"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música"
Friedrich Nietzsche

sábado, novembro 24, 2012

Uma proposta nada modesta

Carta Capital - 12.11.2012 09:09

Um ato legislativo poderia acabar com a dívida pública e grande parte da dívida privada, fazer a economia crescer cerca de 10% e quebrar o poder do setor financeiro sobre o mundo. Não é papo de botequim, nem palavra de ordem de panfleto de extrema-esquerda, mas a proposta de The Chicago Plan Revisited, um estudo patrocinado pelo Fundo Monetário Internacional, elaborado por dois de seus economistas, o tcheco Jaromir Benes e o alemão Michael Kumhof.

Recordemos como um banco privado cria moeda. Quando um cliente A deposita 100 reais na própria conta o banco pode emprestar a mesma quantia a um cliente B, que paga uma despesa a um cliente C, que deposita o ganho no banco, que empresta a D, que paga a E, que deposita no banco e o ciclo se repete indefinidamente. O primeiro cliente continua a dispor dos 100 reais que depositou e que continuam a existir na sua conta. Mas os 100 do cliente C também passaram a existir, bem como os 100 do cliente E etc.: o banco os criou.

A mão visível. A volta do monopólio estatal da emissão de moeda pode ser a forma mais simples de conter o caos financeiro. Foto: Mark Wilson/Getty Images/AFP

Isso exacerba os ciclos econômicos. Em fases de euforia, os bancos subestimam os riscos e usam o poder de multiplicar a moe­da para emprestar mais do que deveriam, inflacionando os agregados monetários. E quando sobrevém uma crise de confiança, aniquilam o dinheiro com a mesma facilidade – ou são obrigados a fazê-lo pelas retiradas em massa de clientes em pânico –, agravando a retração com uma crise deflacionária que pode travar a economia real.

Em tese, para limitar o risco dos bancos e controlar a inflação e os ciclos financeiros, o banco central pode impor o recolhimento compulsório de uma porcentagem variável conforme o tamanho do banco e o tipo de depósito. Digamos que seja 10%: o banco pode emprestar a B apenas 90 dos 100 que o cliente A depositou e a D apenas 81 dos 90 apurados por C e assim por diante. Desta maneira, seu poder de emitir moeda é teoricamente limitado: neste exemplo, o banco ainda pode criar, no máximo, mil reais para cada 100 depositados.

Na prática dos Estados Unidos (pelo menos), dizem Benes e Kumhof, essa limitação é irrelevante: é a decisão dos bancos privados de emprestar mais ou menos que leva o Fed a ajustar o recolhimento. Sua proposta é obrigar os bancos a recolher 100% dos depósitos, cassar seu poder de emitir moeda e restaurar o monopólio do Estado nesse campo. Na essência, é uma reedição do chamado “Plano Chicago”, proposto em 1936 por Henry Simons, da Universidade de Chicago, para combater os ciclos financeiros que causaram a Grande Depressão. Foi apoiado e popularizado por um colega de Yale mais famoso e controvertido, Irving Fisher.

Os dois economistas do FMI recorreram às últimas décadas de aperfeiçoa­mentos matemáticos dos modelos econômicos para simular o funcionamento da proposta e refutar os críticos que a consideram desastrosa e inflacionária. Pelo contrário, concluem que esse regime permitiria à economia funcionar com inflação zero sem risco de “armadilhas de liquidez”, aumentaria o crescimento econômico, reduziria os custos da economia e a necessidade de impostos, parcialmente substituídos pela receita do governo com emissão adicional de moeda (até 3,5% do PIB), além de cumprir seu objetivo principal, que é conter os ciclos financeiros.

Gráfico extraído de The Chicago Plan Revisited

Nesse regime, os bancos poderiam emprestar apenas o próprio patrimônio líquido (capital e lucros acumulados) e os recursos que tomassem emprestado do Tesouro ou de agentes privados para reaplicar a uma taxa mais alta. Continuariam empresas lucrativas, mas sua dimensão econômica e seu peso no PIB diminuiriam. Perderiam o controle sobre a quantidade de dinheiro em circulação, que passaria a ser independente da quantidade de crédito que os bancos julguem conveniente conceder. Por outro lado, não correriam mais o risco de “corridas”, visto que seus fundos não estariam sujeitos a saques imprevistos.

De quebra, a dívida pública desapareceria. Para respaldar suas operações, os bancos teriam de tomar reservas emprestadas ao Tesouro, anulando a dívida líquida do setor público. O governo substituiria a dívida pública, ou a maior parte dela, por moeda não resgatável. A dívida privada também seria muito reduzida, salvo por empréstimos para financiar compra de capital físico.

O gráfico ilustra as mudanças propostas nos balanços do governo e do sistema financeiro dos EUA. Hoje, os ativos dos bancos somam 200% do PIB, sendo 20% títulos públicos, 80% empréstimos para investimentos e 100% outros empréstimos (consumo, hipotecas e capital de giro). Os bancos teriam de tomar emprestado do Tesouro para respaldar todos os seus depósitos, como na figura do meio, aumentando reservas e créditos do Tesouro em 184% do PIB. Em seguida, o principal dos empréstimos dos bancos ao governo (20% do PIB) seria liquidado e os empréstimos de curto prazo ao setor privado cancelados contra créditos do Tesouro, transferidos aos devedores para pagarem suas dívidas aos bancos. Por fim, os bancos reduziriam o patrimônio para se adequar às necessidades menores e o sistema bancário teria suas funções monetária e de crédito rigorosamente separadas (barra vermelha).

Tio Sam, com dívida hoje de 80% do PIB, emitiria 184% do PIB em créditos do Tesouro, respaldado por igual volume de dinheiro (reservas). Na segunda etapa, o cancelamento de dívidas privadas e públicas reduziria esse volume em 120% do PIB, menos 7% para cobrir a redução de patrimônio líquido do setor bancário e o governo passaria de devedor de 80% do PIB a credor líquido de 11% do PIB (créditos de 71% menos títulos do Tesouro de 60%).

As consequências de tal plano para outros países exigiria um estudo à parte. Mas, numa época em que as esquerdas parecem não encontrar um caminho viável entre sonhos utópicos e reformas acanhadas e pontuais, por que não considerar a sério e adaptar às suas prioridades uma proposta tão ousada como essa, por mais que possam desconfiar de sua origem na Escola de Chicago e de sua atualização por técnicos do FMI? Assim como a Taxa Tobin, é uma ideia que, mesmo vindo de especialistas do establishment, tem potencial para recuperar a autoridade de governos eleitos sobre a economia e o sistema financeiro.

 

Será que Dilma tem coragem para aplicar algo do tipo por aqui?

quinta-feira, novembro 22, 2012

Um charuto (nacional) para Zé Dirceu

averdadesufocada - 20/11

Charutinhos, seus camaradas cubanos vão lhe
enviar. Assim
o ajudarão a continuar a bolar
novas estratégias para a tomada do poder!

De Passagem
Por Paulo de Tarso Venceslau


Um misto de alegria e tristeza tomou conta de mim quando foi computado o voto do Ministro Marco Aurélio de Mello, que estabelecia a maioria necessária para o STF condenar José Dirceu de Oliveira e Silva, ex-ministro chefe da Casa Civil do governo petista de Luís Inácio Lula da Silva.
Alegria, por causa da certeza que a democracia venceu a queda de braços com a burocracia petista. Tristeza, por ver um antigo companheiro ser

condenado por práticas que não condizem com os anseios da sociedade brasileira quem ele insiste em ignorar.
Texto completo

Caminho tortuoso
Zé Dirceu, como é conhecido o ex-ministro, não é mais o mesmo que conheci nos anos 1960 e que voltei a reencontrar no final da década seguinte,quando eu acabava de cumprir mais de cinco anos de prisão política e ele vivia clandestinamente no interior do Paraná, desde seu retorno de Cuba.
Dúvidas e mistérios existem desde então. Entre os remanescentes da antiga Ação Libertadora Nacional - ALN, uma organização guerrilheira que assumiu a luta armada como a principal forma para se combater a ditadura,Dirceu era acusado de ser um agente da G2, serviço secreto cubano, usava farda militar de combatente da revolução, ninguém sabia onde ele morava, deslocava-se em veículos do estado cubano e fumava charuto

nacional (cubano). Os militantes da ALN, por outro lado, viviam clandestinamente em Cuba, mal alimentados, fumavam cigarros
populares e charuto só em condições muito especiais.

Em meados dos anos 1990, eu trombei de frente com Lula, liderança máxima do PT, por causa da defesa que ele fazia de seu compadre Roberto Teixeira em suspeitos contratos de prestação de serviço a prefeituras comandadas por petistas. Esse episódio levou à minha expulsão

do PT em fevereiro de 1998.

Era ovo da serpente, metáfora usada para exprimir a constatação de um mal em processo de elaboração, em incubação. Durante o desenvolvimento desse ovo, pode-se acompanhar a lenta e inexorável evolução do monstro que está se criando.

Dirceu já vivia um dilema desde 1994. Na ocasião, chegou a afirmar que Lula era uma ameaça para a esquerda brasileira por falta projeto, ideologia e valores éticos e morais.

Naquele ano, após disputar o governo paulista, Dirceu se dizia frustrado com os rumos do PT. Lula havia disputado a presidência da república pela segunda vez. O ex-ministro ameaçava o próprio quando dizia que não arcaria com os estragos políticos provocados pelos recursos da Odebrecht que entraram na campanha presidencial através da sua.

O clima era tão tenso que Dirceu chegou a anunciar seu afastamento do PT para trabalhar como advogado pela primeira vez na vida. Para tanto,

associou-se a duas advogadas petistas em um escritório alugado na Vila Mariana, imediações da estação Santa Cruz. O escritório, porém, ainda não havia iniciado suas atividades quando, em 1995, Lula e Dirceu pactuaram um acordo (as bases são desconhecidas até hoje) que resultou na eleição de Dirceu para a presidência do PT. O acordo perdurou até a eleição de Lula em 2002, que fez de Dirceu o homem forte do primeiro

governo petista. Sem dúvida, foi um acordo vitorioso.

Sonho doentio pelo poder absoluto

Dirceu sempre teve uma obsessão pelo poder. Foi essa ambição desmesurada pelo poder que quase levou de roldão o governo de Lula em

2005, ameaçado de processo de impeachment pelo Congresso Nacional por causa do mensalão. Foi essa megalomania que acabou com sua carreira política e poderá transformá-lo em preso comum.

Obcecado com a construção de sua candidatura à sucessão de Lula em 2010, Dirceu abriu flancos que o fragilizaram e o conduziram à recente

condenação por corrupção ativa pelo STF. Durante os três primeiros anos do governo Lula ele não pensava e não fazia outra coisa além de

costurar apoios e alianças que julgava imprescindíveis para seu sucesso em 2010. O próprio Lula sentiu-se incomodado com a desenvoltura de Dirceu na condução política de seu governo e, por isso mesmo, recusou a proposta de seu ministro da Casa Civil que insistia em uma aliança mais sólida e profunda com o PMDB.

Lula tinha certeza que naquele momento a aliança proposta o faria refém de Dirceu e de seus aliados pessoais junto ao PMDB. Curiosamente,

após o afastamento de Dirceu da Casa Civil, Lula retomou a mesma aliança em 2006, que o reelegeu, garantiu sua governabilidade até 2010 e elegeu sua sucessora com Michel Temer como vice. Havia, porém, uma pequena enorme diferença: era Lula quem comandava e não mais seu ex-ministro.

Um charuto para o Zé

Defenestrado do governo, Zé Dirceu transformou-se da noite para o dia em um bem sucedido “consultor”, embora, às vezes, tentasse enganar os mais desavisados afirmando que vivia de honorários de advogado. O sucesso dessa empreitada como “consultor” transformou-o em um homem muito rico graças ao estreito vínculo que ainda mantém com o governo cubano (leias e G2); e o controle que exerce sobre a máquina administrativa do governo federal.

A sua condenação poderá levá-lo à prisão. Caso isso ocorra, terá de enfrentar um novo desafio: manter o controle do PT e da máquina administrativa federal da mesma forma que o crime organizado o faz de dentro dos presídios. Eu não duvido.

A fase outonal da vida já me ensinou alguma coisa. Por exemplo, durante os mais de cinco anos que passei como preso político da ditadura, ele sequer me levou um único cigarrinho.
Poderia ter enviado por outras pessoas como muitos outros companheiros o fizeram.

Mas eu não farei o mesmo. Assim que ele for enjaulado como preso comum, juro que não deixarei que lhe falte charuto nacional, brasileiro. Infelizmente, não tive uma carreira tão brilhante como a dele a ponto de poder comprar-lhe Cohiba, Partagas, Montecristo ou Romeu y Julieta. Deixo essa parte para seus amigos da G2.

terça-feira, novembro 20, 2012

Katrina-Sandy: De um furacão ao outro O fim da América tal como era conhecida

resistir info – 20 nov 2012

por GEAB [*]

Tal como antecipado há vários meses pelo LEAP/E2020, o grande choque para a economia e a estabilidade política global chegou no Outono de 2012 sob a forma de um acontecimento simbólico que será assinalado na história mundial: o furacão Sandy.
Em termos de antecipação política, método sobre o qual o LEAP fundamenta suas análises
[1] , o Sandy corresponde a duas características: o acontecimento "gota de água" que torna insuportável as fracturas acumuladas e rompe um sistema; e o acontecimento simbólico que atinge a imaginação e transforma definitivamente a imagem de uma realidade – pois é preciso sempre distinguir entre a realidade de uma mudança sistémica (em marcha desde pelo menos 2008) e sua aceitação colectiva (no caso presente: a América já não é o que era).
O mês de Outubro de 2012 permanecerá portanto nos livros de história como a data do fim da América tal foi conhecida no século XX. O dia 29 de Outubro, a passagem do furacão Sandy sobre Nova York, 83 anos após a terça-feira negra da crise de 1929, revela ao mundo o estado real da sociedade americana e do seu símbolo, Nova York. A viragem é impressionante à simples leitura dos media de todo o mundo, que na véspera de uma eleição que tinha tudo para fascinar o planeta fazia manchetes sobre uma América "mudada", "dividida", "do terceiro mundo", "no impasse", "apocalíptica", etc... (ver lista de links mais adiante). Este espelho americano foi o Sandy que o quebrou definitivamente.
Confirmando todas as antecipações da equipe do LEAP/2020 desde há seis anos sobre a degradação da saúde dos Estados Unidos e, mais particularmente aquelas a partir do GEAB nº 65
[2] , o furacão Sandy é o acontecimento que data a última etapa do afundamento do sistema americano. Afectando o centro financeiro do país, pondo em evidência a incapacidade da cidade mais poderosa do país mais poderoso para resistir a um "pequeno" furacão previsto com vários dias de antecedência, ele marca o fim da América tal como foi conhecida.
Tal como antecipado em Janeiro de 2006, o "muro dólar"
[3] rachou continuamente ao longo dos últimos seis anos e o Sandy atingiu este muro rachado com plena força, revelando um "rei nu" [4] . A devastação de Nova Orleans em 2005 pelo furacão Katrina pode ser comparada a Chernobil para a URSS de 1986 (surpreendendo o mundo inteiro pela fraca gestão da crise e o estado real da economia) e o muro dólar ao muro de Berlim. Dois anos após a queda do muro de Berlim, a URSS afundava. Destruído pela crise, o muro dólar já não está presente e 2013 será o ano do afundamento da América do século XX.

Figura 1.

Do Katrina ao Sany, passando pelo Lehman Brothers, esta sucessão de choques pôs o poder estado-unidense de rastros: a confiança do resto do mundo esfumou-se. É preciso ler em particular, a este respeito, o incrível artigo da Spiegel, Divided States of America: Notes on the Decline of a Great Nation [5] , um verdadeiro condensado de seis anos de antecipações do LEAP... numa revista "convicções firmes" como a Spiegel, isso não é realmente anódino.
Após o Sandy e a eleição presidencial, os media fizeram claramente uma meia volta, inclusive os media europeus habitualmente admiradores dos Estados Unidos, e agora encaram este país com o olho crítico da realidade
[6] . A constatação é unânime: a grande potência saída da segunda guerra mundial já não o é.
No rastro do Sandy, a reeleição de Obama tem um sabor amargo para metade dos americanos e para o resto do mundo, como se vê nas manchetes da sua imprensa: aquilo que deveria ser uma boa notícia, pois Obama era o candidato natural do resto mundo, anuncia claramente a ausência de mudança, o que é inevitavelmente a pior das coisas à luz do que se sabe sobre a situação político-económica dos Estados Unidos. Todos os problemas não resolvidos nestes últimos quatro anos estão novamente sobre a mesa. O período de campanha eleitoral tendo-os artificialmente aplainado, eles ressaltam agora mais poderosos, mais insolúveis.
Com o ressurgimento dos problemas evadidos durante a campanha eleitoral e uma reeleição de Obama difícil de engolir pelos republicanos, os Estados Unidos não ultrapassarão os desafios que se anunciam no fim de 2012 e princípios de 2013: do lado económico, "precipício fiscal", elevação do tecto da dívida, "bolha de títulos", bolha dos créditos para estudantes; do lado social, a fractura explosiva do país entre os brancos maioritariamente pró Romney e as "minorias" maioritariamente pró Obama e, como antecipado no GEAB nº 68, tumultos que se arriscam a degenerar em secessão e guerra civil considerando a quantidade de armas em circulação no país; do lado político, um bloqueio que perdura e que corre o risco de desembocar num golpe de Estado militar num país em que o exército parece cada vez mais claramente como a única coisa a funcionar correctamente, a única portanto capaz de retomar o controle. Desenvolvemos esta análise do afundamento americano neste número 69 do GEAB.

Figura 2.

Abordamos igualmente os problemas do grande vizinho dos Estados Unidos, o Canadá, com a explosão da sua bolha imobiliária e suas consequências. Se bem que a situação canadiana esteja por enquanto longe de ser tão grave quanto aquela dos Estados Unidos, a América do Norte prepara-se para viver momentos difíceis.
Mas a nossa equipe recorda que a crise é mundial e não poupa sequer os países emergentes, a China à cabeça: revemos neste número os desafios que aguardam a China, nomeadamente os movimentos sociais que vão afectá-la em 2013 (como vimos para a Europa e os Estados Unidos nos dois números anteriores).
Apresentamos também, naturalmente, nossas recomendações mensais (divisas, bolsas, etc) e o GlobalEuromètre.
Se enfatizamos os Estados Unidos neste número, não há que perder de vista a situação explosiva mundial e nomeadamente geopolítica, que também está ligada à perda de influência americana. Vê-se nomeadamente no papel voluntariamente secundário que desempenharam na Líbia, no Mali, na Síria: devido a constrangimentos orçamentais, sua nova estratégia consiste em "delegar" as suas agendas aos seus parceiros, a França e o Reino Unido na Líbia, a CEDEAO no Mali
[7] , Israel na Síria [8] , ... A ausência do líder geopolítico dos últimos 80 anos torna a situação no Médio Oriente particularmente intrincada: todos os interesses, os mais díspares, ali se misturam numa vasta cacofonia.
É do lado europeu ou russo-chinês que de facto se encontram as soluções mas os europeus ainda não estão prestes a dessolidarizar-se do seu antigo aliado americano, auto-neutralizando-se de facto. Quanto aos russos e aos chineses, eles ainda beneficiam da aura ideológica das "boas potência", a saber, aquelas cujos interesses combinam com verdadeiros valores universais. Devido a este facto, nem a Rússia nem a China, que vão seriamente ter de trabalhar nestes valores sem os quais não há verdadeira potência, estão ainda em condições de substituir o líder perdido... ao menos pela força, o que é a pior das soluções para eles... e para todo o mundo com certeza.
Outro sinal de enfraquecimento da potência americana, as sanções sobre o Irão parecem impotentes salvo para difundir entre os iranianos o ódio para com o Ocidente. Este é outro espinho que os europeus cravaram voluntariamente no pé ao invés de comprar o petróleo iraniano em euro. Com efeito, o Irão agora escoa sem problemas seu petróleo para a China e a Turquia. Apesar de membro da NATO, a Turquia paga-o em ouro via Dubai
[9] com toda a legalidade. Este sistema mostra em simultâneo a fragilidade da aliança ocidental e a facilidade dos países para prescindirem do dólar a fim de pagar o petróleo, princípio que é a peça fundamental da hegemonia do dólar e dos Estados Unidos no mundo. Num futuro número do GEAB faremos um ponto da situação sobre os desafios mundiais em torno do petróleo, elemento central da geopolítica actual.
Finalmente, segundo o LEAP/E2020, a influência dos Estados Unidos sobre a Europa faz-se também sentir cada vez menos. Se a situação na Europa é pouco brilhante, com um desemprego elevado, um aumento da pobreza na Grécia e na Espanha, nomeadamente, os media anglo-saxónicos não agitam senão esporadicamente o espectro da explosão do Euro e de maneira cada vez menos virulenta, porque isto é cada vez menos crível e porque os problemas dos Estados Unidos – e os da Inglaterra – são cada vez mais visíveis. As mudanças na Eurolândia iniciadas na dor nestes últimos quatro anos começam a dar os seus frutos
[10] . O desligamento em relação à Wall Street e à City fez-se no decorrer da "crise do Euro" e continua actualmente (11); no caso da City, é o Reino Unido que se afasta (12). Assim, se a Eurolândia será como todo o mundo sacudida pelo afundamento do sistema americano, pelo menos não será aspirada por ele. No entanto, numerosos desafios aguardam os europeus, nomeadamente o facto de a atitude de Angela Merkel não facilitar as discussões com os seus parceiros. Retornaremos ao assunto no GEAB nº 70, sobre o futuro político da Alemanha em 2013 e posteriormente.

Notas:
(1) Ver Manuel d'Anticipation Politique, Marie-Hélène Caillol
,
Editions Anticipolis
(2) Retorno antecipado precisamente para o Outono.
(3) Cf. GEAB n°1 e n°52.
(4) Como no conto de Andersen, As novas roupas do imperador. Fonte:
Wikipedia
(5) Fonte: Der Spiegel, 05/11/2012
(6) Ler por exemplo: L'avenir sombre de l'Amérique, nouvel adversaire d'Obama (
Libération e Süddeutsche Zeitung , 07/11/2012), Les États-Désunis d'Amérique ( La Tribune , 06/11/2012), Rebuilding America (Foreign Policy, 14/11/2012), Waarom Amerika niet langer wereldmacht is ("Pourquoi l'Amérique n'est plus la puissance mondiale", Elsevier.nl, etc.)
(7) Fonte:
Le Monde , 11/11/2012
(8) Fonte:
The New York Times, 12/11/2012
(9) Fontes:
Reuters , 23/10/2012; ZeroHedge , 23/10/2012
(10) Último exemplo até à data: um melhor enquadramento europeu de certos produtos especulativos (CDS "nu" e venda a descoberto sobre a dívida dos Estados) passou relativamente desapercebido mas reforça as defesas dos países europeus contra ofensivas financeiras. Fonte: Le Monde, 01/11/2012.
(11) No domínio bancário por exemplo, ver
Seeking Alpha (18/12/2011). Ou o pedido dos alemães para ter o direito de olhar o seu ouro armazenado nos Estados Unidos (fonte Der Spiegel, 30/10/2012).
(12) Fontes: Financial Times (04/11/2012),
Le Monde (31/10/2012), Der Spiegel (02/11/2012), etc...

15/Novembro/2012

[*] Global Europe Anticipation Bulletin.
O original encontra-se em
www.leap2020.eu/...

Oriente Médio: a geopolítica não é para amadores

Enviado por luisnassif, ter, 20/11/2012 - 16:19

Por O Escritor

A Geopolítica não é para amadores

Os mágicos conhecem esse procedimento: distraia as pessoas, chamando a atenção delas para um foco, enquanto você realiza o truque em outro ponto.

1. Israel, como acontece após toda eleição presidencial americana, ataca e destrói alvos estratégicos em Gaza (destruíram até mesmo o equivalente ao Banco Central de Gaza), elimina os novos líderes do inimigo e impõe-se pela força do terror, obrigando o povo palestino a um longo processo de reconstrução.

Aproveita, também, para acelerar um pouco a sua política de genocídio, visando a base: nos últimos 13 anos, Israel mantém uma média de duas crianças palestinas assassinadas por semana.

http://www.dci-palestine.org/documents/children-make-approximately-23-pe...

2. Benjamin Netanyahu torna-se quase imbatível para disputar a eleição de janeiro vindouro. Cerca 90% dos israelenses apoiam a "ofensiva" contra os palestinos.

3. Os EUA dão um recado ao mundo, deixando claro que bloquearão qualquer resolução da ONU que condene o massacre perpetrado por Israel: a carta-branca continua valendo – o que eles fizerem, nós assinamos embaixo.

4. Israel e EUA dão um recado militar claro ao Irã. Reforçando o recado, três embarcações de assalto anfíbio são enviadas para a região, a pretexto de "possível retirada de cidadãos norte-americanos".

http://security.blogs.cnn.com/2012/11/19/u-s-sends-warships-near-israel-...

5. Israel testa pela primeira vez, com sucesso, seu sistema antimísseis, o Domo de Ferro.

6. O governo de Barack Obama dá à sua futura candidata presidencial, Hillary Clinton, a primeira missão internacional importante: garantir a "paz" na região – ou seja, o fim dos ataques de mísseis, depois que os objetivos estratégicos já foram alcançados.

http://worldnews.nbcnews.com/_news/2012/11/20/15298061-clinton-heads-to-...

7. A campanha Hillary-2016 é lançada sobre uma pilha de corpos, com apoios fundamentais (por exemplo, o do quarto homem mais rico do mundo).

http://www.huffingtonpost.com/2012/11/15/warren-buffett-endorses-hillary...

8. O novo presidente egípcio, Mohamed Morsi, fortalece-se ante o Ocidente e ante os árabes, negociando o acordo de paz entre as partes.

Resultado: todos os agentes envolvidos nesta nova Operação Despistamento saem ganhando.

E o mundo todo focado somente nas vidas humanas virando cinzas.

Para quem esteja interessado neste aspecto "menor" da Geopolítica, câmera ao vivo aqui:

http://blogs.aljazeera.com/topic/gaza/view-live-stream-gaza

Luiz Flávio Gomes: PCC vs PM e a hondurização do Brasil

viomundo - publicado em 20 de novembro de 2012 às 15:55

por Luiz Flávio Gomes

De que maneira o chamado Triângulo Norte centroamericano, formado por Honduras, El Salvador e Guatemala, se transformou na zona mais violenta do planeta? De que maneira a guerra do Estado contra o narcotráfico dizimou a vida de 60 mil pessoas em 5 anos no México? Que coincidências existem entre essas tragédias e o repentino e brutal aumento da violência em São Paulo?

A primeira coincidência passa pela forte presença do narcotráfico que, como todo crime organizado, seja em Honduras ou no Brasil, busca e vive do lucro. O aumento do poder aquisitivo do brasileiro incrementou o próspero “negócio” das drogas. Qualquer interferência do poder público (polícia) ou do poder paralelo (milícias) representa menos ganhos e, consequentemente, mais violência (em razão da disputa de espaços). Se em Honduras se constata a forte presença dos cartéis mexicanos, no Brasil (especialmente em São Paulo) o comando da distribuição das drogas está (majoritariamente) nas mãos do PCC. Tanto lá como cá, não há como negar o império do crime organizado.

Uma outra coincidência diz respeito à debilidade das instituições estatais, que não estão conseguindo controlar o crime organizado. Muitas mortes já ocorreram, mas até agora nada de concreto se anunciou sobre o desmantelamento do poder econômico do PCC. Sem levar o crime organizado à miséria nenhum combate será efetivo. É o poder econômico que lhe faz forte (para comprar armas, para arregimentar “soldados”, para disputar territórios, para corromper autoridades públicas etc.).

Os mortos retratam a terceira coincidência entre Honduras e Brasil (91 mortes para cada 100 mil habitantes, em 2011, contra 27,3, no Brasil; El Salvador 69 e Guatemala 39). Honduras é mais violento que o Brasil, mas não podemos esquecer que ocupamos a 20ª posição nesse item no ranking mundial. Ou seja: nosso País também é extremamente violento.

Tanto o Brasil como Honduras são “pontes” entre os produtores das drogas e os EUA (um dos maiores consumidores de todo planeta). Se Honduras se transformou em um porto (quase) seguro para o desenvolvimento dos negócios dos cartéis mexicanos, o Brasil não só é um país de passagem como apresenta a vantagem de ser também um grande consumidor de drogas. Em ambos a impunidade dos barões das drogas é praticamente absoluta. Os “traficantes” representam hoje 24% dos presidiários brasileiros, mas sua quase totalidade é constituída dos pequenos entregadores.

A proliferação das armas de fogo ilegais, nos dois países, constitui outro fator comum, que também passa pelo desemprego dos jovens, pela desigualdade, péssima educação etc. A renda per capita no Brasil é maior, mas eles se igualam no item corrupção. Ambos apreendem muita droga, mas não o suficiente para evitar o tráfico ou mesmo reduzir a potência do crime organizado. Nos dois países o controle da lavagem de capitais é muito precário.

Não apresentamos a instabilidade política de Honduras, que viveu em 2009 um golpe de Estado (queda do presidente Zelaya), mas é bastante peculiar a nossa instabilidade inter-institucional, seja nas relações entre as polícias (que fica mais complexa onde existem as milícias), seja entre os entes federativos (União, Estado e Municípios). Com frequência os estados e a União batem-cabeça sobre o problema da violência.

Cabe ainda considerar que quanto cai o lucro com as drogas, naturalmente o crime organizado já instalado (e isso se passa nos dois países) começa a explorar outras áreas de sustentação (sequestros, roubos, roubos de veículos, extorsão, tráfico de armas e de pessoas etc.). Ainda que houvesse diminuição no tráfico de drogas, isso poderia não significar redução da violência.

A diminuição da violência em El Salvador (vizinho de Honduras) só ocorreu quando os chefes das drogas fizeram um acordo entre eles. No Estado de São Paulo afirma-se que os homicídios só diminuíram quando os chefes do PCC, em troca de não irem para o RDD, passaram a comandar os presídios, impedindo rebeliões e mortes dentro deles, assim como assassinatos fora dos seus muros. Se o governo de São Paulo negava ou não dava importância (até pouco tempo) nem sequer para a existência do PCC, que dirá esse bombástico acordo que o mundo acadêmico (Guaracy Mingardi, por exemplo) insiste em “denunciar”.

Luiz Flávio Gomes é  jurista e professor. Fundador da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil e coeditor do atualidadesdodireito.com.br. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001).

 

Quando o filme Tropa de Elite através do Cap Nascimento colocava a culpa da morte no consumidor de classe média, os intelectuais caíram em cima criticando (claro são os grandes consumidores). Taí o resultado. Contra fatos não há argumentos.

O BRASIL E A ESPANHA, A LISONJA E A CAUTELA

conversa afiada - Publicado em 20/11/2012

O Conversa Afiada reproduz texto de Mauro Santayana, extraído do JB online:

por Mauro Santayana
A visita de Estado que a Presidente da República faz à Espanha, coincidindo com a Reunião Ibero Americana de Cádiz, reclama algumas  reflexões. A primeira delas leva à necessária cautela diante da lisonja. É natural que os povos, como os indivíduos, sintam-se felizes, quando lisonjeados. Os indivíduos sábios, como os povos sábios, aceitam o respeito dos outros, mas desconfiam da lisonja. É como devemos nos comportar com os elogios do governo, das elites econômicas e de parte da imprensa espanhola, nestas horas.
De início, entendamos que a crise mundial, que afeta particularmente os países meridionais da Europa, é mais do que uma questão econômica. Ela está no núcleo da razão ocidental, e  na incapacidade de as estruturas políticas conduzirem o processo do conhecimento científico, que introduziu novos módulos de convívio entre as pessoas e os povos, principalmente mediante os meios instantâneos de comunicação. O problema crucial do homem continua sendo o da desigualdade no usufruto da vida, e a ciência e a tecnologia, longe de resolvê-lo, têm agravado.
O bom momento por que estamos passando, no Brasil, pensando bem, não é tão bom assim, nem garantido: os horizontes do mundo são movediços, movediças as placas tectônicas, movediça a crosta flamejante do sol – que nos manda seus recados de perigo com as frequentes e intensas erupções – e, mais movediça ainda, a alma dos homens. Essa constatação nos inibe o exercício da soberba, ao mesmo tempo em que convoca a razão humanística da solidariedade. Há, no entanto, que se preservar a auto-estima. Aos que nos lisonjeiam, pensando que nos engambelam, devemos deixar claro que não somos parvos, e entendemos bem os seus interesses, da mesma forma que preservamos os nossos.
É assim que vemos a presença da Presidente Dilma Rousseff em Cádiz – que salvou, in extremis, o encontro, segundo a publicação El Confidencial de Madri. Mas é necessário deixar claro que ali não fomos em busca de nada, porque a Espanha nada nos pode oferecer,  neste momento, senão suas mãos vazias, em busca de algum apoio, quando as suas ruas se enchem de desempregados e de famílias despejadas pela voracidade dos bancos credores. Feito esse reparo, voltamos à necessidade de que nos comportemos, nesta quadra, sem descabidos orgulhos, mas tampouco sem sinais de que nos curvamos a uma superioridade que os espanhóis insistem em proclamar. Somos solidários, sim, com o povo ibérico, mas nada nos obriga a ser solidários com o Santander, a Telefónica, a Iberdrola, que nos exploram, nem com uma monarquia que começa a divertir, com seus escândalos e gafes, o jet-set internacional.
A imprensa espanhola – a partir de El Pais, que se encontra em duras dificuldades financeiras – procura dar a versão de que fomos a Madri em busca de investimentos. A verdade, no entanto, é que a Espanha nunca teve dinheiro para investir no Brasil, nem mesmo os 90 bilhões de dólares que apregoa, porque todo o dinheiro que eventualmente trouxe, tomou emprestado de terceiros, e faz parte dos 3 trilhões de euros que o país e suas empresas estão do, e que seu povo terá que pagar a partir de agora.
A pretensa competência espanhola na condução de sua economia, ou de seus líderes empresariais na direção de seus negócios, é um mito que a realidade está demolindo.   O país só conseguiu sair do atraso e do obscurantismo a que esteve relegado durante a maior parte do século XX,  sob a peste do franquismo, porque recebeu bilhões de euros  de recursos da União Européia, a fundo perdido, e fez empréstimos ainda maiores, aproveitando os juros historicamente baixos, durante os primeiros anos do euro. Uma fortuna imensa, muito acima da capacidade de produção do país, ou da renda real de sua população,  que a Espanha não soube utilizar para forjar  economia competitiva e sólida, mediante o desenvolvimento industrial interno e autônomo.
Investiu-se muito em obras de  infraestrutura, muitas delas, hoje sub-utilizadas; os bancos usaram os recursos fartos na especulação imobiliária. E se aplicou, mais do que seria conveniente, no setor de serviços, como no mercado financeiro e nas telecomunicações. Aqui, no Brasil, há quem pense que a Telefónica é uma empresa de classe mundial, quando o grupo deve mais de 100 bilhões de dólares,  dívida  impagável, principalmente se considerarmos a situação de crise que  a Europa e os Estados Unidos esperam nos próximos anos.
Da mesma forma, muita gente acredita que o Santander do Sr. Emilio Botin é uma potência, quando na verdade  teve uma queda de 60% do lucro na matriz este ano, e perdeu quase 50% do seu valor de mercado no Brasil, desde 2009. Mal administradas, com o valor e o lucro em queda, que futuro as empresas espanholas esperam na América Latina? A nacionalização por capitais locais, com ou sem ajuda do governo, ou a transferência de seus ativos e contratos para empresas chinesas, que contam com real  capacidade para investir, com o apoio do país que detêm as maiores reservas internacionais e é o maior credor dos Estados Unidos no mundo.
Esse foi o caso, por exemplo, da Repsol espanhola, que passou a metade do seu negócio no Brasil para a Sinopec, chinesa. 
Mas, em vez de deixar que as coisas se desenrolem normalmente, o Governo Federal vem financiando, direta e indiretamente as multinacionais espanholas no Brasil, enquanto elas continuam, a enviar  bilhões de dólares em remessa de lucros para as suas matrizes todos os anos.
Em setembro de 2011, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais eximiu o Santander de pagar cerca de 4 bilhões de reais em impostos. No mesmo ano, a Vivo, leia-se Telefónica, que tem entre seus “conselheiros”, o genro do rei da Espanha – um ex-jogador de handebol, agora processado por corrupção em seu país – obteve, de uma só vez, 3  bilhões de reais em empréstimos do BNDES para “expansão de infraestrutura”. O BNDES tem financiado  a instalação e expansão de empresas espanholas em outras áreas, como as de transmissão de energia e geração eólica.
Outro mito que se propagou no Brasil, durante a tragédia neoliberal dos anos 90, é o da excelência técnica da engenharia espanhola, e dos técnicos espanhóis de modo geral. A imprensa espanhola não se cansa de dizer que precisamos de suas construtoras para reformar estádios de futebol e as instalações para as Olimpíadas, e para a construção de estradas. É risível. Como se não tivéssemos nós, brasileiros, construído Brasília, a cidade que surpreendeu o mundo por seu projeto urbanístico e arquitetônico; pontes como a Rio-Niterói, estradas como a Transmauritaniana, em pleno Saara, aproveitando conchas encontradas na areia para fazer cimento, ou Itaipu, a maior hidrelétrica do mundo, com uso de uma linha de resfriamento contínuo de concreto, quando a Espanha, ainda na agonia do franquismo, nem mesmo sequer dispunha de uma rodovia duplicada. O mesmo erro se comete com relação às universidades. A possibilidade de, talvez, a média das universidades espanholas ser de boa qualidade, e de estarmos enviando estudantes pra lá, não nega o fato de, no ranking das melhores universidades do mundo, a USP estar à frente de qualquer universidade ibérica (segundo a The Times Higher Education World University Rankings, 2012/2013).
Ora, se a Espanha não tem capitais próprios para investir no Brasil, nem excelência em engenharia de grandes obras, qual a vantagem de continuar estreitando os laços com as elites espanholas e os seus representantes?
A Presidente salvou a cúpula de Cádiz do malogro, mas o Brasil, como nação e seus interesses continentais, foi golpeado, com uma conferência, dentro do evento,  patrocinada pela Espanha, da Aliança do Pacífico,        organização fomentada  pelo México com a intenção de   a fim de “rachar” a América do Sul, e que reúne a Colômbia, o Chile e o Peru, na tentativa de contrapor-se ao Mercosul, à UNASUL e ao Conselho de Defesa Sul-americano. Aproveitando a presença de Dilma, a imprensa espanhola voltou a anunciar, como faz regularmente, que o Brasil estaria mudando a legislação para permitir a entrada de trabalhadores espanhóis em nosso país.
Em respeito aos milhares de brasileiros expulsos da Espanha nos últimos anos, seria conveniente  que nenhuma medida nesse sentido fosse tomada sem  o critério de reciprocidade, de forma que se os cidadãos brasileiros quisessem – embora, nesse momento, seja improvável – pudessem usar do mesmo direito, o de entrar na Espanha e ali trabalhar, a qualquer momento.
Uma última observação: o governo espanhol anunciou ontem que pretende dar visto de residência automática aos nacionais de certos paises que ali adquirirem moradias (da qual estão sendo despejadas as famílias espanholas) pelo valor mínimo de 400.000 reais. A medida não favorece os espanhóis, mas, sim, reduz o buraco em que se meteram os bancos. Ora, como um país que se encontra nesta situação, se apresenta como “investidor” nas grandes obras brasileiras?
Ao aceitar tais “investimentos” o Brasil poderá estar salvando as elites empresariais claudicantes da Espanha, mas não estará ajudando seu povo, nem o nosso. E há mais, quando lhe perguntaram  quem seriam os compradores dos imóveis, o funcionário citou russos e chineses, pertencentes ao BRICS.  O Brasil é parte dos BRICS. Ao que parece, os brasileiros, mesmo com dinheiro, continuam sendo indesejáveis ali.

domingo, novembro 18, 2012

"Tudo que sei é que não sou marxista"

Fundação Lauro Campos - Qua, 10 de Fevereiro de 2010 10:47

Sergio Granja

Karl Marx: "Tudo que sei é que não sou marxista"

Karl Marx: "Tudo que sei é que não sou marxista"

A frase foi dita pelo próprio Marx, a propósito "dos marxistas franceses do fim dos anos 70" (séc. XIX) que, segundo Engels, se serviam da concepção materialista da história como "pretexto para não estudar a história".1 E, ao que parece, a mania grassava um pouco por toda a parte:

"De um modo geral, a palavra 'materialismo' serve para muitos escritores novatos na Alemanha de simples frase com a qual se etiqueta toda espécie de coisas sem estudá-las antecipadamente, pensando que basta colar essa etiqueta para que tudo seja dito."

Contra isso, Engels adverte: "Ora, nossa concepção da história é, antes de tudo, uma diretiva para o estudo, e não uma alavanca para construções à maneira dos hegelianos."2

Para o parceiro de Marx, "o método materialista se transforma em seu contrário cada vez que se o emprega não como um fio condutor da investigação histórica, mas como um modelo pronto com a ajuda do qual se cortam e recortam os fatos históricos".3

Em outra ocasião, Engels esclarece o materialismo histórico do seguinte modo:

"[...]  De acordo com a concepção materialista da história, o fator determinante na história é, em última instância, a produção e a reprodução da vida real.  Nem Marx nem eu nunca afirmamos mais do que isso.  Se alguém desnaturou essa posição no sentido de que o fator econômico é o único determinante, transformou-a assim em uma frase oca, abstrata, absurda.  A situação econômica é a base, mas os diversos elementos da superestrutura, as formas políticas da luta de classes e seus resultados - as constituições estabelecidas uma vez a batalha ganha pela classe vitoriosa, etc. -, as formas jurídicas, e mesmo os reflexos de todas essas lutas reais no cérebro dos participantes, teorias políticas, jurídicas, filosóficas, concepções religiosas e seu desenvolvimento ulterior em sistemas dogmáticos, exercem igualmente sua ação sobre o curso das lutas históricas e, em muitos casos, as determinam de maneira preponderante na forma.   Há interação de todos esses fatores no seio dos quais o movimento econômico finalmente abre seu caminho como uma necessidade, através de uma multiplicidade infinita de contingências (quer dizer, de coisas e acontecimentos cuja ligação interna entre si é tão distante ou tão difícil de demonstrar que podemos considerá-las como inexistentes ou ignorá-las).  Senão, a aplicação da teoria a qualquer período histórico seria, creio, mais fácil do que a resolução de uma simples equação do primeiro grau.

"Nós fazemos nossa história, mas de acordo com premissas e em condições muito bem determinadas.  Entre todas, são as condições econômicas que são finalmente determinantes.  Mas as condições políticas, etc., por vezes a própria tradição que assombra o cérebro dos homens, jogam igualmente um papel, se bem que não decisivo.  São igualmente as causas históricas e, em última instância, econômicas que formaram o Estado prussiano e que continuaram a desenvolvê-lo.  Mas dificilmente se poderia pretender, sem ser pedante, que, entre os numerosos pequenos Estados da Alemanha do Norte, seria precisamente o Brandebourg que estava destinado pela necessidade econômica, e ainda não por outros fatores (sobretudo por essa circunstância que, graças à posse da Prússia, o Brandebourg estava envolvido nos negócios poloneses e através deles implicado nas relações políticas internacionais, que são igualmente decisivas na formação da potência da Casa da Áustria), a se tornar a grande potência na qual se encarnou a diferença na economia, na língua e também, depois da Reforma, na religião entre o Norte e o Sul.  Dificilmente se chegará a explicar economicamente, sem ser ridículo, a existência de cada pequeno  Estado alemão do passado e do presente, ou ainda a origem da mutação consonantal do alto-alemão, que alargou a linha de partição geográfica constituída pelas cadeias de montanhas dos Sudetes ao Taunus, até fazer uma verdadeira falha atravessando toda a Alemanha.

"Mas, em segundo lugar, a história se faz de tal maneira que o resultado final resulta sempre dos conflitos de um grande número de vontades individuais, cada uma das quais, por seu turno, é feita tal qual é por uma multiplicidade de condições particulares de existência; há aí inumeráveis forças que se contra-arrestam mutuamente, um grupo infinito de paralelogramas de forças, do qual sai uma resultante - o acontecimento histórico - que pode ser vista, por sua vez, como o produto de uma força agindo como um todo, de maneira inconsciente e cega.  Pois, o que cada indivíduo quer é impedido por cada outro e o resultado é alguma coisa que ninguém quis.  É assim que a história tem se desenvolvido até nossos dias como se fosse um processo natural e submetida assim, substancialmente, às suas mesmas leis de movimento.  Mas, em razão das diversas vontades - cada uma deseja o que impele sua constituição física e as circunstâncias exteriores, econômicas em última análise (ou suas próprias circunstâncias pessoais ou as circunstâncias sociais gerais) -, essas vontades não chegam ao que querem, mas se fundem em uma média geral, em uma resultante comum, não se tem o direito de concluir que elas são iguais a zero.  Ao contrário, cada uma contribui para a resultante e, a esse título, está inclusa nela.

"Por outro lado, gostaria de suplicar que estudem essa teoria nas fontes originais e não de segunda mão; é verdadeiramente mais fácil. Marx raramente escreveu alguma coisa em que ela não jogue o seu papel.  Mas, em particular, O 18 Brumário de Louis Bonaparte é um excelente exemplo de sua aplicação..  NoCapital, ela é revisitada seguidamente.  A seguir, permito-me enviá-los igualmente a minhas obras: O Senhor Eugen Dühring subverte a ciência e Ludwig Feuerbach e o fim da filosofia clássica alemã, nas quais faço a exposição mais detalhada do materialismo histórico de que tenho conhecimento.

"É em parte de Marx e minha, a responsabilidade pelo fato de, às vezes, os jovens darem um peso maior do que o devido ao lado econômico.  Face a nossos adversários, precisávamos sublinhar o princípio essencial negado por eles, e então nem sempre dispúnhamos do tempo, do espaço ou da ocasião de dar lugar aos outros fatores que participam da ação recíproca.  Mas quando se tratava de apresentar um trecho da história, quer dizer, de passar à aplicação prática, a coisa mudava e não havia erro possível.    Mas, infelizmente, acontece muito frequentemente que se acredite ter compreendido perfeitamente uma nova teoria e poder manejá-la sem dificuldade, desde que se tenha apropriado de seus princípios essenciais; e isso nem sempre é exato.  Eu não posso eximir dessa recriminação a mais de um de nossos 'marxistas' recentes, e também é preciso dizer que se tem feito coisas singulares [...]"4

E Engels diz ainda:

"Ocorre com os reflexos econômicos, políticos e outros, assim como com os reflexos no olho humano, que eles atravessam uma lente convexa e, em consequência, adquirem uma forma invertida, de pernas pro ar.  A única diferença é que falta um sistema nervoso que os reponha de pé na representação que se tem deles.  O homem do mercado mundial só vê as flutuações da indústria e do mercado mundial sob a forma do reflexo invertido do mercado monetário e do mercado de valores, e então o efeito torna-se causa em seu espírito.  Já vi isso em Manchester nos anos 40: para compreender a marcha da indústria, com suas máxima e mínima periódicas, o curso da bolsa de Londres era absolutamente inutilizável, porque esses senhores queriam explicar tudo pelas crises do mercado de dinheiro, que, entretanto, na maior parte do tempo, não eram mais do que sintomas.  Tratava-se, então, de demonstrar que o nascimento das crises industriais não tinha nada a ver com uma superprodução temporária, e a coisa tomava, então, um caráter tendencioso, que incitava a falsificações.  Hoje em dia, esse elemento desaparece - ao menos para nós, de uma vez por todas - e, por outro lado, é um fato que o mercado de dinheiro também pode ter suas próprias crises, para as quais as perturbações produzidas diretamente na indústria não jogam nenhum papel; nesse domínio, resta ainda muitas coisas a estabelecer e estudar, em particular no que concerne à história dos últimos vinte anos.

"Onde há divisão do trabalho em escala social, há também independência dos trabalhos parciais, uns em relação aos outros.  A produção é o fator decisivo em última instãncia.  Mas, ao mesmo tempo que o comércio dos produtos torna-se independente da produção propriamente dita, ele obedece a seu próprio movimento, que certamente o processo de produção, a grosso modo, domina, mas que, no detalhe, e no interior dessa dependência geral, não obedece menos a suas próprias leis, que têm sua origem na natureza desse fator novo.  Ele possui suas próprias fases e reage, por seu lado, sobre o processo de produção."5

Na perspectiva da divisão social do trabalho, Engels faz uma autocrítica:

"[...] nos dedicamos inicialmente a deduzir as representações ideológicas - políticas, jurídicas e outras -, assim como as ações por elas condicionadas, dos fatos econômicos que estão na sua base, e tínhamos razão. Mas, considerando o conteúdo, fomos negligentes com a forma: a maneira pela qual se constituem essas representações, etc. [...]"

E, em seguida, esclarece sobre a ideologia.

"A ideologia é um processo que o dito pensador realiza com consciência, sem dúvida, mas com uma consciência falsa. As forças motrizes verdadeiras que o colocam em movimento permanecem desconhecidas para ele, se não esse não seria um processo ideológico. Também se imaginam forças motrizes falsas ou aparentes. Pelo fato de se tratar de um processo intelectual, deduz por aí o conteúdo e a forma do pensamento puro, quer seja de seu próprio pensamento ou o de seus predecessores.  É exclusivamente um assunto dos materiais intelectuais; sem vê-los de mais perto, considera-se que esses materiais são provenientes do pensamente e não se ocupa de pesquisar se têm qualquer outra origem mais distante e independente do pensamento.  Essa maneira de proceder é para si a própria evidência, pois todo ato humano realizando-se por intermédio do pensamento aparece em última instância fundado igualmente sobre o pensamento.

"O ideólogo historiador (historiador deve ser aqui um vocábulo coletivo para: político, jurista, filósofo, teólogo, breve, por todos os domínios pertencentes à sociedade e não somente à natureza) tem portanto em cada domínio científico uma matéria que se formou de maneira independente no pensamento de gerações anteriores e que evoluiu de maneira independente no cérebro dessas gerações sucessivas.  Fatos exteriores pertencem, é verdade, a esse domínio ou, por outra parte, bem que podem ter contribuído para determinar esse desenvolvimento, mas esses fatos reconhecem tacitamente ser, não fossem, por sua vez, por eles mesmos, simples frutos de um processo intelectual, de sorte que continuamos a estar sempre no reino do pensamento puro que felizmente digeriu até mesmo os fatos mais cabeçudos.

"É essa aparência de história independente das constituições de Estado, dos sistemas jurídicos, das concepções ideológicas em cada domínio particular que cega, acima de tudo, a maior parte das pessoas."6

Essas citações foram retiradas do volume de correspondência de Marx e Engels.  Sobre essa correspondência, Lênin diz que

"o rico conteúdo teórico do marxismo se desenvolve aí com uma clareza extraordinária, pois Marx e Engels retornam várias vezes em suas cartas aos aspectos mais diversos de sua doutrina, sublinhando e esclarecendo - às vezes discutindo e persuadindo um ao outro - os pontos mais recentes (em relação às visões anteriores), os mais importantes, os mais difíceis".7

Aqui, Lênin referfe-se ao marxismo como "doutrina", conceito que Engels preferiria evitar:

"Todavia, a concepção de Marx, em seu todo, não é uma doutrina, mas um método.  Não fornece dogmas fechados, mas os pontos de partida para o estudo ulterior e o método para essa pesquisa."8

Pretendemos, futuramente, retornar à correspondência de Marx e Engels, com vistas a contribuir para o debate teórico e a formação intelectual dos leitores.

Notas:

1 Carta de Engels a C. Schmidt, 5 de agosto de 1890 (Correspondance: 448)

2 Idem: 449

3 Carta de Engels a P. Ernst, 5 de junho de 1890 (Correspondance: 446)

4 Carta de Engels a J, Bloch, 21-22 de setembro de 1890 (Correspondance: 452-454)

5 Carta de Engels a C. Schmidt, 27 de outubro de1890 (Correspondance: 454-455)

6 Carta de Engels a F. Mehring, 14 de julho de 1893 (Correspondance: 499-500)

7 LÉNINE, V.  OEuvres, Paris-Moscou, t. 19,  p. 593

8 Carta de Engels a W. Sombart, 11 de março de 1895 (Correspondance: 522)

Bibliografia:

MARX, Karl; ENGELS, Friedrich.  Correspondance (1844-1895), Moscou: Editions du Progrès, 1971.

* Citações traduzidas livremente do francês.

Sergio Granja é pesquisador da Fundação Lauro Campos

Convém lembrar que o então articulista karl Marx do Jornal Daily Tribune em 1853, foi defensor da ocupação britânica na India, e, dos EUA na sua guerra travada contra o México pela anexação da Califórnia e outros territórios.  Belo exemplo de defensor da democracia (seguida ainda hoje por uma pseudoesquerda).

Quem abertamente se proclamou contrário a esse tipo de atitude foi Mikhail Bakunin, que foi expulso da 1ª Internacional Socialista (com pressão do profeta socialista) por demonstrar as idiotices proclamadas por Marx.

E assim caminha a esquerda marxista, neomarxista e agregados…

RDC: les rebelles du M23 aux portes de Goma

RFI - Article publié le : dimanche 18 novembre 2012 - Dernière modification le : dimanche 18 novembre 2012

 

29 juillet 2012, Nord-Kivu. Les soldats des FARDC patrouillent dans la région de Goma.

29 juillet 2012, Nord-Kivu. Les soldats des FARDC patrouillent dans la région de Goma.

REUTERS/James Akena

Par RFI

Des hélicoptères de l'ONU sont entrés en action contre les rebelles du M23 dans l'est du Congo-Kinshasa, en vain semble-t-il. Car les rebelles congolais sont ce dimanche 18 novembre à la lisière de Goma, la capitale provinciale du Nord-Kivu. Ils exigent la neutralité de la mission de stabilisation de l'ONU en RDC, ainsi que l'arrêt de son soutien à l'armée régulière congolaise. La nuit dernière, le Conseil de sécurité de l'ONU s'est réuni en urgence à New York pour réfléchir à l'éventualité de la chute de Goma. Pendant ce temps, la population de Goma se terre chez elle.

« Nous sommes enfermés dans nos maisons, couchés sous les lits », explique une habitante de Goma. En tout cas, l’inquiétude persiste encore au chef-lieu du Nord-Kivu. Les combats sont signalés à quelques kilomètres de l’aéroport, aux environs du camp des déplacés de Kanyarucinya.

Selon des sources humanitaires, tous les déplacés ont quitté ce camp, en direction de Goma. L’armée régulière s’est retirée de ses positions, y compris à l’aéroport, selon la Monusco. Mais le lieutenant-colonel Olivier Hamouli, porte-parole des FARDC, refuse de parler de débandade.

Lieutenant colonel Olivier Hamouli

Porte-parole des FARDC

On résiste encore au niveau de l’aéroport pour que nous puissions nous assurer que l’aéroport de Goma est gardé. Néanmoins, au niveau de la ville, on a évité les combats. On a évité le bain de sang parce que l’ennemi était en train de lancer des bombes au niveau de Goma. Alors, on a évité que les populations civiles puissent être victimes de ces agissements

18/11/2012 par Boniface Vignon

Les FARDC se sont dirigés vers Saké, avec des chars et autres engins. Le porte-parole du M23 a confirmé que les rebelles sont à l’entrée de Goma. Vianney Kazarama a cependant déclaré qu’ils ne vont pas entrer dans cette ville maintenant, le M23 serait décidé à poursuivre les FARDC, où qu’elles aillent.

Lieutenant colonel Vianney Kazarama

Porte-parole militaire du M23

Notre mission, ce n’est pas d’entrer dans la ville de Goma (…), c’est pour poursuivre l’ennemi et neutraliser la capacité des forces armées de Kabila

18/11/2012 par Boniface Vignon

Les autorités congolaises accusent le Rwanda d’avoir aligné ses troupes d'élites aux côtés de la rébellion.

Aquele Tratado de Maastricht !

resistir info – 18 nov 2012

por Juan Torres López [*]

É curioso que tão pouca gente se recorde agora do Tratado de Maastricht , o qual está a origem dos problemas actuais da União Europeia. Na base de muitas mentiras tenta-se fazer crer às pessoas que aquilo que acontece aos países que sofrem as maiores perturbações é que realizaram demasiada despesa pública social [NR] e que isso aumentou até níveis insuportáveis o peso da dívida pública, de onde deduzem a exigência de executar políticas de austeridade baseadas no corte de direitos e prestações sociais.
A realidade é outra e bem diferente: O que verdadeiramente fez com que crescesse a dívida pública (além do impacto mais recente da crise financeira internacional e da queda subsequente dos rendimentos públicos) não foi o incremento da despesa pública primária (ou seja, a associado a despesas correntes ou de investimento) e sim os recursos dedicados a pagar juros e a dívida que foi sendo necessária para enfrentar a dívida anterior.
Calcula-se que os Estados europeus vêm pagando à banca privada uns 350 mil milhões de euros por ano a título de juros desde que deixaram de ser financiados pelos seus antigos bancos centrais e depois pelo Banco Central Europeu (Jacques Holbecq e Philippe Derudder,
'La dette publique, une affaire rentable: A qui profite le système?' , Ed. Yves Michel, Pari´s, 2009). É esse, portanto, o verdadeiro fardo que agora lastreia as economia europeias e não o peso insuportável, como querem fazer crer, do Estado Previdência. Não podemos cansar de repetir que se os saldos primários que o Estado espanhol foi tendo desde 1989 houvessem sido financiados a uma taxa de juro de 1% por um banco central (como é lógico que deveria ter sido) o peso da dívida pública espanhola seria agora de 14% do PIB e não os 87% actuais (Eduardo Garzón Espinosa. 'Situación de las arcas públicas si el estado español no pagara intereses de deuda pública': http://eduardogarzon.net/?p=328 ). Essa é a demonstração concreta de que são os juros financeiros e não a despesa social a verdadeira origem da dívida, que se quer combater na base de cortes nos direitos e na democracia.
E esquece-se agora que foi o artigo 104 do Tratado de Maastricht que consagrou essa proibição de que os bancos centrais financiassem os governos. Uma condição totalmente absurda do ponto de vista económico e financeiro, que só beneficia a banca privada a qual pôde assim fazer um negócio de dimensões autenticamente astronómicas: é fácil calcular que graças a isso os bancos europeus terão recebido graciosamente cerca de sete mil milhões de euros, desde que foi ratificado o Tratado de Maastricht, a título de juros. Um dinheiro que, além disso, ao invés de ser dedicado a financiar preferencialmente o desenvolvimento produtivo europeu, alimentou a especulação financeira, a formação de borbulhas. Estas, ao explodirem, levaram em frente economias inteiras e as contas multimilionárias que os bancos europeus mantêm nos paraíso fiscais ou que dedicam ao financiamento de todo tipo de crimes e delitos, o tráfico de armas, de pessoas, de droga ou a corrupção política.
Para que isso fosse possível, o Tratado também estabeleceu outra medida igualmente carente de fundamento científico: a independência dos bancos centrais que, na realidade, simplesmente foi o procedimento que permitiu que actuassem com liberdade total ao serviço da banca privada. Prova disso é que a gestão dos bancos centrais desde que se tornaram independente foi aquela com menos êxito de toda a sua história, pois foi nessa época que se verificou o maior número de crises financeiros e os episódios mais graves de instabilidade monetária. Ainda que, deve-se dizer, a maior distribuição de rendimento em favor dos poderosos graças à política de taxas de juro e ao manejo da quantidade de dinheiro em circulação.
Com o objectivo de favorecer a banca privada, o Tratado de Maastricht é o responsável original pelo facto de os Estados europeus estarem manietados na hora de fazer política económica, cujo êxito baseia-se sem dúvida na coordenação constante entre seus diferentes responsáveis e entre suas diferentes manifestações e instrumentos. E daí, desde Maastricht, serem tão impotentes para controlar o que agora nos cai em cima.
Também foi esse Tratado que pela primeira vez estabeleceu regras igualmente absurdas de convergência nominal, que o tempo encarregou-se de demonstrar serem completamente inúteis para conseguir o equilíbrio e a harmonia que uma união monetária precisa para funcionar correctamente e sem gerar mais problemas do que aqueles que resolve. Ou as de estabilidade orçamental, tão infundadas e injustificadas do ponto de vista científico que foram incumpridas numas 140 ocasiões pelos diferentes Estados. E cuja perversão demonstra-se simplesmente perguntando-nos em que situação se encontrariam hoje em dia os países, agora mais avançados do mundo, se houvessem estado submetidos a essas normas de estabilidade orçamental desde há 100 ou 150 anos.
Mas o Tratado de Maastricht não foi decisivo só pela introdução destas ataduras económicas e privilégios que condenaram os povos da Europa e as suas diferentes nações à situação em que agora nos encontramos. Foi decisivo também pela forma anti-democrática como foi ratificado, evitando o debate social sobre este tipo de aspectos essenciais, ou melhor, ocultando aos cidadãos suas conclusões e inclusive fazendo truques na hora de aprová-lo.
Por isso Maastricht foi o primeiro e o mais claro alerta de que os construtores e beneficiários da Europa neoliberal que ali se punha em andamento não necessitavam democracia e sim muito pelo contrário. E que, portanto, com o Tratado começava o seu desmantelamento real.
O lado positivo de Maastricht é que demonstra a origem ilegítima que teve a dívida que injustamente se faz recair sobre os povos europeus. E, portanto, a primeira razão para auditá-la em toda a Europa e repudiá-la o quanto antes.

16/Novembro/2012

[NR] É a tese que muitos comentaristas, como Henrique Medina Carreira, afirmam reiteradamente na TV portuguesa.
[*] Professor de Teoria Económica na Universidade de Sevilha.
O original encontra-se em
http://juantorreslopez.com/impertinencias/aquel-tratado-de-maastricht/

Noam Chomsky e colegas denunciam cobertura da mídia sobre Gaza

viomundo - publicado em 18 de novembro de 2012 às 11:06

A cobertura da mídia sobre Gaza: nós sabemos!

do Vermelho

Em texto manifesto, linguistas denunciam a manipulação do noticiário pela grande imprensa para camuflar o massacre do povo palestino, apelam a jornalistas para que não sirvam de joguetes e para que as pessoas se informem pela mídia independente. Entre os signatários, Noam Chomsky. Confira a íntegra.

Enquanto países na Europa e América do Norte relembravam as baixas militares das guerras presentes e passadas, em 11 de Novembro, Israel estava alvejando civis. Em 12 de novembro, leitores que acordavam para uma nova semana tiveram já no café da manhã o coração dilacerado pelos incontáveis relatos das baixas militares passadas e presentes.

Não havia, porém, nenhuma ou quase nenhuma menção ao fato de que a maioria das baixas das guerras modernas de hoje são civis. Era também difícil alguma menção, nessa manhã de 12 de novembro, aos ataques militares à Gaza, que continuaram pelo final de semana. Um exame superficial comprova isso na CBC do Canada, Globe and mail, na Gazette de Montreal e na Toronto Star. A mesma coisa no New York Times e na BBC.

De acordo com o relato do Centro Palestino para os Direitos Humanos (PCHR, pela sigla em inglês) de domingo, 11 de Novembro, cinco palestinos, entre eles três crianças, foram assassinados na Faixa de Gaza, nas 72 horas anteriores, além de dois seguranças. Quatro das mortes resultaram das granadas de artilharia disparadas pelos militares israelenses contra jovens que jogavam futebol. Além disso, 52 civis foram feridos, seis dos quais eram mulheres e 12 crianças. (Desde que este texto começou a ser escrito, o número de mortos palestinos subiu, e continua a aumentar.)

Artigos que relatam os assassinatos destacam esmagadoramente a morte de seguranças palestinos. Por exemplo, um artigo da Associated Press publicado no CBC em 13 de novembro, intitulado “Israel estuda retomada dos assassinatos de militantes de Gaza”, não menciona absolutamente nada de civis mortos e feridos. Ele retrata as mortes como alvos “assassinados”. O fato de que as mortes têm sido, na imensa maioria, de civis, mostra que Israel não está tão engajado em “alvos” quanto em assassinatos “coletivos”. Assim, mais uma vez, comete o crime de punição coletiva.

Outra notícia de AP na CBC de 12 de novembro diz que os foguetes de Gaza aumentam a pressão sobre o governo de Israel. Traz a foto de uma mulher israelense olhando um buraco no teto de sua sala. Novamente, não há imagens, nem menção às numerosas vítimas sangrando ou cadáveres em Gaza. Na mesma linha, a manchete da BBC diz que Israel é atingido por rajadas de foguetes vindos de Gaza. A mesma tendência pode ser vista nos grandes jornais da Europa.

A maioria esmagadora das notícias enfatizam que os foguetes foram lançados de Gaza, nenhum dos quais causaram vítimas humanas. O que não está em foco são os bombardeios sobre Gaza, que resultaram em numerosas vítimas graves e fatais. Não é preciso ser um especialista em ciências da mídia para entender que estamos, na melhor das hipóteses, diante de relatos distorcidos e de má qualidade e, na pior, de manipulação propositadamente desonesta.

Além disso, os artigos que se referem à vítimas palestinas em Gaza relatam consistentemente que as operações israelenses se dão em resposta ao lançamento de foguetes a partir de Gaza e à lesão de soldados israelenses. No entanto, a cronologia dos eventos do recente surto começou em 5 de novembro, quando um inocente, aparentemente mentalmente incapaz, homem de 20 anos, Ahmad al-Nabaheen, foi baleado quando passeava perto da fronteira. Os médicos tiveram que esperar seis horas até serem autorizados a buscá-lo. Eles suspeitam que o homem pode ter morrido por causa desse atraso. Depois, em 08 de novembro, um menino de 13 anos que jogava futebol em frente de sua casa foi morto por fogo do IOF, que chegou ao território de Gaza em tanques e helicópteros. O ferimento de quatro soldados israelenses na fronteira em 10 de novembro, portanto, já era parte de uma cadeia de eventos que começou quando os civis de Gaza foram mortos.

Nós, os signatários, voltamos recentemente de uma visita à Faixa de Gaza. Alguns de nós estamos agora conectados aos palestinos que vivem em Gaza através de mídias sociais. Por duas noites seguidas, palestinos em Gaza foram impedidos de dormir pela movimentação contínua de drones, F16, e bombardeios indiscriminados sobre vários alvos na densamente povoada Faixa de Gaza . A intenção clara é de aterrorizar a população, e com sucesso, como podemos verificar a partir de relatos dos nossos amigos. Se não fosse pelas postagens no Facebook, não estaríamos conscientes do grau de terror sentido pelos simples civis palestinos em Gaza. Isto contrasta totalmente com a consciência mundial sobre cidadãos israelenses chocados e aterrorizados.

O trecho de um relato enviado por um médico canadense que esteva em Gaza, servindo no hospital Shifa ER no final de semana, diz: ” os feridos eram todos civis, com várias perfurações por estilhaços: lesões cerebrais, lesões no pescoço, tamponamento cardíaco, ruptura do baço, perfurações intestinais, membros estraçalhados, amputações traumáticas. Tudo isso sem monitores, poucos estetoscópios, uma máquina de ultra-som. …. Muitas pessoas com ferimentos graves, mas sem a vida ameaçada foram mandadas para casa para ser reavaliadas na parte da manhã, devido ao grande volume de baixas. Os ferimentos por estilhaços penetrantes eram assustadores. Pequenas feridas com grandes ferimentos internos. Havia muito pouca morfina para analgesia.”

Aparentemente, tais cenas não são interessantes para o New York Times, a CBC, ou a BBC.

Preconceito e desonestidade com relação à opressão dos palestinos não é nada novo na mídia ocidental e tem sido amplamente documentado. No entanto, Israel continua seus crimes contra a humanidade com a anuência plena e apoio financeiro, militar e moral de nossos governos, os EUA, o Canadá e a União Europeia. Netanyahu está ganhando apoio diplomático ocidental para operações adicionais em Gaza, que nos fazem temer que outra operação Cast Lead esteja no horizonte. Na verdade, os novos acontecimentos são a confirmação de que tal escalada já começou, como a contabilização das mortes de hoje que aumenta.

A falta generalizada de indignação pública a estes crimes é uma conseqüência direta do modo sistemático em que os fatos são retidos ou da maneira distorcida que esses crimes são retratados.

Queremos expressar nossa indignação com a cobertura repreensível desses atos pela mainstream mídia (grande imprensa corporativa). Apelamos aos jornalistas de todo o mundo que trabalham nessas mídias que se recusem a servir de instrumentos dessa política sistemática de camuflagem. Apelamos aos cidadãos para que se informem através de meios de comunicação independentes, e exprimam a sua consciência por qualquer meio que lhes seja acessível.

Hagit Borer, linguista, Queen Mary University of London (UK)

Antoine Bustros, compositor e escritor, Montreal (Canadá)

Noam Chomsky, linguista, Massachussetts Institute of Technology, USA

David Heap, linguista, University of Western Ontario (Canadá)

Stephanie Kelly, linguista, University of Western Ontario (Canadá)

Máire Noonan, linguista, McGill University (Canadá)

Philippe Prévost, linguista, University of Tours (França)

Verena Stresing, bioquímico, University of Nantes (França)

Laurie Tuller, linguista, University of Tours (França)

Julie Lévesque: A guerra contra o antissemitismo global na era da islamofobia

viomundo - publicado em 17 de novembro de 2012 às 20:39

por Julie Lévesque

Global Research, 12/11/2012

Tradução  de Jair de Souza

Esqueçam a desenfreada islamofobia a nível mundial e a demonização dos árabes. O jornalHaaretz informa que a Agência para Democracia, Direitos Humanos e Trabalho, do Departamento de Estado dos EUA, “institucionalizou a luta contra o antissemitismo global”, muito embora os Estados Unidos e seus aliados estejam há mais de uma década destruindo países habitados principalmente por muçulmanos. Ou, não seria, talvez, precisamente para apoiar a guerra contra o Islã e o mundo árabe – isto é, “a guerra contra o terrorismo” – que esta “guerra contra o antissemitismo global” tenha sido lançada? (Leaving post, U.S. official reflects on a new definition of anti-Semitism, Haaretz, October 17, 2012.)

A Agência de Democracia, Direitos Humanos e Trabalho, que se apresenta como líder dos “esforços dos EUA para promover a democracia, proteger os direitos humanos e a liberdade religiosa internacional e para impulsar globalmente os direitos trabalhistas”, exige agora que os funcionários do Departamento de Estado frequentem um “curso de 90 minutos sobre antissemitismo no Instituto de Relações Exteriores (Foreign Service Institute), a escola de preparação de diplomatas.” (Ibid.)

Por conveniência, “uma definição de antissemitismo de 341 palavras” foi redigida, a qual “incluía não apenas as formas tradicionais – injúrias de origem racial, estereótipos – mas também novas formas, como a negação do Holocausto e a relativização do Holocausto”, explicou Hannah Rosenthal, ex-monitora de antissemitismo no Departamento de Estado. (Ibid.)

Rosenthal, que comandou por duas vezes o Conselho Judaico para Questões Públicas e é agora presidenta e diretora executiva da Federação Judaica de Milwaukee, também indicou que sua equipe “conseguiu incluir (na definição) situações nas quais a crítica legítima a Israel se torna antissemitismo”. (Ibid.)

Esta iniciativa é mais uma demonstração do “monopólio judaico da vitimização”. No mundo pós 11/9, no qual muçulmanos e árabes são vítimas de discriminação racial e religiosa nos países ocidentais, uma decisão deste tipo é logicamente injustificável. A caça aos “radicais islamistas”, retratados pelo Departamento de Estados dos EUA como a máxima ameaça, independentemente de qual partido esteja no governo, transformou todos os muçulmanos e árabes em suspeitos e inimigos potenciais. A “guerra contra o antissemitismo global” não é nada mais do que um outro instrumento de engano da “guerra contra o terror” dos EUA, a qual indubitavelmente favorece Israel.

Este novo curso sobre antissemitismo para funcionários estadunidenses é também um peixe pequeno no oceano da “Indústria do Holocausto”. Os lobbies pró-israelenses/judaicos estão decididos em sua missão de erradicar quaisquer críticas legítimas ao Estado de Israel. No entanto, Rosenthal tentou mostrar-se tolerante ao dizer que “as críticas a Israel similares àquelas niveladas contra quaisquer outros países não poderão ser consideradas como antissemitas.”

Embora esta declaração possa parecer justa e equilibrada, não o é, e também não é lógica. Resulta ser não somente impossível equilibrar as críticas entre países, senão que Israel e os EUA são os campeões de crítica não-equilibrada. O melhor exemplo disto é sua crítica ao Irã, que, diferentemente dos EUA e Israel, não ocupa nenhum outro país no momento, não está empregando suas forças armadas contra nenhuma outra nação e não possui nenhum armamento nuclear comprovado. Apesar destes fatos, vem sendo apresentado como a mais perigosa ameaça do planeta.

Nivelando a crítica e normalizando a islamofobia

Tenha ou não sido usada de propósito, a expressão “niveladas contra outros países”,  em lugar de “dirigidas” ou “destinadas”, traduz o desejo de minimizar a crítica contra Israel. A “nivelação da crítica” serve a um propósito de primeira linha relacionado à sua ocupação da Palestina: justificar o injustificável; dar a impressão de que está se protegendo de um inimigo que combate com meios equiparados aos seus e que está colocando sua sobrevivência em grande perigo. Serve para justificar a ocupação de várias décadas, a punição coletiva dos palestinos, o que é um crime de guerra com base nos Princípios de Nuremberg, os quais foram elaborados na onda dos julgamentos aos nazistas. Quando se trata de Israel e Palestina, não é logicamente possível criticar igualmente os dois países: como pode um país ocupado, sem forças armadas, ao qual são negados o direito de autodeterminação e os direitos humanos básicos, ser criticado tanto quanto seu brutal e superarmado ocupante?

Há uma frase superficial estereotipada que os chamados “comentaristas neutros” costumam usar muito para “nivelar sua crítica”: “O conflito Israel-Palestina é complicado”. Primeira e principalmente, não se trata de um conflito. É uma guerra. Uma guerra travada com meios desproporcionais, na qual toda uma população está sendo punida e o agressor é vitimizado. Em segundo lugar, não é complicado. É muito simples. Israel ocupa um território e comete crimes de guerra de forma regular, enquanto que a “comunidade internacional” permanece sentada sem fazer nada, já seja porque Israel é seu aliado ou simplesmente porque seus interesses não estão em risco.

Esta “nivelação de críticas” faz parte do legendário processo de legitimação da injustiça e dos crimes de guerra. Na década de 1990, os Acordos de Oslo trivializaram a ocupação israelense da Palestina. Recentemente, o futebolista palestino Mahmoud Sarsak se tornou um ícone da luta contra a normalização. Ele foi preso numa passagem fronteiriça, encarcerado em Israel e libertado somente depois de uma greve de fome de 96 dias. Adie Mormech escreve:

O Dr. Haidar Eid denominou a luta pela libertação da Palestina em oposição à normalização com Israel de “A des-Osloização da mente dos palestinos”. Ele descreveu o posicionamento de Mahmoud Sarsak (o futebolista palestino) ao recusar ser recepcionado pelo F.C. Barcelona juntamente com o soldado israelense Gilad Shalit de a luta contra o “Vírus de Oslo”.

O “Vírus de Oslo” se refere ao que estava por trás da série de iniciativas de normalização que começaram de forma séria em 1993, no auge dos Acordos de Oslo, e o acordo feito entre a Organização para a Libertação da Palestina (OLP) e o governo trabalhista de Israel de então.

Edward Said, que vira de imediato os perigos da normalização sem justiça, escreveu em 1995 sobre a decisão da liderança palestina de aprovar o acordo de Oslo. “Pela primeira vez no século XX, um movimento de libertação anticolonialista não somente descartou suas consideráveis conquistas, senão que fez um acordo de cooperar com uma ocupação militar antes de a ocupação ter terminado” (Adie Mormech, De-Osloization and the fight against Normalisation, Scoop, October 25, 2012.)

Sarsak explicou sua decisão da seguinte maneira:

“Há uma diferença entre uma pessoa aprisionada com sua arma, com uniforme militar, de dentro de seu tanque… e a prisão numa passagem fronteiriça de um atleta que estava a caminho de seu clube esportivo profissional na Cisjordânia. Eu anuncio minha disposição de me reunir com o Barcelona ou qualquer outro clube espanhol fora do contexto de um convite conjunto a Gilad Shalit, se me convidarem como um atleta palestino que experimentou… o sofrimento de uma greve de fome pela liberdade e pela dignidade.”(Adie Mormech, Mahmoud Sarsak and the end of Oslo-era normalization, Mondoweiss, October 26, 2012)

A narrativa segundo a qual o “conflito” entre a Palestina e Israel é complicado é parte da trivialização da brutal e ilegal ocupação da Palestina por Israel. Por uma distorção absurda e macabra da realidade, somos levados a crer que os israelenses são as únicas vítimas de racismo e discriminação.

A injustiça foi vulgarizada e minimizada a tal ponto que, segundo um levantamento recente, a maioria dos israelenses aceita e admite que há uma forma de apartheid em seu próprio país, e cerca de 50% da população apoia a segregação e a discriminação contra os árabes:

Uma nova enquete revelou que a maioria dos israelenses judeus acredita que o Estado Judaico pratica “apartheid” contra os palestinos, com muitos apoiando abertamente as políticas discriminatórias contra seus cidadãos árabes.

Um terço dos que responderam creem que os cidadãos árabes de Israel não deveriam ter direito a voto, ao passo que quase a metade – 47 % – gostaria que lhes fossem retirados seus direitos de cidadania e que fossem postos sob o controle da Autoridade Palestina (…)

A enquete, conduzida pelo grupo de pesquisa israelense Dialog, concluiu que 59% de 503 pessoas consultadas gostaria de ver os judeus receberem preferência para os empregos no setor público, ao passo que a metade gostaria de ver os judeus melhor tratados do que os árabes.

Um pouco mais de 40% gostaria de ver moradias e salas-de-aulas separadas para judeus e árabes. (Catrina Stewart, The new Israeli apartheid: Poll reveals widespread Jewish support for policy of discrimination against Arab minority, The Independent October 23, 2012)

Noam Sheizaf, um jornalista israelense, escreveu que as “descobertas refletem a noção generalizada de que Israel, como um Estado Judaico, deveria ser um Estado que favorecesse os judeus. Elas são também o resultado da ocupação… Após quase meio século de dominação sobre outro povo, não é nenhuma surpresa que a maioria dos israelenses não pense que os árabes mereçam os mesmos direitos.” (Ibid.)

Esta dominação dos palestinos pelos israelenses vem sendo estimulada e mantida por países que alegam defender a liberdade, os direitos humanos e a democracia.

A Autoridade Palestina foi criada com os Acordos de Oslo em 1994 como um organismo de governo provisório com poderes limitados e com independência geográfica ainda mais limitada de Israel, cuja duração deveria ter sido de apenas cinco anos, de acordo com a linha de tempo estipulada pela qual os “acordos de status final” deveriam ter sido alcançados.

Dezenas de milhões de dólares jorraram sobre a Autoridade Palestina (AP) vindos de ardentes partidários de Israel, tais como os Estados Unidos e a União Europeia, e investimentos similares prosseguiram em projetos conjuntos Israel-Palestina que, uma vez mais, não fizeram nenhum esforço para mudar o status quo político e econômico da vida palestina concreta.

O discurso proeminente em relação a grupos recentemente formados, tais como One Voice (Uma Voz) e outras colaborações, era que o “conflito” Israel-Palestina era um problema de ignorância e preconceito em oposição a uma questão de injustiça e do continuado despojo e subjugação de um povo por outro. (http://www.maan-ctr.org/pdfs/Boycott.pdf)

A onda de colaborações que veio após Oslo aumentaram a legitimidade global de Israel de tal modo que os acordos bilaterais com a União Europeia e outros países se multiplicaram, assim como outros acordos que incluíam laços mais próximos com a OTAN e a OCDE. Entre 1994 e 2000, houve um acréscimo de seis vezes no investimento estrangeiro direto em Israel, de US$ 686 milhões para aproximadamente US$ 3,6 bilhões. (De-Osloization and the fight against Normalisation, op. cit.)

De certo modo, o “Vírus de Oslo” normalizou o ostracismo de todos os árabes e muçulmanos, e o maltrato aos palestinos era um prelúdio para a aceitação da atual e patente islamofobia e arabofobia (E como os árabes também são semitas, a arabofobia também é antissemitismo, mas é virtualmente impossível usar essa expressão em relação com os sentimentos antiárabe em razão de sua forte conotação judaica.)

O mundo ocidental aceita as ocupações dos EUA e Israel sobre terras árabes e muçulmanas para proteger interesses estratégicos e financeiros, e a “guerra global contra o antissemitismo” assim como a “guerra global ao terror” são os pretextos escolhidos para a invasão militar, onde quer que a “intervenção humanitária” se mostre inadequada. Aqueles que resistem à ocupação estadunidense no Afeganistão ou à ocupação israelense da Palestina são retratados como terroristas. Aqueles que matam civis e funcionários governamentais eleitos na Síria são apresentados como combatentes da liberdade. Se você resiste à ocupação, você será bombardeado. Se você combater por ela, você será armado.

O antissemitismo e a islamofobia como instrumentos da guerra de propaganda dos EUA

Alguns argumentam que Israel não passa de posto avançado do imperialismo estadunidense: “Os Estados Unidos estão alinhados com Israel fundamentalmente porque usam Israel para projetar sua influência imperial na região rica em recursos.” (Michael Fiorentino Israel: An outpost of empire, SocialistWorker.org, April 16, 2010.). Com isto em mente, a “guerra global contra o antissemitismo” pode ser vista como um instrumento da guerra de propaganda imperial dos Estados Unidos.

Em A Indústria do Holocausto, Norman Finkelstein escreve: “Assim como as organizações judeo-estadunidenses dominantes negligenciaram o holocausto nazista nos anos subsequentes à Segunda Guerra Mundial para ajustar-se às prioridades do governo dos EUA na Guerra Fria, também sua atitude quanto a Israel manteve-se em linha com a política estadunidense nos EUA.” Com a guerra árabe-israelense de 1967, “O Holocausto se tornou uma fixação na vida do judeu estadunidense”. (Finkelstein, Norman. The Holocaust Industry. New York: Verso, 2003, p. 16-17.)

Não é segredo para ninguém que os EUA querem expandir e manter sua hegemonia, e o infame Projeto para um Novo Século Estadunidense (Project for a New American Century) expôs claramente o que deve ser feito para tal efeito.

O papel das forças militares durante a Guerra Fria era dissuadir o expansionismo soviético. Hoje sua tarefa é garantir e expandir as “zonas de paz democrática”, dissuadir o surgimento de uma nova grande potência competidora, defender regiões chave da Europa, Ásia Oriental e Oriente Médio, e preservar a proeminência dos Estados Unidos mediante a próxima transformação da guerra viabilizada por novas tecnologias (…)

A liderança global dos Estados Unidos (…) baseia-se na segurança da pátria estadunidense, a preservação de um equilíbrio de forças favorável na Europa, no Oriente Médio e nas circundantes regiões produtoras de energia, assim como na Ásia Oriental.(Rebuilding America’s Defenses, Project for a New American Century, September 2000.)

Chama muito a atenção de que expandir as “zonas de paz democrática” seja o único objetivo entre parênteses, posto que estes em geral denotam sarcasmo e ironia. Afora de “paz democrática”, os objetivos hegemônicos estão muito claros e a nova “guerra contra o antissemitismo global” só pode contribuir ainda mais para o projeto imperial dos Estados Unidos, do qual Israel é tanto uma ferramenta de uso como um beneficiário.

Fortemente armados pelos Estados Unidos, a política exterior de Israel é uma extensão da política exterior dos Estados Unidos. Desde a criação de Israel fomos acostumados ao maltrato dos palestinos: isto foi “normalizado”. A punição coletiva infligida aos palestinos por Israel, um crime que os judeus sofreram sob o regime nazista, é aceito e perpetuado pelos Estados Unidos. Sem a ajuda e a permissão dos Estados Unidos e a aceitação da chamada “comunidade internacional”, os palestinos não seriam perseguidos.

Da mesma forma que Israel usa o Holocausto para justificar a punição coletiva dos palestinos e a agressão a seus vizinhos, os Estados Unidos usam o 11/9 para justificar a punição coletiva dos muçulmanos no mundo inteiro e várias invasões militares. Muito antes dos Memorandos da Tortura da administração Bush que avalizam a tortura, Israel já tinha oficialmente autorizado a tortura através do Relatório Landau, em 1987. A islamofobia é sem dúvida a forma mais aceita de discriminação na atualidade e, neste contexto, a institucionalização da “guerra global contra o antissemitismo” é claramente uma outra expressão distorcida da mesma.

Em The Islamophobia Industry: How the Right Manufactures Fear of Muslims (A indústria da islamofobia: Como a Direita Fabrica o Medo aos Muçulmanos), Nathan Lean “traça o arco do sentimento islamofóbico que aflorou no ocidente”, o qual está fortemente ligado à “Indústria do Holocausto”.

“Ele expõe a multimilionária indústria dos traficantes do medo e a rede de financiadores e organizações que bancam e perpetuam o fanatismo, a xenofobia e o racismo, e criam um clima de medo que sustenta um ameaçador câncer social” (…)

“Trata-se de uma relação de benefícios mútuos, na qual ideologias e afinidades políticas convergem para levar adiante a mesma agenda.” (…)

Elas provêm principalmente do sionismo direitista e do cristianismo evangélico, que se unem para formar uma frente judeo-cristã em suas batalhas contra o Islã. Seus financiadores também provêm desses mundos – embora o mundo sionista de direita tenha gerado a maioria dos ativistas anti-muçulmanos (…)

É este sionismo cristão que liga estreitamente direitistas evangélicos com fortes partidários do Estado Judeu. Os sionistas que espalham o fanatismo anti-islâmico podem ser alocados em três campos, segundo Lean: o sionismo religioso (judeu), o sionismo cristão e o sionismo político. “Para os sionistas religiosos, a profecia é o principal instigador de seu fervor islamofóbico. Para eles, os palestinos não são apenas habitantes indesejados; não são apenas árabes em terras judaicas. Não são sequer apenas muçulmanos. Eles são forasteiros não-judeus feitos de tecido diferente – e as ordens de Deus em relação a eles são bem claras”, ele escreve.  E há o sionismo político, que se abstém da linguagem religiosa, mas continua sendo hostil para com os muçulmanos. Como Max Blumenthal escreveu, estes personagens, alguns dos quais são neoconservadores, creem que “o Estado Judeu (é) um Forte Apache do Oriente Médio nas linhas de frente da Guerra Global ao Terror.” (Alex Kane, Islamophobia: How Anti-Muslim bigotry was brought into the American mainstream, Mondoweiss, October 29, 2012.)

Os Estados Unidos estão usando Israel para suas guerras sujas e, por sua vez, Israel está usando os Estados Unidos para combater seus vizinhos. Eles são aliados inseparáveis, cada qual acumula poder e expande seu controle sobre territórios estrangeiros e suas populações, e seus aliados se beneficiam disso. Qualquer que seja o pretexto usado, a razão para deflagrar guerras permanece a mesma: poder e dinheiro. E isto sempre se consegue com a demonização de quem estiver no caminho.