"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música"
Friedrich Nietzsche

sexta-feira, abril 25, 2008

Instituto Humanitas Unisinos - 25/04/08

A força do Opus Dei

A ‘obra’ de Escrivá de Balaguer comemora 25 anos como Prelazia Pessoal tendo Rouco, arcebispo de Madri e presidente da Conferência Episcopal Espanhola, como anfitrião e a conquista do Leste, que foi comunista, como objetivo.

“A famosa e polêmica fundação de Escrivá goza de uma situação especial dentro da sempre rígida Igreja romana. No último meio século ninguém se destacou tanto como a obra fundada por são Josemaría Escrivá de Balaguer. Há 25 anos, João Paulo II, que chegou ao cargo protegido e impulsionado sobretudo pelo Opus, concedeu a esta fundação o caráter de Prelazia Pessoal, única ainda no mundo”, escreve o jornalista espanhol Juan G. Bedoya. Mas, Bento XVI, arremata, continua dando sinais de simpatia pela Obra.

Segue a íntegra do artigo de Juan G. Bedoya publicado no El País, 23-04-2008. A tradução é do Cepat.

O Opus Dei está aproveitando o 25º aniversário de sua extraordinária ereção como Prelazia Pessoal para fazer uma demonstração de sua força perante a opinião pública. Não estão em crise, presumem seus dirigentes, o biólogo catalão Ramón Herrando Prat de la Riva e a economista madrilena Inocencia Fernández, esta como dirigente das mulheres da fundação. Outras congregações clássicas não podem dizer o mesmo. Diante da perda de vocações entre os jesuítas, por exemplo – hoje apenas 19.000 em todo o mundo, frente a quase o dobre há pouco mais de meio século –, o Opus Dei soma 87.000 membros laicos, 10.000 a mais que em 1982. 55% são mulheres. A Obra conta também com 1.900 sacerdotes. Seu objetivo agora é a conquista dos ex-países comunistas do Leste europeu.

A famosa e polêmica fundação de Escrivá goza, além disso, de uma situação especial dentro da sempre rígida Igreja romana. No último meio século ninguém se destacou tanto como a obra fundada em 1928 por são Josemaría Escrivá de Balaguer (Barbastro, Huesca, 1902 – Roma, 1975) com o nome de Opus Dei. Há 25 anos, João Paulo II, que chegou ao cargo protegido e impulsionado sobretudo pelo Opus, concedeu a esta fundação o caráter de Prelazia Pessoal, única ainda no mundo.

O fundador, já elevado às honras dos altares, goza também de uma predileção especial na Basílica de São Pedro em Roma, o maior templo da cristandade: de três anos para cá, uma das imponentes fachadas deste templo exibe uma escultura de Escrivá, de cinco metros de altura.

“Sem medo nem vergonha, com o objetivo não de se adaptar ao mundo, mas de convertê-lo e renová-lo”. Este é o desafio que o cardeal arcebispo de Madri e presidente da Conferência Episcopal Espanhola, Antonio María Rouco Varela, faz ao Opus Dei.

O cardeal lamenta que os espanhóis não presumam no exterior da força de sua Igreja. “Sinto falta que os representantes no estrangeiro não falem sobre as grandes contribuições que a Igreja espanhola fez à Igreja universal, entre elas o Opus Dei”, disse diante dos cardeais vindos do Vaticano a Madri para celebrar o aniversário da Prelazia, convidados pela Universidade de Navarra. Entre os presentes estava o cardeal Julián Herranz, presidente emérito do Pontifício Conselho para os Textos Legislativos, e o secretário da Pontifícia Congregação para os Bispos, arcebispo Francesco Monterisi.

A ascensão do Opus Dei à categoria de Prelazia Pessoal foi o grande sonho do fundador Escrivá. Homem de grandes ambições, queria livrar-se das dependências em relação aos bispos porque sua fundação, então com 70.000 membros – a imensa maioria leigos, homens e mulheres, celibatários ou casados –, tinha pouco a ver, na sua opinião e na realidade, com os institutos e as congregações tradicionais.

“O Opus Dei não era nem poderia ser uma forma moderna ou evolutiva desse estado de vida consagrada”, afirma o cardeal Herranz, ele próprio do Opus. Escrivá pretendeu inclusive o máximo grau de independência em relação aos bispos (prelatura nullius), mas teve que se conformar com a “prelazia pessoal”, uma espécie de diocese mundial, também excepcional no mundo católico.

O Opus não gozou de trato especial com os papas Pio XII, João XXIII e Paulo VI, mas foi o movimento predileto do polonês João Paulo II, mais conservador que os anteriores. Também gozou da complacência do ditador Francisco Franco, que teve por vezes Josemaría Escrivá como confessor e que fez de vários de seus seguidores ministros de Estado.

Essas estreitas e polêmicas relações com o poder ditatorial – Escrivá esteve com Franco nos primeiros dias da Guerra Civil, em Burgos – não impediu o Opus de manter uma grande presença social e política nos primeiros anos da transição e nos Governos de José María Aznar.

O empenho pessoal de João Paulo II para distingui-lo de maneira especial tinha a ver com essa ofensiva de reabilitação quando ordenou, em 1980, que estudassem com certa urgência a possibilidade de destacar o papel da Obra com um status especial. Queria uma decisão antes de viajar a Espanha. Quando chegou a Madri, em 31 de outubro de 1982, pouco depois da vitória da esquerda socialista nas eleições realizadas três dias antes, o Papa trazia debaixo dos braços a constituição apostólica Ut sit (Que seja), que convertia o Opus Dei na primeira e ainda única Prelazia Pessoal da Igreja católica.

A última estátua do Vaticano

João Paulo II sustentava que, assim como o Concílio de Trento foi posto em prática pelo zelo da Companhia de Jesus – outra grande fundação espanhola, do basco Inácio de Loyola – mais que pelo zelo dos bispos, agora, aquele outubro de 1982 em que chegava a uma Espanha governada com esmagadora maioria por Felipe González, eram os movimentos laicos como o Opus Dei, os novos apóstolos do Vaticano II.

O papa polonês deu mais mostras da sua predileção por Josemaría Escrivá. Num rapidíssimo processo – o segundo mais breve na história da Igreja romana, depois do processo de canonização de Teresa de Calcutá –, beatificou-o no dia 17 de maio de 1992, apenas 17 anos depois da sua morte, e o canonizou 10 anos depois, no dia 6 de outubro de 2002.

O Opus continua sendo uma fundação fundamentalmente espanhola, apesar de já estar presente em 64 países. Os espanhóis são 35.000 dos 87.000 mil membros (nos Estados Unidos, por exemplo, há apenas 3.000, e mais alguns na Itália e no México); são espanhóis os seus máximos prelados, depois da morte de Escrivá (os monsenhores Álvaro del Portillo e Javier Echevarría), e é espanhol, sobretudo, o primeiro impulso e poder, antes que o fundador decidisse empreender sua “romaria” no final dos anos 50 (“Católico, Apostólico, Romano! Gosto de que sejas muito romano. E que tenhas desejos de fazer a tua romaria, videre Petrum, para ver Pedro”, escreve em Caminho, máxima 520), onde se introduziu nos círculos papais até conseguir o título de monsenhor com o apoio do regime franquista.

Apesar do crescimento de outras fundações, entre outras a do também espanhol Kiko Argüello, os chamados Kikos, que são centenas de milhares de pessoas, o Opus mantém a preeminência do passado também com o atual papa Bento XVI. Isso ficou claro quando este acudiu para benzer a instalação de uma importante estátua de Escrivá num centenário nicho da fachada exterior esquerda da Basílica de São Pedro, um fato de extraordinária simbologia. A permissão para ocupar tão excepcional lugar no maior templo do catolicismo foi dada pessoalmente por João Paulo II, em 2004, mas foi Bento XVI que quis realçar com sua presença que aplaudia a idéia.

Instituto Humanitas Unisinos - 25/04/08

ONU estima em 300 mil o número de mortes no conflito de Darfur

A crise de Darfur, região ocidental do Sudão assolada pela violência desde 2003, não reflui. Ao contrário, piora. A ONU elevou para 300 mil o número total de mortos no conflito – o balanço anterior, de 2006, fixava esse número em 200 mil –, os desdobramentos da missão de paz das Nações Unidas empacaram e a FAO irá reduzir a alimentação para os refugiados devido ao aumento da insegurança. As informações são de reportagem do El País, 24/04/2008. A tradução é do Cepat.

O novo cálculo da ONU sobre vítimas nesta região semidesértica do tamanho da França é, no entanto, pouco científico. A base é a estimativa feita em 2006 pela Organização Mundial da Saúde (OMS). “A cifra de 2006 teria que ser muito mais alta agora; talvez aproximadamente 50% maior”, sustenta John Holmes, coordenador para Assuntos Humanitários da ONU, que admitiu não dispor de nenhum estudo novo.

O embaixador do Sudão no ONU bradou aos céus e exclamou que estas cifras “não ajudam [a resolver o conflito], não são corretas nem confiáveis”. Segundo o Governo sudanês, a cifra de mortos diretos do conflito passou no último ano de nove mil para dez mil. A estimativa da ONU inclui também as mortes indiretas em decorrência da penúria das condições de vida na região: 2,5 milhões – mais de 40% da população de Darfur – vivem em condições extremamente precárias nos campos de refugiados.

A missão de paz conjunta entre a ONU e a União Africana, que foi aceita por Cartum [capital do Sudão] no ano passado, está prestes a se converter num fiasco. Apenas nove mil dos 26 mil soldados previstos foram deslocados para o que deveria ser a maior missão de paz do mundo com a participação da ONU. E o que é pior: os instrumentos logísticos indispensáveis para a missão, como helicópteros com capacidade para atirar, não chegam.

Dessa vez, a culpa pela situação não é de Cartum, segundo admitiu o enviado da ONU para a região, Rudolph Adada, ao denunciar a falta de interesse da comunidade internacional pela missão.

Além disso, a ONU irá reduzir quase pela metade as rações para os refugiados devido às dificuldades de distribuição; 60 veículos da FAO foram seqüestrados desde dezembro passado e 26 motoristas – a grande maioria, locais – estão desaparecidos.

Instituto Humanitas Unisinos - 25/04/08

Técnicos são contra renegociação de Itaipu

Enquanto o núcleo político tenta ser diplomático, para retirar o assunto dos holofotes, as áreas técnicas do governo brasileiro não cansam de mandar recados para o presidente eleito do Paraguai, Fernando Lugo. O bombardeio veio tanto da Eletrobrás quanto de aliados da ministra Dilma Roussef. A reportagem é de Mônica Tavares e Erica Ribeiro e publicada pelo jornal O Globo, 25-04-2008.

Ao mesmo tempo, os paraguaios parecem ter acusado o golpe e, pela primeira vez desde a eleição de Lugo, não acusaram o Brasil de ser injusto ontem.

As declarações mais fortes foram feitas ontem pelo presidente da Empresa de Pesquisa Energética, Maurício Tolmasquim, que é contrário a uma revisão da tarifa. Ele lembrou que os paraguaios só entraram com a água no projeto da hidrelétrica.

Coube aos consumidores brasileiros financiar, desde 1973, os recursos e a tecnologia aplicados na usina, afirmou ele.

— Não é justo fazer o consumidor brasileiro pagar um sacrifício a mais ao que vem pagando há anos, que seria aumentar a tarifa para uma transferência de recursos para o Paraguai. Seria uma transferência do consumidor (brasileiro) para o Paraguai — ponderou Tolmasquim.

Ex-secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia quando Dilma Rousseff comandava a pasta e apadrinhado da atual chefe da Casa Civil, Tolmasquim ressaltou ainda:

— Do ponto de vista do setor elétrico, não cabe ao consumidor de energia elétrica arcar com esta responsabilidade de transferência de renda. Esta ajuda ao Paraguai pode ser feita, mas por outros mecanismos. Seria um erro fazer isto através da tarifa do consumidor brasileiro.

Segundo Tolmasquim, a hidrelétrica custou US$ 12 bilhões, sendo que “o capital inicial pago foi US$ 50 milhões do Paraguai e US$ 50 milhões do Brasil”. A parte paraguaia para o restante da obra foi inteiramente financiada pelo Brasil:

— O Paraguai ganhou um empreendimento que hoje vale (a metade paraguaia) cerca de US$ 60 bilhões, o que equivale a algumas vezes o PIB do Paraguai.

Sendo que a contribuição dele para o processo foi o fato de estar na fronteira com o Brasil.

O diretor de engenharia da eletrobrás, Valter Cardeal, concorda. Ontem, no Rio, ele frisou que o aumento da tarifa paga ao Paraguai afetaria o bolso dos brasileiros.

— Itaipu é um caso único no Brasil onde o serviço é pelo custo. A tarifa que está sendo praticada é para os consumidores brasileiros, que pagam mais de 90% desse custo e estão pagando nada mais que uma tarifa justa e módica — disse ele, que foi presidente interino da Eletrobrás antes do atual presidente, Luiz Antonio Muniz Lopes.

Muniz Lopes rompeu o silêncio ontem, e levantou um outro possível efeito de uma negociação.

Ele disse, durante um evento no Clube de Engenharia, no Rio, que qualquer solução relacionada ao preço da energia de Itaipu paga pelo Brasil não deve prejudicar os acionistas minoritários da empresa. Isso porque a Eletrobrás tem ações nas bolsas de Nova York e de Madri, e qualquer dano aos acionistas mancharia a imagem do país.

Para ele, a questão envolvendo preços não é empresarial. Ele fez coro com o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, ao classificar o preço pago pela energia como “muito justo”, conseguindo remunerar os paraguaios e honrar as dívidas contraídas para construir a usina:

— Não cabe à Eletrobrás entrar nesta questão. A engenharia econômico-financeira foi muito feliz e o preço é justo. Essa é uma questão de Estado.

Ajustes, complementos, devem ser definidos pelo governo sem prejuízo aos acionistas.

O vice-presidente eleito do Paraguai, Federico Franco, que dera um recado para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva de que “os paraguaios não eram mais súditos” do Brasil, baixou o tom ontem.

— O tratado de Itaipu firmado em 1973 foi feito sob a ditadura Stroessner. O Parlamento de então estava submetido a seu poder.

Hoje é diferente. Então, o acordo deve ser revisado — disse ele. — Mas o presidente Lugo não quer renegociar o tratado.

Só pede um preço justo, um preço de mercado pela energia.

Lugo não fala há dois dias sobre Itaipu.

Instituto Humanitas Unisinos - 25/04/08

O grande negócio do etanol. A Esso vai para um usineiro

A Cosan, maior produtora de açúcar e álcool do país, controlada pelo usineiro Rubens Ometto, anunciou ontem a compra da Esso Brasileira de Petróleo, subsidiária da americana ExxonMobil no Brasil, que atua em distribuição de combustíveis e lubrificantes. A reportagem é de Ronaldo D’Ercole e Ramona Ordoñez e publicada pelo jornal O Globo, 25-04-2008.

Pela estrutura de abastecimento e distribuição de combustíveis à rede de 1.500 postos com bandeira Esso no país, além da fábrica de lubrificantes e do prédio sede no Rio, na Barra da Tijuca, a Cosan pagará US$ 954 milhões. A compra foi considerada positiva pelo setor de petróleo, principalmente pelas distribuidoras de combustíveis.

Ao entrar um novo grupo, evitou-se a concentração de mercado, que era temida caso a Petrobras vencesse a disputa. Especialistas e executivos do setor dizem que os consumidores serão os grandes beneficiários, pois a competição poderá gerar reduções de preços, principalmente do álcool.

A Cosan terá o direito de usar a marca Esso nos postos espalhados por 20 estados por um prazo longo, mas que não foi revelado. A sede da Esso, que já transferira várias atividades para Curitiba, será mantida no Rio. A Exxon continuará, no Brasil, com as operações de produtos químicos e de exploração e produção de petróleo.

O negócio marca um avanço na estratégia do grupo de se consolidar como um dos maiores produtores globais de açúcar e etanol, implementada com a associação ao grupo inglês Tate Lyle, no fim dos anos 90, e reforçada pelas parcerias com os traders franceses Tereos e Sucden.

— Somos o primeiro grande produtor mundial de etanol integrado verticalmente — disse o vice-presidente financeiro da Cosan, Paulo Diniz.

Preço independente da Petrobras

Dos US$ 954 milhões, a Cosan desembolsará US$ 826 milhões e terá créditos a receber de US$ 35 milhões, mas assumirá uma dívida de US$ 163 milhões. Segundo Diniz, do US$ 1 bilhão que a Cosan tem em caixa, serão usados apenas US$ 310 milhões.

Outras alternativas estão em avaliação para pagar o restante, entre elas a possibilidade de ter como sócio um grande fundo de private equity (de investimento direto em empresas) — que já teria manifestado interesse — e um financiamento bancário, que estaria pré-negociado. Estimase que o negócio seja liquidado em até oito meses.

A Cosan bateu concorrentes de peso como a Petrobras, o grupo Ultra e o fundo GP Investmentos.

— A Cosan fez a melhor proposta comercial para o grupo (ExxonMobil) — disse o presidente da Esso no Brasil, Carlos Pietrowski, para quem o negócio beneficiará o consumidor.

— O consumo do álcool para uso automotivo já superou o da gasolina, e agora entra no mercado de combustíveis uma empresa que será integrada da usina ao posto. A Cosan vai poder fazer sua política de preços sem depender da Petrobras — disse o consultor Jean-Paul Prates, da Expetro.

Segundo o analista Jayme Alves, da Spinelli Corretora, a Cosan vai eliminar uma fase no segmento de álcool, seu produto principal:

— Hoje, ela entrega o álcool às distribuidoras por uma faixa de R$ 0,80 por litro. Em São Paulo, o produto é vendido por R$ 1,20 nos postos. Com a aquisição, ela poderá se apropriar dessa margem.

As duas empresas vão manter operações independentes. A Cosan continuará fornecendo etanol a seus clientes.

A Esso continuará comprando de seus fornecedores e distribuindo à sua rede e clientes no atacado.

— O volume de etanol vendido pela Esso é similar ao volume produzido pela Cosan, e o mercado brasileiro de etanol cresce uma Esso por ano. Nossa idéia é manter a independência de cada negócio para que eles sejam eficientes — disse Diniz, acrescentando que a intenção da Cosan é preservar ao máximo os quadros de pessoal da Esso.

Diniz fez questão de desfazer o mal-estar que rumores sobre a intenção de fechar o capital, originados por algumas condutas da empresa, causaram no mercado ano passado. Sem mencioná-los, disse que o grupo conta com o mercado de capitais para novas parcerias.

O vice-presidente do Sindicato Nacional das Distribuidoras de Combustíveis (Sindicom), Alísio Vaz, acredita que o crescimento do mercado ilegal, a sonegação de impostos e a adulteração de combustíveis pesaram na decisão da Exxon.

A Exxon está vendendo operações em vários países. Desfez-se de ativos de distribuição em Portugal e na Espanha este mês, e pôs à venda suas operações de distribuição na América latina. O objetivo é focar exploração e produção. Segundo fontes, a Petrobras não deverá mais apresentar proposta pelos ativos da Exxon no Chile e no Uruguai. O diretor de Abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa, disse que a estatal vai rever a atuação na distribuição.

Há um ano, o grupo Ipiranga vendeu o segmento à Petrobras e ao Ultra. Comenta-se no mercado que a Chevron assinou termo de exclusividade com o Ultra para discutir a venda de sua rede de postos Texaco no Brasil, negócio de US$ 1 bilhão.

Instituto Humanitas Unisinos - 25/04/08

Juro eleva dívida pública interna para R$ 1,2 tri

A dívida pública interna em títulos subiu 0,63% em março e atingiu a marca de R$ 1,25 trilhão, de acordo com dados do Tesouro Nacional divulgados ontem. A alta ocorreu por causa do pagamento de juros, que no mês passado, ainda antes da alta na taxa básica promovida pelo Comitê de Polícia Monetária (Copom) do Banco Central, somou R$ 12,56 bilhões. A reportagem é de Fabio Graner e Renata Veríssimo e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 25-04-2008.

A conta de juros resultou na elevação da dívida mesmo com o Tesouro tendo feito um resgate líquido - vencimentos maiores que ofertas de novos títulos em mercado - de R$ 5 bilhões.

Apesar da alta no estoque, um destaque da dívida em março foi a forte queda na participação de títulos vinculados à taxa Selic, que caiu de 34,4% do total da dívida interna em fevereiro para 33,3%.

Esses papéis são considerados pelo Tesouro de pior qualidade porque têm maior grau de imprevisibilidade. Mas, em períodos de elevação da taxa básica de juros, costumam ter maior demanda dos investidores, pois seu rendimento sobe junto com a taxa Selic.

Segundo o coordenador-geral de operações da dívida pública, Guilherme Pedras, a redução da parcela vinculada à Selic ocorreu porque houve uma grande concentração de vencimentos no mês.

Enquanto os títulos pós-fixados perderam espaço na dívida, os prefixados (cuja taxa é definida na hora do leilão) e atrelados à inflação ganharam terreno.

O primeiro grupo subiu de 35,7% para 36,3% e o segundo, de 26,9% para 27,4%. Esses papéis são considerados de melhor qualidade, pois conferem ao Tesouro maior previsibilidade de desembolsos.

Pedras negou que a instituição do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sobre investimentos estrangeiros em títulos públicos esteja reduzindo a demanda pelos papéis do governo, já que o perfil do investidor estrangeiro seria mais voltado para o longo prazo, diluindo o efeito da taxação.

Apesar do discurso contemporizador de Pedras, a medida do IOF desagradou e foi vista como uma decisão que só trouxe prejuízos à administração da dívida, encarecendo o custo de emissão dos papéis do governo, tanto de curto como de longo prazo.

quinta-feira, abril 24, 2008

Resistir Info - 24/04/08

Uma Era de Transição

Os Eua, a China, o Pico Petrolífero e a morte do neoliberalismo

por Minqi Li [*]

Até recentemente a economia capitalista global desfrutou um período de relativa tranquilidade e crescimento a um ritmo relativamente rápido após a crise económica global de 2001-02. Durante este período de expansão económica tem havido vários importantes desenvolvimentos económicos e políticos. Primeiro, os Estados Unidos – a potência económica declinante mas ainda a principal força condutora da economia capitalista global – foram caracterizados por crescentes desequilíbrios internos e externos. A economia estado-unidense experimentou um período de dívida financiada, "expansão" conduzida pelo consumo com salários e emprego estagnados, e tem estado a incorrer grandes e crescentes défices em conta corrente (o défice em conta corrente é uma medida ampla do défice comercial). Segundo, a China tornou-se um actor principal na economia capitalista global e tem estado a desempenhar um papel cada vez mais importante na sustentação do crescimento económico global. Terceiro, a acumulação capitalista global está a impor uma pressão crescente sobre os recursos naturais e o ambiente do mundo. Há uma evidência cada vez mais convincente de que a produção petrolífera global atingirá o seu pico e começará a declinar dentro de poucos anos. Quarto, a aventura imperialista estado-unidense no Médio Oriente sofreu derrotas devastadoras e tem havido resistência crescente ao neoliberalismo e ao imperialismo americano por todo o mundo.

Quando a bolha habitacional dos EUA explode e o domínio do dólar sobre o sistema financeiro global torna-se cada vez mais precário, a economia estado-unidense está agora a ir para a recessão e a economia capitalista global está a entrar num novo período de instabilidade e estagnação. Nos próximos anos veremos provavelmente um grande realinhamento das várias forças politicas e económicas globais e isto estabelecerá o palco para uma nova ascensão da luta de classe global.

Neoliberalismo e desequilíbrios globais

A partir da década de 1980, o neoliberalismo tornou-se a ideologia económica dominante do capitalismo global. Sob as políticas e instituições neoliberais (tais como monetarismo, privatização, desregulamentação, "reforma" do mercado de trabalho e liberalização comercial e financeira), as desigualdades no rendimento e na distribuição de riqueza altearam-se e, em muitas partes do mundo, o povo sofreu declínios devastadores nos padrões de vida. Quando o capital financeiro fluía entre países em busca de ganhos especulativos, uma economia nacional após outra eram destruídas. Sob a pressão de capitalistas financeiros e dos seus representantes institucionais (tais como o FMI, o Banco Mundial e o Departamento do Tesouro dos EUA), muitos governos ficaram comprometidos com as chamadas políticas fiscal e monetária "responsáveis", o que muitas vezes conduziu a consequências económicas e sociais desastrosas.

Na década de 1990, as contradições do neoliberalismo levaram a crises financeiras cada vez mais violentas. De 1995 a 2002, a economia global foi abalada sucessivamente pelas crises que se desenvolveram no México, países do Sudeste Asiático, Rússia, Argentina e Turquia. A economia japonesa lutou com deflação e estagnação a seguir à explosão da bolha de activos em 1990. Havia um sério perigo de que toda a economia capitalista global pudesse cair num círculo vicioso de rupturas financeiras e afundamento na depressão. Neste contexto, os défices em conta corrente dos EUA desempenharam um indispensável papel estabilizador.

Nos anos 1990, os Estados Unidos experimentaram a maior bolha no mercado de acções da história. Apesar da estagnação dos salários reais e dos rendimentos familiares, o consumo doméstico expandiu-se rapidamente quando a dívida habitacional escalou. Na recessão de 2001, temendo que os Estados Unidos pudessem cair numa estagnação persistente, estilo japonês, o Federal Reserve cortou drasticamente a política de taxas de juro e manteve a taxa de juro real abaixo de zero durante vários anos. Em consequência, o mercado de acções permaneceu altamente super-valorizado de acordos com os padrões históricos e a oferta excessiva de moeda e capital a crédito por sua vez alimentaram uma grande bolha habitacional.

Alimentada por uma bolha de activos após outra, a economia dos EUA foi capaz de manter uma expansão relativamente rápida da procura interna. Quando o resto do mundo sofre de insuficiente procura interna, as importações americanas de bens e serviços tenderam a crescer mais rapidamente do que as exportações. Em consequência, os Estados Unidos tem estado a incorrer em grandes e crescentes défices em conta corrente, os quais em 2006 atingiram mais de 800 mil milhões dólares, ou 6 por cento do PIB.

Os défices estado-unidenses em conta corrente geram directamente procura efectiva para o resto da economia mundial, permitindo a muitas economias, incluindo as economias asiáticas e exportadores de petróleo e commodities, perseguirem o crescimento económico conduzido pelas exportações. Mas talvez, mais importante, os défices americanos em conta corrente representam gastos em excesso do rendimento que deve ser financiado pela tomada de empréstimos do resto do mundo. Os défices americanos portanto criam activos para o resto do mundo.

Os bancos centrais das economias asiáticas e os exportadores de petróleo tornaram-se os maiores financiadores dos défice em conta corrente dos EUA. De 1996 a 2006, o total de reservas em divisas estrangeiras de países de baixo e médio rendimento escalou de 527 mil milhões de dólares para 2,7 milhões de milhões de dólares e sua participação no PIB mundial mais do que triplicou: de 1,7 por cento para 5,6 por cento. A ascensão de reservas de divisas estrangeiras reduziu o risco de fugas de capital maciças e crises financeiras, permitindo a estes países terem algum espaço para prosseguirem políticas macroeconómicas expansionistas. A China, em particular, desempenhou um papel crucial no financiamento dos défices em conta corrente americanos e acumulou as maiores reservas de divisas estrangeiros actualmente montando a cerca de 1,6 milhão de milhões de dólares.

O gráfico 1 apresenta as taxas de crescimento económico mundial de 1961 a
Gráfico 1. 2006, com o PIB mundial medido em US dólares constantes de 2000. Na "era dourada" da década de 1960, a economia global expandiu-se rapidamente com taxas de crescimento anual a flutuarem entre 4 e 7 por cento. A partir da década de 1970, a economia global tem estado a lutar com crescimento vagaroso com taxas a flutuarem sobretudo entre 2 e 4 por cento. Durante quatro períodos, 1974-75, 1980-82, 1991-93 e 2001-02, a economia global esteve em crises profundas (embora não haja definição oficial, considera-se geralmente que a economia global está em recessão quando a taxa de crescimento económico do mundo cai abaixo dos 2,5 por cento ao ano). A partir de 2003, a economia global tem desfrutado de uma certa estabilidade relativa e cresceu a cerca de 4 por cento ao ano. Contudo, com a economia do EUA a entrar agora em recessão, esta estabilidade relativa de vida curta está prestes a chegar ao fim.

A expansão económica dos EUA desde 2001

A Tabela 1 apresenta indicadores económicos seleccionados da economia dos EUA. A sua recuperação económica após a recessão de 2001 foi muito fraca. Desde então, a taxa de crescimento médio anual tem sido de apenas 2,4 por cento, a ser comparada com os 4 por cento na década de 1960 e os 3,3 por cento nas de 1980 e 1990. Tanto o emprego como os salários reais dos trabalhadores tem estado estagnados. Medido em dólares de 1982, o salário real horário médio dos trabalhadores do sector privado dos EUA em 2006 era de 8,2 dólares, cerca de 80 por cento mais baixo do que em 1972. A partir de 2000, o rendimento familiar mediano tem estado em queda.

Tabela 1. Contudo, os lucros corporativos tem escalado. Os lucros corporativos em proporção do PIB aumentaram de 5,8 por cento em 2001 para 9,8 por cento em 2006. O preço das acções em relação aos rácios de rendimentos permanece excessivamente elevado, sugerindo que a bolha do mercado de acções ainda não foi plenamente desinchada. O boom do mercado de acções no fim da década de 1990 conduziu ao sobre-investimente generalizado. No principio dos anos 2000, as taxas de utilização da capacidade industrial estavam nos mais baixos em todas as décadas do período pós Segunda Guerra Mundial. Com excesso de capacidade de produção substancial, o investimento privado tem sido lento apesar da melhoria dramática na lucratividade corporativa.

O crescimento económico estado-unidense desde 2001 tem sido conduzido pela expansão do consumo familiar, o qual agora representa mais de 70 por cento do PIB. Como a maioria das famílias sofre de rendimento em queda ou estagnados, a expansão do consumo foi financiada pelo crescimento explosivo da dívida habitacional. A dívida habitacional dos EUA ascendeu de cerca de 90 por cento do rendimento pessoal disponível para 103 por cento em 2000, e para 140 por cento em 2006. Em 2007, os serviços de dívida habitacional (juros e pagamentos do principal em dívida) ascenderam para 14 por cento do rendimento disponível, o mais alto já registado. Nesse meio tempo, a taxa de poupança familiar (o rácio da poupança familiar em relação ao rendimento disponível) caiu da média histórica de aproximadamente 10 por cento para, agora, virtualmente zero.

O consumo financiado pela dívida era claramente insustentável. Nem a dívida das famílias nem o fardo do serviço da dívida podiam subir indefinidamente em relação ao rendimento familiar. Com a explosão da bolha habitacional, as famílias terão de aumentar as suas taxas de poupança e reduzir seu fardo de dívida. Se a taxa de poupança familiar retornassem ao seu nível médio histórico, isto conduziria a uma enorme redução dos gastos familiares. Com a maioria dos lares estado-unidenses a sofrerem de rendimentos reais em queda ou em estagnação, é difícil ver como o consumo possa crescer rapidamente nos próximos anos. Se o consumo estagna, então, dado o peso esmagador do consumo na economia estado-unidense, é altamente provável que caiu numa recessão profunda seguida por uma estagnação persistente.

Será que o Federal Reserve será capaz de vir em resgate e criar mais uma bolha maciça de activos? Aterrorizado pela perturbação dos mercados globais de acções, o Federal Reserve já cortou drasticamente nas taxas de juro. Contudo, com o mercado de acções e o mercado habitacional bastante super-valorizados, é difícil que alguém possa identificar uma outra grande bolha de activos a criar. Além disso, com o nível de endividamento familiar tão elevado e a taxa de poupança familiar já tão baixa, taxas de juro baixas pouco podem fazer para estimular o consumo familiar.

Mais realisticamente, com o consumo familiar a estagnar ou contrair-se, o governo dos EUA podia tentar compensar a desvantagem com mais gastos públicos e um aumento no défice fiscal. Se as taxas de poupança familiares ascendessem em direcção à sua média histórica, então Washington terá de incorrer num défice fiscal muito grande, da ordem dos 6 por cento do PIB ou mais. Dado o actual ambiente político nos Estados Unidos, é duvidoso que uma política fiscal efectiva de uma magnitude suficientemente grande possa ser desenvolvida e executada.

Se a actual ou, mais provavelmente, a próxima administração atrever-se a utilizar políticas expansionistas muito agressivas para revitalizar a economia, então os Estados Unidos provavelmente continuarão a incorrer em défices em conta corrente muito grandes. Com um défice em conta corrente de 6 por cento do PIB, teoricamente, a dívida externa líquida dos EUA podia continuar a ascender para 120 por cento do PIB. [1] Isto seria claramente impossível. Muito antes de este limite teórico ser atingido, tornar-se-ia cada vez mais difícil para os Estados Unidos financiarem seus défices em conta corrente. O actual declínio relativamente ordenado do dólar transformar-se-ia num crash. O dólar perderia seu status como divisa de reserva principal do mundo e os Estados Unidos experimentariam a sua própria terapia de choque.

De um modo ou de outro, os Estados Unidos não serão capazes de incorrer em grandes e crescentes défices em conta corrente durante muito mais tempo. Dado o papel crucial dos défices em conta correntes estado-unidenses na estabilização da economia capitalista global, se a economia dos EUA cair em estagnação persistente e o seu défice em conta corrente tiver de ser corrigido, levanta-se a questão: Qual das outras grandes economias pode substituir os Estados Unidos para conduzir a expansão da economia capitalista global?

A China e o capitalismo global

Gráfico 2. O gráfico 2 compara a contribuição para o crescimento económico mundial da grandes economias do mundo (medidas pelo rácio entre o crescimento económico nacional e o crescimento económico global). A contribuição dos EUA caiu de cerca de 40 por cento no fim da década de 1990 para aproximadamente 30 por cento hoje, e a contribuição da Eurozona caiu de cerca de 20 por cento para cerca de 10 por cento. Em comparação, a contribuição da China ascendeu para cerca de 15 por cento e o grupo "BRIC" (Brasil, Rússia, Índia e China em conjunto) agora gera mais de 20 opor cento do crescimento económico do mundo.

Como à Eurozona falta impulso de crescimento e o Brasil, Rússia e Índia permanecem relativamente pequenos para desempenhar papeis decisivos na economia global, a China parece ser o único candidato plausível para substituir os Estados Unidos e tornar-se a principal força condutora da economia capitalista global. Poderá a China conduzir o capitalismo global a um outro período de estabilidade e crescimento rápido?

Após o famoso "Passeio ao Sul" de Deng Xiaoping, em 1992, a liderança do Partido Comunista Chinês ficou oficialmente comprometida com o objectivo de uma "economia socialista de mercado", a qual, no contexto chinês, não é senão um eufemismo para capitalismo. Na década de 1990, a maior parte do Estado e das empresas possuídas colectivamente na China foram privatizadas. Dezenas de milhões de trabalhadores do Estado e do sector colectivo foram despedidos. Os trabalhadores remanescentes do sector estatal perderam os seus direitos socialistas tradicionais simbolizado pelo “iron rice bowl” (um pacote de direitos económicos e sociais que incluía segurança de emprego, cuidados médicos, infantários, pensões e habitação subsidiada) e foram reduzidos a trabalhadores assalariados explorados por capitalistas internos e estrangeiros. Nas áreas rurais, com o desmantelamento das comunas populares, os sistemas públicos de cuidados médicos e de educação entraram em colapso. Mais de uma centena de milhão tornaram-se trabalhadores migrantes, formando o maior exército de reserva do mundo de trabalho barato.

Tabela  2. A Tabela 2 compara a taxa salarial dos trabalhadores chineses com taxas salariais em países seleccionados. Uma taxa salarial de trabalhador médio na China é cerca de um vigésimo daquela nos Estados Unidos, um sexto daquela na Coreia do Sul, um quarto daquela na Europa do Leste e a metade daquela no México ou no Brasil. A taxa salarial média chinesa agora parece ser mais alta do que aquela em países vizinhos do Sudeste Asiático. Mas a taxa salarial média chinesa pode estar superestimada pois as estatísticas oficiais de salários cobrem apenas os trabalhadores no sector urbano formal e não incluem os trabalhadores migrantes.

Uma força de trabalho grande, produtiva e barata permite aos capitalistas chineses e aos capitalistas estrangeiros na China lucrarem com a exploração intensa e maciça. Contudo, isto levanta a questão de como o montante maciço de valor excedente (surplus value) produzido pelos trabalhadores chineses pode ser realizada através da "procura efectiva". Com a maioria dos trabalhadores e camponeses chineses pesadamente explorados, o consumo de massa tem estado a crescer, na melhor das hipóteses, a um ritmo mais vagaroso do que a economia em geral. Como o consumo de massa fica para trás, a economia chinesa tem dependido cada vez mais do investimento e de exportações para guiar a expansão da procura.

Tabela 3. A Tabela 3 apresenta indicadores seleccionados da economia chinesa. O rendimento do trabalho (a soma dos rendimentos salariais dos residentes urbanos e dos rendimentos líquidos dos camponeses) em proporção do PIB da China caiu de 51-52 por cento na década de 1980 para 38 por cento no princípio dos anos 2000. Analogamente, o consumo familiar em proporção do PIB caiu de 50-52 por cento na década de 1980 para 41 por cento no princípio dos anos 2000. Em contraste, a proporção de investimento no PIB ascendeu mais de 40 por cento e a proporção das exportações cresceu mais de 30 por cento.

As exportações líquidas já davam uma contribuição significativa para o crescimento económico da China no fim da década de 1990 e princípio da de 2000. Desde então, o excedente comercial da China experimentou um crescimento explosivo. Em 2007, a China tinha um enorme excedente em conta corrente de US$378 mil milhões, ou 12 por cento do PIB da China. Dentro de poucos anos, espera-se que a China ultrapasse a Alemanha e se torne o maior exportador do mundo.

Por quanto tempo poderá o actual modelo de crescimento da China ser sustentado? Os Estados Unidos representam cerca de 20 por cento do mercado exportação geral da China. Em 2007, a União Europeia como um todo (incluindo a Eurozona, o Reino Unido e os novos Estados membros da Europa do Leste) realmente substituíram os Estados Unidos e tornaram-se o maior mercado único de exportações da China. Contudo, para a China incorrer em grandes excedentes em conta corrente, algumas outras economias tem de incorrer em grandes défices em conta corrente. A balança de transacções correntes geral da Europa tem estado num equilíbrio grosseiro. De uma perspectiva global, os excedentes em conta corrente da China tem sido inteiramente absorvidos pelos défices estado-unidenses em conta corrente. Se os Estados Unidos não incorrerem mais em grandes defíces corrente, então, a menos que a Europa comece a incorrer em grandes défices, será muito difícil para China sustentar seus grandes excedentes comerciais.

O nível de investimento excessivamente elevado da China resulta numa procura maciça de energia e matérias-primas. Em 2006 a China consumiu um terço do aço mundial e um quarto do alumínio e do cobre mundial. O consumo de petróleo da China foi de 7 por cento do total mundial, mas a partir 2000 a China tem representado um terço da procura de petróleo incremental total do mundo. A procura maciça da China foi um factor importante por trás da escalada dos custos globais de energia e matérias-primas. Entre Janeiro de 2003 e Janeiro de 2008, o índice mundial dos preços da energia no mundo ascendeu 170 por cento e o índice mundial dos preços de metais ascendeu 180 por cento. [2]

Se o nível actual de investimento for sustentado por mais alguns anos, isto deixaria a China com um maciço excesso de capacidade de produção que é muito maior do que o necessário para atender a procura final no mercado mundial e muito maior do que pode ser suportado pela oferta mundial de energia e matérias-primas. A China seria então ameaçada com uma grande crise económica. Para a economia chinesa ser reestruturada numa base mais "sustentável" (do ponto de vista da sustentabilidade da acumulação capitalista), a economia chinesa tem de ser reorientada em direcção à procura interna e ao consumo.

Como o investimento e as exportações líquidas da China têm estado a crescer mais rapidamente do que a economia global, a fatia combinada do consumo familiar e do governo agora representa pelo menos 50 por cento do PIB. Se o investimento retornasse para níveis mais sustentáveis (cerca de 30-35 por cento do PIB) e o excedente comercial se tornasse mais pequeno (0-5 por cento do PIB), então a fatia conjunta do consumo familiar e do governo precisaria ascender mais do que 15 pontos percentuais, para 65 por cento do PIB. Mas para o consumo crescer, o rendimentos dos trabalhadores e camponeses e o gasto social do governo têm de crescer em conformidade. A Tabela 3 mostra a estreita correlação entre rendimento do trabalho e consumo familiar. Daí decorre que deve haver uma maciça redistribuição do rendimento dos capitalistas para o trabalho e os gastos sociais numa quantia equivalente a cerca de 15 por cento do PIB.

Será que a classe capitalista chinesa será suficientemente esclarecida para empreender uma tal reestruturação económica e social? Suponha-se que a liderança do Partido Comunista Chinês tenha vistas suficientemente largas para entender que, para a segurança dos interesses a longo prazo do capitalismo chinês, seja necessário efectuar algumas concessões aos trabalhadores e camponeses chineses. Será que o partido terá a vontade necessária e o meios para impor uma tal redistribuição às corporações transnacionais, aos ricos capitalistas chineses (muitos dos quais têm íntimas ligações dentro do partido e do governo), e aos governos provinciais e locais que nos últimos anos desenvolveram várias alianças com os capitalistas internos e estrangeiros? Estas são algumas perguntas difíceis para as elites capitalistas chinesas.

O Pico Petrolífero e os limites da acumulação

Suponha-se que a classe capitalista chinesa tenha a necessária clarividência e vontade para efectuar uma reestruturação keynesiana, estilo social-democrata. Será que uma tal reestruturação conduzirá o capitalismo chinês a um caminho de crescimento sustentável e rápido, e será que a expansão da economia chinesa conduzirá por sua vez a economia capitalista global a uma outra "era dourada"?

A Tabela 3 mostra o crescimento do consumo de energia na China. A partir de 2000 ele acelerou-se muito. Representa agora 15 por cento do total mundial e equivale a 70 por cento do consumo de energia dos EUA. À taxa de crescimento actual, o consumo de energia da China duplicará em sete anos e a China dentro em breve ultrapassará os Estados Unidos e tornar-se-á o maior consumidor de energia do mundo. A China depende do carvão para cerca de70 por cento do seu consumo energético total e o consumo de carvão do país também está a crescer a uma taxa que indica uma duplicação em sete anos. O consumo de petróleo da China (já representando um terço da procura incremental do petróleo mundial) está a crescer a uma taxa que implica uma duplicação em nove anos. Por outras palavras, em cerca de uma década, se a tendência actual se mantiver, a China consumirá uma vez e meia tanta energia quanto os Estados Unidos consomem hoje. Será que a oferta mundial de energia se manterá ao ritmo da procura em crescimento rápido da China enquanto atende à procura do resto do mundo?

A economia capitalista global depende de combustíveis fósseis (petróleo, gás natural e carvão) em 80 por cento da oferta mundial de energia. O petróleo representa um terço da oferta total de energia e 90 por cento da energia utilizada no sector dos transportes. O petróleo é também um input essencial para a produção de fertilizantes, plásticos, remédios modernos e outros produtos químicos.

O petróleo é um recurso renovável. Num estudo recente, o Energy Watch Group alemão destaca que as descobertas mundiais de petróleo atingiram o pico na década de 1960, a produção de petróleo já atingiu o pico em 25 grandes países ou regiões produtoras, e apenas nove países ou regiões ainda têm potencial de crescimento. Todas as grandes companhias de petróleo internacionais estão a lutar para impedir o declínio da sua produção de petróleo. [3]

Colin Campbell, da Association for the Study of Peak Oil and Gas estima que a produção mundial de todos os líquidos (inclui petróleo bruto, areias asfálticas, xistos betuminosos, líquidos de gás natural, processos gas-to-liquids e coal-to-liquids, e biocombustíveis) provavelmente atingirá o pico cerca de 2010. Após o pico, a produção mundial de petróleo cairá cerca de 25 por cento no ano 2020 e cerca de dois terços em 2050. Campbell também estima que a produção mundial de gás natural atingirá o pico em 2045. Num estudo anterior, o Energy Watch Group alemão espera que a produção mundial de carvão atinja o pico em 2025. [4]

A energia nuclear e muitas fontes de energia renovável (tais como solar e vento), além das suas muitas outras limitações, não pode ser utilizada para fabricar combustíveis líquidos e gasosos ou servir como matéria-prima em indústrias químicas. A biomassa é a única fonte de energia renovável que pode ser utilizada como substituto para combustíveis fósseis na fabricação de combustíveis líquidos ou gasosos. Mas a produção em grande escala de biomassa poderia conduzir a problemas ambientais muito sérios, e o potencial de biomassa está limitada pela quantidade disponível de terra produtiva e água. Ted Trainer, um eco-socialista australiano, estima que atender a actual procura estado-unidense de petróleo e gás exigiria o equivalente a nove vezes de todas as terras agriculturáveis dos EUA ou que oito vezes toda a terra actualmente florestada dos EUA fosse plenamente dedicada à produção de biomassa. Trainer conclui que "não há possibilidade de que mais do que um fracção muito pequena da procura de combustíveis líquidos e gasosos possa ser atendida por fontes de biomassa". [5]

Se a produção mundial de petróleo e a produção de outros combustíveis fósseis alcançar seu pico e começar a declinar nos próximos anos, então a economia capitalista global enfrentará uma crise sem precedentes que será difícil ultrapassar.

O esgotamento rápido de combustíveis fósseis é apenas um entre muitos problemas ambientais sérios com que o mundo hoje se confronta. O sistema económico capitalista está baseado na produção para o lucro e a acumulação de capital. Numa economia capitalista global, a competição entre capitalistas individuais, corporações e Estados capitalistas força cada um deles, constantemente, a perseguir a acumulação de capital em escalas cada vez maiores.

Portanto, sob o capitalismo, há uma tendência para a produção material e o consumo expandirem-se incessantemente. Após séculos de acumulação implacável, os recursos não renováveis do mundo estão a ser esgotados rapidamente e o sistema ecológico da terra está agora à beira do colapso. A sobrevivência da civilização humana está em risco. [6]

Alguns argumentam que, devido ao progresso tecnológico, os países capitalistas avançados tornaram-se "desmaterializados" (diminuindo a quantidade de materiais e energia por unidade de produção) pois o crescimento económico repousa mais sobre serviços do que sobre o sector industrial tradicional, o que tornaria o crescimento económico menos prejudicial ao ambiente. De facto, muitos dos modernos sectores de serviços (tais como transportes e telecomunicações) são altamente intensivos em energia e recursos.

Apesar de tais afirmações respeitantes à desmaterialização, os países capitalistas avançados são ecologicamente muito mais desperdiçadores do que a periferia, com consumo per capita de energia e recursos e uma pegada ecológica (ecological fooprint) de longe mais alta do que a média mundial. Segundo o Living Planet Report, a América do Norte tem uma pegada ecológica per capita de 9,4 hectares globais, mais do que quatro vezes a média mundial (2,2 hectares globais). A União Europeia, supostamente amiga do ambiente, tem uma pegada ecológica de 4,8 hectares globais, ou seja, mais do que o dobro da média mundial. Cuba, o único país que permanece comprometido com objectivos socialistas entre os Estados socialistas históricos, é o único país que alcançou um alto nível de desenvolvimento humano (com um índice de desenvolvimento humano superior a 0,8) ao mesmo tempo que tem uma pegada ecológica per capita menor do que a média mundial. [7]

A apregoada desmaterialização das economias capitalistas avançadas, no sentido mais vasto e mais significativo do declínio do impacto ambiental global, são de facto refutadas pelo Paradoxo de Jevons, o qual diz que a eficiência acrescida na aportação de energia e materiais normalmente conduz a um aumento na escala de operações, e através disso a uma ampliação da pegada ecológica geral. Isto tem sido um padrão normal através da história do capitalismo. [8]

Além disso, parte do que é mencionado como desmaterialização decorre da relocalização do capital industrial dos países capitalistas avançados para a periferia em busca de trabalho barato e baixos padrões ambientais. A ascensão dramática do capitalismo chinês resultou parcialmente desta relocalização capitalista global. Embora os países capitalistas avançados possam ter-se tornado ligeiramente "desmaterializados" neste sentido, os capitalistas e as chamadas classes média na China, Índia e Rússia, e grande parte da periferia, estão a emular e reproduzir o estilo de vida "consumista" capitalista que é muito desperdiçador numa escala maciçamente ampliada. O capitalismo global como um todo continua a mover-se implacavelmente rumo à catástrofe ambiental global.

A morte do neoliberalismo e a era de transição

Em 1 de Fevereiro, Immanuel Wallertein, o principal teórico do sistema mundial, nos seus comentários bisemanais declarou o ano 2008 como o ano da "Morte da globalização neoliberal". Wallerstein começa por destacar que, ao longo da história do sistema-mundo capitalista, as ideias de capitalismo de mercado livre com intervenção governamental mínima e as ideias de capitalismo regulado pelo estado com alguma protecção social estiveram na moeda em ciclos alternados.

Em resposta à estagnação do lucros à escala mundial na década de 1970, o neoliberalismo tornou-se politicamente dominante nos países capitalistas avançados, na periferia e, finalmente, no antigo bloco socialista. Contudo, o neoliberalismo fracassou no cumprimento da sua promessa de crescimento económico, e quando as desigualdades globais aumentaram, grande parte da população mundial sofreu declínios nos rendimentos reais. Após meados dos anos 1990, o neoliberalismo deparou-se com resistência crescente por todo o mundo e muito governos tem estado sob pressão para restaurar alguma regulação estatal e protecção social.

Confrontada com a crise económica, a administração Bush perseguiu em simultâneo uma nova ampliação das desigualdades internamente e o imperialismo unilateral no exterior. Estas políticas por agora fracassaram decisamente. Quando os Estados Unidos já não podem financiar sua economia e suas aventuras imperialistas com dívida externa cada vez maior, o US dólar, acredita Wallerstein, enfrenta a perspectiva de uma queda livre e deixará de ser a divisa de reserva do mundo.

Wallerstein conclui: "O desequilíbrio político está a balouçar para trás... A questão real não é se esta fase está ultrapassada mas se o balouço de volta será capaz, como no passado, de restaurar um estado de equilíbrio relativo no sistema-mundo. Ou foi efectuado demasiado dano? E estaremos nós agora incapazes de evitar o caos mais violento na economia-mundo e portanto no sistema-mundo como um todo?" [9]

Seguindo os argumentos de Wallerstein, nos próximos anos iremos provavelmente testemunhar um grande realinhamento da política global e das forças económicas. Haverá uma intensificação na luta de classe global acerca da direcção da transformação social global. Se estivermos num dos ciclos do sistema-mundo capitalista, portanto rumo ao fim do actual período de instabilidade e crise, provavelmente observaremos um retorno ao domínio keynesiano ou politicas capitalistas de Estado capitalistas por todo o mundo.

Contudo, foi feito demasiado dano. Após séculos de acumulação capitalista global, o ambiente global está à beira do colapso e não há mais espaço ecológico para uma outra grande expansão do capitalismo global. A escolha é nítida — ou a humanidade permitirá que o capitalismo destrua o ambiente e portanto a base material da civilização humana, ou destruirá o capitalismo primeiro. A luta pela sustentabilidade ecológica devem somar forças com as lutas dos oprimidos e explorados para reconstruir a economia global na base da produção para as necessidades humanos de acordo com princípios democráticos e socialistas.

Neste sentido, entrámos numa nova era de transição. No fim desta transição, de um modo ou de outro, estaremos num mundo fundamentalmente diferente e cabe a nós decidir que espécie de mundo virá a ser.

Notas
1. A dívida externa líquida equivale à soma acumulada dos défices de transacções correntes. Se assumirmos que o défice de transacções correntes dos EUA permanece em 6 por cento do PIB, a taxa de crescimento do PIB nominal americano continuar em 5 por cento ao ano, e que não há mudança na taxa de câmbio, então teoricamente o rácio da dívida externa líquida americana em relação ao PIB manter-se-á ascendendo até 120 por cento.
2. Martin Wolf, “China Changes the Whole World,” Financial Times , January 23, 2008.
3. The Germany Energy Watch Group, “Crude Oil—The Supply Outlook,” EWG-Series no. 3 (October 2007), http://www.energywatchgroup.org .
4. The Association for the Study of Peak Oil and Gas, Newsletter No. 86 (February 2008); The Germany Energy Watch Group, “Coal: Resources and Future Production,” EWG-Series No. 1 (March 2007), http://www.energywatchgroup.org .
5. Ted Trainer, Renewable Energy Cannot Sustain A Consumer Society (Dordrecht, Netherlands: Springer, 2007), 73–92.
6. Sobre o potencial de destruição da acumulação capitalista sobre o ambiente global, ver John Bellamy Foster, “The Ecology of Destruction,” Monthly Review 58, no. 8 (February 2008): 1–14.
7. World Wildlife Fund, Zoological Society of London, and Global Footprint Network, Living Planet Report (2006), http://www.panda.org/downloads/living_planet_report.pdf .
8. John Bellamy Foster, Ecology Against Capitalism (New York: Monthly Review Press, 2002), 94–95.
9. Immanuel Wallerstein, “2008: The Demise of Neoliberal Globalization,” Commentary no. 226 (February 1, 2008), http://www.binghamton.edu/fbc/226en.htm .


[*] Ensina teoria económica na Universidade de Utah, em Salt Lake City.

O original encontra-se em http://monthlyreview.org/080401li.php

Resistir Info - 18/04/08

O colapso financeiro dos EUA acabará com a Guerra do Iraque
– E não serão os EUA a escolher o momento

por Mike Whitney

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"Venha e veja nossas morgues transbordantes e descubra nossos pequeninos...
Poderá encontrá-los neste ou naquele canto, uma pequena mão espetada, a apontar para si...
Venha e procure por eles no entulho dos raids aéreos "cirúrgicos", poderá encontrar uma pequena perna ou uma pequena cabeça... a pedir sua atenção.
Venha e veja-os amontoados em montes de lixo, a catar restos de comida...
Venha e veja, venha..."
"Flying Kites", Layla Anwar

Os militares americanos venceram todas as batalhas que combateram, mas perderam a guerra.

As guerra são vencidas politicamente, não militarmente. Bush não entende isto. Ele ainda mantém a crença de que uma colonização política pode ser imposta pela força. Mas está errado. A utilização de força esmagadora só espalha a violência e aumenta a instabilidade política. Agora o Iraque é ingovernável. Era este o objectivo? Quilómetros de muralhas de betão a prova de dinamite agora serpenteiam Bagdad para separar as partes combatentes; o país está fragmentado em uma centena de pedaços mais pequenos, cada um deles dominado por comandantes da milícia local. Trata-se de sinais de fracasso, não de êxito. Eis porque o povo americano já não pode apoiar a ocupação. Ele está a ser prático, sabe que o plano de Bush não funcionará. Como disse Nir Rosen, "o Iraque tornou-se a Somália".

A administração ainda apoia o presidente iraquiano Nouri al Malik, mas al-Maliki é uma figura de proa sem significado que não terá qualquer efeito sobre o futuro do país. Ele não tem base popular de apoio e nada controla para além das muralhas da Zona Verde. O governo al-Maliki é meramente uma fachada árabe concebida para convencer o povo americano de que está a ser feito algum progresso político, mas não há progresso. É uma simulação. O futuro está nas mãos dos homens com armas; foram eles que dividiram o Iraque em feudos controlados localmente e são eles que acabarão por decidir quem dirige o Estado. No momento, o combate entre facções está a ser descrito como "guerra sectária", mas a expressão é intencionalmente enganadora. O combate é de natureza política; as várias milícias estão a competir umas com as outras para ver quem preencherá o vácuo deixado pela remoção de Saddam. É uma luta pelo poder. Os media gostam de retratar o conflito como um choque entre árabes semi-loucos – "nostálgicos desesperados (dead-enders) e terroristas" – que gostam da ideia de matar seus compatriotas, mas isso é apenas um meio de demonizar o inimigo. Na verdade, a violência é inteiramente racional; é a reacção inevitável à dissolução do Estado e à ocupação por tropas estrangeiras. Muitos peritos militares previram que haveria erupções de combates após a invasão inicial, mas as suas advertências foram ignoradas por políticos despistados e os media coniventes. Agora a violência deflagrou outra vez em Bassorá e Bagda, e não há fim à vista. Só uma coisa parece certa, é que o futuro do Iraque não será decidido na urna eleitoral. Bush garantiu isto.

Os militares estado-unidenses não dominam o Iraque nem têm o poder para controlar acontecimentos no terreno. Eles são apenas uma das muitas milícias que competem pelo poder num Estado que é dirigido pelos senhores da guerra. Depois de o exército efectuar operações de combate ele é forçado a retirar-se para os seus campos e as suas bases. Este ponde precisa ser enfatizado a fim de entender que não há futuro real para a ocupação. Os EUA simplesmente não têm a mão-de-obra para manter o território ou estabelecer segurança. De facto, a presença de tropas americanas incita à violência porque elas são encaradas como forças de ocupação, não como libertadores. Inquéritos mostram que a vasta maioria do povo iraquiano quer as tropas americanas saiam. Os militares destruíram demasiado do país e sacrificaram demasiadas pessoas para esperar que estas atitudes venham a alterar-se em qualquer momento próximo. A poetisa e bloguista iraquiana Layla Anwar resumiu os sentimentos de muitas das vítimas de guerra num post recente no seu sítio web An Arab Woman Blues - Reflections in a sealed bottle... .

"Às portas da Babilónia a grande, você ainda está a lutar, a combater, perseguir este ou aquele, deter, bombardear do alto, preencher morgues, hospitais, cemitérios e embaixadas e fronteiras com filas para vistos de saída.
"Nenhum iraquiano deseja sua presença. Nenhum iraquiano aceita sua ocupação.
"Levem a notícia aos FDPs, vocês nunca controlarão o Iraque, nem em seis anos, nem em dez anos, nem em 20 anos... Vocês trouxeram sobre si próprios o ódio e a maldição de todos os iraquianos, dos árabes e do resto do mundo... agora enfrentem a vossa agonia". (Layla Anwar; "An Arab Woman's Blues: Reflections in a sealed bottle")

Será que Bush espera mudar a mente de Layla ou dos milhões de outros iraquianos que perderam seus seres queridos ou foram forçados ao exílio ou viram o seu país e a sua cultura esmagados debaixo da bota da ocupação estrangeira? A campanha pelos corações e mentes está perdida. Os EUA nunca serão bem vindos no Iraque.

De acordo com um inquérito publicado na revista médica britânica Lancet, mais de um milhão de iraquianos foram mortos na guerra. Outros quatro milhões foram deslocados internamente ou abandonaram o país. Mas os números nada nos dizem acerca da magnitude do desastre que Bush provocou ao atacar o Iraque. A invasão é a maior catástrofe humana no Médio Oriente desde a Nabka em 1948. Os padrões de vida declinaram abruptamente em toda a área – mortalidade infantil, água limpa, alimentação, segurança, fornecimentos médicos, educação, energia eléctrica, emprego, etc. Mesmo a produção de petróleo ainda está abaixo dos níveis anteriores à guerra. A invasão é o mais abrangente fracasso político desde o Vietnam, tudo deu errado. O coração do mundo árabe caiu no caos. O sofrimento é incalculável.

O problema principal é a ocupação; é o catalizador primário para a violência e um obstáculo para a arrumação política. Enquanto a ocupação persistir perdurará o combate. As afirmações que o chamado aumento repentino [de tropas] mudaram a paisagem política são altamente exageradas. O tenente-general reformado William Odom comentou acerca deste ponto numa entrevista no Jim Lehrer News Hour:

"O aumento repentino (surge) manteve a instabilidade militar e nada alcançou em termos de consolidação política. As coisas estão muito pior agora. E não as vejo a ficarem melhores. Isto era previsível um ano e meio atrás. E continuar a apresentar o verniz cozinhado das meias verdades confortáveis é enganar o público americano e faze-los pensar que não é a charada que realmente é... Quando se diz que está a ter lugar a libanização do Iraque, sim, mas não por causa do Irão e sim porque os EUA entraram e tornaram esta espécie de fragmentação possível. E ela verificou-se ao longo dos últimos cinco anos... O governo al-Maliki está agora em pior estado... A noção de que há alguma espécie de progresso é absurda. O governo al-Maliki utilizar o seu Ministério do Interior como uma milícia de esquadrão da morte. Assim, chamar Sadr de extremista e Maliki de bom rapaz é simplesmente não perceber a realidade de que não há bons rapazes". (Jim Lehrer News Hour)

A guerra do Iraque estava perdida antes de o primeiro tiro ser disparado. O conflito nunca teve o apoio do povo americano e o Iraque nunca representou uma ameaça para a segurança nacional dos EUA. Todos os pretextos para a guerra eram baseados em mentiras; foi um golpe orquestrado pelas elites e os media para executar uma agenda da extrema-direita. Agora a missão fracassou, mas ninguém quer admitir seus erros através da retirada; assim a carnificina continua sem interrupção.

Como acabará

A administração Bush decidiu adoptar uma estratégia que não tem precedentes na história americana. Decidiu perseverar numa guerra que já foi perdida moralmente, estrategicamente e militarmente. Mas combater uma guerra perdida tem os seus custos. A América está muito mais fraca agora do que quando Bush tomou posse para o seu primeiro mandato em 2000, política, económica e militarmente. O poder e o prestígio americanos continuarão a deteriorar-se por todo o mundo até que as tropas sejam retiradas do Iraque. Mas é improvável que isto aconteça até que todas as outras opções tenham sido esgotadas. As condições económicas em deterioração nos mercados financeiros estão a colocar enorme pressão baixista sobre o dólar. Os mercados de acções e títulos corporativos estão em desordem; o sistema bancário está a entrar em colapso, os gastos do consumidor estão baixos, as receitas fiscais estão em queda, e o país a caminho de uma penosa e prolongada recessão. Os EUA deixarão o Iraque mais cedo do que muitos acreditam, mas não o farão num momento escolhido por si. Ao invés disso, o conflito finalizará quando os Estados Unidos não tiverem mais capacidade para travar a guerra. Esse momento não está muito longe.

A Guerra do Iraque assinala o fim do intervencionismo estado-unidense durante pelo menos uma geração; talvez mais ainda. O fundamento ideológico para a guerra (apropriação/mudança de regime) revelou-se como uma justificação sem base para agressão não provocada. Alguém terá de ser responsabilizado. Terá de haver tribunais internacionais para determinar quem é responsável pelas mortes de mais de um milhão de iraquianos.

18/Abril/2008
O original encontra-se em http://www.globalresearch.ca/index.php?context=va&aid=8730

Instituto Humanitas Unisinos - 24/04/08

Mugabe pretende anular eleição

A imprensa estatal do Zimbábue está levantando a possibilidade de que Robert Mugabe vai anular a eleição presidencial do mês passado e instalar um governo de união nacional, mantendo-se no cargo de presidente, enquanto uma nova Constituição é negociada. A proposta, publicada num artigo do jornal local Herald, não é um plano formal do Zanu-PF, mas a publicação geralmente é usada pelo partido no poder para preparar o terreno para mudanças políticas. A notícia é do Jornal do Brasil, 24-04-2008 e do Corriere della Sera, 23-04-2008.

Instituto Humanitas Unisinos - 24/04/08

A perversão dos ideais – o liberalismo

“Em seu surgimento, o liberalismo aparece como um movimento de ruptura, em claro antagonismo com o Antigo Regime, em sua dupla dimensão política e religiosa, às quais se opõe e quer substituir”, diz José Vidal-Beneyto. Por conta disso, “a conjunção destes dois absolutismos [a Igreja Católica e a Monarquia] faz da luta liberal contra eles um dos primeiros movimentos de libertação política na Europa ocidental”.

Entretanto, escreve Vidal-Beneyto, os pais fundadores e seus teóricos mais recentes “construíram um impressionante corpo doutrinal que representa uma proposta filosófica e político-econômica digna, que eu inevitavelmente banalizei, e que o lamentável trabalho dos políticos e a voracidade do lucro transformaram num mundo de horrores”.

Segue a íntegra do artigo de José Vidal-Beneyto publicado no El País, 12-04-2008. A tradução é do Cepat.

Para efeito desta reflexão, o ideal é um conjunto de princípios, valores e propostas a cuja realização aspiram os seres humanos num determinado âmbito ou na totalidade de suas existências. As grandes formações políticas, os corpos doutrinais que as sustentam e os marcos referenciais que as demarcam sofrem transformações com o passar do tempo, e, às vezes, desembocam em contra-imagens que pervertem seus valores iniciais e são uma dramática caricatura de sua versão inicial.

Esse foi o destino dos principais movimentos políticos – liberalismo, socialismo, comunismo, anarquismo, conservadorismo e fascismo –, assim como das forças que os apoiaram, que ocuparam o espaço político durante os últimos dois séculos e sem solução de continuidade.

Dentre eles, hoje, na perspectiva democrática do mundo ocidental, os mais robustos são o liberalismo e as versões atenuadas do socialismo, que conhecemos como social-democráticas e, mais conservadoramente, social-liberais.

Em seu surgimento, o liberalismo aparece como um movimento de ruptura, em claro antagonismo com o Antigo Regime, em sua dupla dimensão política e religiosa, às quais se opõe e quer substituir. A impugnação do absolutismo religioso e a batalha pela secularização, que entronca com a colocação básica da ideologia do Iluminismo, supõe um enfrentamento frontal com as posições da Igreja católica alinhada com as opções da Monarquia e estreitamente associada às práticas absolutistas do poder real.

A conjunção destes dois absolutismos faz da luta liberal contra eles um dos primeiros movimentos de libertação política na Europa ocidental. O impulso para a democracia neles subentendido constitui, como assinala Pierre Manent em História Intelectual do Liberalismo (Rio de Janeiro: Imago, 1998), uma determinação democrática permanente que voltaremos a encontrar em sua ação contra os poderosos por herança, na desqualificação do Estado e sua oposição à dominação das massas.

Essa pulsão inesgotável acabará produzindo a convergência de liberalismo e democracia numa das figuras dominantes da contemporaneidade política: o liberalismo democrático ou demoliberalismo. Seus pilares fundamentais são os interesses e os indivíduos, ou mais precisamente os interesses individuais únicos capazes de organizar uma comunidade livre e autônoma, suscetíveis de cobrir suas necessidades naturais, sem que as opiniões nem as paixões interfiram nessa satisfação, o que é seu primeiro direito natural básico e ao qual ninguém pode se opor.

Matriz que desemboca em três grandes blocos: direito à vida e à integridade física; direito à propriedade e ao trabalho, que é o que nos assegura a subsistência, e direito à liberdade e à crítica, que são os que nos garantem o poder de escolher o que mais nos convém. A organização e o poder político não têm outra razão de ser que afiançar e proteger esses direitos.

A conjunção entre fins do indivíduo e cumprimento social se realiza no intercâmbio de bens e serviços cuja eficácia igualitária repousa na eliminação de grupos e classes dominantes herdeiras que falseiam a troca e perpetuam a injustiça. A troca se realiza num espaço privilegiado da sociedade, o mercado, que não necessita de nenhum poder nem regras alheias a ele, porque dispõe de disposições reguladoras próprias, as leis do mercado, que, além disso, são presididas por “uma mão invisível” que opera por si só a partir de dentro, afiançando e preservando sua articulação.

Os pais fundadores, John Locke, Adam Smith, Edmund Burke, Thomas Paine, François Guizot e Jean-Baptiste Say, e os mais próximos, Tocqueville, Stuart Mill, Von Mises, Von Hayek, Jouvenel e Aron construíram um impressionante corpo doutrinal que representa uma proposta filosófica e político-econômica digna, que eu inevitavelmente banalizei, e que o lamentável trabalho dos políticos e a voracidade do lucro transformaram num mundo de horrores.

Dany-Robert Dufour acaba de publicar – em Le divin marché. La révolution culturelle libérale [O divino mercado. A revolução cultural liberal] – um inventário dos mesmos em forma de mandamentos: “Deixar-te-ás guiar exclusivamente pelo egoísmo”, “Utilizarás os outros como meio para alcançares os teus objetivos”, “Combaterás todos os Estados e governos”, “Violarás as leis sem que te condenem”, e assim por diante até dez.

Ilustrando a máxima de Mandeville, “os vícios privados produzem a riqueza pública”, o que reduz o ideal liberal a uma abominável caricatura.

Instituto Humanitas Unisinos - 24/04/08

Crise de alimentos no Haiti leva a fuga pelo mar

A fome e o custo de vida podem criar uma nova onda de refugiados marítimos no Haiti, alertam autoridades e analistas do país, onde duas semanas de protestos diários levaram recentemente à queda do primeiro-ministro. A reportagem é de Joseph Guyler Delva e publicada pelo portal do jornal O Globo, 23-04-2008.

Na pequena Montrouis, 80 quilômetros ao norte de Porto Príncipe, haitianos em desespero prometem aproveitar a primeira oportunidade de embarcar num navio que os leve aos Estados Unidos e os tire da miséria no país mais pobre do Ocidente.

"Vou partir no próximo barco para Miami, porque não consigo mais resistir a esta fome", disse à Reuters na terça-feira Marcel Jonassaint, 34 anos, que se distraía sentado perto do porto, descalço, atirando pedrinhas no mar.

"Tenho quatro filhos, não tenho emprego, é tudo caro, mesmo para os que estão trabalhando", disse Jonassaint. "Então o que você quer que eu faça?"

Montrouis é uma localidade conhecida como ponto de partida para os barcos com migrantes. "Eu já tinha ido embora neste ano. Nosso barco foi interceptado em alto-mar, mas vou tentar de novo", afirmou a sorridente Rachel Chavanne, 29 anos. "Conheço algumas pessoas, como um primo meu, que tiveram sucesso na viagem. Um dia minha vez também vai chegar."

Há poucos dias, o Parlamento destituiu o primeiro-ministro Jacques Eduard Alexis, na esperança de que isso aplacasse os protestos e saques provocados pelo aumento dos preços dos alimentos. Pelo menos seis pessoas morreram nesses incidentes.

Jeanne Bernard Pierre, diretora de assuntos migratórios do governo, disse que desde o início da crise alimentar sua agência recebeu em uma só semana mais haitianos repatriados em barcos do que habitualmente recebe em um mês ou mais.

"Recebemos 213 repatriados na semana passada, acabamos de receber 227 e estamos recebendo 114 amanhã", disse Pierre na terça-feira à Reuters.

"Está claro que mais 'boat people' [refugiados navais] estão deixando o país, e deveria se esperar ainda mais caso não consigam encontrar uma alternativa", disse Pierre, que pediu ao governo e à comunidade internacional que criem programas para ajudar os haitianos mais miseráveis.

FOTOS DE TUBARÕES

A Guarda Costeira dos EUA interceptou 972 haitianos no mar desde 1o. de outubro. No mesmo período de 2007, apenas 376 migrantes haviam sido capturados. Mas essas cifras habitualmente variam bastante, de modo que é impossível vincular eventuais picos com qualquer fato específico, como a crise alimentar, segundo Barry Bena, agente da Guarda Costeira norte-americana.

"Há picos em certos momentos, e há meses a fio em que não temos nenhum barco haitiano", explicou.
Pierre disse que seu departamento se empenha em convencer os haitianos a não emigrarem, mas que "eles acreditam que a única alternativa que lhes resta é partir".

Funcionários da migração estão sendo enviados a bairros pobres e litorâneos para alertar sobre o risco de viajar em embarcações improvisadas. Costumam ouvir como resposta, porém, exemplos de parentes e amigos que chegaram a Miami.

"Até mostramos fotos de tubarões comendo pessoas, mas eles dizem conhecer muitos outros que chegaram ao solo dos EUA e agora estão mandando dinheiro para parentes que ficaram no Haiti", disse Pierre.

Há frequentes relatos de afogamentos quando barcos precários e superlotados viram ou racham em sua tentativa de alcançar os EUA ou as Bahamas.

No fim de semana, um barco suspeito de transportar migrantes clandestinos virou na costa das Bahamas. Equipes de resgate recolheram 3 sobreviventes e 15 mortos, muitos deles haitianos.

O ativista de direitos humanos Renan Hedouville acha que os haitianos estão migrando devido à falta de atenção do governo e do restante do mundo. "O direito universal ao acesso a alimentos foi negligenciado a negado a muita gente. Por isso as pessoas em desespero estão indo para o mar, arriscando suas vidas e buscando uma solução que não é [solução] realmente."

Instituto Humanitas Unisinos - 24/04/08

Lula elogia desenvolvimento do país sob Médici e Geisel

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva elogiou, ontem, um dos generais a quem a esquerda brasileira mais se opôs no período da ditadura: o ex-presidente Emílio Garrastazu Médici. Inimigo de todas as instituições ligadas aos Direitos Humanos no país, acusado de comandar "os anos negros" dos governos militares - 1969 a 1974, período em que a oposição aponta como o mais violento, em que mais se torturou no Brasil - Médici foi "absolvido" por Lula por ter assinado os documentos que permitiram a criação da Embrapa e também da Itaipu Binacional, que hoje é objeto de disputa com o presidente eleito do Paraguai, Fernando Lugo, que pressiona pela revisão do contrato com o Brasil. A reportagem é de Paulo de Tarso Lyra e publicada pelo jornal Valor, 24-04-2008.

A homenagem do presidente foi prestada ao general em solenidade que celebrou, ontem, 35 anos da Embrapa. O elogio ao general, que comandou também o chamado "milagre econômico brasileiro", ocorreu em meio a um discurso de lançamento do PAC da Embrapa. Lula ressaltou que Médici foi um dos homens que levaram o país a viver um dos momentos políticos mais críticos de sua história. Mas apontou a contradição: foi ele também quem criou a Embrapa e Itaipu.

"Em uma demonstração de que cada um de nós tem uma coisa boa para oferecer. Tem coisas ruins dentro da gente, e que nós não poderemos ficar julgando eternamente as pessoas por um gesto, ou dois gestos, sem compreender os outros gestos que as pessoas fizeram, que permitiram que o Brasil encontrasse o seu rumo", destacou o presidente. Para o presidente, "cada um de nós será julgado um dia. Cada um de nós será julgado por aquilo que fez, por aquilo que deixou de fazer, pelos nossos erros e pelos nossos acertos".

Antes de citar Médici, Lula elogiou o sucessor do general, o também gaúcho Ernesto Geisel. Em outras oportunidades, o presidente petista também já havia exaltado o responsável pela anistia política, como o "presidente que comandou o último grande período desenvolvimentista do país".

Ontem, repetiu a citação. "Por isso, é com muito orgulho que, de vez em quando as pessoas falam: o Lula defende, elogia o governo Geisel, o Lula elogia não sei das quantas e tal". De todos seus antecessores, o senador José Sarney (PMDB-AP) também recebe afagos de Lula. O presidente, diversas vezes, fez mea-culpa aos ataques desferidos contra a ferrovia Transamazônica. Na época da Constituinte, Lula disse que "era uma ferrovia que ligava o nada a lugar nenhum". Hoje, orgulha-se de dar continuidade às obras do pemedebista e aliado fiel do Senado.

Lula reconciliou-se até mesmo com o ex-presidente e atual senador por Alagoas, Fernando Collor. Filiado ao PTB, partido que integra a base de sustentação do governo no Congresso, Collor foi recebido, juntamente com a bancada de senadores de seu partido, no gabinete presidencial no primeiro semestre do ano passado. Na oportunidade, Lula e Collor - que sofreu impeachment - conversaram amenidades, como "qual era a posição da sua mesa quando você estava aqui". Lula disse que as divergências do passado eram algo que deveria ficar no passado. Só não teve elogio ainda para Fernando Henrique Cardoso.