A andar como sonâmbulos rumo ao precipício petrolífero
—James Oppenheim
Chegou o momento de discutir o que podemos esperar da OPEP pois tem tudo a ver com a nossa prosperidade na próxima década. Depois de 2010, o petróleo bruto produzido fora do cartel atingirá o plateau e declinará gradualmente, de modo que qualquer crescimento na oferta de petróleo convencional terá de vir da OPEP.
Agora os decisores da OCDE e os consumidores devem entender que a política a curto prazo da OPEP de alívio pelo lado da oferta, a qual não é para proporcionar qualquer alívio, é também a sua política a mais longo prazo. Não se pode contar com a OPEP para salvar-nos do esmagamento petrolífero. Devemos ajustar as nossas expectativas a fim de reflectir a realidade, não as nossas esperanças e sonhos.
As expectativas ilusórias colocadas na capacidade e vontade da OPEP de expandir a oferta de petróleo estão destinadas a deixar as nossas vidas desprotegidas dentro de uns poucos anos. Impactos de preços prejudiciais já estão a acontecer agora. Para a maior parte dos cidadãos, futuros impactos pesarão muito mais do que questões acerca de quem será o próximo presidente dos Estados Unidos. Na ausência de uma grande e imediata mudança política nos Estados Unidos que objective reduzir substancialmente nosso consumo de petróleo, será a OPEP, não o nosso governo eleito ou as companhias do "Big Oil" , que estabelecerão os preços mínimos para combustíveis líquidos.
Esta semana trouxe-nos a notícia de que o presidente da OPEP, Chakib Khelil "não exclui que os preços do petróleo atinjam US$200 por barril, embora a oferta seja adequada, porque o mercado é conduzido pelo deslizamento do dólar".
Khelil acrescentou: "Os preços são altos devido à recessão nos Estados Unidos e à crise económica que afectou vários países, uma situação cujo efeito é desvalorizar o dólar, e portanto cada vez que o dólar cai um por cento, o preço do barril ascende em US$4, e vice-versa naturalmente".
Ele considerou ainda que "se este (o dólar) se fortalecer em 10 por cento, é provável que os preços (do petróleo) caiam 40 por cento" [Nota: para US$71,35 por barril ao preço de hoje].
"Mas não penso que um aumento na produção ajudasse a reduzir preços, porque há um equilíbrio entre oferta e procura e os stocks de gasolina nos Estados Unidos registaram um excedente e estão no seu mais alto nível de cinco anos".
Nota: A afirmação de Khelil acerca dos actuais stocks de gasolina nos EUA é falsa (ver gráfico). Os stocks de gasolina em queda estão agora no topo da média de 5 anos para Abril, e abaixo daquela média para outros meses. Por outro lado, grandes e danosas altas de preços do gasóleo e défices estão a verificar-se por todo o mundo.
Embora seja verdade que há uma correlação negativa entre o valor do dólar e os preços do petróleo – o último sobe quando o anterior cai – não há boas razões para acreditar que o mergulho do dólar tenha provocado os choques de preços dos últimos 8 meses (ambas as referências são do Econbrowser, de James Hamilton).
Os pensamentos de Khelil sobre o preço do petróleo são simplesmente mais uma numa longa série de desculpas que a OPEP avança para justificar suas políticas de produção. O presidente da OPEP está realmente a dizer que US$200/barril nos próximos poucos meses está OK da parte deles.
Duas visões do seu futuro
Precisamos estabelecer expectativas realistas acerca das contribuições da OPEP para o abastecimento de petróleo. Tenho verificado que a maior parte das pessoas não partilha meu entusiasmo por gráficos, tabelas e aritmética, mas se a sua prosperidade futura repousa sobre o entendimento destes números e do que eles significam, deveriam fazer um esforço. Este é o meu desafio. Minha tarefa é apresentar o material tão claramente quanto possível.
O primeiro gráfico [1] provem da Global Liquids Supply Outlook , da PFC Energy, uma apresentação de Bob MacKnight feita em 26 de Março de 2008. O gráfico mostra o pico da produção de petróleo não-OPEP em 2010, mas chama a atenção sobre a produção da OPEP.
Podem-se ver três linhas que mostram três cenários separados para o crescimento da produção da OPEP até 2020, um com acréscimos anuais de 1,1%, um de 1,7% e um terceiro de 2,4%. Estes são os casos baixo, médio e alto, respectivamente. Como pode ver, após 2010 a maior parte do crescimento do petróleo do mundo depende da produção do bruto (e de líquidos do gás natural) da OPEP.
No cenário de baixo crescimento da PFC, a OPEP deve fornecer 33 milhões de barris por dia (mi. b/d) ao mercado mundial em 2010, 37 mi. b/d em 2015 e 46 mi. b/d em 2020. Cada cenário de crescimento exige níveis de produção da OPEP cada vez mais altos como se mostra, exemplo 37-45 mi. b/d em 2015 abarca os casos de crescimento de alto a baixo.
Nossa segunda ajuda visual, a Tabela 1.5, do 2007 World Oil Outlook , da OPEP, mostra a avaliação que a Organização faz das interrogações sobre o seu caso de referência. Vamos calcular a queda entre o caso de referência da OPEP e o cenário de baixo crescimento da PFC. O caso de referência da OPEP não incluía o Equador, o qual aderiu ao cartel em Novembro de 2007. Pode-se então acrescentar os 0,5 mi. b/d do Equador ao caso de referência da OPEP para cada ano.
Subtraia o número ajustado do bruto da OPEP na tabela ao número no Caso Baixo da PFC em cada ano Y. Em 2010, o défice é de 33 – 30,7 = 2,3 mi. b/d. Em 2015, o défice é de 2,7 mi. b/d. Em 2020, o défice é de 6,7 mi. b/d.
Agora pode ver facilmente que o apelo a si própria feito pela OPEP é mais baixo do que o caso mais baixo [2] de crescimento da PFC numa margem vasta e sempre crescente. Atrevo-me a dizer que o caso de referência reflecte o que a OPEP pretendia produzir — na data de 2007 — sem se importar com as nossas expectativas. Não importa que estas expectativas provenham da EIA, da IEA, do IHS Energy/CERA, da Wood Mackenzie, do CGES e de quaisquer outros "peritos" que se pretenda nomear. Apenas a opinião da OPEP importa aqui porque são eles que estarão no Assento do Condutor em 2010 e depois disso.
Iremos nós fixar as nossas esperanças numa mudança de comportamento da OPEP nos próximos anos? Pense acerca da sua política de sentar-sobre-as-mãos, das suas persistentes afirmações de que "o mercado está em equilíbrio", da visão despreocupada de Khelil do barril a US$200...
É pior do que você pensa
Embora o descrito anteriormente pinte um quadro negro, a situação é realmente pior do que se possa pensar. O caso de referência da OPEP agora pode ser encarado como claramente optimista. Alguns pontos a considerar são listados abaixo. As coisas ficam um bocado complicada em #1 e #3. Assim, seja paciente por favor.
1- A produção média mensal da OPEP em 2008 (segundo o April Oil Market Report da IEA) está a ser de 32,28 mi. b/d, de modo que se pode dizer: "Bem! A OPEP está a produzir mais para facilitar o aperto do mercado mundial". A OPEP está sobretudo a acrescentar a sua produção total média mensal através da aquisição, que não é maior do que no núcleo da "OPEP 11". Angola aderiu ao cartel em Janeiro de 2007. O Equador aderiu em Novembro de 2007. Há agora 13 países membros da OPEP. A produção média mensal era de 29,71 mi. b/d em 2006, e 30,66 mi. b/d em 2007 somando os 1,61 mi. b/d de Angola (= 29,05 mi. b/d para a "OPEP 11". Tome o número da produção de 2008 de 32,28 e subtraia o total para Angola e Equador, o qual agora acresce 2,4 mi. b/d. O total para a "OPEP 11" é 29,88 mi. b/d. Este número mal foi alterado ao longo dos últimos 27 meses.
O caso de referência ajustado pela OPEP, com um total 30,7 mi. b/d em 2010, implica produção de 28,30 mi. b/d do núcleo "OPEP 11" se assumirmos os actuais níveis de produção para Angola e o Equador. Isto é realmente uma diminuição de 1,41 mi. b/d em relação ao nível de 2006 antes de outros países aderirem ao cartel.
Em conclusão, a produção total dos suspeitos habituais — Arábia Saudita, EAU, Kuwait, Irão, Iraque, Nigéria, Argélia, Venezuela e os outros — é assumida estar abaixo do nível de 2006 no caso de referência de 2007 da OPEP relativo a 2010. A Tabela 1.5 mostra que a opção sobre o seu petróleo bruto é realmente mais baixa em 2010 do que em 2005.
2- Quanto desta produção da OPEP estará disponível para exportação? Menos do que costumava estar de acordo com o OPEC's Growing Call on Itself . da CIBC. O consumo está a subir nos países do Golfo Pérsico e alhures. Ler o relatório CIBC e The Sierra Club Solution para uma discussão das tendências de exportação (ASPO-USA, 30/Janeiro/2008).
3- Declarações sauditas recentes parecem indicar uma mudança oficial na política que mais uma vez confirma a posição Paradigm Shift (ASPO-USA, 20/Junho/2007). Este argumento declara que os sauditas e outros exportadores de petróleo não produzirão seu petróleo de uma forma não constrangida para atender à procura mundial. O rei Abdullah disse-nos que "Eu não faço segredo de que quando houver alguma nova descoberta [de petróleo] eu lhes direi: 'não, deixem-no no chão, com a graça de deus, nossos filhos precisam dele' ". O ministro saudita do Petróleo, al-Naimi, validou as observações do rei no Arab News de 20/Abril/2008.
O principal exportador da Arábia Saudita não tem planos para embarcar em nova expansão de capacidade quando previsões de procura a longo prazo caem e ofertas de combustíveis alternativos aumentam, disse o ministro saudita do Petróleo à newletter da indústria Petroleum Argus.
O possuidor das maiores reservas de petróleo do mundo não vê necessidade de ir além do seu objectivo de capacidade para 2009 de 12,5 milhões de barris por dia "pelo menos até 2020", disse o ministro do Petróleo e Recursos Minerais Ali Al-Naimi.
As previsões de procura de energia a longo prazo têm caído agudamente, disse ele na entrevista dada em 11 de Abril àquele semanário, lançando dúvida sobre a necessidade de mais petróleo saudita.
As previsões de procura caíram para níveis tão baixos quanto 106 mi. b/d em 2030, uma redução quanto às estimativas anteriores de 130 mi. b/d.
O mundo actualmente consome cerca de 86 mi. b/d.
Estes desenvolvimentos acrescentam um novo vinco ao que já sabíamos acerca das intenções sauditas. Ver The Saudis Are Blowing Smoke Again , ASPO-USA, 12/Março/2008. As projecções de baixa procura da Arábia Saudita (isto é, da OPEP) poderiam ser denominadas "uma profecia que se cumpre a si própria" até que a produção mais baixa da OPEP após 2010 determinará que muitos consumidores saiam dos mercados de petróleo. Pior ainda, a projecção da PFC (ver gráfico) mostra que mesmo a produção não constrangida da OPEP incrementaria a produção mundial apenas para menos de 100 milhões de barris por dia em 2015 em qualquer caso! É isso, isso é tudo o que pode ser e alguma vez será [conseguido] com base nas estimativas de esgotamento da PFC para a OPEP como um todo. (Veja a apresentação deles.)
O caso de baixo crescimento da PFC excede o caso de referência da OPEP após 2009. Mas sem novas contribuições substanciais dos sauditas ao longo da próxima década — agora já nos disseram que não haverá — o próprio caso de referência parece ser demasiado generoso. O ministro do Petróleo al-Naimi agora está a pedir-nos que olhemos para cenário de "baixo crescimento" da OPEP ao invés do caso de referência mostrado na Tabela 4.2 do 2007 World Oil Outlook (ver gráfico). Tome os défices (shortfalls) ajustados calculados para o caso de referência da OPEP para cada ano e então acrescente o número negativo dado na Tabela 4.2. O défice de bruto da OPEP em relação ao caso de crescimento baixo de 1,1% da PFC fica agora como se segue: 3,6 mi. b/d em 2010; 6,1 mi. b/d em 2015; 13,5 mi. b/d em 2020.
4- Se o antecedente não é bastante alarmante, considere que aumentos substanciais na produção da OPEP na próxima década exigiriam grandes contribuições do Iraque , Nigéria e Venezuela , agora que sabemos que uma capacidade de produção de 12,5 mi. b/d é tudo o que obteremos dos sauditas. (Todos os links são para colunas anteriores da ASPO-USA.) Perspectivas para grandes aumentos de produção da parte destes três países são improváveis por razões peculiares a cada um.
Agora já estabelecemos expectativas realistas acerca de futuras contribuições da OPEP. Eles não produzirão bastante petróleo bruto nos próximos 12 anos para atender mesmo um cenário de crescimento mínimo. Poucos assuntos são mais importantes do que a contribuição potencial do petróleo bruto da OPEP para a produção mundial quando avançamos rumo a 2020.
A viver para além dos nossos meios
Espero que seja capaz de ultrapassar esta discussão por vezes tortuosa porque há pouco mais que eu pessoalmente possa fazer para convencê-lo de que estamos todos numa Grande Perturbação. Em The Big Thirst do New York Times, o inestimável Jad Mouawad, que agora começa a perceber, citou o ex céptico do Pico Petrolífero Vaclav Smil —
"O país tem estado a viver para além dos seus meios", disse Vaclav Smil, um eminente perito em energia da Universidade de Manitoba. "A situação é horrenda. Precisamos fazer sacrifícios relativos. Mas o povo não percebe quão horrenda é a situação".
A menos que adoptemos algumas acções drásticas, será Tudo OPEP, Todo o tempo após 2010 quando ligar o rádio ou a TV para ouvir as inevitáveis notícias sobre se a gasolina atingirá finalmente os US$5 ou US$6 por galão [1 galão = 3,78 litros]. Mas em 2008, o nosso discurso sobre a situação petrolífera ainda é uma brincadeira. Precisamos parar de dizer tolices acerca da promoção da Strategic Petroleum Reserve, da abertura do Arctic National Wildlife Refuge, de levar a OPEP a tribunal, cortar impostos federais sobre a gasolina, elevar impostos sobre o Big Oil, punir especuladores, contar com o imaginário etanol celulósico, esperar por produção em massa de híbridos plug-in, e todas as outras insensatezes com que somos bombardeados todos os dias.
Estamos a andar como sonâmbulos rumo ao precipício petrolífero. A OPEP não atenderá as expectativas fantásticas colocadas sobre ela pelos "peritos". Só posso esperar que os americanos apreendam esta realidade muito em breve, porque tudo o que estamos a fazer por agora é rearrumar as cadeiras no tombadilho do Titanic.
[1] Verá que o petróleo bruto não-OPEP, condensados, areias petrolíferas e líquidos de gás natural (NGL) são empacotados juntos com líquidos de gás natural (NGL) da OPEP. Isto é contabilização padrão, porque a produção NGL da OPEP não é restringida pelo sistema de quotas do cartel. Portanto, é sempre colocada do lado não-OPEP da contabilidade.
[2] A OPEP tem um cenário de "crescimento alto" que muda apenas ligeiramente os cálculos feitos aqui. Os défices para este cenário de boom desenvolvem-se como se segue: 2,4 mi. b/d em 2010; 1,8 mi. b/d em 2015; 5,3 mi. b/d em 2020.
[*] dave.aspo@gmail.com
O original encontra-se em http://www.aspo-usa.com/index.php?option=com_content&task=view&id=363&Itemid=91