"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música"
Friedrich Nietzsche

quinta-feira, agosto 07, 2008

Produção de carros bate recorde e Brasil supera a França

Instituto Humanitas Unisinos - 07/08/08

De janeiro a julho, 2,01 milhões de carros e máquinas agrícolas saíram das linhas de montagem nacionais. Com isso, o país conquistou a 6.ª posição no ranking dos maiores fabricantes mundiais de automóvel. A notícia é do jornal O Estado de S. Paulo, 07-08-2008,

Os sucessivos recordes de produção de automóveis fizeram o Brasil deixar a França no retrovisor ao ultrapassá-la da sétima para a sexta posição no ranking dos maiores produtores mundiais de automóveis. A informação é do presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Jackson Schneider, que divulgou ontem os dados de atividade do setor até o mês passado. Segundo Schneider, nos sete primeiros meses do ano o Brasil produziu 2,01 milhões de carros, e ficou atrás apenas do Japão (6 milhões de unidades), China (5,2 milhões), Estados Unidos (4,3 milhões), Alemanha (3,3 milhões) e Coréia do Sul (2,8 milhões).

A produção e a venda de veículos no Brasil continuam batendo recordes. A produção no mês passado foi de 320,1 mil unidades, 19,8% maior que no mesmo mês de 2007. A fabricação de veículos de janeiro a julho, por sua vez, acumula alta de 21,8%. As vendas de veículos no mercado interno totalizaram 288,1 mil unidades em julho – 12,6% maior em relação a junho e 32,6% maior em comparação com julho do ano passado. No acumulado dos primeiros sete meses do ano, as vendas somaram 1,7 milhão de unidades, também recorde histórico. O volume de vendas é 30,4% maior do que o registrado no mesmo intervalo de 2007.

Para Schneider, a melhoria das condições de financiamento continua puxando as vendas de veículos no Brasil. Segundo o executivo, o volume de crédito disponível para o setor em junho somou R$ 84,3 bilhões, o que representa um crescimento de 18,6% em relação ao mesmo mês do ano passado.

Segundo ele, apesar do aumento da taxa básica de juros, as vendas não foram afetadas. A expectativa é de que isso ocorra nos próximos meses. Ele ressaltou que a taxa de inadimplência do setor ficou em 3,6% em junho com pequena alta sobre o mesmo mês do ano passado (3,2%), mas menor do que os 3,7% registrados em maio. “O setor continua favorecido pelo ambiente macroeconômico, com a economia, a massa salarial e o emprego em crescimento”, disse.

As vendas internas de máquinas agrícolas no atacado totalizaram 5 mil unidades em julho de 2008, o que representa uma queda de 0,9% em relação ao mês anterior. Na comparação com julho de 2007, o volume representa uma alta de 43,7%. No acumulado dos primeiros sete meses do ano, as vendas do segmento somaram 30,4 mil unidades, volume 50,8% maior que o registrado no mesmo período do ano passado.

O executivo informou ainda que permanecem inalteradas as projeções do setor para o ano, com alta de 24,2% nas vendas internas de autoveículos para um total de 3,06 milhões de unidades. Também foram mantidas as projeções de vendas de máquinas agrícolas para uma alta de 38,6%, totalizando 53,1 mil unidades.

Schneider disse que a expectativa é de que o setor registre um crescimento mais cadenciado no segundo semestre, o que na sua opinião é bom para as montadoras e para a cadeia de fornecedores. “Crescer 30% exige muito de uma cadeia que tem uma produção tão complexa”, avaliou o executivo.

As exportações de veículos e máquinas agrícolas somaram em julho US$ 1,23 bilhão, equivalente a uma queda de 3,8% sobre junho e de 2,9% sobre julho de 2007. As vendas externas do setor somaram US$ 8,12 bilhões nos primeiros sete meses do ano, o que representa crescimento de 9,5% em relação a igual período do ano passado.

Ustra diz que sua família abrigou Tarso em 64

Instituto Humanitas Unisinos - 07/08/08

Em documento de 32 páginas enviado à Justiça de São Paulo, onde é réu em duas ações civis por torturas que teria praticado ou ordenado nos anos 70, o coronel reformado do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra inclui informação que reputa prova importante de que sua índole é boa e, como tal, seria incapaz de agredir semelhantes. Segundo Ustra, foi sua família quem abrigou, após a revolução de 31 de março de 1964, um jovem gaúcho que temia a repressão. A reportagem é de Fausto Macedo e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 07-08-2008.

Tarso Fernando Herz Genro era o nome daquele rapaz, segundo relata o oficial a quem as entidades de direitos humanos conferem o rótulo de símbolo dos porões. No auge dos anos de chumbo, então major, Ustra comandou o Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) do antigo II Exército.

Hoje com 61 anos e ministro da Justiça, Tarso sustenta que os atos de arbítrio cometidos durante o período militar não se classificam como crimes políticos e devem ser punidos com base no Código Penal. Segundo o ministro, os agentes públicos que cometeram violências não devem ter privilégio.

Por e-mail a seus advogados, o coronel narra o episódio que diz ter sucedido há quase 40 anos. “A família que abrigou Tarso Genro foi a minha. Meu irmão José Augusto, advogado, já falecido, na época da Contra-Revolução, em 1964, era colega de colégio ou aluno da faculdade, não me recordo mais, e muito amigo do Tarso. Tarso fugiu e se refugiou em Rivera, fronteira com o Uruguai. Como nunca foi procurado, com medo de voltar ao Brasil e ser preso, pois já era um agitador do Partido Comunista, telefonou ao meu irmão e pediu socorro.”

O coronel afirma: “Como meu irmão era noivo da filha do secretário da Segurança Pública do Rio Grande do Sul, coronel Athos Teixeira Baptista, pediu ao futuro sogro que ninguém fizesse nada com o Tarso, o que aconteceu. Meu irmão foi à Rivera, apanhou Tarso e o apresentou ao coronel Athos, em Porto Alegre. O coronel intercedeu para que Tarso fizesse o NPOR (Núcleo de Preparação de Oficiais da Reserva) no Regimento Mallet, onde ele foi matriculado e se tornou oficial de Artilharia.”

“A personalidade de Ustra e seus familiares não se compatibiliza com torturas e violências”, acentuam os advogados dele, Paulo Esteves, Sérgio Toledo e Salo Kibrit.

Por meio de sua assessoria, Tarso admitiu que “realmente conheceu” o irmão de Ustra. Ele afirmou, no entanto, que não ficou ao abrigo da família do coronel. “Essa história não confere”, afirmou o ministro. “Saí do Brasil em 1971, o processo contra mim correu em Porto Alegre e meu advogado foi Eloar Guazzelli.”

Bancada ruralista consegue cortar à metade juro da dívida agrária

Instituto Humanitas Unisinos - 07/08/08

A bancada ruralista impôs ontem uma derrota à equipe econômica ao derrubar à metade os juros que vão corrigir dívidas agrícolas inscritas na Dívida Ativa da União (DAU) que serão renegociadas. A reportagem é de Cristiane Jungblut e publicada no jornal O Globo, 07-08-2008. A notícia é o título principal do Jornal do Comércio, 07-08-2008.

A vantagem foi obtida durante a votação da medida provisória (MP) 432.

O texto aprovado, por 264 votos favoráveis e 128 contrários, trocou a Taxa Selic, atualmente em 13% ao ano, pela Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), em 6,75% anuais. A nova regra valerá para R$ 7,2 bilhões em débitos.

No total, o governo vai renegociar R$ 75 bilhões.

A proposta foi apresentada pelo deputado Valdir Collato (PMDB-SC), da base aliada.

Ao sair o resultado, houve aplausos tímidos no plenário, para desespero dos líderes governistas. O governo já avisou que vai tentar derrubar essa alteração do texto no Senado. Nos últimos dias, o relator da MP, deputado Luiz Carlos Heinze (PP-RS), vinha tentado negociar a questão com a Fazenda, mas o ministro Guido Mantega disse que não abria mão de manter a Taxa Selic.

— Isso é ilógico, um absurdo — reagiu Gilson Bittencourt, secretário-adjunto de Microfinanças e Política Agrícola do Ministério da Fazenda, que acompanhou a votação.

PT, PV e PSOL ficaram isolados na votação

Segundo ele, os juros ficarão tão irrisórios que os ruralistas irão preferir ficar totalmente inadimplentes para ingressar na DAU e renegociar de forma vantajosa.

Além de reduzir o indicador de correção, a Câmara também aprovou a ampliação de cinco para dez anos no prazo de pagamento dos débitos inscritos na Dívida Ativa; o fim da cobrança de 20% pela inscrição do passivo; e abatimento entre 38% e 72%, que serão aplicados sobre o saldo devedor para quem quitar a fatura.

Autor da emenda, Valdir Collato disse que o governo vinha aplicando ilegalmente a Taxa Selic sobre as dívidas agrícolas, já que o juro dos contratos agrícolas é de 6,75%. Ele explicou que, como as dívidas foram inscritas na DAU, elas se transformaram em passivos fiscais e, assim, o Tesouro passou a aplicar as regras do pagamento de impostos:

— Essa decisão do plenário dá esperança a muitos produtores que corriam o risco de ter seus bens confiscados. Era uma ilegalidade.

Surpreendido pela manobra do DEM, que encampou a proposta de Collato e apresentou um destaque pedindo a votação da mudança em separado, o líder do governo na Câmara, Henrique Fontana (PT-RS), disse que o Planalto vai buscar alterar o quadro no Senado.

Na verdade, quase todos os partidos votaram a favor da mudança, com PT, PV e PSOL ficando isolados na defesa da aplicação da Taxa Selic. O PMDB, partido do autor da proposta e do ministro da Agricultura, liberou a bancada, o mesmo acontecendo com o PP.

Já PTB e PR, também da base governista, encaminharam voto a favor.

— Do jeito que estava, um produtor com dívida de R$ 175 mil já estava pagando R$ 772 mil — defendeu o deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO), vice-líder do DEM.

Lucros no Brasil vão para os EUA cobrir prejuízos com o subprime

Instituto Humanitas Unisinos - 07/08/08

Boa parte do dinheiro estrangeiro que deixou o Brasil nos últimos meses tem sido usada para cobrir os rombos provocados pelo mercado americano de subprime (hipotecas de alto risco). Até agora, a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) foi a mais prejudicada pela fuga de recursos. Só nos meses de junho e julho a saída de capital externo somou R$ 15 bilhões. A reportagem é de Renée Pereira e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 07-08-2008.

Tudo isso exatamente porque a bolsa paulista teve desempenho excepcional nos últimos anos, o que proporcionou ganhos expressivos a fundos de investimentos e instituições financeiras que administram fortunas de milionários estrangeiros. Mas, com a dificuldade enfrentada especialmente nos Estados Unidos, esses investidores passaram a priorizar a venda de ativos aqui, onde há liquidez, para cobrir perdas lá fora.

Do lado corporativo, os exemplos não são diferentes. No primeiro semestre de 2008, empresas instaladas no Brasil fizeram remessas recordes de lucros e dividendos para as matrizes no exterior. Segundo o Banco Central (BC), o volume de recursos somou US$ 18,99 bilhões no período, quase o dobro do valor de igual período do ano passado.

Entre os setores que mais remeteram lucros estão os que enfrentam dificuldades em seus países de origem. É o caso do automotivo e de serviços financeiros, com US$ 2,76 bilhões e US$ 2,40 bilhões, respectivamente.

O analista da Hencorp Commcor Corretora, Marcos Forgione, alerta que ainda não se consegue avaliar com certeza até onde vão os problemas da economia mundial, em especial os prejuízos provocados pelo mercado subprime. Dependendo da profundidade da crise, uma hora isso vai chegar ao mercado interno, reduzindo os resultados das empresas, o que afasta o investidor da bolsa.

Ele explica que, além de vender papéis aqui para cobrir rombos lá fora, há ainda aqueles investidores que preferem deixar ambientes de risco para se refugiar em ativos mais conservadores, como os títulos americanos. Vale destacar, entretanto, que a taxa de juro real americana, descontada a inflação projetada para os próximos 12 meses, está negativa em 2,9% ao ano, segundo dados da Consultoria UpTrend. “Apesar disso, os papéis americanos são considerados um porto seguro”, diz Forgione.

Para o economista da Modal Asset Managment, Alexandre Póvoa, a saída de recursos ainda não representa um cenário dramático. Segundo ele, o País atraiu muitos fundos criados para investir em emergentes e fundos de commodities, que aplicavam até em papéis de empresas ligadas a esse mercado.

“Eles ganharam muito dinheiro, tanto com a valorização das ações como com a variação da moeda brasileira. Num momento de indefinição é normal rever posições.”

UMA "FISHING EXPEDITION" PAGA COM DINHEIRO PÚBLICO

Site do Azenha - Atualizado em 07 de agosto de 2008 às 12:25 | Publicado em 06 de agosto de 2008 às 22:42

Hoje o Congresso mandou um recado aos jovens juízes, procuradores e delegados encarregados de fazer cumprir a lei no Brasil.

"Olha só o que pode acontecer com você".

Não importa que a convocação tenha partido do deputado Marcelo Itagiba (PMDB-RJ).

Importa o papel que a instituição desempenhou.

E o Congresso brasileiro, hoje, concorreu para o constrangimento de um funcionário público de carreira que, ao que me consta, não é acusado de crime algum.

O teatro - do absurdo, obsceno, chamem do que quiserem - teve os seguintes ingredientes:

1) Quase todas as perguntas feitas ao delegado não diziam respeito ao tema que é foco da CPI: grampos, legais ou ilegais.

2) Durante uma discussão entre deputados um deles acusou colegas de não aparecerem na CPI, sugerindo que alguns estavam ali em busca dos holofotes.

3) Os deputados sabiam que o delegado não podia falar sobre o inquérito, sob segredo de Justiça. Ainda assim, muitos deles fizeram perguntas que sabiam, de antemão, que o delegado não poderia responder. Foi para tirar uma casquinha e aparecer na TV? Ou foi uma "fishing expedition"?

Fishing expedition significa, literalmente, "expedição de pesca".

É a manobra através da qual se testa o adversário, se manda sinais que só o adversário é capaz de entender, se confirma alguma informação.

Foi o que fez o deputado Arnaldo Faria de Sá, por exemplo, ao sugerir que o delegado tinha promovido uma "armação" para flagrar o suborno de um colega.

E ao perguntar, cinicamente, se de fato o delegado estava ali como "testemunha".

Deixou implícito, presumo, que o delegado poderá ser arrastado de novo, da próxima vez como réu.

Nunca vi um agente do FBI, da DEA ou do Serviço Secreto americano, depois de uma operação policial aparentemente bem sucedida, ser arrastado para o Congresso americano para ser constrangido.

O Brasil não perde a sua capacidade de se superar.

PS: A convocação do delegado, do juiz e do banqueiro para depor na CPI foi do deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR)

Bolívia: 0,63% das propriedades concentram 66% da terra

Site do Azenha - Atualizado em 07 de agosto de 2008 às 13:12 | Publicado em 07 de agosto de 2008 às 13:08

WASHINGTON - Um estudo do Center for Economic and Policy Research, de Washington, sugere que a disputa política na Bolívia é fortemente influenciada pelo divórcio geográfico entre onde vivem os bolivianos mais pobres e onde ficam os recursos naturais do país.

Mark Weisbrot e Luis Sandoval estudaram a posse de terras e a produção de gás e petróleo, esta última responsável por 6,5% do PIB e por 47% das exportações da Bolívia.

Os departamentos (equivalentes aos estados brasileiros) da chamada Meia Lua - Beni, Pando, Santa Cruz e Tarija -, que buscam maior autonomia administrativa, concentram 82% da produção de gás natural; mas a população indígena mais pobre vive fora da região.

O estudo desmente que o governo central não transfira a renda das exportações de gás e petróleo para os departamentos da Meia Lua. Eles recebem, de acordo com o estudo, 30% do total - contra 19,7% para o restante do país.

De acordo com a análise, 0,63% das propriedades concentram 66% da terra agricultável da Bolívia. Já 86% das fazendas ficam com apenas 2,4% da terra utilizável.

O estudo não entra na questão política.

No próximo domingo o presidente Evo Morales e oito dos nove "prefeitos" (os governadores de lá) enfrentam um referendo revogatório. Morales precisa obter a mesma votação de quando foi eleito para permanecer no cargo, cerca de 53%. Os governadores precisam de 50%. Os que forem rejeitados podem concorrer em novas eleições.

Evo vem se colocando numa posição centrista nos últimos meses. À esquerda dele os movimentos sociais - com destaque para a Central Obrera Boliviana (COB) - acusam o presidente de afagar os latifundiários. À direita ficam os prefeitos da Meia Lua, acusados por Evo de agir sob influência do embaixador dos Estados Unidos.

Será possível costurar um pacto federativo nos moldes do brasileiro, em que a São Paulo deles (Santa Cruz) aceite financiar o desenvolvimento do Nordeste?

Você não vai encontrar nada que preste na mídia brasileira sobre a Bolívia, com raríssimas exceções, ainda que boa parte do gás que toca a indústria paulista venha de lá. É que nós somos europeus.

O mundo pós-unipolar

Blog do Luis Nassif - 06/08/08

O novo impasse transatlântico

Por David P. Calleo

No Valor de hoje



(...) Os interesses geopolíticos da Europa e dos EUA vêm divergindo e poderão continuar assim, pouco importa quem seja o presidente.

Interromper esse distanciamento progressivo exigirá importantes mudanças nas perspectivas e políticas nos dois lados do Atlântico. Os EUA terão de parar de definir seus interesses transatlânticos em termos de sua mentalidade hegemônica e a Europa terá de assumir um comando mais pleno de sua própria região.

A referência a interesses geopolíticos ressalta a influência da geografia na configuração desses interesses. É famosa a concordância expressa por Charles de Gaulle e Winston Churchill: "Em última instância, a Grã-Bretanha é uma ilha, a França é uma ponta de continente; os EUA são de outro mundo". De Gaulle e Churchill compreenderam que durante séculos o Canal da Mancha constituiu uma colossal barreira geopolítica a um compartilhamento de interesses durável entre o Reino Unido e a França. Se o canal é tal barreira, vínculos duradouros através do Atlântico parecem implausíveis.

Em outras palavras, dessa perspectiva os dois espaços econômicos mais ricos e mais poderosos do mundo, União Européia (UE) e EUA, tendem a ser rivais, mesmo quando são aliados.

Com efeito, um inimigo compartilhado deu suporte à aliança dos EUA com partes da Europa durante grande parte do Século XX. Esse inimigo, porém, também era europeu - primeiro a Alemanha e depois a Rússia. De fato, o interesse geopolítico transatlântico compartilhado foi entre os EUA e uma parte da Europa contra outra.

Com o colapso da União Soviética (URSS), em 1991, a aliança transatlântica confrontou novas realidades. Os interesses tanto da UE como dos EUA foram amplamente redefinidos. (...) A Europa Central reviveu e a Alemanha foi reunificada. A Europa Ocidental evoluiu - de uma "Comunidade" para uma "União" - e seus Estados tornaram-se menos firmemente vinculados à proteção americana.

A extinção da URSS estimulou as elites políticas americanas a construir uma visão "unipolar" da posição e interesse mundiais dos americanos. Essa tendência acelerou à medida que o atual governo Bush tentou construir uma hegemonia unilateral mundial a partir da "guerra ao terror", que provocou crescente inquietação na "Velha Europa".

Embora a invasão do Afeganistão pelos EUA tenha sido amplamente considerada como justificada, a invasão do Iraque por forças anglo-americanas provocou uma fratura exposta entre os EUA e seus dois maiores aliados continentais, França e Alemanha, que foram apoiados pela Rússia e pela China. Um grande bloco eurasiano surgiu repentinamente em oposição às pretensões de hegemonia mundial americana, prefigurando uma nova fluidez nos relacionamentos geopolíticos, se não uma mudança tectônica de alinhamentos.

A eficácia da resistência franco-alemã à hegemonia americana foi, no entanto, temperada pelas reações de outros países europeus. Tony Blair, primeiro-ministro do Reino Unido, fez o melhor a seu alcance para ressuscitar a relação especial da era Churchill, e o Reino Unido recebeu a adesão da Itália e da Espanha, juntamente com quase todos os países da Nova Europa. A dupla franco-alemã já não pôde alegar estar falando em nome da UE como um todo. Os planos europeus para uma política externa e de segurança comuns e para uma cooperação mais estreita no setor de defesa pareceu brutalmente desacreditada.

Aos poucos, porém, a Europa pareceu avançar em sua coesão na oposição às políticas e pretensões unipolares americanas.

(...) As razões para a defecção européia são eminentemente geopolíticas. A leste da Europa está a Rússia, a seu sul, o mundo muçulmano. A Europa necessita boas relações com ambos com a finalidade de penetrar mercados crescentes, acessar fontes de matérias-primas e energia e garantir sua própria estabilidade doméstica, ao mesmo tempo em que muitos europeus acreditam que as políticas americanas gerem atritos com essas regiões. Nessas circunstâncias, a aliança transatlântica sobrevive menos por interesses efetivamente compartilhados do que devido a inércia.

Poderá alguma coisa restaurar a antiga harmonia transatlântica? Um forte renascimento do imperialismo russo ou uma guerra entre civilizações com o mundo muçulmano poderia criar ameaça tão ameaçadora que uma Europa amedrontada retomaria sua dependência em relação aos EUA, como durante a Guerra Fria. Mas a Europa não estará ansiosa por abraçar tal futuro. (...) A construção de um sistema de Estados tão balanceado em escala regional foi a grande realização da Europa no Pós-Guerra.

(...) O que parece efetivamente claro é que uma Europa coesa, forte e mantendo bom relacionamento com seus vizinhos não se encaixará facilmente em uma aliança transatlântica estreita com os EUA se os americanos estiverem empenhados em manter hegemonia mundial.

Avanços da integração

Blog do Luis Nassif - 07/08/08

Em geral, quando se fala em integração da América Latina pensa-se em Mercosul – que é uma mera união aduaneira. Muito mais importante é a Iniciativa para a Integração da Infra-estrutura Regional Sul Americana (IIRSA) existe desde agosto de 2000, quando ocorreu em Brasília a reunião fundadora.

Segundo o Projeto Brasil (www.projetobr.com.br), com exceção da Guiana Francesa, todos os países da América do Sul participam desse plano do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) em parceria com a Corporação Andina de Fomento (CAF) e o Fundo para o Desenvolvimento da Bacia do Prata (Fonplata).

***

Com o plano envolvendo a execução de 348 obras em 20 anos e um investimento de aproximadamente 38 bilhões de dólares, a iniciativa tem visibilidade inversa aos números, relata a repórter Nina Adorno. A crítica tem ficado por conta dos movimentos sociais, cientistas e organizações não-governamentais preocupados com os impactos ambiental, econômico e social dessa integração.

***

Em geral, há certa incompreensão sobre os objetivos da IIRSA.

No Brasil, a área total de influência das obras será de 2,5 milhões de quilômetros quadrados. Serão atingidas 137 unidades de conservação, 107 terras indígenas – nas quais vivem 22% da população indígena brasileira – e 484 áreas prioritárias para a conservação da biodiversidade. Somente na Amazônia, o bioma mais afetado, 322 áreas entre as mais ricas em espécies estarão expostas à ação do homem. Tudo isso conforme o relatório A Perfect Storm in the Amazon Wilderness: Development and Conservation in the Context of the Initiative for the Integration of the Regional Infrastructure of South America (IIRSA),do cientista Tim Killeen, da ONG Conservação Internacional (CI).

***

Dos seus planos 31 são considerados de curto prazo e, em relação à Carta de Projetos da Iniciativa, 40% já se encontram em distintos graus de execução. “São os projetos que tinham mais sentido do ponto de vista da integração física. O acompanhamento, o monitoramento da análise da gente, principalmente no Brasil, tem se centrado mais nessa lista”, assegurou Afonso Oliveira de Almeida, secretário de planejamento e investimentos estratégicos e coordenador nacional da IIRSA

***

A visão incorreta é julgar que a integração parte de uma visão equivocada da economia, de consolidar o papel da região como fornecedora de matéria-prima.

Os críticos temem ainda que a dependência sul-americana em relação aos países ricos e o desequilíbrio local se agravem. “A IIRSA já parte das regiões mais competitivas do continente. Essa definição de competitividade, depois de 20 anos de abertura caótica e irrestrita, fez com que apenas os setores que se moldaram sobrevivessem no continente. É uma lógica voltada para fora e, em geral, especializada em exportação de recursos naturais”, Luis Fernando Novoa, professor da Universidade Federal de Rondônia e membro da Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais.

***

Ora, a integração criará regiões de desenvolvimento, novos mercados, novas possibilidades de sinergia e, conseqüentemente, de industrialização, agregação de valor, adensamento de cadeia produtiva.

O dia depois do referendo

Instituto Humanitas Unisinos - 06/08/08

No dia 10 de agosto ocorrerá uma batalha decisiva não somente para a Bolívia, mas para toda a América Latina. Uma vitória do governo Evo Morales e a derrota dos prefeitos opositores de La Paz, Cochabamba e Pando pode ser o começo de uma ofensiva para desarticular a oligarquia boliviana. Neste dia, os bolivianos decidirão se confirmam ou revogam o mandato do presidente e seu vice e de oito dos nove prefeitos departamentais. O artigo é de Raúl Zibechi, publicado pelo jornal La Jornada e pela Agência Carta Maior, 06-08-2008.

Eis o artigo.

O referendo revogatório de 10 de agosto pode consagrar uma decisiva vitória política do governo de Evo Morales e produzir assim uma virada que permita com que passe à ofensiva diante da direita do departamento de Santa Cruz. Neste dia, os bolivianos decidirão se confirmam ou revogam o mandato do presidente e seu vice, Álvaro García Linera, e de oito dos nove prefeitos departamentais. Com segurança, o governo conseguirá mais votos do que os obtidos nas eleições de dezembro de 2005, quando alcançou 53% . A oposição teme que vários dos prefeitos que apóiam a direita autonomista tenham seu mandato revogado pelos eleitores. O referendo foi convocado para frear a ofensiva dos autonomistas, que este ano promoveram vários plebiscitos nos departamentos da chamada “media luna”, que lhes deram vitórias com até 80% dos votos.

A direita está criando um clima de polarização para evitar uma consulta na qual tem todas as chances de perder, porque a popularidade do governo é muito alta como resultado das importantes mudanças introduzidas nestes dois anos e meio. O primeiro elemento que deve ser levado em conta é que dois terços dos bolivianos se reconhecem como indígenas, sendo que, pela primeira vez na história, tem um presidente de sua mesma cultura. O segundo é o que o governo está gerando algumas transferências de renda para os mais pobres, como o fundo escolar Juancito Pinto, pelo qual 1,8 milhão de estudantes recebem 200 bolivianos anuais (28 dólares) para frear a evasão. Além disso, há a Renda Dignidade, de até 3 mil bolivianos (425 dólares), que beneficia 570 mil pessoas maiores de 60 anos, e que é financiado pelo Imposto Direto sobre os Combustíveis.

Em terceiro lugar, cabe destacar as mudanças estruturais que resultam no fortalecimento do papel do Estado na economia e em uma importante melhoria econômica do país, em parte assegurada pelo aumento dos preços internacionais dos combustíveis, especialmente do petróleo. As reservas internacionais da Bolívia passaram de 1,7 bilhões de dólares (antes de Evo) para 7 bilhões de dólares. No final deste ano, as exportações terão se multiplicado cinco vezes, com destaque para minerais, combustíveis e produtos da agroindústria. Segundo García Linera, a participação do Estado na economia passou de 13 para 22% nestes 30 meses de governo. No que diz respeito à renda petroleira, o controle do Estado passou de 27% para 75%, elevando sua receita de 500 milhões de dólares anuais para 2 bilhões de dólares anuais.

Na área de mineração, terceiro núcleo do poder boliviano, o Estado passou a controlar 55% dos lucros (a partir da aprovação da lei de impostos sobre produtos de mineração). Antes, recebia apenas 20%. Além disso, o Estado entrou no negócio através das minas Huanuni e Vinto, e prevê outros quatro projetos de exploração para 2009. Mesmo sem nacionalizações com confiscos, as mudanças são notáveis. Nos setores da pecuária e da agroindústria, o Estado deixou de transferir aos grandes produtores 150 milhões de dólares anuais em infraestrutura e apoio técnico, para criar um programa de apoio a pequenos e médios produtores de arroz, trigo, milho e soja. Começou também a intervir no mercado da soja, comprando de pequenos produtores, aos quais paga preços superiores aos de mercado. Este ano, o governo espera administrar 80 mil toneladas, 10% da produção total.

Dos quatro principais setores da economia do país, o único onde o Estado não intervem é o financeiro. Essas mudanças, que tendem a se aprofundar, explicam o boicote e as ameaças das classes dominantes, que percebem a possibilidade de receber um duro golpe. Caso se confirme a vitória no referendo, o governo levará às urnas a nova Constituição, aprovada pela Assembléia Constituinte em 9 de dezembro de 2007. Até agora se absteve de dar este passo pela relação de forças criada nos primeiros meses do ano e pela ofensiva da direita com a convocação dos referendos autonômicos. Pode-se objetar que o governo não enfrentou com a força necessária a oligarquia de Santa Cruz, em particular na polêmica questão da terra. Até agora, entregou 800 mil hectares, dos 30 milhões que espera transferir às 200 mil famílias campesinas.

Limites e possibilidades do governo Evo Morales

Até aqui, o governo está distribuindo terras que não tocam nos interesses dos latifundiários, que boicotam de forma violenta os trabalhos do Ministério de Terras, em Santa Cruz, onde ainda vivem comunidades indígenas em situação de escravidão. Como assinala o antropólogo Pablo Regalsky, por momentos há a impressão de que o governo se situa como um árbitro acima dos interesses de classe, atitude que “o empurra a favorecer a direita de forma que ela cresça o suficiente para colocar na parede os movimentos sociais (Viento Sur, n° 97, maio de 2008). Mais do que derrotar o governo de Evo, essa oligarquia busca blindar seus interesses construindo um cordão, material e simbólico, para impedir que os movimentos indígenas, amplamente hegemônicos no altiplano, possam derrotá-la como fizeram entre 2000 e 2005 com as elites que governavam desde La Paz.

Neste sentido, Reglasky tem razão ao recordar que o cerco dos movimentos a La Paz não foi derrotado, razão que empurra à direita a querer mudar a capital para Santa Cruz ou Sucre. Mas, para além das insuficiências do governo de Evo, no dia 10 de agosto se joga uma batalha decisiva não somente para a Bolívia, mas para toda a América Latina. Uma contundente ratificação do governo e a possível derrota dos prefeitos opositores de La Paz, Cochabamba e Pando pode ser o começo de uma necessária ofensiva para desarticular a oligarquia cruceña, revertendo 50 milhões de hectares que obteve ilegalmente desde a reforma agrária de 1953. Para essa tarefa há força suficiente, como vêm mostrando os movimentos em todo o país, que nunca baixaram a guarda e agora estão em vigília para impedir qualquer manobra desestabilizadora.

Seis centrais sindicais receberão R$ 56 mi

Instituto Humanitas Unisinos - 06/08/08

Pela primeira vez na história do sindicalismo brasileiro, seis centrais sindicais receberão recursos do chamado imposto sindical - que equivale a um dia de salário do trabalhador no ano. As centrais sindicais embolsarão R$ 55,5 milhões neste ano. Os recursos deverão ser repassados nas próximas semanas. A reportagem é de Julianna Sofia e publicada pelo jornal Folha de S. Paulo, 06-08-2008.

Historicamente contrária ao imposto sindical, a CUT (Central Única dos Trabalhadores) - braço do PT no sindicalismo - será a entidade a receber o maior volume de recursos: R$ 19,8 milhões. Em segundo lugar, aparece a Força Sindical. Comandada pelo deputado federal Paulo Pereira da Silva, o Paulinho (PDT-SP), a central receberá R$ 15,1 milhões.

Paulinho está sob investigação da Polícia Federal por suspeitas de envolvimento em um esquema para desviar dinheiro do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). Na Câmara, o deputado e sindicalista responde a um processo disciplinar no Conselho de Ética.

As demais centrais sindicais beneficiadas com a divisão dos recursos do imposto sindical são: UGT (União Geral dos Trabalhadores), que receberá R$ 8,8 milhões; NCST (Nova Central Sindical de Trabalhadores), que terá direito a R$ 6,6 milhões; CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil), com R$ 2,9 milhões; e CGTB (Central Geral dos Trabalhadores do Brasil), com R$ 2,4 milhões.

A distribuição inédita de recursos do imposto sindical foi estabelecida pela lei nº 11.648 (de março deste ano), que regulamentou as centrais sindicais. Até então, as entidades não tinham respaldo legal para suas atividades, estando à margem da estrutura sindical.

O imposto sindical era partilhado apenas entre sindicatos (60%), federações (15%), confederações (5%) e governo (20%). Nas negociações com o governo e o Congresso, as centrais conseguiram abocanhar 10%, e o governo passou a ficar com 10%.

Enquanto as seis centrais foram beneficiadas com a medida, outras 12 entidades cadastradas no Ministério do Trabalho não preencheram os critérios exigidos. Entre elas, estão a CGT (Confederação Geral de Trabalhadores), a CAT (Central Autônoma de Trabalhadores) e a Conlutas (Coordenação Nacional de Lutas).

Rateio

Os critérios para a partilha dos recursos estão definidos na lei que criou as centrais sindicais. Para obter a representatividade necessária ao reconhecimento de sua atuação, a entidade precisa obedecer a quatro requisitos cumulativos. O mais importante deles define que as centrais precisam comprovar a filiação de sindicatos que representem, no mínimo, 7% dos trabalhadores sindicalizados no país.

Como a definição desse percentual eliminaria quase todas as entidades (sobrariam apenas CUT e Força), a lei estabelece uma regra transitória para os dois primeiros anos de sua vigência. Nesse período, o índice é de 5% dos sindicalizados.

No levantamento realizado pelo Ministério do Trabalho, a CUT atingiu 35,84%. Já a Força Sindical contabilizou 12,33%. Apesar dessa diferença percentual, as duas entidades receberão valores próximos. A justificativa para isso seria o fato de a CUT contar em sua base com um elevado número de sindicatos ligados a servidores públicos, que não recolhem o imposto sindical.

Freire critica idéia de 'desanistia' e pede ‘coragem de abrir os arquivos

Instituto Humanitas Unisinos - 06/08/08

O presidente nacional do PPS, Roberto Freire, considera “um grande equívoco” a reformulação da Lei de Anistia proposta pelo ministro da Justiça, Tarso Genro. Na opinião dele, o governo está sendo “omisso” porque, em vez de propor uma “desanistia”, deveria ter “a coragem de abrir os arquivos para saber onde estão os desaparecidos”. A reportagem é de Rui Nogueira e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 06-08-2008.

Avalia, também, que Tarso precisa “tomar cuidado ao falar sobre questões de direitos humanos, porque ele foi o responsável pela deportação dos dois boxeadores cubanos”. O ex-senador refere-se aos atletas Guilhermo Rigondeaux e Erislandy Lara, que abandonaram a delegação de Cuba nos Jogos Pan-Americanos do Rio, em julho de 2007, mas foram presos pela polícia brasileira e devolvidos à ditadura de Fidel Castro.

Na quinta-feira, ao abrir audiência no Ministério da Justiça intitulada Limites e Possibilidades para Responsabilização Jurídica dos Agentes Violadores de Direitos Humanos durante o Estado de Exceção no Brasil, Tarso defendeu a punição para agentes do Estado que praticaram tortura durante o regime militar. Na avaliação do ministro, tortura e violações de direitos humanos são crimes comuns, e não políticos, e por isso quem os praticou não poderia se beneficiar da anistia.

“A partir do momento em que o agente do Estado pega o prisioneiro e o tortura num porão, ele sai da legalidade do próprio regime militar e se torna um criminoso comum. Não foi um ato político. Ele violou a ordem jurídica da própria ditadura e tem de ser responsabilizado”, argumentou ele, durante o evento.

Essa posição provocou reações no meio militar e recebeu contestação pública do ministro da Defesa, Nelson Jobim, para quem este é um assunto que não cabe ao Executivo discutir, mas ao Judiciário interpretar.

Para Freire, a Lei de Anistia beneficiou tanto militantes de movimentos contra a ditadura militar - inclusive os que optaram pela luta armada - quanto agentes do Estado brasileiro que cometeram “crimes hediondos, como a tortura”. O presidente do PPS, que integrou a comissão de deputados e senadores que elaborou a lei de 1979 e também foi constituinte em 1988, diz que não cabe, agora, “promover uma nova alternativa jurídica em torno da Lei de Anistia por causa daqueles que estavam do lado do governo e praticaram atos ilegais, mas que no momento da definição do processo de anistia foram anistiados”.

Freire diz que a um governo democrático se impõem duas tarefas: a reparação pela Justiça de “todos aqueles que foram torturados, que sofreram na mão do Estado a prática do crime da tortura, e a abertura dos arquivos do período da ditadura militar, no que o atual governo tem sido omisso”. Ele pondera, ainda, que os arquivos não devem ser abertos por revanchismo. “Mas para que tenhamos conhecimento da nossa história, saber onde estão nossos desaparecidos”, argumenta.

O ex-senador afirma que uma revisão da lei agora acaba por gerar exacerbação dos militares, como já está ocorrendo, e ressuscitar no País um clima de confronto. “A justiça pode ser feita sem a revisão da lei. Pelo Judiciário, ou seja, aqueles que sofreram abusos e arbitrariedades por parte dos torturadores devem cobrar na Justiça as indenizações a que têm direito.”

A estratégia do pré-sal

Blog do Luis Nassif - 05/08/08

Estratégia para pré-sal é exportar só derivados

Claudia Safatle, Cláudia Schüffner e Francisco Góes, de Brasília e do Rio

Com investimentos de mais de US$ 43 bilhões na construção de novas refinarias até 2016 e aumento da capacidade de produção das plantas já existentes, o Brasil se prepara para ser exportador de produtos petrolíferos de maior valor agregado. As duas refinarias premium que serão construídas no Maranhão e no Ceará, com capacidade de 900 mil barris por dia, serão destinadas à exportação de diesel com as especificações exigidas pelos mercados japonês, europeu e americano. Pelos planos do governo, a capacidade de refino do país passará dos atuais 1,792 milhão de barris/dia para 3,2 milhões até 2020.

Essa decisão é parte da estratégia do presidente Lula, que, em recente reunião com a Casa Civil e com a direção da Petrobras, estabeleceu três premissas decorrentes do aumento da produção de petróleo, na próxima década, a partir da camada pré-sal: o país não será exportador de óleo bruto; parte das receitas com a exploração será mesmo destinada a um fundo de investimento em educação; e só serão importados equipamentos que a indústria naval local não for capaz de produzir. A recuperação desse setor, agora, "não tem mais volta", sintetizou um ministro que participa do grupo de trabalho criado para elaborar um modelo de exploração do pré-sal (continua).

Por SergioSikeira

Também não conheço muito bem o modelo norueguês, mas sei que além da Statoil eles ainda tem a Hydro de capital misto. Quanto a Petoro (100% estatal), pelo que sei, ela tem a prerrogativa de participar dos projetos de E&P do país, mas quase sempre como um sócio minoritário e nunca como operadora. Seu objetivo é irrigar de recursos o fundo estatal do petróleo, que ajuda a garantir a boa vida dos noruegueses.

Repito que acho o modelo de produção partilhada mais adequado ao Brasil NA ÀREA ESTRATÉGICA DO PRÉ-SAL. Em Angola, a Sonangol licita oa áreas de exploração, as empresas privadas assumem todo o risco exploratório e caso bem sucedidadas ficam com 10 a 35% da produção. O estatal fica com a gestão e a parte do lobo na produção, enquanto o estado é remunerado pelos impostos, percentual dos lucros e bônus de assinatura dos contratos.

Lógico que contratos de prestação de serviços seriam muito mais lucrativos no caso de risco explotório zero, mas duvido desta história. Nunca existiu risco zero na história da exploraçãp petrolífera.

A exploração e produção no pré-sal é extremamente cara e acho difícil o estado ter capacidade de aporte no volume adequado às necessidades demandadas. E o modo de atrair o investimento privado de risco (ainda que misto via Petrobras) é garantindo a parte que lhe cabe neste latifúndio. Como no présal o risco é menor e as reservas maiores acredito que metade dos percentuais angolanos seriam suficientes.

Orgulho extemporâneo

Blog do Luis Nassif - 05/08/08

Não faz bem para o quadro político, não agrega nada à luta pelos direitos humanos as constantes declarações de Tarso Genro - que, agora, afirma "ter orgulho de sua ficha". Não há nada que desabone sua carreira política, a resistência contra a ditadura engrandecerá sua biografia. Mas deixem-se esses fatos para uma futura biografia ou para quando sair do governo.

Agora, Tarso está Ministro. Tudo o que ele fala, tem o peso da declaração do Ministro que ele está.

Quais abusos?

Blog do Luis Nassif - 05/08/08

Ficou complexa essa questão dos supostos abusos de autoridades policiais, a partir da Operação Satiagraha. Ontem o Estadão fez uma mesa redonda com Gilmar Mendes, do STF, Tarso Genro, Ministro da Justiça, Antonio Fernando de Souza, procurador-geral e Ceza Brito, da Ordem dos Advogados do Brasil (clique aqui).

Antes de ontem o delegado Protógenes deu uma entrevista à “Folha”- que está sendo malhada por jornalistas sérios, taxando-o de “populismo de direita”. Nela, o que vi foi um cidadão comum insurgindo-se contra os abusos e a impunidade nos crimes de colarinho branco.

Historicamente, sempre me posicionei contra abusos de procuradores e da PF. No meu livro “O Jornalismo dos anos 90” relato vários episódios em que procurei me colocar contra o chamado “clamor das ruas”. Em todos eles era o poder de Estado ou de polícia contra pessoas físicas.

O que ocorreu nos últimos anos, em nível mundial, no entanto, foi o aparecimento de um poder muito superior a tudo o que se conhecia até então: a aliança entre o crime organizado, setores do mercado e parte da mídia, uma mistura infernal cooptando (ou fuzilando) juízes, funcionários públicos e políticos.

O sistema de poder no país é composto por um determinado número de instituições públicas e privadas. Há os tradicionais Executivo, Legislativo e Judiciário. Depois há o poder financeiro – desde o início dos anos 90 um poder hegemônico no país -, gestores inescrupulosos administrando recursos provenientes dos mais diferentes setores, em larga margem da lavagem de dinheiro. E há a mídia, o chamado quarto poder.

A crise da desvalorização cambial fragilizou empresas de comunicação. Algumas conseguiram resolver de forma satisfatória. Outras precisaram recorrer a investimentos de fora. E aí se aliaram a grupos complicados, criando um poder quase invencível. Parte da história recente da mídia brasileira passa pelo Opportunity e Pactual – não coincidentemente envolvidos conjuntamente na Operação Satiagraha.

As reações a esse super-poder se davam de forma individual e as retaliações eram terríveis juntando a capacidade do grupo de produzir dossiês e de publicações de cometerem assassinatos de reputação. Vocês são testemunhas diárias desse jogo barra-pesada de lobistas notórios.

Juízes que ousaram enfrentar Dantas sofreram assassinato de reputação; políticos e jornalistas foram estigmatizados e sofreram escuta e espionagem. Até a Academia Brasileira de Letras foi cooptada, para que um de seus “imortais” desse um parecer vergonhoso a respeito do estilo de sentença de uma juíza.

Era uma força aparentemente invencível.

Se não fossem os juízes de Primeira Instância, os delegados, os procuradores atuando na linha de frente, com poder de escuta e de esquadrinhar, qual seria o desfecho desse jogo? Até onde iria o poder dessa aliança espúria?

Satiagraha foi uma reação a partir da consciência individual de um grupo pequeno de pessoas. Tentar ironizar entrevistas do delegado Protógenes é perda de tempo: ele correu risco no cargo e na carreira apostando em suas convicções, enquanto outros se calavam.

Nesse caso específico, sem a "espetacularização" não teria havido a Operação Satiagraha.

IPEA: ÍNTEGRA DA PESQUISA SOBRE REDUÇÃO DE POBREZA

Site do Azenha - Atualizado em 06 de agosto de 2008 às 02:31 | Publicado em 06 de agosto de 2008 às 02:04

Pesquisa revela que o número de pobres diminuiu
(05/08/2008 - 15:30)


Houve queda no número de indigentes e crescimento de ricos

O Ipea divulgou hoje pesquisa que revela que, devido ao crescimento econômico no país, a pobreza reduziu e o número de ricos aumentou.

O estudo foi realizado em seis regiões metropolitanas - Recife, Salvador, São Paulo, Porto Alegre, Belo Horizonte e Rio de Janeiro, e constatou que o percentual de pobres na cidade de Belo Horizonte, por exemplo, entre 2002 (38,3%) e 2008 (15,2%), teve queda de 23,1%.

Já em Recife, o índice de pobreza foi o que menos reduziu. Entre 2002 (52,3%) e 2008 (43,1%) a redução foi de apenas 9,2%. De acordo com o presidente do Ipea, Marcio Pochmann, "a pobreza está caindo significativamente e inclui a indigência".

Entre o mesmo período houve queda no percentual de indigentes. Em 2002 esse total era de 12,7% dos pobres. Atualmente o número caiu para 6,6%.

O crescimento econômico, os ganhos do salário mínimo e as transferências do governo, contribuíram para a redução da pobreza. No caso dos ricos, além do crescimento econômico, essa classe se beneficiou dos ganhos de produtividade, que pouco são repassados aos salários dos trabalhadores.

O número de ricos entre os anos de 2002 e 2008 também aumentou. De 448 mil subiu para 476 mil pessoas. Ainda de acordo com a pesquisa, a classe média está em expansão.

O estudo compreende o período de 1992 a 2008, e conceitua como pobre o indivíduo que tem renda mensal de até meio salário mínimo (R$ 207,50) e o rico, aquele que pertence a uma família que possui renda mensal igual ou superior a 40 salários mínimos (R$ 16.600,00).

MAIO DE 2002: FHC MONTA O PLANO DE FUGA

Conversa Afiada - 05/08/08


Maio de 2002.

. FHC nomeia Gilmar Mendes para o Supremo.

. Maio de 2002.

. FHC recebe Daniel Dantas para um jantar no Palácio.

. Maio de 2002.

. FHC destitui a diretoria da Previ hostil a Dantas.

. Maio de 2002.

. FHC nomeia Luiz Cantidiano para a CVM.

. Cantidiano tinha sido sócio de Dantas.

. Maio de 2002.

. FHC, Serra e Marcelo Itagiba mandam o delegado Deuler Rocha da Polícia Federal para a Ilha do Diabo, porque cometeu o erro de investigar Dantas.

. Essa cronologia foi montada por um leitor do Conversa Afiada, que se deu conta de que o notável artigo do jurista Dalmo Dallari – clique aqui para ler – sobre Mendes tinha sido escrito em MAIO DE 2002 !

. Maio de 2002 – deve ter sido quando o Farol de Alexandria se deu conta de que seu candidato, o presidente eleito José Serra, não seria eleito (na verdade, Serra perdeu por 61 % a 39%, o mesmo resultado de Gilberto Alckmin.)

. Foi essa “transição civilizada” que o Presidente que tem medo, o Presidente Lula, aceitou de Fernando Henrique.

. E vai levar para a sua biografia, editada, em capa dura, como “coffee table book” pela “BrOi”, com recursos da Lei Rouanet.

GRAMPO: DE SANCTIS DESMONTA FARSA DA FOLHA (*)

Conversa Afiada - 05/08/08


A Folha (da Tarde *), a mesma que publicou a “reportagem” que ajudou Daniel Dantas a escapar – clique aqui para ler –, inventou a farsa de “1984”.

. A farsa da Folha (da Tarde *) consistiu em dizer, no domingo – clique aqui para ler – que o ínclito Delegado Protógenes Queiroz era o “Mega-Big Brother” de “1984”.

. Porque teve acesso irrestrito a todas as ligações telefônicas do Brasil.

. A Folha (da Tarde*) quis dizer que o ínclito delegado Queiroz seria uma combinação de CIA, NSA e FBI, com uma central de armazenamento de centrais telefônicas de que nem a Casa Branca dispõe.

. A farsa da Folha (da Tarde *) tem o objetivo de desviar a atenção da patranha da “BrOi” – de que a Folha (da Tarde*) é cúmplice – e devolver para debaixo do tapete as falcatruas do quadrilheiro Daniel Dantas.

. É o Golpe do “Estado de Direita” em marcha.

. Os líderes do Golpe são o PiG, que elegeu o Supremo Presidente Gilmar Mendes seu porta-voz.

. (Como diz um amigo meu: o Presidente Supremo não desempenha esse papel de líder do Golpe do “Estado de Direita” à toa. Logo ele que se aperfeiçoou nas letras jurídicas ao trabalhar para Eduardo Jorge, lugar-tenente do Farol de Alexandria. Aplica-se a Mendes, segundo o meu amigo, a “Lei Vitorino Freire”: jabuti sobe em árvore ? Se você vir um jabuti na árvore é porque alguém pôs ele lá.)

. Acontece que há uma metade do Brasil que não joga no time de Daniel Dantas.

. (Espera-se que entre os 9 ministros do Supremo Tribunal Federal haja algum representante dessa metade ... Falei em nove, porque, além do Supremo Presidente, a Ministra Ellen Grace, para não abrir o disco rígido, defendeu a tese de que Dantas não é Dantas, mas Dantas ...)

. O juiz Fausto De Sanctis, da 6ª. Vara Federal de São Paulo, que prendeu Dantas duas vezes (e o Supremo Presidente mandou soltar, duas vezes, em 48 horas), publicou nota oficial na página A6 da Folha (da Tarde*) de hoje: clique aqui para ler.

. O corajoso juiz De Sanctis desmente, ponto por ponto, a farsa da Folha (da Tarde *).

. A farsa é mais uma tentativa do pessoal do “Estado de Direita” de inventar documentos, provas, indícios para dar o Golpe.

. A “Carta Brandi” do Lacerda, o maior de todos os golpistas, foi uma. Clique aqui para ler.

. O juiz De Sanctis tem uma explicação irrefutável.

. Numa linguagem mais simples, o que se pode dizer é que o ínclito Delegado Queiroz quis saber quem ligava para um grampeado (grampeado, ressalte-se, com autorização judicial).

. Por exemplo, quis saber se o “Gomes”, ou “arquiteto” que ligava para o Dantas era mesmo o Luiz Eduardo Greenhalgh.

. Como não existe catálogo telefônico de celular, o ínclito Delegado Queiroz conseguiu aquilo que qualquer vendedor de celular tem: acesso ao cadastro de clientes de uma operadora.

. O Conversa Afiada sugere à chefe de reportagem da Folha (da Tarde *) – se é que a Folha (da Tarde *) tem reportagem, ou se é tudo opinião – para designar um repórter.

. A Folha (da Tarde*) ainda tem repórter ?

. O Conversa Afiada toma a liberdade de sugerir o nome do colonista (*2) Guilherme Barros, um especialista em teles ...

. O repórter Barros iria a uma loja que vende celular.

. Qualquer loja, de qualquer operadora.

. E diz que quer comprar um novo celular.

. E pede ao vendedor para estudar um plano em que economize dinheiro, porque as contas estão muito altas.

. O vendedor fará o que a farsa da Folha (da Tarde *) denunciou: consultará o cadastro do cliente para sugerir um plano mais econômico.

. Qualquer vendedor de qualquer loja de celular no Brasil tem o que o Delegado Queiroz conseguiu.

. É simples, caro leitor.

. O PiG, a Folha (da Tarde *, especialmente) e o Supremo Presidente querem é isso mesmo: instalar o medo, disseminar um clima de “1984” para dar o Golpe do “Estado de Direita”.

. E, assim, ninguém mais fala do Daniel Dantas.

. Ninguém se pergunta: por que cargas d’água o Fernando Henrique Cardoso haveria de aplicar no “Banco” Opportunity ?

. A ordem é: vamos levar Dantas de volta para debaixo do tapete !

. Clique aqui para ler sobre as novas manifestações explícitas de um Golpe para instalar o “Estado de Direita”: “Estadão e Mendes trabalham pelo “Estado de Direita” e clique aqui para ler “CPI do Grampo trabalha para Mendes”.

. Clique aqui para ler sobre as aplicações de Fernando Henrique Cardoso no “Banco” de Dantas.

(*) Já estava na hora de a Folha tirar os cães de guarda do armário e confessar, como fez a Folha, que foi “Cão de Guarda” do regime militar. Instigado pelo Azenha – clique aqui para ir ao Viomundo – acabei de ler o excelente livro “Cães de Guarda – jornalistas e censores do AI-5 à Constituição de 1989”, de Beatriz Kushnir, Boitempo Editorial, que trata das relações especiais da Folha (e a Folha da Tarde) com a repressão dos anos militares. Octavio Frias Filho, publisher da Folha (da Tarde), não quis dar entrevista a Kushnir.

(*2) Clique aqui para ler o verbete “Colonista”.

Em tempo: como previsto, o depoimento do ínclito Delegado Protógenes à CPI dos Grampos foi inútil. À Bancada Dantas na CPI, leia-se Marcelo Itagiba e Raul Jungmann, serviu para mostrar serviço a seus doadores. Ao ínclito Delegado Queiroz, serviu para desmoralizar o Golpe do “Estado de Direita”, leia-se o Supremo, a CPI dos Grampos e o Governo do Presidente que tem medo. Como diria o locutor esportivo, “a bola está lá dentro”, ou seja, nas mãos dos corajosos juiz Fausto De Sanctis e procurador Rodrigo de Grandis. E se os Golpistas do “Estado de Direita” pensam que vão enrolar o ínclito Delegado Queiroz, é bom tomar cuidado: além de inteligente, ele tem a ficha de todos eles ...

Clique aqui para ler “Delegado se nega a responder perguntas na CPI dos grampos”, na Agência Brasil.

Brasil, Argentina e Venezuela. A ausência de uma estratégia unificada

Instituto humanitas Unisinos - 05/08/08


Na análise do sociólogo argentino Atílio Borón em artigo para o Pagina/12, 04-08-2008, o Brasil, a Argentina e a Venezuela não jogam juntos em uma estratégia de fortalecimento das relações na América Latina. Borón considera que a Argentina pensa apenas no curto prazo e não fortalece estratégia alguma; por sua vez o Brasil pensa no longo prazo, mas se equivoca em sua política de inserção internacional. Para o sociólogo argentino, é Chávez que tem uma estratégica mais clara para o continente sul-americano. A tradução é do Cepat.

Eis o artigo.

A Argentina chega debilitada na reunião dos três presidentes. De um lado, com um poder político presidencial minguado pela recente (e inesperada) derrota de uma iniciativa – a Resolução 125 – que insolitamente o governo elevou a uma disputa de um referendo revogatório e perdeu. Mas também debilitada economicamente, pese os dados da macroeconomia que continuam mostrando elevadas taxas de crescimento do PIB cuja euforia se dissimula no momento de graves problemas.

A inflação é um inimigo sério que o governo não leva a sério, e tampouco estabelece uma adequada estratégia para combatê-la porque continua acreditando nos índices do INDEC. A crise energética é outra formidável e ainda mais letal ameaça: liquidada a preço vil nossa petroleira estatal durante o menemato (em uma operação que contou com o apoio irrestrito do PJ, da CGT, dos governadores das províncias e de boa parte dos dirigentes políticos), duas grandes empresas estrangeiras continuam extraindo óleo cru das nossas reservas e exportando sem nenhum controle do Estado em resguardar um bem público não renovável e de extraordinário valor.

Sabemos o que exportam porque o dizem em seus balancetes, algo que não exige provas na hora de denunciar a necessária reconstrução do estado na Argentina. As reservas estão se esgotando, não há exploração de novos poços, e diante da ausência de novos empreendimentos hidroelétricos a chegada da crise é apenas uma questão de tempo. Quanto mais crescer a economia, mais rapidamente a crise chegará.

Some-se a tudo isso a inexistência de um plano nacional de desenvolvimento – reclamado por Aldo Ferrer em sua memorável exposição na Câmara dos Deputados – e o panorama é suficientemente claro. Quando se diz que o “modelo não muda” o que se diz é que um modelo que se faz na acumulação.

Os dados anteriores demonstram que a Argentina continua sendo o reino do “curto-prazismo”: Nenhum governo desde a restauração democrática até aqui pensou para além da próxima conjuntura eleitoral, e assim se vai. No Brasil, ao contrário, a propensão em pensar – e atuar pensando – no longo prazo tem sido um dos seus traços mais característicos. Por isso puderam construir Brasília em meio a um deserto; por isso persistem durante décadas em fazer da Petrobrás e da Embraer duas grandes empresas; por isso puderam criar o Banco Nacional de Desenvolvimento e fazer que, ao cabo desses anos, disponha de mais recursos para empréstimos que o Banco Mundial; por isso enquanto o Brasil constrói rodovias, portos, aeroportos e grandes obras hidroelétricas, a Argentina constrói... discursos.

Está claro que pensar no longo prazo nem sempre equivale a pensar corretamente. O “longo-prazismo” brasileiro tem um “tendão de aquiles”: sua visão errônea de inserção na economia internacional. Por isso a contribuição (se deixarem) que pode dar Chávez no robustecimento do MERCOSUL é de fundamental importância. O bolivariano é o único que possui uma visão não apenas de longo prazo, mas também estrategicamente acertada. Chávez não se equivoca, como os demais, esperando “compreensão e apoio” dos Estados Unidos ou da União Européia.

Tem consciência de que a lógica que preside o sistema é imperialista e que as potências dominantes, e especialmente o seu centro principal, não fazem concessões e tampouco se comovem com as aspirações dos nossos povos. Lula, ao contrário, celebrou em março de 2007, o seu acordo estratégico com George Bush para produzir etanol e biodiesel, optando por alimentar os tanques dos automóveis do Norte no lugar do estômago de seu povo. E por isso mesmo na agonizante Rodada de Doha se alinhou às grandes potências e de “descolou” dos seus irmãos do sul, prometendo abrir os seus mercados em troca de que os ricos do mundo comprem os seus produtos.

Tudo, possivelmente, por uma ilusão: aceder a um assento no Conselho de Segurança da ONU, obsessão que os velhos e novos colonialistas estimulam habilmente para obter mais concessões do gigante sul-americano ao módico preço de manter viva sua demagógica promessa. A Argentina tem uma longa história de subordinação aos desejos e interesses do Norte e terminou com as mãos vazias.

Chávez, ao contrário, sabe que a única opção para os nossos países é potencializar a nossa autonomia decisória: daí as estratégicas decisões de criar a ALBA, o Banco do Sul, o Gasoduto do Sul, Telesur e tantas iniciativas nessa perspectiva. E nessa convicção, o bolivariano não exibe fraqueza e nem cede diante do canto de sereia do império. Oxalá que os demais se contagiem.

O inquérito italiano

Blog do Luis Nassif - 04/08/08

No capítulo “O post-it de Mainardi” descrevo a estratégia da defesa de Daniel Dantas no inquérito da Kroll, no Brasil, e o papel de Diogo Mainardi.

O que os advogados de Dantas buscam é a chamada “contaminação do inquérito” – isto é, trazer para o inquérito da PF o inquérito da Telecom Itália e as vinculações brasileiras. Fazendo isso, Dantas se livra. Qualquer juiz considerará que o inquérito se baseou em práticas ilegais. Daí o termo “contaminação”: as ilegalidades da Telecom Itália no Brasil (sob Tronchetti Provera) comprometerão os trabalhos legais da Policia Federal e do MP, porque estarão ambos reunidos no mesmo inquérito. E tudo terminará em pizza.

Insisto: anote bem essas observações, porque ficará mais fácil entender os caminhos que Diogo Mainardi passou a trilhar.

Esse capítulo foi escrito meses atrás.

A estratégia de Dantas consistia nisso. Através de Diogo Mainardi – entre outros – tentaria pressionar a Justiça para incluir no inquérito da Kroll os “grampos” da Telecom Itália. Em sua coluna, além de insistentemente afirmar que o inquérito brasileiro deveria incluir o material do inquérito italiano, Mainardi informou ter levado pessoalmente (!) ao Ministério Público o relatório.

Confira a nota abaixo. É do Ministério Público Federal de São Paulo e foi divulgada na quinta-feira passada. Através dela se fica sabendo que algum agente infiltrado colocou o CD da Kroll no inquérito. A defesa de Dantas imediatamente alegou que o inquérito estava “contaminado”. Os procuradores federais denunciam que o CD foi anexado ao processo sem o devido comunicado ao MPF e à Justiça.

Alguma dúvida sobre a importância que a defesa de Dantas dava a essa "contaminação" e sobre o papel desempenhado por Mainardi neste jogo, a ponto de se propor a levar pessoalmente o material ao MP?

MPF pediu que a Justiça determine ao diretor geral da PF a abertura de procedimento administrativo para apurar como CD foi arrecadado

O Ministério Público Federal manifestou-se contrário a insinuações da defesa de Daniel Dantas de que a prova da Operação Chacal estaria comprometida por um CD, contendo informações supostamente colhidas ilegalmente em operação de contra-espionagem da Telecom Italia, realizada em 2004, que teria sido descoberto nos autos somente agora, quatro anos após a abertura do caso, após o envio ao Brasil, por procuradores da República italianos da cópia da denúncia oferecida naquele país contra dirigentes da TIM que, supostamente, teriam espionado Daniel Dantas e outros no Brasil.

O CD teria sido entregue ao setor de contra-inteligência da PF, em agosto de 2004, mas o auto de arrecadação, cuja cópia foi apresentada pelos procuradores italianos na denúncia apresentada à Justiça de Milão, não consta dos autos do processo a que Daniel Dantas responde pelos crimes de interceptação telefônica ilegal e receptação, um dos três que integram o Caso Kroll, como ficou conhecida a investigação deflagrada pela Operação Chacal, da PF, em 2004, que apura como o dono do banco Opportunitty investigou ilegalmente seus então adversários da Telecom Italia, membros do governo e jornalistas, por intermédio da empresa Kroll.

Na manifestação, as procuradoras da República responsáveis pelo caso Kroll, Anamara Osório Silva e Ana Carolina Yoshii Kano Uemura, reiteram que oficiaram à 5ª Vara Federal de São Paulo, no último dia 14 de julho, pedindo que a Justiça determine ao Diretor Geral da PF, Luiz Fernando Correa, que seja aberto procedimento administrativo disciplinar para apurar as circunstâncias em que o tal CD foi arrecadado por um delegado federal sem a devida comunicação ao MPF e à Justiça, ou seja, sem cópia no processo. No pedido à direção da PF, o MPF pede que seja checada a veracidade do depoimento do italiano Mario Bernardini, que afirma saber parte do conteúdo do CD.

Na manifestação, o MPF informa que não reconhece o auto de arrecadação do CD como prova para os autos. Para o MPF, o CD é ilegítimo como prova e, além disso, o auto de arrecadação é inválido, pois só veio a conhecimento das procuradoras por meio de uma cópia, juntada pela defesa, da denúncia formulada pelos procuradores italianos, quase quatro anos após a deflagração da operação, na qual denunciam que diretores da Telecom Italia teriam também investigado Daniel Dantas.

Para as procuradoras brasileiras, a denúncia na Itália é normal e só confirma o que já havia sido dito nos autos inúmeras vezes pelo MPF que, a despeito dos crimes cometidos no Brasil por Dantas e seus aliados e pela TIM, na Itália, "a investigação privada parecia ser comum entre todos, acusados e seus adversários comerciais". Além disso, o MPF não pode se manifestar sobre uma investigação em outro país, por não poder investigar no exterior, e vice-versa.

Para o MPF, as alusões da defesa de que a prova estaria "contaminada" não passam de "meras insinuações", pois a prova dos autos brasileiros foi colhida com autorização judicial para interceptações telefônicas e telemáticas, bem como, busca e apreensão. Tanto é assim que outro CD entregue à PF, em julho de 2004, por Angelo Jannone, ex-diretor da TIM, também foi excluído dos autos como prova após manifestação do MPF, atendendo pedido da defesa de Dantas.

Marcelo Oliveira
Assessoria de Comunicação
Procuradoria da República no Estado de S. Paulo

Cachorro comendo o rabo

Blog do Luis Nassif - 04/08/08

Há alguns dogmas na economia brasileira, que não se consegue demolir nem a golpes de marreta. Um dos mais renitentes é a idéia da utilização da poupança externa para financiar a dívida interna.

O “Valor” incorre nesse erro no editorial de hoje (clique aqui):

(...) É possível que uma parte dos investidores que hoje aplicam em títulos públicos seja "hedge funds". Mas é fato que os papéis do Tesouro despertam interesse crescente de investidores institucionais, como fundos de pensão e seguradoras, sobretudo depois que o Brasil recebeu o grau de investimento por duas agências de classificação de risco.

(...) A maior parte dos investimentos estrangeiros em renda fixa é dirigida a ativos de longo prazo. As estatísticas do BC mostram que, dos US$ 10,171 bilhões que ingressaram no país no primeiro semestre, 81,5% eram aplicações de longo prazo (maiores que um ano) e 18,5% investimentos de curto prazo (até um ano).

Em março, quando a Fazenda taxou essas aplicações com IOF, houve repercussões imediatas na curva de juros de longo prazo, que subiu. Ficou claro neste episódio que, sem a presença dos estrangeiros, o Tesouro é obrigado a pagar juros mais altos no financiamento da dívida interna.

Onde estão os erros?

1. Os estrangeiros não pagam Imposto de Renda sobre as aplicações. Por isso, muito provavelmente parte dos recursos que chegam são de brasileiros que os remetem para fora e retornam na forma de capital externo. Essa distorção merecia uma CPI. Concedeu-se uma isenção parcial de IR, mas a taxa continuou a ser balizada pelas aplicações com IR.

2. Financiamento externo para a dívida pública é a mesma coisa que o cachorro comendo o próprio rabo.

  • Entram os dólares (seja de que procedência forem).
  • Aqui, são trocados por reais, para poderem ser aplicados em títulos públicos.
  • O BC é o grande comprador desses dólares, para impedir a apreciação ainda maior do real.
  • Em seguida, o BC emite títulos, para enxugar parte da liquidez colocada na economia, para adquirir os dólares.
  • Portanto, um dólar que entra significa um percentual de aumento da dívida pública.

É incrível essa dificuldade de colocar todos os números na mesma cesta, avaliar o impacto da entrada de dólares sobre o aumento da dívida pública (que supostamente esses dólares viriam refinanciar).

Vou fazer uma afirmação polêmica, sobre a qual venho pensando há muito tempo. Pode ter algum furo no raciocínio, mas ainda não identifiquei, nem os economistas para os quais coloquei a questão: o efeito do financiamento em dólares da dívida pública é o mesmo de uma emissão monetária - que não custa nada ao governo. Ou seja, se emitir reais e resgatar dívida, o efeito monetário será o mesmo que o de permitir a entrada de dólares para financiar dívida.

VÍDEO: DANTAS E MENDES PARA CRIANÇAS

Conversa Afiada - 04/08/08

FHC CONFIRMA: iFHC APLICA COM DANTAS

Conversa Afiada - 04/08/08

O assessor de imprensa do iFHC, Carlos Magno, respondeu ao Conversa Afiada:

“jocosta” é o endereço eletrônico José de Oliveira Costa, diretor do iFHC e é a pessoa responsável por essas aplicações (extratos e documentos) em fundos diferentes.

O iFHC aplica em dez fundos diferentes. Todos os investimentos começaram a ser feitos a partir de 2004. O iFHC não aplica seus recursos em paraísos fiscais.


Em tempo: Como é que o Instituto de Fernando Henrique Cardoso sabe se o dinheiro foi ou não para paraísos fiscais – ou o tesoureiro do Instituto Fernando Henrique Cardoso ignora que “dinheiro não tem carimbo" ? (PHA)

Leia o que o Conversa Afiada já publicou sobre esse assunto:

. Um leitor atento do Conversa Afiada localizou em duas das 7000 páginas do relatório do ínclito delegado Protógenes Queiroz uma informação relevante.

. O Instituto Fernando Henrique Cardoso aplicou dinheiro no “Banco” Opportunity, do quadrilheiro Daniel Dantas.

. E não foi pouco: o saldo na conta era de R$ 2,8 milhões, em 2 de maio de 2008, ou seja, três meses atrás.

. Acompanhe, caro leitor:


. Amanhã, segunda-feira, dia 4 de agosto, o Conversa Afiada vai procurar “jocosta”, que, no Instituto Fernando Henrique Cardoso, recebeu o extrato da conta do Instituto no “Banco” de Dantas.

. O Conversa Afiada gostaria de saber se o Instituto Fernando Henrique Cardoso aplicou em contas do Opportunity em paraísos fiscais, nas Bahamas, Cayman e Montevidéu (*).

. Se for assim, a Polícia Federal tem que pedir um mandado judicial para ir lá fechar o Instituto.

. O interessante é que, neste domingo mesmo, o Farol de Alexandria escreve um texto (em estilo de exemplar elegância) para tentar se livrar do cadáver de Daniel Dantas.

(*) O Conversa Afiada encaminhou a pergunta nesta segunda-feira, dia 04, à assessora de imprensa do iFHC Roberta Vigano. Aguardamos resposta.

Hospitais dos EUA deportam imigrantes

Instituto Humanitas Unisinos - 04/08/08

No alto das montanhas da Guatemala, trancado numa casa de um único cômodo onde passa dia e noite sobre uma cama, Luis Alberto Jiménez tem uma grave lesão cerebral e nenhuma idéia da batalha que se desenrola em torno de sua história na distante Flórida. Jiménez, de 35 anos, representa a colisão entre dois sistemas americanos repletos de falhas: imigração e saúde. A reportagem é de Deborah Sontag e publicada pelos jornais New York Times, O Globo e El País, 04-08-2008.

Há oito anos, ele era um imigrante ilegal nos EUA e trabalhava como jardineiro na Flórida, quando foi vítima de um grave acidente de carro provocado por um americano embriagado.

Um hospital local salvou sua vida, mas, sem conseguir vaga em algum centro de reabilitação que recebesse o paciente sem seguro, manteve o imigrante sob sua guarda por anos, a um custo total de US$ 1,5 milhão.

O que aconteceu em seguida deu origem à batalha legal com repercussões por todo o país: Jiménez foi deportado — não pelo governo, mas pelo próprio hospital, o Martin Memorial, que alugou uma ambulância aérea por US$ 30 mil e o mandou de volta a seu país.

O caso de Jiménez acabou revelando ao público uma prática pouco conhecida, mas aparentemente disseminada nos EUA. Muitos hospitais estão tomando para si a tarefa de repatriar imigrantes porque não conseguem vagas para interná-los sem seguro médico.

O sistema de saúde americano não cobre internações longas para imigrantes ilegais, criando um dilema para os hospitais, que são obrigados por lei a encontrar assistência para pacientes que necessitem de cuidados pós-hospitalares. Não há números oficiais, mas alguns hospitais chegam a repatriar 96 imigrantes por ano.

“A repatriação é uma sentença de morte para muitos”

As autoridades de imigração não exercem papel algum nessas repatriações.

Muitos hospitais garantem que não repatriam pacientes que não estejam estabilizados e que acertam para que recebam cuidados médicos em seus países. Mas o fato é que os hospitais estão agindo num vácuo legislativo, sem assistência governamental ou supervisão, deixando amplas margens para transgressões legais e éticas. Alguns advogados de imigrantes vêem essas repatriações como um tipo de descarte internacional de pacientes, que são afastados dos hospitais do primeiro mundo e levados para instituições onde o tratamento é bem menos adequado.

— A repatriação é uma sentença de morte para muitos desses casos — afirma Steven Larson, especialista em saúde de imigrantes e médico do setor de emergência do Hospital da Universidade da Pensilvânia.

Administradores de hospitais vêem esses casos como um fardo imposto a eles pelas falhas dos sistemas de saúde e de imigração. Em muitos casos, a única alternativa à repatriação é manter os imigrantes indefinidamente em hospitais voltados a tratamento de problemas agudos.

— Isso sobrecarrega o sistema e acabamos não conseguindo oferecer cuidados adequados para nossos próprios cidadãos — afirma Alan B. Kelly, vice-presidente da Scottsdale Healthcare, no Arizona.

Violência assola campanha de cidade paranaense, campeã em royalties de Itaipu

Instituto Humanitas Unisinos - 04/08/08

A eleição do quinto prefeito de Itaipulândia, município do Oeste do Paraná criado há 16 anos, já conta com episódios que envolvem assassinato, denúncias de desvio de recursos públicos e a prisão de sete pessoas. Poderia ser mais uma história de violência no interior de um país continental, não fosse o fato de a cidade ser um oásis de renda e indicadores sociais. Por ser vizinha à hidrelétrica de Itaipu, recebeu, desde 1993, US$ 163 milhões em royalties - renda que a torna privilegiada em termos de arrecadação e serve de combustível para a política local. A reportagem é de Marli Lima e publicada pelo jornal Valor, 04-08-2008.

O nome da cidade já diz tudo. Era um distrito de São Miguel do Iguaçu, chamado Aparecidinha do Oeste, e ganhou condições econômicas para tornar-se independente com a formação do lago da usina e o conseqüente alagamento de terra que resultou na desapropriação de 54% de sua área pela hidrelétrica binacional. A perda de território tornou-se a solução financeira da cidade. Com os royalties foi possível asfaltar ruas, construir a prefeitura, a Câmara de vereadores, escolas, hospital e postos de saúde. Como ainda sobrava dinheiro, a população passou a receber benefícios como cestas básicas, óculos de graça, transporte gratuito a estudantes e bolsas para as faculdades da vizinhança, tanto públicas como privadas.

Para ter idéia da importância dos royalties para Itaipulândia, em 2007 eles somaram R$ 24 milhões dos R$ 35,3 milhões arrecadados pelo município, ou 68% - ou, ainda, o equivalente a R$ 2,8 mil no ano para cada um dos 8,5 mil moradores. Dezesseis municípios que tiveram áreas alagadas recebem essa compensação financeira de Itaipu. A vizinha Santa Helena ficou com a maior fatia, mas o maior valor per capita é o de Itaipulândia. "Poderia ser uma Suíça", compara o delegado-chefe da 6ª Subdivisão da Polícia Civil, de Foz do Iguaçu, Alexandre Macorin de Lima, que comandou a investigações sobre o assassinato recente do prefeito Vendelino Royer (PMDB).

No dia 8, após sair de reunião com líderes comunitários, Royer foi executado com cinco tiros. O vice, Laudair Bruch (PMDB), tomou posse, mas foi preso no dia 17, acusado de ser o mandante do crime. Embora ele tenha negado, o delegado diz que as evidências e a confissão de outros seis presos, entre eles o candidato a vereador Dirceu Buron (PMDB), demonstram sua participação. Bruch era também secretário de finanças até abril, mas a proximidade das eleições levou ao rompimento entre prefeito e vice, que passaram a apoiar candidatos diferentes.

Royer não iria tentar a reeleição e decidiu unir-se a Lotário Knop (PDT), o primeiro prefeito de Itaipulândia, que quer voltar ao cargo. Bruch decidiu concorrer ao cargo de vereador e ficou do lado de Miguel Bayerle (PR), que já foi prefeito da cidade por dois mandatos e, quatro anos atrás, ajudou a eleger Royer. Na confusa teia de relações, restam dúvidas sobre o que estará nas urnas em outubro e o que acontecerá até lá. No dia 21, o presidente da Câmara de vereadores, Gilberto Silvestri (PMDB), tomou posse como prefeito sob protestos de parte da população, que o associa a Bruch. Um movimento liderado por seis dos nove vereadores pede a intervenção do Estado no município. "Esse grupo quer usar a máquina para a campanha", afirma o vereador Claudemir Ferreira da Silva (PSB).

Procurado pelo Valor, Silvestri não quis dar entrevista. Na prefeitura, uma decreto fixado na porta diz que não haverá atendimento externo até o dia 3. Do lado de fora, a bandeira da cidade, rasgada pelo vento, mostra o atual clima. A população evita falar tanto do assassinato do prefeito e da prisão do vice como das denúncias feitas um dia antes do crime pelo vereador Marcelo Gomes Prates (PMDB), que exibiu na Câmara um vídeo em que aparece um secretário de Royer contanto pilhas de dinheiro no escritório de um empresário de publicidade. "Todo mundo falava mal do Vendelino, hoje estão dizendo que ele é bom", reclama. "Ele queria seguir a lei, mexeu com muita gente", afirma a viúva, Veronice Royer. Na nota de pesar, no site da prefeitura, está escrito que Royer "foi capaz de com sua conduta denunciar, mudar paradigmas e criar novos conceitos".

Os últimos acontecimentos levaram muitos a pensar nas motivações dos envolvidos. "Estamos nessa situação por causa desses malditos royalties", disse uma moradora, que prefere não ser identificada. "O problema era o caixa 2", comentou outro. Para parte dos moradores, o dinheiro dos royalties é visto com indiferença. "Para nós não faz diferença, temos de trabalhar do mesmo jeito", opinou uma terceira entrevistada. Os três pediram para não ter os nomes citados por medo de retaliações. Uma das maiores reclamações de políticos e eleitores é a construção de um parque termal que já teria consumido cerca de R$ 16 milhões e está abandonado, porque ainda exigiria alguns milhões para ser concluído. No local, quatro vigias revezam-se para cuidar dos tobogãs e piscinas vazios.

Até a deterioração política, Itaipulândia vinha exibindo indicadores sociais admiráveis. A pesquisa Trata Brasil, feita no final de 2007 pela Fundação Getúlio Vargas, mostrou que o município ocupa o primeiro lugar entre os municípios do país no ranking de investimento em saúde e saneamento, com R$ 859 por morador (segundo dados do IBGE de 2000). Em Brasília, que ocupa a 15ª posição, o gasto foi de R$ 422 e, em Porto Alegre, o 36º colocado, de R$ 323. Como a prefeitura está fechada e conta com o terceiro secretário de finanças em três meses, não há dados recentes disponíveis sobre os investimentos da cidade. O que se sabe é que, com a queda do dólar, o valor dos royalties também caiu e prejudicou o orçamento dos últimos anos.

Gilmar Ribeiro, presidente da Associação Comercial e Empresarial de Itaipulândia, disse que os benefícios dos royalties podem ser vistos na cidade. "Eles sempre ajudaram. A estrutura das escolas é muito boa", cita. O diretor da Escola Municipal Carlos Gomes, Celso Balzan, concorda parcialmente. No prédio construído há três anos estudam 600 alunos de 4 a 10 anos. No local, além do curso regular, há aulas de reforço, projeto para melhorar o português e a matemática, esporte, cultura e boa merenda. Mas o filósofo e pedagogo queria mais do que uma escola bonita e engrossa o coro dos que acreditam que os royalties deixaram os itaipulandenses dependentes.

"As pessoas não vêm a educação como necessidade. Tudo gira em torno dos apoios políticos que podem render frutos", diz Balzan. "Meu filho tem hora de estudo diário, mas muitos pais não estimulam as crianças a aprender mais", reclama. Segundo ele, como o governo municipal financia o pagamento da faculdade, os adolescentes e jovens também não se preocupam em estudar mais para passar em vestibular em instituição pública. "A infra-estrutura é boa, mas não gerou retorno em receita para o município."

Além da dependência do dinheiro repassado por Itaipu, a proximidade com o Paraguai é outro problema. "A disputa política pelo poder é feroz e criou-se uma dependência dos royalties e também do contrabando, porque é muito fácil usar um barco para levar mercadoria de um lado para o outro", afirma o promotor de justiça Haroldo Nogiri, da Comarca de São Miguel do Iguaçu, responsável também por Itaipulândia. "Já soube de aluno que disse ao professor que ganha mais puxando caixa (de contrabando) no rio."