"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música"
Friedrich Nietzsche

sexta-feira, novembro 17, 2006

O Estado de São Paulo - 17/11/06

OMC decide retomar negociações da Rodada de Doha Genebra

Os 150 países membros da Organização Mundial do Comércio (OMC), agora com a participação do recém-admitido Vietnã, decidiram ontem, em Genebra, retomar as negociações da Rodada Doha, que visa a reduzir os entraves ao livre comércio mundial. Os debates foram suspensos em julho. Por ora, essa tentativa de avanço se dará apenas no nível técnico. Significa que os chefes das comissões temáticas (agricultura, serviços, produtos industriais) poderão convocar o retorno aos trabalhos quando considerarem oportuno.
Ao tomar a decisão de liberar as reuniões técnicas, o diretor-geral da OMC, Pascal Lamy, advertiu que as negociações mais importantes, no nível político, não poderão recomeçar sem o compromisso claro das grandes potências de modificar suas propostas de abertura dos seus mercados.
As negociações começaram em 2001, em Doha, no Catar, com data de encerramento marcada para o fim de 2004. Seu foco principal é a abertura comercial a serviço do desenvolvimento, com destaque para a redução das desigualdades nos países mais pobres. O principal obstáculo nas negociações é a recusa dos Estados Unidos e da União Européia de reduzir substancialmente os subsídios que concedem aos seus produtores rurais.

Reuters Brasil - 17/11/06

Irã promete resposta "esmagadora" a qualquer agressão

TEERÃ (Reuters) - O Irã responderá decisivamente a qualquer ato de agressão pelos Estados Unidos ou por Israel, disse na sexta-feira o ministro da Defesa iraniano, Mostafa Mohammad Najjar.

Os EUA e Israel são os críticos mais ferozes do Irã, que acusam de desenvolver armas nucleares secretamente e de apoiar grupos terroristas. O Irã nega as acusações.

"Se os americanos ou sionistas quiserem fazer qualquer coisa contra o sagrado establishment da República Islâmica, nossas Forças Armadas darão a eles uma resposta esmagadora e decisiva", disse Mohammad Najjar.

"(A resposta) fará que eles lamentem seu ato pela eternidade."

As forças iranianas realizaram três jogos de guerra no último ano, que incluíram testes com mísseis balísticos de médio alcance, os quais poderiam atingir Israel ou bases dos EUA no golfo Pérsico.

(Texto de Alireza Ronaghi)

O Globo - 17/11/06

Senhor das armas

A Taurus será um dos alvos do relatório final da CPI das Armas, que depois de um ano está chegando ao fim.

Os deputados tentaram investigar os compradores de 21 mil armas comercializadas pela gigante do armamento, pegas com os bandidos cariocas.

Mas a Taurus só teria fornecido à CPI o nome de 7 mil proprietários. Alegou que um incêndio destruiu o resto dos arquivos. Ah, bom!

Prossegue o tiroteio

O relatório da CPI desmistifica a idéia de que bandido compra arma no mercado negro.

No caso do Rio, muitas armas usadas por facínoras saíram de lojas da Baixada e de Niterói.

O Globo - 17/11/06

Militantes somalis ajudaram Hezbollah

Relatório da ONU indica que radicais foram enviados para lutar no Líbano

NOVA YORK. Mais de 700 integrantes de grupos radicais islâmicos da Somália viajaram para o Líbano em julho para lutar ao lado do Hezbollah na guerra contra Israel. Segundo um relatório da ONU, a milícia no Líbano retribuiu o favor oferecendo treinamento e - através de seus patronos Irã e Síria - armas para a aliança muçulmana que luta para controlar a Somália.

O relatório parece ser a primeira indicação de que guerreiros estrangeiros auxiliaram o Hezbollah nos 34 dias do conflito, período durante o qual Israel manteve um forte bloqueio ao Líbano. O relatório também diz que o Irã tentou trocar armas por urãnio da Somália, apesar de não saber se o país conseguiu fechar o negócio.

O relato de 86 páginas foi escrito por quatro especialistas que monitoram violações a um embargo ao comércio de armas à Somália iniciado em 1992.

Os especialistas têm acesso às informações dos serviços de espionagem dos 15 países do Conselho de Segurança. Qualquer envolvimento de somalis seria surpreendente, pois a eficácia do Hezbollah é atribuída à sua familiaridade com a região.

O relatório afirma que, em meados de julho, Aden Hashi Farah, um dos líderes da aliança islâmica somali, selecionou pessoalmente 720 guerreiros para lutar ao lado do Hezbollah no Líbano. Pelo menos cem já tinham retornado em setembro, enquanto outros ficaram no Líbano para treinamento avançado. Não está claro quantos foram mortos, apesar de o relatório dizer que alguns estavam feridos e foram medicados na Somália. Além de treinar alguns somalis, o Hezbollah "negociou apoio adicional" do Irã e da Síria, inclusive com armas.

Folha de São Paulo - 17/11/06

Caçadores matam guia do Ibama em tocaia

Equipe foi atacada a tiros por traficantes de tartarugas quando navegava em rio de Roraima; 2 pessoas ficaram feridas

Criminosos fugiram com a lancha onde estava o corpo; PF investiga se o ataque foi uma reação ao aumento da fiscalizão na região

KÁTIA BRASIL

DA AGÊNCIA FOLHA, EM MANAUS

Uma equipe do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) foi alvo de emboscada de ca�adores ilegais de tartarugas anteontem em Roraima. Uma pessoa morreu e duas ficaram feridas. O grupo formado por dois servidores do instituto e três guias locais contratados como colaboradores navegava no rio água Boa do Univini (afluente do rio Branco), área de difícil acesso em Caracaraí (RR), quando foi atacado a tiros.

A superintendente do Ibama em Roraima informou que a Polícia Federal investiga se o conflito foi uma reação contra a fiscalização na área.

Os funcionários atacados integram o projeto do Ibama Quelônios da Amazônia -de manejo e proteção dos principais quelônios da região. Quelônios são uma ordem (que inclui tartarugas, cágados e jabutis) dentro da classe dos répteis. O executor do projeto, o analista ambiental e veterinário do Ibama Raimundo Pereira Cruz, integrava o grupo e um dos feridos -o outro baleado - o guia Josué Silva, que está em estado grave. O guia José Santos Cruz foi morto. A equipe estava na região desde segunda.

A superintendente do Ibama de Roraima, Nilva Baraína, disse que a equipe sofreu a emboscada quando seguia, de lancha, para o acampamento.

"Eles estavam dentro do barco quando fizeram uma curva e foram atacados a tiros. Eles [caçadores] estavam de tocaia. O pessoal do Ibama n�o estava armado e não revidou."

Segundo Nilva, os sobreviventes relataram que foram obrigados a pular na água -inclusive os feridos-, enquanto os atacantes fugiam com a lancha, onde estava o corpo do guia José Santos Cruz.

Nesse momento, o grupo se separou. Raimundo Cruz nadou até uma praia fluvial, onde se escondeu. Ele foi encontrado ontem, ferido na perna.

O piloto da lancha e chefe substituto do escritório do Ibama em Caracaraí, José Silva Araújo, e dois guias -entre eles Josué Silva, que ficou ferido- conseguiram chegar, por volta das 6h de ontem, a um hotel de selva próximo ao local do conflito, na região do baixo rio Branco, onde foram socorridos. Um gerente do hotel acionou o Ibama via rádio.

O guia Josué Silva foi levado de avião até Boa Vista, onde foi internado em estado grave. Até a conclusão desta edição, a lancha e o corpo do guia José Santos Cruz não tinham sido encontrados.

Investigação

Dois aviões e um helicóptero do governo de Roraima partiram de Boa Vista na tarde de ontem para a região do conflito.

As aeronaves transportavam equipes das polícias Federal e Militar para a investigação do caso e busca dos caçadores, que seriam seis homens.

Uma das hipóteses é que o ataque tenha sido uma reação contra a fiscalização na área.

Há 15 dias, uma equipe da 15 fiscais da Femact (órgão ambiental de Roraima), acompanhada por cinco policiais militares, está na região do baixo rio Branco em ação de combate à captura de quelônios.

Na última sexta-feira, o Ibama apreendeu dez tartarugas no porto fluvial de Caracaraí. Chamados de tartarugueiros, os caçadores praticam com�rcio ilegal de quelônios para as cidades de Manaus (AM) e Belém (PA). Eles capturam as tartarugas -muitas delas filhotes- e as mantém em criadouros clandestinos até que barcos façam o traslado.

A direção nacional do Ibama informou ontem que o crime em Roraima não foi o primeiro envolvendo funcionários do órgão. Como exemplo, a assessoria do Ibama citou o assassinato, em 2001, de João Dantas de Brito, então chefe da unidade de Floresta Nacional do Ibama em Nósia Floresta (RN).

As operações de combate ao tráfico de tartarugas na região amazônica são realizadas com frequência pelas polícias Federal e Militar e pelo Ibama. Na região do baixo rio Branco, em Roraima, 680 tartarugas foram apreendidas em criadouros clandestinos durante operação em dezembro de 2005.

Naquela área, traficantes de tartarugas aproveitam a vazante (período em que um rio apresenta o menor volume de águas) do rio Branco para aprisionar os quelônios.

Colaboraram JOSÉ EDUARDO RONDON, da Agência Folha, e a Sucursal de Brasília

quinta-feira, novembro 16, 2006

Correio Brasiliense

LIVRE COMÉRCIO
Andinos tentam salvar acordos

Presidente colombiano, Álvaro Uribe, só consegue promessas após dois dias em Washington. Peru e Equador também enviam representantes aos Estados Unidos para acelerar a ratificação de tratados


A vitória dos democratas nas eleições legislativas nos Estados Unidos se transformou em pesadelo para Peru, Colômbia e Equador, que viram escorrer pelas mãos o esforço de meses de negociações com a administração Bush para a assinatura de tratados de livre comércio (TLC). Desde o início da semana, os governos dos três países empreenderam uma ofensiva diplomática para evitar um mal maior, com a expiração dos atuais acordos de preferências no dia 31 de dezembro. O presidente colombiano, Álvaro Uribe, viajou a Washington, onde foi recebido pela secretária de Estado americana, Condoleezza Rice, e altos funcionários. Depois de dois dias de reuniões, ele conseguiu arrancar da Representante de Comércio dos EUA (USTR), Susan Schwab, uma promessa de postergação da Lei de Preferências Aduaneiras Andinas (ATPDEA), assim como a ratificação dos TLC.
“Manifestamos nosso apoio à prolongação da ATPDEA para Colômbia, Peru, Equador e Bolívia, a fim de minimizar as perturbações comerciais”, afirmou John Veroneau, adjunto de Schwab, por meio de um comunicado. Veroneau lembrou que Uribe e “representantes do Peru” se reuniram anteontem com altos funcionários da USTR para defender a prolongação das preferências. Na nota, ele garantiu que o governo “trabalhará com o Congresso para que os acordos de comércio sejam apresentados o mais rapidamente possível”. A idéia é prolongar a vigência dos atuais tratados antes que os democratas —mais protecionistas que os republicanos —, assumam o controle do Senado e da Câmara dos Deputados, em janeiro.

Democratas
Uribe também se reuniu com o senador John McCain, cotado como próximo candidato à Presidência pelos republicanos. Como argumento, o mandatário colombiano advertiu sobre o risco da perda de “centenas de milhares de empregos”, e da escalada do narcotráfico. Uribe aproveitou para estabelecer contatos com os democratas. “Precisamos das preferências. A incerteza está gerando dúvidas e os investidores não querem se arriscar”, disse. A expectativa da não renovação das preferências fez com que a empresa Levis cancelasse novos contratos. “Só a incerteza já custou ao país 7 mil empregos. Mas há 600 mil em jogo”, disse Uribe.
O governo colombiano pressionou por várias vezes pela extensão das preferências, mas os republicanos ignoraram. Eles contavam que o Congresso apreciaria e aprovaria o TLC negociado até o final do ano, o que tornaria as preferências desnecessárias. Para o senador democrata Chris Dodd, a chance de o Congresso renovar as preferências tarifárias é mínima. “Acho difícil que ocorra. Só temos mais duas semanas (de sessões parlamentares) e duvido que se possa aprovar isso”, disse Dodd, membro da Comissão de Relações Internacionais do Senado. Segundo ele, o partido quer tempo para avaliar o conteúdo dos acordos.
“Os republicanos negociaram acordos e tratados de livre comércio sem nos levar em conta. Agora queremos revisá-los”, acrescentou. O recado foi o mesmo para o ministro do Comércio Exterior do Equador, Tomás Peribonio, que também fez seu périplo por gabinetes em Washington. O chanceler peruano, José Antonio García Belaunde, se mostrou otimista e disse que seu governo está debruçado numa nova estratégia para conseguir a ratificação do TLC.
Os Estados Unidos assinaram em 1991 com os países da Comunidade Andina de Nações (CAN) um acordo de preferências tarifárias unilaterais válido por 10 anos. Previa, em contrapartida, a instalação de bases norte-americanas em território andino para o combate ao narcotráfico. Apostando no sucesso da Área de Livre Comércio das Américas (Alca), os EUA decidiram estender a validade do pacto até o dia 31 de dezembro de 2006. Mas o fracasso das negociações da Alca levou a administração Bush a rever seus planos e a pressionar pela assinatura de TLC em condições favoráveis — considerando que os mercados exportadores andinos estão comprometidos com os EUA.

Folha de São Paulo - 16/11/06

PETRÓLEO

Petrobras e PDVSA descobrem um megacampo na Venezuela


Em investimento conjunto, as estatais Petrobras, brasileira, e PDVSA, venezuelana, conseguiram identificar na bacia do rio Orinoco, na Venezuela, um campo gigante de petróleo com reservas de 9 bilhões de barris.
É um volume superior ao reservatório de 8 bilhões de barris do campo de Marlim, o maior do Brasil, localizado na bacia de Campos (litoral do Rio de Janeiro).
O projeto é a contrapartida da Petrobras ao investimento da PDVSA na refinaria de Pernambuco, cujas participações acionárias de cada empresa ainda estão em fase de definição, segundo José Sergio Gabrielli, presidente da estatal brasileira. Com inauguração prevista para 2011, a unidade demandará investimentos de US$ 2,5 bilhões a US$ 2,8 bilhões.
"Esse projeto está associado à refinaria. É a contrapartida da refinaria", disse Gabrielli, que esteve anteontem na Venezuela com o presidente Lula na inauguração de uma ponte financiada pelo BNDES.
Segundo Gabrielli, as companhias já obtiveram a "certificação das reservas provadas" do campo de Carabobo 1 na bacia terrestre do rio Orinoco. No jargão da indústria do petróleo, isso significa que há a comprovação da existência do óleo e de que ele pode ser explorado -nem todos os volumes de óleo descobertos têm viabilidade de produção, dependendo do seu tipo e de sua acomodação no subsolo.
Ao todo, a PDVSA conseguiu comprovar que existem reservas de 45,4 bilhões de barris de óleo no bloco de Carabobo, subdividido em vários campos a serem explorados em conjunto com outras empresas.
Não está acertada ainda, segundo Gabrielli, a participação acionária da Petrobras no projeto. Pelas leis da Venezuela, a PDVSA tem de controlar, ao menos, 51% dos campos de petróleo do país, por meio de empresas mistas criadas com outras companhias.
Segundo Gabrielli, o óleo do campo é do tipo "ultrapesado" -de menor valor comercial e mais difícil de ser explorado.
Para o especialista em petróleo Guiseppe Bacoccoli, pesquisador da Coppe (Coordenação dos Programas de Pós-Graduação em Engenharia), da UFRJ, o óleo do Orinoco é considerado pela comunidade internacional de petróleo como "não-convencional", ou seja, de difícil aproveitamento comercial por ser muito pesado. (PEDRO SOARES)

O Estado de São Paulo - 16/11/06

Japão assume direito de ter arma atômica

Governo diz que Constituição não proíbe, mas nega plano de armar-se
Reuters, Associated Press e EFE

Num comunicado em resposta ao questionamento de um parlamentar, o gabinete do primeiro-ministro japonês Shinzo Abe (conservador) declarou ontem que a Constituição pacifista do país permitiria que o Japão tivesse 'um nível mínimo' de armas nucleares, caso isso fosse necessário para sua defesa. O mesmo comunicado do governo, no entanto, informa que o país não tem planos para a aquisição ou o desenvolvimento de um arsenal atômico.
Foi a primeira vez que o governo japonês assumiu publicamente o direito do país de ter esse tipo de arma - do qual o Japão foi a primeira e até hoje única vítima, em 1945, com o bombardeio americano a Hiroshima e Nagasaki.
A questão parlamentar - levantada pelo deputado Sadakazu Tanigaki, do Partido Liberal Democrata (PLD) - surgiu após as iniciativas do ministro de Relações Exteriores, Taro Aso, de defender um debate sobre as estratégias japonesas para proteger-se da ameaça externa depois do teste atômico norte-coreano.
Shochi Nakagawa, diretor de estratégias políticas do PLD - e rival político de Tanigaki no próprio partido -, considerou conveniente examinar a legalidade da eventual posse de armas por parte do Japão, após a mudança da situação da segurança regional na Ásia. Segundo ele, 'a posse de armas nucleares reduz a possibilidade de o Japão ser atacado'.
Na avaliação do governo, a Constituição japonesa não diz nada sobre a posse de armas nucleares.
Aso já sugerira anteriormente que simpatizava com a possibilidade de 'um debate sem tabus' sobre a posse de armas nucleares.
As declarações de Aso e Nakagawa provocaram críticas de países como a Coréia do Sul e a China. De acordo com Tanigaki, 'no Japão, efetivamente, há liberdade de opinião, mas é preciso evitar que declarações de autoridades enviem uma mensagem errada para os países vizinhos'.

segunda-feira, novembro 13, 2006

National Geographic

A velha-guarda libanesa de Foz do Iguaçu se reúne para o tradicional café de domingo na mercearia de Abbas Assad. A comunidade sempre tem muito o que conversar: negócios, religião, família – e até terrorismo.

Zaki Moussa ainda se lembra da primeira vez em que viu as famosas cataratas do Iguaçu, em 1987. “Fiquei admirado, o maior rio do Líbano não tem 30 metros de largura”, recorda enquanto caminhamos pelas passarelas do renovado Parque Nacional do Iguaçu. Zaki aproveita o feriado para mostrar um dos principais cartões-postais do Brasil a seu irmão Saade, que faz sua primeira viagem ao país. Zaki é hoje um próspero agente de viagens, pai de três filhos nascidos ali e um dos líderes de sua comunidade – realidade muito distante da que vivia em 1987, quando a ida às cataratas foi um breve alívio na dura rotina do recém-chegado a um país sobre o qual pouco sabia. A decisão de deixar sua terra natal, o Líbano, não foi planejada. O país vivia desde 1975 uma guerra civil entre cristãos e uma coalizão muçulmana. Beirute, a “pérola do Oriente”, estava dividida em linhas religiosas. Nascido na pequena Lala, poupada pelo conflito, Zaki partiu em 1985 para a conflagrada capital disposto a estudar biologia e iniciar sua vida adulta. Mas a situação do país se deteriorou, e logo ficou claro para Zaki, então com 20 anos, que o futuro que buscava estava em outro lugar.Com essa diáspora nos anos 1980, hoje existem mais libaneses espalhados pelo mundo (cerca de 11 milhões) do que no próprio Líbano (4 milhões). Em Foz do Iguaçu, eles são maioria entre 12 mil imigrantes de origem árabe, boa parte deles vivendo no bairro de Jardim Central, onde as ruas têm nome peculiar, como Meca e Palestina.A escolha de Foz como destino é curiosa, e começa com a chegada, em 1950, do mascate libanês Ibrahim Barakat ao que então não passava de um batalhão de fronteira do Exército brasileiro. Como poucos eram os mercadores que se aventuravam tão longe do litoral, Barakat viu sua carga de tecidos e utensílios domésticos desaparecer nas mãos dos soldados e suas famílias. “Parecia uma festa, todo mundo queria comprar dele”, diverte-se Mohamad Barakat, filho do mascate. Um ano e outras rentáveis viagens depois, Barakat resolveu trazer o primogênito e abrir uma loja na frente do batalhão. Cinco anos depois, chegou a família toda. A prosperidade atraiu para a região primos e amigos tanto de Baloul, cidade natal dele, como da vizinha Lala, cidade de sua esposa, Amina, formando uma pequena colônia libanesa no povoado, então praticamente isolado do resto do país. Para sorte dos pioneiros, Foz cresceu um bocado nos anos 1960, com a construção da ponte da Amizade até Ciudad del Este (na época Puerto Stroessner), no Paraguai, e o asfaltamento da BR-277 até Curitiba. Depois, com a hidrelétrica de Itaipu, em dez anos a população local pulou de 34 mil para 136 mil – hoje são 280 mil iguaçuenses. A presença árabe se faz notar. De dia, é fácil distinguir mulheres cobertas pelo véu shaddor fazendo compras pelas ruas. À noite, os homens ocupam suas mesas nos restaurantes, tagarelando em árabe depois de passar o dia atrás do balcão de suas lojas perto da ponte de Amizade ou nas galerias de Ciudad del Este.A mais tradicional dessas mesas não se reúne à noite, mas nas manhãs de domingo, no açougue e mercearia de Abbas Assad. Entre intermináveis rodadas de chá, café não coado e manakishi (pão árabe quase torrado, coberto de ervas, gergelim e azeite de oliva), a velha-guarda da comunidade discute os últimos acontecimentos do mundo árabe. A idéia é confraternizar, e até o sectarismo religioso é deixado de lado. Sempre que pergunto a alguém se é xiita ou sunita, a resposta vem precedida de um sincero “Ah, somos todos muçulmanos”. Apesar de aclamarem a boa acolhida do povo brasileiro, a maioria dos árabes que conheci se relaciona predominantemente com outros árabes. Alguns imigrantes de primeira geração nem sequer falam bem o português e ainda acalentam o sonho de retornar à terra natal. “Nos sentimos como refugiados. Não fizemos planos de deixar nosso país e tínhamos uma única saída: imigrar”, explica-me Zaki Moussa, que se lembra de como sofreu para dominar o português. A língua é sem dúvida o maior obstáculo à integração, mas não é o único. Segundo o Islã, um muçulmano não deve consumir álcool nem carne de porco e deve comer apenas carne abatida segundo o preceito hallal (o animal é degolado com um só golpe de uma faca bem afiada e depois pendurado para que todo o sangue escorra). Como fazer, então, para confraternizar com um povo cujas atividades sociais geralmente se revolvem em torno de uma mesa farta de cerveja e cujo prato mais famoso é feijão-preto com metade de um porco boiando dentro?“Quando eu recebia brasileiros, comprava cerveja, mesmo sendo contra minha religião. Agora, na casa de brasileiros, eles não servem bebidas para não nos constranger”, conta Assem Dabaja, desde 1987 no Brasil e dono de uma das duas escolas árabes da cidade. Em sua escola, Dabaja é um espectador privilegiado das pressões e expectativas depositadas sobre os ombros da segunda geração, que logo estará tomando as rédeas da colônia.Os mais novos terão de lidar ainda com uma recente e incômoda fama. Depois dos ataques de setembro de 2001 em Nova York, a imprensa americana começou a rotular “a região da tríplice fronteira” – mais conhecida hoje pelo contrabando de mercadorias e pelas fortunas provenientes dessa economia paralela – como um paraíso de terroristas. Num artigo de 2002 para a revista Vanity Fair, o repórter Sebastian Junger descreve seu encontro com o ex-agente argentino Mario Aguilar Rizi, que passou anos investigando dois atentados contra alvos israelenses em Buenos Aires, em 1992 e 1994. Rizi conta que se deparou com campos de treinamento de militantes em fazendas próximas à fronteira com células do grupo libanês Hezbollah e da rede Al Qaeda, além de membros do grupo basco ETA e de outras facções terroristas. Junger reconhece que Rizi é uma figura polêmica, com uma série de entreveros com a lei, mas outras reportagens, com fontes distintas, chegaram a afirmar que Osama bin Laden e seu braço direito, Muhamad Khalid Sheik, estiveram na região em 1995.O assunto é espinhoso. A embaixada americana em Brasília limita-se a me dizer, de forma diplomática, que a região preocupa o governo de seu país porque “há uma enorme quantidade de dinheiro oriundo de atividades ilegais sendo enviada para o Oriente Médio”. Especula-se ainda que 400 marines venham realizando no Paraguai exercícios militares em conjunto com tropas locais. A imprensa guarani acusa o episódio como o início da implantação de uma base americana fixa na região – o que a embaixada dos EUA em Assunção nega de forma categórica. No Brasil, a assessoria de imprensa do setor de inteligência e combate ao terrorismo apenas informa que, oficialmente, não há indício da presença de células terroristas na área. Meu anfitrião Zaki Moussa me diz que a questão já causou incômodo suficiente, “sem que nunca tenham provado nada”. Ele e outros pais esperam que o problema não interfira em uma meta da comunidade: que seus filhos aprendam a viver no Brasil, mas sem perder a identidade árabe. “Não gosto quando meu filho fala que é brasileiro”, confessa Assem Dabaja. Na escola que dirige, nem todas as alunas usam o véu. O currículo normal é reforçado com aulas diárias de língua e cultura árabes. As meninas jogam futebol de salão e até disputam campeonatos com escolas não-árabes. A única disciplina deixada de fora é educação sexual. O sexo e a relação com as mulheres talvez sejam os maiores obstáculos no caminho da integração.“No Líbano não existe esse negócio de menina sair com amigos”, diz Dabaja. Mas para Mehedin Sleiman, um solteiro de 24 anos, esse é um dos grandes prazeres de ser brasileiro. Quase todas as noites ele e seus amigos, todos descendentes, saem para paquerar na noite de Foz – mesmo que, no final, terminem jogando baralho na casa de um deles. As baladas são sempre regadas, com raras abstenções, a uísque com guaraná. Numa sexta-feira aventuro-me com o grupo até a boate Disco, a mais badalada da cidade. A multidão balança ao som de música eletrônica, e quase todos parecem conhecer Mehedin. A cada cinco minutos uma garota vem cumprimentá-lo, e seus muitos amigos nunca deixam seu copo de Black Label ficar vazio. “Minha mãe até hoje fica acordada me esperando voltar”, diverte-se ele.Mehedin sempre namorou brasileiras, mas nenhuma delas até hoje pôs os pés em sua casa, “por respeito à minha irmã”. Ele não se importa com a nacionalidade da mulher com quem vier a casar, mas sabe que uma brasileira não seria a primeira escolha de sua mãe. Apesar das pressões familiares, muitos de seus amigos estão se casando com brasileiras, mas não são poucos os relacionamentos que fracassam diante da diferença de culturas. A prima de Mehedin, Najla, nunca pôde usufruir das mesmas liberdades – não porque fosse proibida, mas por não julgar apropriado. A caçula de cinco irmãos homens sempre teve liberdade para fazer o que quisesse, mas sabia também que tudo estaria sendo monitorado pela comunidade. Ela manteve essa postura até o dia em que o descendente de italianos Rodolfo Chiesa conquistou seu coração nas salas do curso de odontologia. Até ele procurar os pais dela para pedir sua mão, o namoro resumiu-se a telefonemas. Com o casamento marcado, os dois puderam enfim fazer programas juntos pela cidade. Antes de casar, no entanto, Rodolfo ainda deu um último passo em direção ao coração dos Sleiman: se converteu ao islamismo. Casados desde março, o casal parece feliz. “Estamos estudando o Alcorão”, diz ela. Diante das peculiaridades de sua história de amor, eles só não sabem ainda qual será a cultura de seus filhos – se eles gostarão de agir como brasileiros ou preservarão os arraigados costumes árabes –, num dilema que certamente marcará as futuras gerações de Foz do Iguaçu.

O Estado de São Paulo - 13/11/06

Armas vêm dos Estados Unidos

A CPI do Tráfico de Armas reuniu informações detalhadas sobre 31 operações policiais destinadas à apreensão de armamentos e munições. Segundo o balanço, a maior parte das armas apreendidas é de fabricação estrangeira e o principal fabricante são os Estados Unidos. De 731 armas apreendidas nessas operações, 548 tiveram a origem identificada, sendo 371 estrangeiras e 177 nacionais. A pesquisa da CPI abrange apenas uma parte das operações realizadas nos últimos dois anos. O número de armas apreendidas é bem maior do que o pesquisado. Só este ano, a Polícia Federal apreendeu 3.336 armas.

Recomendo assistirem o filme O Senhor das Armas, que retrata o comércio de armas no mundo e seus patrocinadores (Sindeaux).

O Estado de São Paulo - 13/11/06

Israel: 'Irã deve começar a temer'

Na véspera de encontro com Bush, Olmert adverte Teerã sobre programa nuclear do país

O primeiro-ministro israelense, Ehud Olmert, advertiu ontem o Irã sobre as conseqüências do programa nuclear do país, dizendo que Teerã deveria 'começar a temer' as conseqüências de adquirir armas nucleares. 'Eles (os iranianos) devem temer se não fizer um acordo com a comunidade internacional', disse Olmert, de acordo com a porta-voz Miri Eisin. A ameaça foi feita durante o vôo a caminho de Washington, onde Omert deve se reunir hoje com o presidente dos EUA, George W. Bush.
Olmert descreveu o presidente iraniano, Mahmud Ahmadinejad, como 'um homem pronto para cometer crimes contra a humanidade' e disse que as ambições do Irã serão o principal tema de seu encontro com Bush. A visita do primeiro-ministro ocorre dias depois que os democratas derrotaram os republicanos nas eleições legislativas do dia 7, e tem como objetivo redefinir a política americana em relação a Israel após a derrota do partido de Bush.
Apesar do comentário agressivo de Olmert, o vice-ministro de Defesa de Israel, Ephraim Sneh, afirmou que uma ofensiva militar israelense deveria ser considerada apenas como último recurso, após esgotadas todas as vias de negociação. 'A opção militar teria conseqüências graves', disse Sneh.
Em resposta às declarações do premiê israelense, o porta-voz do Ministério de Relações Exteriores do Irã, Mohammad Ali Hosseini, afirmou que a reação a um eventual ataque militar israelense será 'destruidora'. 'Israel não dispõe dos meios para ameaçar o Irã porque sua situação de segurança é frágil', declarou Hosseini. Além disso, Hosseini anunciou que o Irã instalará 3 mil centrífugas de enriquecimento de urânio até março de 2007.
O anúncio acontece um dia antes de os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU (EUA, Rússia, China, França, Grã-Bretanha) mais Alemanha retomarem em, Nova York ,as discussões sobre o projeto europeu de resolução contra o Irã. O chefe iraniano de negociação nuclear, Ali Larijani, declarou que, se o CS adotar a resolução com todas as restrições previstas, significará o fim das negociações com as grandes potências.
O projeto europeu prevê sanções econômicas e comerciais contra o Irã, mas não interfere nas atividades vinculadas à construção da usina iraniana de Bouchehr, que conta com a cooperação da Rússia - fator indispensável para a obtenção do apoio russo. Os EUA, por sua vez, querem endurecer o projeto europeu.
Os seis países 'iniciarão uma fase explicativa, mas ainda não encerrarão a negociação', disse o embaixador da França na ONU, Jean-Marc de La Sablière. Os seis países, porém, não chegaram a um acordo sobre a extensão das sanções.
Em Teerã, o presidente iraniano Mahmud Ahmadinejad criticou os esforços da ONU para impor restrições a seus país. 'É vergonhoso que o Conselho de Segurança ameace os países que buscam combustível nuclear com objetivos pacíficos', afirmou. AP e AFP

O Globo - 13/11/06

Reconstrução ameaça fracassar
Bilhões gastos não foram suficientes para devolver qualidade de vida ao país

BAGDÁ. Por pouco mais de US$38 bilhões, os EUA e seus empreiteiros no Iraque deram a 4,6 milhões de pessoas acesso a água. Distribuíram sementes a fazendeiros, melhorando as colheitas de trigo. Com a capacidade de geração de eletricidade acima dos níveis do pré-guerra, deram mais horas de energia a muitos. Consertaram mais de cinco mil escolas e vacinaram 4,6 milhões de crianças contra a pólio.
A lista continua. Mas à medida que a reconstrução patrocinada e liderada pelos EUA se aproxima do fim, autoridades americanas e empreiteiros lutam com uma realidade dura: os milhares de sucessos no Iraque podem terminar num grande fracasso.
- Fizemos uma quantidade significativa de trabalho. Mas fomos esmagados pela violência - diz Clifford G. Mumm, que passou a maior parte dos últimos três anos no Iraque administrando projetos para a Bechtel Corp. - É muito difícil ser otimista - diz.
Os projetos custeados pelos EUA há muito são alvo de sabotagem. Muitos dos que foram poupados continuam sem utilidade para uma população paralisada pela violência.

EUA tinham Plano Marshall como modelo
No entanto, os que participam do esforço de reconstrução dizem que a preocupação com segurança não é o único problema. Planejamento e coordenação malfeitos por autoridades dos EUA fizeram com que mesmo projetos individuais bem-sucedidos fracassassem. Por exemplo, centros de saúde foram construídos a custos altos, mas sem água ou saneamento.
E agora que os EUA estão repassando os esforços de reconstrução para o Iraque, muitos envolvidos no processo temem que os iraquianos não tenham treinamento ou dinheiro necessários para manter funcionando as instalações construídas pelos EUA.
Essa não era a maneira com que se esperava que a reconstrução funcionasse. Em 2003, seis meses após a invasão, o presidente Bush prometeu ao Iraque "o maior compromisso financeiro do gênero desde o Plano Marshall". Funcionários de alto escalão do governo consideraram aquele plano - que ajudou a reconstruir a Europa após a Segunda Guerra - um modelo para o Iraque. O Congresso logo aprovou um orçamento que, embora previsse menos dinheiro que o Plano Marshall, parecia suficiente para pôr o Iraque de volta nos trilhos.
Andando pelas ruas da cidade de Mosul, três anos depois, o taxista Sattar Othman quase não percebe:
- Que reconstrução? - pergunta. - Hoje bebemos água sem tratamento de uma instalação erguida há anos que nunca passou por manutenção. A eletricidade só nos visita duas horas por dia. E agora estamos andando para trás. Cozinhamos em fogões a lenha, que recolhemos de florestas, devido à falta de gás - relata.
A visão de Othman é compartilhada por muitos no país. Iraquianos expressam frustração não apenas com os EUA mas com os líderes iraquianos - por embolsarem dinheiro de ajuda que deveria servir ao bem de todos.
Os EUA alocaram mais de US$38 bilhões para reconstruir o Iraque, mais do que para qualquer outra nação. A maioria do dinheiro já se foi. Três quartos do fundo principal para a reconstrução foram gastos e o restante foi separado para a finalização de projetos-chave.
Ao todo, 88% de todos os projetos planejados (cerca de 12 mil) foram completados, com apenas 4% ainda por começar. No entanto, medir o sucesso por projetos finalizados é uma maneira errada de medir o sucesso.
- Sabíamos que não se tratava do número de projetos finalizados, e sim de perguntar: a eletricidade está chegando a Bagdá? Há segurança nas ruas? O petróleo está fluindo? É o que interessa - disse Jon C. Bowersox, que até pouco tempo era adido de saúde da embaixada dos EUA.

O Globo - 13/11/06

Um manual para ensinar a mordomia
Texto da Câmara lista 180 serviços oferecidos aos deputados

BRASÍLIA. Produzido para orientar deputados e assessores sobre o funcionamento da Câmara, o recém-criado "Manual do gabinete parlamentar", que interessa principalmente aos 269 novatos que tomarão posse em fevereiro, lista a série de mordomias e benesses a que um congressista tem direito e dá dicas, no mínimo, curiosas: desde a importância de contratar um "assessor de pleitos" às possibilidades de instalações do gabinete, que vão do modelo "enxuto" ao "ampliado".
O número de serviços oferecidos pela Câmara a um deputado chega a exatamente 180. São privilégios como cotas fixas para gastos com Correios, passagem aérea, frigobar, TV a cabo, telefone, poltronas, passaporte diplomático, serviço médico estendido a familiares e assinaturas de jornais e revistas, além da verba indenizatória para gastos no estado de origem.
O manual foi elaborado pelo Departamento de Apoio Parlamentar e tem 330 páginas. A idéia é que funcione como um guia para os deputados. Ele está sendo divulgado na intranet da Câmara, rede interna a que apenas parlamentares e servidores da Casa têm acesso.
No texto, destaca-se a recomendação para a contratação de um "assessor de pleitos", que trabalhará pela liberação de emendas nos ministérios. É definido como o profissional que atua fora da Câmara, junto aos órgãos da administração, acompanhando processos, projetos e pleitos de interesse do parlamentar. Dica valiosa para uma categoria que viu quase uma centena de pares envolvidos em negociatas com a máfia dos sanguessugas. Entre os requisitos necessários, o assessor deve conhecer "a sistemática de liberação de verbas e prestação de contas junto aos órgãos federais e ao Tribunal de Contas da União e a estrutura dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário".
Um capítulo do manual sugere modelos de gabinete, a quantidade ideal de funcionários - de motorista a chefe de gabinete - e os requisitos necessários para cada cargo. São apresentados quatro modelos de gabinete: o "enxuto", com quatro funcionários; o "básico", com cinco; o "completo", com seis; e o "ampliado", com sete. O manual ressalva que se trata de uma sugestão e que o regimento interno da Câmara não prevê categorias funcionais no quadro de pessoal. Os servidores do gabinete são secretários parlamentares. O guia traz ainda sugestões de organização do gabinete, detalhando a disposição das salas e da mobília. Os parlamentares podem, a qualquer momento, solicitar que o espaço seja reformado.
Além das dicas que auxiliam na rotina do gabinete, o manual enumera as verbas a que o deputado tem direito e explica como requisitá-las e prestar contas. Os recursos são referentes a auxílio-moradia (R$3 mil); cota postal/telefônica (R$4,2 mil), verba indenizatória (R$15 mil) e o salário bruto (R$12,4 mil). O valor da cota de passagem aérea varia de acordo com a região do parlamentar: um deputado do Rio tem direito a R$8,3 mil mensais em passagens aéreas; um do Acre, a R$15,6 mil. O parlamentar pode escolher se prefere morar num apartamento funcional ou receber o auxílio-moradia e alugar um imóvel.
Eles têm direito também a assinatura de cinco jornais e revistas, entregues em casa ou no gabinete. As boas-vindas não se resumem às orientações do manual. Os parlamentares também receberão pastas executivas de couro no valor total de R$407,7 mil.

domingo, novembro 12, 2006

Folha de São Paulo - 12/11/06

Militares apóiam coronel acusado de tortura

Oficiais evocam Lei da Anistia e se mobilizam por Ustra; segundo coronel, esquerda terrorista foi responsável por 120 mortes

Coronel reformado do Exército enfrenta processo no qual é acusado de tortura nos anos 70 contra cinco pessoas da mesma família

DA SUCURSAL DO RIO

O processo no qual o coronel reformado do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra é acusado de tortura contra cinco pessoas da mesma família durante a ditadura desencadeou uma ampla mobilização de oficiais das Forças Armadas -já fora da ativa- em apoio ao réu.

O movimento se intensificou depois da audiência da quarta-feira, quando testemunhas de acusação afirmaram ter sido torturadas por Ustra na década de 1970. O pilar da argumentação dos oficiais solidários ao coronel é que a Lei de Anistia (1979) beneficiou não apenas os opositores condenados judicialmente mas também os funcionários dos governos militares, ainda que não tenham sido alvo de ações na Justiça.

"Não existe anistia só de um lado; a anistia só vale para eles?", pergunta o general-de-divisão (três estrelas) reformado Francisco Batista Torres de Melo, coordenador do Grupo Guararapes. Sediada em Fortaleza, a associação reúne 463 oficiais das Forças Armadas (32 generais) e 1.020 civis.

Um manifesto do Guararapes considera a ação contra Ustra "descabida" e uma "afronta" à Lei de Anistia.

O processo "é quase uma aberração", na opinião do general-de-exército (quatro estrelas, o máximo concedido) da reserva Gilberto Barbosa de Figueiredo. Ele preside o Clube Militar, no Rio de Janeiro.

"A lei [de 1979] valeu para os dois lados", diz o general. "Depois dela, o processo não cabe. É a mesma coisa que querer julgar alguém que assaltou um banco. Zerou o jogo. Não vai mais ser julgado por crime que cometeu na época."

A idéia é reafirmada pelo advogado Paulo Esteves, defensor de Ustra: "A moeda tem dois lados com idêntica possibilidade de propositura de ações. É o que a anistia buscou evitar".

"Há pessoas na administração pública que têm contra si imputações [por atitudes] que não são das mais corretas", diz Esteves. "[O processo] traz à baila um assunto que não interessa a ninguém. [No regime militar] ocorreram de lado a lado coisas desagradáveis."

Crimes da esquerda

O advogado se refere a crimes de assalto, seqüestro e morte cometidos por militantes da esquerda armada. Levantamento promovido por Ustra calcula em 120 os mortos e 330 os feridos em ações de guerrilha e terrorismo.

Com o codinome "Tibiriçá", o coronel dirigiu de setembro de 1970 a janeiro de 1974 a seção paulista do órgão centralizador do combate à oposição, o Doi-Codi (Destacamento de Operações de Informações -Centro de Operações de Defesa Interna). Nesse período, pelo menos 40 presos foram mortos nesse local, conforme o jornalista Elio Gaspari no livro "A Ditadura Encurralada".

Os autores da ação contra Ustra são o casal Maria Amélia e César Teles, seus filhos, Janaína e Édson, e Criméia Almeida, irmã de Maria Amélia. Eles acusam o militar por seqüestro e tortura em 1972 e 1973. Janaína tinha 5 anos, e Édson, 4. Também foram levados para o Doi-Codi. Os adultos militavam no PC do B. Eles narram diversas modalidades de sevícias. Grávida então de sete meses, Criméia conta que também foi submetida a violência.

A ação declaratória não visa indenização pecuniária ou condenação. Pede o reconhecimento de Ustra como responsável por danos morais e à integridade física. Em primeira instância, a Justiça considerou que, como a Lei de Anistia trata de crimes, não se aplica a ações civis, e o processo prossegue.

A Folha tentou ouvir Ustra, 74, mas ele não respondeu ao recado. Em conversa em setembro, o militar chamou os relatos de "mentiradas". Disse que os acusadores ficam "inventando coisas" e "mulheres mentem". Atualmente ele se dedica a divulgar seu livro "A Verdade Sufocada", com a versão sobre os anos de poder militar e os crimes da esquerda.

Um dos promotores do lançamento do livro em Porto Alegre é o general-de-brigada (duas estrelas) reformado José Apolônio Neto. Para o oficial, "estão fazendo uma barbaridade com o coronel Ustra. É um ato de rebeldia do pessoal do outro lado da rua".

Indagado sobre o caso, o Exército respondeu que, "como o assunto está tramitando na Justiça, o Exército Brasileiro não se pronunciará".

(MÁRIO MAGALHÃES)

O Globo - 12/11/06

Enquanto isso...


Juízes voltam a ter privilégio de férias de três meses

Pressão de magistrados funciona e Conselho Nacional de Justiça (CNJ) revoga decisão que acabara com benefício

BRASÍLIA. Uma decisão tomada sem muito alarde pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) devolveu aos juízes um privilégio extinto pela reforma do Judiciário: as férias coletivas nos tribunais. A proibição começou a vigorar em dezembro de 2004, para impedir que a categoria gozasse de três meses de descanso por ano.

A resistência dos magistrados em cumprir a nova regra fez com que o CNJ, órgão criado pela mesma reforma para fiscalizar a atividade dos juízes, editasse uma resolução para reiterar a medida. No entanto, em 24 de outubro, a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Ellen Gracie Northfleet, que também preside o CNJ, sucumbiu às pressões dos juízes e advogados e convenceu os conselheiros a revogarem a medida.

A atitude dos integrantes do CNJ nesse episódio provocou polêmica entre parlamentares que acompanharam de perto a tramitação - que consumiu 12 anos - da reforma do Judiciário no Congresso.

O deputado Maurício Rands (PT-PE), que relatou a emenda constitucional na Câmara, diz que não seria competência do CNJ regular o assunto. Isso porque, na emenda, o fim das férias forenses coletivas seria auto-aplicável e deveria entrar em vigor imediatamente após a promulgação. O parlamentar estuda entrar com uma ação direta de inconstitucionalidade.

- O CNJ não pode contrariar uma norma constitucional - argumenta Rands.

A chance de uma ação como essa sair vitoriosa é grande. No meio jurídico, avalia-se que o CNJ tem tomado medidas que ultrapassam seus poderes. No caso das férias coletivas, Ellen teria ficado na berlinda por causa das circunstâncias em que a decisão foi tomada. O CNJ revogou a proibição após a ministra ter se reunido com representantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e de instituições representativas de magistrados.

OAB, que era contra privilégio, mudou de idéia

Quando a reforma do Judiciário estava sendo discutida no Congresso, a OAB se manifestou a favor do fim das férias coletivas. Acreditava-se que a medida tornaria as decisões judiciais mais ágeis, pois não haveria intervalo na prestação do serviço dos tribunais. A OAB, porém, mudou de idéia. Chegou à conclusão que, sem as férias coletivas, os prazos para ajuizar recursos às ações também não paravam de correr. Assim, os advogados não poderiam planejar suas próprias férias.

- A iniciativa do Congresso não deu certo. É o que chamamos revolta dos fatos contra a lei. Os tribunais já estavam acostumados com as férias coletivas. Implicaria uma mudança de costume muito grande - diz o advogado Paulo Lobo, representante da OAB no CNJ.

As férias coletivas foram proibidas apenas na primeira e segunda instâncias, mas mantidas nos tribunais superiores. Para não cumprir a medida, os tribunais alegaram que haveria conseqüências na administração interna. Argumentaram que os colegiados teriam que trabalhar sempre com juízes substitutos em suas composições. Isso provocaria mais demora nos julgamentos, pois esses juízes não estariam totalmente familiarizados com as ações. Agora, caberá a cada tribunal decidir se cumpre a emenda constitucional.

Procurada pelo GLOBO, a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), principal representante da categoria, não quis se manifestar sobre o assunto.

O Globo - 12/11/06

MOROSIDADE PARA PUNIR

Após a detenção, a impunidade Das 785 pessoas detidas em 20 grandes operações da PF, 94% já estão nas ruas

Das 785 pessoas detidas pela Polícia Federal em 20 grandes operações de combate à corrupção e repressão a organizações criminosas nos últimos quatro anos, a maioria está nas ruas e sem qualquer punição, segundo levantamento feito pelo GLOBO. Apenas 40 investigados permanecem detidos. Ou seja, o número de presos hoje corresponde a pouco mais de 5% do contingente detido. De 2003 até agora, a PF fez 241 operações e prendeu 4.292 empresários, lobistas e servidores públicos, entre outros. Mas, das 20 maiores operações, apenas sete já resultaram em condenações dos acusados. As operações da PF foram insistentemente lembradas pelo presidente Lula no programa gratuito de TV, durante a campanha eleitoral. Os publicitários do então candidato à reeleição pretendiam transformar as ações policiais num símbolo da luta contra a corrupção supostamente travada pelo presidente.

- As instituições são tolerantes com crimes financeiros. Para ficar preso neste país, o sujeito tem que estuprar, matar e confessar o crime. Isso se não tiver um bom advogado - afirma o procurador da República Mário Lúcio de Avelar.

Nessa lista de 20 investigações, policiais federais e procuradores da República obtiveram sentenças condenatórias dos réus nas operações Anaconda, Praga do Egito, Shogun, Farol da Colina, Cavalo de Tróia, Poeira no Asfalto e Curupira. Os processos das demais operações se arrastam na burocracia da Justiça ou até nos escaninhos do Ministério Público Federal.

Foi o que aconteceu com a operação Albatroz. Em agosto de 2004, a PF prendeu 20 empresários e servidores ligados a organização chefiada pelo então deputado estadual do Amazonas Sebastião Cordeiro. A investigação, batizada de Operação Albatroz, atingiu também cinco secretários do governador Eduardo Braga (PMDB). Pelos cálculos da polícia, o esquema movimentou R$500 milhões em contrabando e fraude em licitações do governo local, ao longo de dez anos.

Mas, apesar do alentado relatório da PF sobre as fraudes, o subprocurador da República Carlos Eduardo de Oliveira só apresentou a denúncia contra os acusados em setembro, dois anos e um mês após o início das investigações. Neste período, Cordeiro teve o mandato cassado, mas recuperou os bens e hoje mora nos Estados Unidos numa casa comprada ano passado. Nem declarou o negócio imobiliário à Receita Federal.

Os sinais da impunidade são também a marca da Operação Vampiro. Com a decisão do Ministério Público de fazer um aditamento da denúncia original para incluir os nomes do ex-ministro Humberto Costa e do ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares no rol dos acusados, o processo, que já estava em fase adiantada, voltou à estaca zero. A primeira denúncia foi feita em 2004.

- Os baixos índices de condenação são, em parte, resultado da desarticulação entre o Ministério Público e a Polícia Federal. Entre as instituições estaduais, essas diferenças são ainda mais graves - afirma o sociólogo Cláudio Beato, especialista em questões de segurança pública.

Condenados à prisão recorrem em liberdade

A impunidade tem sido a tônica até nos processos que resultam em condenação. Depois de mandar à prisão os doleiros Messod Gilberto e Samuel Messod Benzecry, investigados na Operação Farol da Colina, contra crimes de lavagem de dinheiro, a Justiça Federal do Amazonas permitiu que os dois recorressem da sentença em liberdade. A Justiça Federal do Rio concedeu benefício similar a empresários e policiais investigados por adulteração de combustíveis na Operação Poeira no Asfalto. Condenados, eles recorreram e aguardam o desfecho em liberdade.

- É, no mínimo, um contra-senso: condenar uma pessoa à prisão e, logo em seguida, soltar essa pessoa para que recorra em liberdade. É o mesmo que não punir - diz um juiz federal que acompanha de perto as investigações criminais.

O delegado Jorge Pontes, da Divisão de Repressão a Crimes Fazendários da PF, concorda que os índices de punição são baixos. Mas, para ele, as prisões feitas pela PF no início de cada operação não são parâmetros para se medir os resultados de uma investigação. Segundo Pontes, a PF pede as prisões em caráter provisório, apenas para instruir os inquéritos que, mais tarde, são levados à Justiça. Ele diz que, com as prisões, de cinco a dez dias de duração, a polícia obtém confissões e provas para as investigações.

- As prisões provisórias, como o próprio nome indica, são um importante instrumento de investigação, e não de punição - afirma Pontes.

O subprocurador Eduardo Oliveira não foi localizado. Segundo a assessoria da Procuradoria Geral da República, ele viajou para o exterior.