite econômica envelhecida.

Figuras símbolos, como o cardeal Arns e os irmãos Lorscheiter, príncipes políticos, como dom Lucas Neves e conservadores influentes, como Eugênio Salles, foram substituídos por burocratas sem visão política nem missionária.

Agora, Francisco tenta repor a Igreja no caminho da reconstrução.

Fortaleza se une para preservar o Parque Ecológico do Cocó

GGN - ter, 30/07/2013 - 11:58 - Atualizado em 30/07/2013 - 16:14

Jornal GGN - Um dos maiores parques localizados em área urbana na América do Sul, o Parque Ecológico do Cocó, em Fortaleza, está sendo ameaçado. A celeuma começou quando a prefeitura iniciou o desmatamento, derrubando árvores para dar espaço para a construção de dois viadutos - localizados no cruzamento entre as avenidas Antônio Sales e Engenheiro Santana Júnior.  
O impasse se formou. Ativistas acamparam no local para impedir a continuação das obras. Luciano Hortencio mora em frente ao parque do Cocó, e se diz orgulhoso por seu privilégio. Ele o descreve como um lindíssimo bosque formado por áreas nativas e manguezais, banhado pelo rio Cocó, repleto de aves e animais de nossa fauna. “O parque nos traz paz e harmonia para os sentidos. Você não imagina o prazer que se sente ao acordar de manhã, manhãzinha, com o canto das aves silvestres. Só sabe quem sente, quem ouve... É indescritível! Além de tudo isso, o Parque Ecológico do Cocó e nossa principal reserva de verde”, relata emocionado.
O Ministério Público Federal no Ceará (MPF-CE) entrou na segunda-feira (29) com uma ação civil pública na Justiça Federal com pedido de liminar contra a prefeitura de Fortaleza e a União pedindo a paralisação das obras de mobilidade urbana que causam intervenções no Parque do Cocó.
A ação, sugerida pelo procurador da República Oscar Costa Filho, pede suspensão das obras do viaduto. O MPF requer, ainda, a elaboração dos estudos prévios de impacto ambiental, em atendimento ao que pede a legislação ambiental.
Um laudo divulgado pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente), com base no Código Florestal Nacional, aponta para o fato de que as 79 árvores que foram derrubadas, até agora, estavam em área de preservação, o que atesta a ilegalidade da obra. De acordo com o Ibama, para que a intervenção fosse realizada, seria preciso, primeiro, um estudo específico para a região.
Antes que o MPF-CE entrasse com sua ação, na última sexta-feira (26), a SPU (Superintendência do Patrimônio da União) liberou a retomada das obras da construção dos viadutos. De acordo com o órgão, “a documentação apresentada pela Prefeitura Municipal de Fortaleza atende às exigências para a autorização da obra".
As obras paralisaram por determinado período. Tanto MPF-CE quanto a própria SPU questionaram sobre a legalidade da derrubada de árvores dentro do Parque do Cocó. A SPU recebeu um relatório da prefeitura e considerou legal a devastação, liberando a obra. O MPF-CE continuou sua ação de impedimento da construção, entrando, então, na segunda-feira, dia 29, com a liminar contra a prefeitura. Essas idas e vindas acabaram por tornar a situação do parque ainda mais complicada.
Hortencio reclama que, em detrimento do "progresso", as áreas verdes sempre foram postas em segundo plano. Entretanto, os insumos e recursos naturais são finitos, lembra ele. “A questão de prioridade para o ser humano, nunca foram as áreas verdes, pelo contrário. O verde sempre foi relegado a um plano absolutamente inferior, sendo os seus defensores minimizados e achincalhados por lutarem pela sua preservação”, analisa.
O ex-ministro Ciro Gomes fez declarações polêmicas desdenhando da opinião dos opositores à construção do viaduto. Ele alegou que 70 mil carros e 274 ônibus com 144 mil passageiros, demoram meia hora por dia para passar pelo trecho e, com a construção do viaduto, o tempo seria de três minutos. “Mas ficam lá (atrapalhando) meia-dúzia de ‘burguesotes’ e maconheiros”, esbravejou Ciro, sem cargos na região mas auxiliando na administração de seu parente, em Fortaleza, em uma polêmica entrevista a uma rádio local, a Verdes Mares.
Com relação às declarações do ex-ministro, Hortêncio disse que toda e qualquer palavra ou expressão, de quem quer que for, que desdenhe, insulte, agrida ou minimize um opositor, merece repúdio. “Liberdade de expressão não pode e nem deve ser confundida com falta de educação”, critica.
Ao ser questionado sobre a necessidade de fato do viaduto, Luciano relata que os estudantes de arquitetura da Universidade Federal do Ceará estão promovendo um concurso a fim de dar outras opções para o problema do tráfego nessa área. “Por que não aproveitar boas ideias? Por que fazer tudo a toque de caixa?”, indaga. “O que está acontecendo é de cortar o coração, porque promove a total descaracterização do parque". 
O Parque tem como vizinho o Iguatemi, o Centro de Convenções, e a expansão imobiliária da classe média. Não devemos esquecer que Tasso Jereissati é o dono do Iguatemi, e que Ciro Gomes é cria política de Tasso. Há mais jogo de interesses nesse caso do que o que transparece na reportagem.

Formados em Cuba, brasileiros destacam atenção à saúde primária “que rompe com a ditadura do dinheiro”

viomundo - publicado em 29 de julho de 2013 às 22:11


Andreia Campigotto trabalha em Cajazeiras, no sertão paraibano
“Medicina cubana ensina a atender o povo com qualidade e humanismo”, afirma militante
29 de julho de 2013
Por José Coutinho Júnior
Da Página do MST
A saúde no Brasil tem sido tema de grandes debates nas últimas semanas, provocados tanto pelas manifestações das ruas, que exigem melhoras e mais investimentos na área, quanto pelas propostas recentes do governo em trazer médicos de outros países para trabalhar em regiões mais carentes.
Essas propostas, assim como a obrigação dos estudantes de universidades públicas em cumprir dois anos no Sistema Único de Saúde (SUS), tem sido alvo de fortes críticas das associações de médicos, que afirmam que essas não seriam as soluções para os problemas.
A Página do MST conversou com Augusto César e Andreia Campigotto, ambos militantes do Movimento e formados em medicina em Cuba, sobre o tema.
Nascido em Chapecó e com 25 anos de vida, Augusto César ainda não exerce a profissão. Está estudando para fazer a prova de revalidação do diploma cubano e, assim, poder atuar no Brasil. Quando conseguir seu registro, pretende trabalhar na área rural, atendendo os Sem Terra e os assentados da Reforma Agrária.
Andreia Campigotto tem 28 anos e nasceu em Nova Ronda Alta (RS). Trabalha em Cajazeiras, no sertão paraibano, como residente em medicina da família em uma unidade básica de saúde, que atende uma comunidade de 4 mil pessoas.
Formato
O curso de medicina cubano dura seis anos. Para estudantes de outros países, ele se inicia na Escola Latinoamericana de Medicina, localizada em Havana. Depois de um período inicial de dois anos, os estudantes são enviados para as diversas universidades do país. Augusto e Andreia foram para a universidade da província de Camagüey.
O curso de medicina cubano não se difere muito do brasileiro, do ponto de vista curricular.

Augusto é de Chapecó e estuda para fazer o Revalida
“Os dois primeiros anos trabalham com as ciências médicas. Estudamos fisiologia humana, anatomia humana e desde o primeiro ano temos contato com os postos de saúde. Quando somos distribuídos para as universidades, vivenciamos o sistema público de saúde. Comparado com o Brasil, o nível teórico é igual, mas o nível de prática é maior”, afirma Augusto.
“Um estudo do governo federal mostra a compatibilidade curricular dos cursos de medicina de 90% entre Brasil e Cuba. Então, não há grandes diferenças teóricas”, conta Andreia.
A diferença principal entre os dois cursos está na concepção de medicina e de saúde na formação dos médicos. “O curso brasileiro é voltado para as altas especialidades. Tem essa lógica de que você faz medicina, entra numa residência e se especializa. Já em Cuba o curso se volta à atenção primária de saúde, para entendermos a lógica de prevenção das doenças e o tratamento das enfermidades que as comunidades possam vir a ter”, diz Augusto.
Em contrapartida, “saúde” e “medicina” no Brasil são sinônimos de pedidos de exames e tratamento com diversos medicamentos, calcados em sua maioria na alta tecnologia. Com isso, a medicina preventiva fica em segundo plano, alimentando uma indústria baseada na exigência destes procedimentos.
“No Brasil, temos uma limitação na formação do profissional, pois ela é voltada ao modelo hospitalacêntrico, que pensa só na doença e no tratamento. Em Cuba isso já foi superado. Lá eles formam profissionais para tratar e cuidar com qualidade, humanismo e amor cada paciente; aprendemos de verdade a lidar com a saúde do ser humano”, analisa Andreia.
Ela destaca que os médicos formados na ilha são capazes de atender a população sem utilizar somente a alta tecnologia, condição que não necessariamente limita um atendimento com qualidade à população que mais carece.
“É mais barato fazer promoção e prevenção de saúde. No entanto, isso rompe com a ditadura do dinheiro. Com isso, os médicos aguardam o paciente ficar doente para pedir um monte de exames e dar um monte de medicamentos”, afirma Augusto.
De acordo com ele, essa estrutura fortalece o complexo médico-industrial, que se favorece sempre que há alguém internado ou que precise tomar algum medicamento.
“Não negamos a necessidade de medicamentos e equipamentos, porque precisamos dar atenção a esse tipo de paciente. Mas não precisamos esperar que todas as pessoas fiquem doentes para começar a trabalhar a questão da saúde”, acredita Augusto.
Nesta série de reportagens, os dois relatam as diferenças entre os cursos e a concepção de medicina em Cuba e no Brasil, opinam sobre os problemas brasileiros em relação à saúde e defendem uma medicina que sirva para atender com qualidade o povo brasileiro. Na quarta-feira (29/07), Andreia e Augusto contam como é a prova de revalidação dos diplomas estrangeiros, e analisam a elitização da medicina nas universidades brasileiras.

As mudanças no mapa do IDH brasileiro

viomundo - publicado em 29 de julho de 2013 às 21:55



O Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil 2013 mostra que cerca de 74% dos municípios brasileiros (ou 4.122 deles) se encontram nas faixas de Médio e Alto Desenvolvimento Humano, enquanto cerca de 25% deles (ou 1.431 municípios) estão nas faixas de Baixo e Muito Baixo Desenvolvimento Humano. Os dados foram divulgados hoje (29/07), no lançamento do Atlas Brasil 2013, em Brasília, pelo PNUD. As faixas de desenvolvimento humano são calculadas tendo como base o Índice de Desenvolvimento Humano (IDHM) dos 5.565 municípios pesquisados pelo Censo de 2010, do IBGE.
Os dados refletem a evolução apresentada pelo IDHM do Brasil nas duas últimas décadas, ao sair da faixa de Muito Baixo (0,493) em 1991 para Alto (0,727) em 2010. Esta evolução sinaliza também que o país está conseguindo, aos poucos, reduzir as disparidades históricas de desenvolvimento humano entre os municípios das regiões Norte e Nordeste e aqueles localizados no Centro-Sul.
Em 1991, pelos recálculos e adaptações feitas no Atlas Brasil 2013 para o novo IDHM, 85,8% dos municípios brasileiros fariam parte do grupo de Muito Baixo Desenvolvimento Humano. Em 2000, esse número teria caído para 70% e, em 2010, despencado para 0,57% (32 municípios). Apesar da evolução neste quadro, a análise por regiões mostra que o Nordeste ainda tem a maioria de seus municípios no grupo de Baixo Desenvolvimento Humano (61,3%, ou 1.099 municípios), enquanto no Norte eles somam 40,1% (180 municípios) nesta categoria. Pelos dados atuais, 0,8% dos municípios do Brasil (44 deles) fazem parte da faixa de Muito Alto Desenvolvimento Humano.
As regiões Sul (64,7%, ou 769 municípios) e Sudeste (52,2% ou 871 municípios) têm uma maioria de municípios concentrada na faixa de Alto Desenvolvimento Humano. No Centro-Oeste (56,9%, ou 265 municípios) e no Norte (50,3, ou 226 municípios), a maioria está no grupo de Médio Desenvolvimento Humano. Ainda segundo o mesmo levantamento, Sul, Sudeste e Centro-Oeste não possuem nenhum município na faixa de Muito Baixo Desenvolvimento Humano. Por outro lado, as regiões Norte e Nordeste não contam com nenhum município na faixa de Muito Alto Desenvolvimento Humano.
Desempenho por estados
O Distrito Federal é a Unidade da Federação (UF) com o IDHM mais elevado (0,824) e se destaca também como o único do grupo a figurar na faixa de Muito Alto Desenvolvimento Humano. Além disso, o DF tem o maior IDHM Renda (0,863), o maior IDHM Educação (0,742) e o maior IDHM Longevidade (0,873) entre as UFs. Na outra ponta, Alagoas (0,631) e Maranhão (0,639) são os estados com menor IDHM do país.
Na comparação feita entre as UFs, constata-se que a diferença entre o maior e o menor IDHM do grupo recuou 25,5% entre 1991 (0,259) e 2010 (0,193). A maior redução nas disparidades foi encontrada no IDHM Longevidade, onde a diferença caiu 41,6% (de 0,202 em 1991 para 0,118 em 2010). A queda na diferença entre o maior e o menor IDHM Educação foi a segunda maior: 15,9%, de 0,264 (1991) para 0,222 (2010). No IDHM Renda, a queda foi de 11,6% pela mesma comparação, passando de 0,284 (1991) para 0,251 (2010).
A redução na diferença entre os maiores e menores IDHMs dos estados e DF mostra que as Unidades da Federação conseguiram reduzir as desigualdades entre si em termos de desenvolvimento humano.
Apesar disso, os estados do Sul e Sudeste continuam com IDHM e subíndices superiores aos do Brasil – com exceção de Minas Gerais (0,730) que, na dimensão Renda, encontra-se abaixo do IDHM Renda do país (0,739). Todos os estados do Norte e Nordeste têm IDHM e subíndices menores que os do Brasil.
Análise de disparidade entre municípios
A análise de disparidade entre os maiores e menores IDHMs Longevidade, Renda e Educação no âmbito dos municípios mostra distâncias absolutas maiores do que as encontradas na comparação entre estados. Entre os 5.565 municípios comparados, o IDHM Longevidade, assim como nos estados, foi onde houve maior redução: a diferença entre o mais alto e mais baixo município caiu 41,1% entre 1991 e 2010, de 0,377 para 0,222, respectivamente. No IDHM Renda, esta diferença caiu 14,4% no mesmo período (de 0,574 para 0,491). Já para o IDHM Educação, a disparidade entre o mais alto e o mais baixo registrado por municípios apresenta alta de quase 13% em relação ao que se via em 1991 (de 0,547 para 0,618).
Capitais brasileiras
Das capitais brasileiras, apenas cinco delas aparecem entre os 20 municípios de maior IDHM: Florianópolis (3º), Vitória (4º), Brasilia (9º e Belo Horizonte (20º).
O Atlas Brasil 2013 mostra que nenhuma capital brasileira aparece entre os 20 municípios de mais alto IDHM Longevidade. No ranking do IDHM Educação, apenas três delas estão entre as 20 de melhor desempenho: Vitória (4º), com 0,805; seguida de Florianópolis (5º), com 0,800; e mais abaixo por Curitiba (17º), com 0,768. Já no ranking do IDHM Renda para municípios, sete capitais aparecem entre as 20 de maior subíndice: Vitória (3º), com 0,876; Porto Alegre (6º), com 0,867; Brasília (8º), com 0,863; Curitiba (11º), com 0,850; São Paulo (15º), com 0,843; Belo Horizonte (17º), com 0,841; e Rio de Janeiro (18º), com 0,840.