"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música"
Friedrich Nietzsche

domingo, abril 29, 2007

Instituto Humanitas Unisinos - 29/04/07

O bagre transversal

"De todo esse bafafá sobre as mudanças no Ibama e no MMA há uma lição a extrair: fracassou o objetivo central de Marina Silva ao integrar o governo. A saber, conferir "transversalidade" à questão ambiental, integrando-a ao cerne das decisões nacionais. Por ora, permanece um bagre atravessado na garganta de Lula". A opinião é de Marcelo Leite, autor do livro "Promessas do Genoma" (Editora da Unesp, 2007) em artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo, 29-04-2007.

Eis o artigo.

"A dourada (Brachyplatystoma rousseauxii), um bagre que pode alcançar mais de dois metros de comprimento, virou celebridade. O presidente Lula revoltou-se por ter de engolir esse peixe barbudo -quer dizer, dotado dos devidos barbilhões - do rio Madeira e vê-lo engasgar suas desejadas hidrelétricas Jirau e Santo Antônio.

Quem fisgou a dourada, fonte de proteínas para milhares de ribeirinhos da região amazônica, foi o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis). Sua sobrevivência é um dos vários problemas detectados no estudo de impacto ambiental dos empreiteiros, que a agência rejeitou. Lula tem razão de inquietar-se com o bagrão ambientalista. Há motivos para crer que, sem Jirau e Santo Antônio, seu segundo governo pode acabar nas barbas de um novo apagão elétrico. Os 6.450 megawatts das duas usinas vitaminam as contas de chegar do Ministério de Minas e Energia (MME) para impedir que o PAC vá para o ralo por falta de energia.

Silas Rondeau (MME) disparou um ultimato contra Marina Silva: ou o licenciamento ambiental no Madeira sai até o mês que vem, ou receberá como troco a construção de Angra-3 e mais termelétricas a óleo e carvão. Acredita-se que o titular do MME conte com o apoio de outra famigerada ministra, Dilma Rousseff (Casa Civil, ex-MME). Lula não sabe o que quer. Quer manter Marina Silva e usufruir de sua reputação internacional. Ao mesmo tempo, quer que ela se curve aos imperativos dos grandes negócios, das grandes obras e dos grandes financiadores de campanhas eleitorais.

Ou seja, quer que a ministra do Meio Ambiente atropele seu dever de ofício e arranque do Ibama sinal de verde para toda obra que o Planalto considerar inadiável. (Em outras palavras, quer porque quer que ela destrua a reputação da qual ele não quer abrir mão.) Esse, aliás, é o propósito de um esquisito projeto que o presidente da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), Jerson Kelman, levou ao Congresso "em caráter pessoal" (?): para todos os efeitos, transferir o licenciamento ambiental de empreendimentos estratégicos do Ibama para a Presidência da República.

Só de pensar que Kelman era um dos nomes comentados para substituir Marina Silva quando ainda tentavam derrubá-la... Seria como designar o operador da cadeira elétrica para capelão do corredor da morte. Não que o Ibama mereça defesa incondicional. Por má vontade, burocracia ou manobras obstrucionistas de um Ministério Público militante, o processo de licenciamento termina condenado por parte da opinião pública como excessivamente moroso. Essa reprovação não é boa para o país nem para o Ibama.

Marina Silva mudou algumas coisas no instituto. Não deu a devida atenção, porém, para a necessidade de demolir sua imagem de barricada contra o desenvolvimento, o progresso e todas essas grandes palavras com que se camuflam interesses poderosos. Palavras manejadas com desenvoltura por aqueles que defendem as decisões "científicas" da CTNBio (aquela comissão de biossegurança que é técnica antes de ser nacional), mas pedem decisões políticas, não "técnicas", do Ibama.

De todo esse bafafá sobre as mudanças no Ibama e no MMA há uma lição a extrair: fracassou o objetivo central de Marina Silva ao integrar o governo. A saber, conferir "transversalidade" à questão ambiental, integrando-a ao cerne das decisões nacionais. Por ora, permanece um bagre atravessado na garganta de Lula."

Instituto Humanitas Unisinos - 29/04/07

Concentração bancária. Três maiores bancos concentram 49% dos depósitos

Metade de todo dinheiro depositado no sistema bancário brasileiro - cerca de R$ 730 bilhões - está nas mãos de apenas três grandes instituições financeiras: Banco do Brasil, Bradesco e Itaú, que lucraram em 2006 R$ 15,4 bilhões. Juntas, elas também são responsáveis por 42,6% do total de ativos do setor no País, hoje calculado em US$ 847 bilhões, segundo levantamento feito a pedido do Estado pela agência de classificação de risco Austin Rating. A notícia é do jornal O Estado de S. Paulo, 29-04-2007.

De acordo com o estudo, de dezembro de 1994 para cá, a participação desses três bancos nos depósitos totais (à vista, a prazo, poupança e depósitos interbancários) cresceu 12,5 pontos porcentuais e a dos ativos, 6 pontos. Números que evidenciam um aumento da concentração bancária no Brasil no período e, para muitos, explicam as elevadas taxas de juros e a quantidade cada vez maior de novas tarifas cobradas pelos bancos.

E OS ESTRANGEIROS?

Na década de 90, quando os estrangeiros entraram pesadamente no País comprando várias outras instituições, como Real, Banespa e Bamerindus, esperava-se que a competição seria, enfim, instaurada. Mas nada disso ocorreu. Ao contrário. Todos os estrangeiros entraram na onda do mercado interno: os juros continuaram altos e as tarifas aumentaram.

Instituto Humanitas Unisinos - 29/04/07

Represa de Três Gargantas desaloja 1,3 milhão

Templos, rochas com inscrições seculares e vilas da região central da China ficam debaixo d’água
No começo de 2003, tomei um navio e passei três dias entre os desfiladeiros do Yang-tse (Chang Jiang), o terceiro rio mais longo do mundo, depois do Nilo e do Amazonas. Aproveitei uma das últimas oportunidades para ver uma das grandes maravilhas naturais do mundo antes que fosse destruída pela barragem da hidrelétrica de Três Gargantas, na região central da China. A notícia é do jornal O Estado de S. Paulo, 29-04-2007.

Em alguns pontos o Yang-tse é caudaloso, cor de barro, com fortíssima correnteza. Depois as águas ficam transparentes, ladeadas por montanhas. Animais silvestres, pássaros estranhos, inscrições seculares esculpidas nas rochas, vilas que eram verdadeiros patrimônios da humanidade por sua antiguidade e estilo de vida, tudo isso está condenado. No navio as pessoas estão mudas, os olhares fixados nos altos paredões das margens do rio. A cada curva, uma surpresa. Aparece um velho templo taoísta, uma escadaria imensa, uma estátua colossal cujo corpo é a montanha, ou apenas uma pequena figura humana naquela imensidão, olhando o navio, e sabemos que estamos assistindo ao desterro desse homem, quem sabe o último de uma antiquíssima geração, agora obrigado a ir para algum lugar longe de seu rio.

Além da tragédia ambiental, a construção da barragem causou um grave problema social. Mais de 1,3 milhão de pessoas foram transferidas, a maioria para o interior do país, no que ativistas dos direitos humanos chamaram de criação de “bolsões de refugiados”. Para aproveitar tijolos, portas e todas as velharias das casas e edifícios a ser submersos não se usou o processo de implosão, mas a simples marreta de pedra, o que levou a um número excessivo de acidentes de trabalho, com muitas mortes mantidas em segredo.

A barragem, que começou a ser construída em 1996, estará totalmente pronta em 2009, ao custo de US$ 25 bilhões. É o maior projeto chinês desde a Grande Muralha, 2.500 anos atrás. Sua capacidade de gerar energia será o dobro da de Itaipu, que destruiu as cachoeiras de Sete Quedas. A barragem também pretende evitar as cheias do rio e regularizar a navegação.

Instituto Humanitas Unisinos - 29/04/07

Apologia da incredulidade. Uma entrevista com Fernando Savater

"Tentei ir dos aspectos mais teóricos, abstratos e, enfim, talvez das camadas mais profundas da crença religiosa até suas repercussões mais sociais, políticas e históricas, relacionadas com os acontecimentos que hoje padecemos. Por um lado, me parece importante tentar aprofundar, não simplesmente descartar a religião como um puro fenômeno sem importância, mas tomá-la como algo muito enraizado em nossa própria construção simbólica." A declaração é do filósofo basco Fernando Savater, que dedica seu último livro, La vida eterna (Ariel), à crítica das crenças religiosas do ponto de vista político e antropológico. Contra a fé dogmática propõe uma "incredulidade ilustrada", capaz, no entanto, de aproximar-se do sagrado (mas "um sagrado material, não sobrenatural, não divino").

Fernado Savater esteve na Argentina e foi entrevistado pelo Clarín, 21-04-2007. A tradução é do Cepat.

Fernando Savater é um apaixonado pelo turfe e pela história das idéias, reconhecidíssimo divulgador da filosofia na língua espanhola, se considera mais "professor que filósofo". Escreveu quase cinqüenta ensaios, também novela, teatro e literatura infantil. Suas idéias, reunidas num Dicionário filosófico pessoal, se emolduram numa rebelião reflexiva, não isenta de humor e ironia. Especialista em ética, disciplina que define como "a convicção de que nem tudo vale igualmente, de que há razões para preferir um tipo de atuação em detrimento de outro", dedicou a ela, entre outros textos, La tarea del héroe (1982), Invitación a la ética (1982), Ética como amor própio (1988) e o célebre Ética para Amador (1991), traduzido para 18 idiomas. Incursionou na televisão, com uma exitosa série de programas sobre "Os dez mandamentos" (que logo converteu num livro Los diez mandamientos em el siglo XXI, 2005). Sua rotunda oposição ao terrorismo em todas as suas formas o converteu em alvo militar da organização armada ETA, do país basco.

O problema - retomando o assunto do primeiro parágrafo - não é tão simples. Não é só como nos desfazemos das religiões, de seus dogmas e proibições, de seus deveres impossíveis, do fanatismo de alguns clérigos e de muitos fiéis. O problema é, antes, o que aconteceria se não houvesse uma fé como a fé religiosa, nem um sentimento de gratidão - pela vida, por aqueles que amamos - ou de recolhimento pessoal, que permitisse dar sentido e gravidade à nossa existência. Que nos faça responsáveis por ela, pelo modo como escolhemos viver. (Porque se não há nada nem ninguém a quem prestar contas, por que deveria haver responsabilidade?) Ao mesmo tempo, se não queremos submeter a nossa inteligência ao ditame do irracional nem deixar abandonada nossa vocação de transcendência, onde encontraremos refúgio? Em qual imaginária República? Na natureza? Na arte?

Fernando Savater colocou sobre seus ombros esta tremenda questão (que - por outro lado - está na moda). E em seu último livro, La vida eterna, procura abarcar todos os seus aspectos do ponto de vista de um leigo, democrata, livre pensador da União Européia, que admite também, no entanto, que "somos criaturas metafísicas".

Seu ensaio parte de uma aspiração mais ou menos modesta: aplacar "esses charlatões" que, com maior ou menor pedagogia e com uma firmeza avassaladora, pretendem explicar o curso do universo inteiro por meio de insólitos recursos ao sobrenatural. Logo adentrou na origem das crenças; ali, diz, há sempre uma fraqueza, um desejo - de imortalidade, de perpetuar-se, de ser reconhecido por alguém, além - que deve ser conjurado. Para o final parece desandar o tramo inicial para recorrer novamente o caminho de pedra rumo ao sagrado.

As páginas de La vida eterna - escritas para serem compreendidas por um público amplo - vão da recusa das crenças mais triviais até a análise do vínculo entre Deus e a filosofia, entre religiosidade e humanidade. Da crítica aos usos políticos da religião e os protestos contra o Papa, à evocação de poetas e pensadores que, em tempos inquisitoriais, pagaram com sua vida o atrevimento da dúvida ou deram testemunho de sua incredulidade sem jactância. Com eles se encontrará o leitor do começo ao fim do ensaio.

Na origem da fé, diz, sempre há um desejo. Propõe então, em vez de "ter a pretensão de compreender a realidade a partir do que desejamos, tentar compreender precisamente os mecanismos reais do nosso furor desejante". Isso nos faria desejar menos?

Não, claro, não se trata de erradicar o desejo mais ou menos oculto que temos, que não confessamos de todo a nós mesmos. Mas, ao clareá-lo contribuímos para racionalizá-lo e para tirar seus aspectos excessivos.

O desejo religioso deveria ser tratado terapeuticamente como quem propõe descobrir os mecanismos do desejo homossexual para "curá-lo"?

Os desejos estão aí, digamos, e não se pode desejar ou não desejar a vontade. O que acontece é que ao menos se deve compreender até que ponto certas crenças, certas ideologias, não são pura descrição do real, mas antes projeções de nosso desejo.

Sua colocação não se dirige tanto à fé, mas à new age.

Isso é provavelmente porque as grandes crenças contêm outros elementos socializadores. Em vez de responder a um mecanismo de desejo, a fé pode ser um elemento socializador, unificador do conjunto da comunidade; ao passo que esses discursos mais sectários, mais caprichosos, estão mais diretamente relacionados com o nosso desejo singular. Por isso, distingui no livro entre fé e credulidade.

Seu livro começa com uma crítica das crenças mais vulgares e avança até uma visão cada vez mais fina do sagrado. Não há uma recusa da fé.

Tentei ir dos aspectos mais teóricos, abstratos e, enfim, talvez das camadas mais profundas da crença religiosa até suas repercussões mais sociais, políticas e históricas, relacionadas com os acontecimentos que hoje padecemos. Por um lado, me parece importante tentar aprofundar, não simplesmente descartar a religião como um puro fenômeno sem importância, mas tomá-lo como algo muito enraizado em nossa própria construção simbólica. Nossa vida não é só experiência biológica, mas também, e sobretudo, aventura simbólica. Acontece que além das religiões há as igrejas, os clérigos, os dogmas, as significações de enfrentamento político e social, as inquietações... Isso não é simplesmente religião, mas uma derivação da religião.

Desde esse nível político assinala que "se deve respeitar os crentes seja quem forem enquanto se submetem e não violam as leis do país". Mas essa afirmação não esgota a análise filosófica do fato religioso.

Acredite no que alguém acredite, o importante é separar entre esse direito do crente de crer em suas crenças religiosas e o resto da sociedade. Uma coisa é que as crenças religiosas sejam um direito e outra, que se convertam num dever para todos. O mal do fanático é que constantemente está procurando converter a religião que tem direito a ter num dever para os demais. Isso pode levar a situações de enfrentamento violento: numa mesma sociedade pode haver religiões diferentes, mas se cada uma pretende converter-se num dever para todos é inevitável o choque e a transgressão de leis que se devem ditar de acordo com princípios racionais, empíricos, e não de acordo com revelações religiosas que não estão sujeitas ao controle por parte de ninguém.

A "incredulidade realmente ilustrada", que você resgata como uma forma válida de crença, não está naturalmente orientada a exercer a crítica de qualquer submissão ou de algumas "leis vigentes"? Mesmo as da democracia européia, que em seu livro aparece como paradigma de convivência racional.

Bom, é que - homem! - essa experiência é o aprofundamento na nossa convicção simbólica. Trata-se da busca da dimensão sagrada, não manejável, não meramente utilitária, não meramente biológica, do ser humano. Procura-se aprofundar na nossa condição simbólica, na "liberdade" dos condicionantes biológicos. Essa capacidade simbólica é também capacidade crítica de leis e instituições: é uma luta contra a fatalidade. O conceito de natural está ligado à idéia de fatalidade e de leis necessárias; enquanto que a dimensão simbólica, sagrada, está ligada antes ao possível, à busca da revogação do que parece fatal a favor de outras fórmulas mais abertas, mais livres.

O judaísmo ou o cristianismo primitivo foram também modos de se opor a uma vida institucionalizada - a escravidão no Egito, o império romano -, a um status quo com "leis vigentes" que se desejava reverter. Se identificamos a religião só com o fanatismo e não com modos de lutar contra poderes opressivos lhe tiramos um aspecto historicamente importante.

Claro. Essa é a complexidade do fenômeno religioso: nele há aspectos emancipatórios e outros dogmáticos, escravizantes, e às vezes é muito difícil discernir uns dos outros. Evidentemente, há uma luta emancipatória; de fato, teóricos da utopia marxista como Ernest Bloch insistiram muito nessa dimensão libertadora utopista que se encontra em muitas religiões. Mas, essas mesmas religiões caem com facilidade em dogmas, inquisições e imposições. A história do cristianismo mostra-o muito bem.

Na sua análise do sagrada analisa o fracasso da arte em oferecer o amparo que outrora os mitos davam: "a massificação das artes, sua perda de aura reverencial - diz - compromete esta eficácia mítica" pois a arte caminha "mais para o entretenimento do que ao discernimento". Mas o problema do sagrado é com o entretenimento ou com o discernimento? É possível conciliar o sagrado e a racionalidade?

Eu creio que é possível, dentro de um limite. A racionalidade chega até um limite para além do qual ainda há um prolongamento do simbolismo em forma de desejos, mitos: o que chamamos sagrado. Se somos capazes de estabelecer os limites com certa precisão e não transgredi-los, se não tentamos converter em racional o que não pode sê-lo (porque se refere antes à imaginação e à fantasia) e, por outro lado, se não deixamos de tentar substituir a razão por imaginações ou dogmas caprichosos, ambas podem conviver.

A razão é importante para o ser humano, mas também outros estímulos o são: impulsos simbólicos que não são meramente racionais. Em tempos de esteticismo, alguns pensaram que a arte poderia dar esse prolongamento simbólico à vida humana. Hoje isso é muito difícil: a arte mais ornamental, talvez lúdica, mas não tem essa profundidade que o simbolismo pode alcançar, de modo que não pode substituir a experiência de enfrentamento com a morte que o sagrado desenvolve.

A racionalidade não admite um critério fora da "manipulação" de seus próprios "discernimentos". E os especialistas em discernir sobre a arte também não chegam a constituir-se num grupo de pertença espiritual.

Se o que se busca é um movimento que abarque uma comunidade, um grupo amplo de pessoas, essa busca não estará no estabelecimento estético da arte moderna, que exige um comentário crítico para poder ser desfrutado como arte. O problema da arte moderna é que só sabemos que é arte depois de ter lido comentários que no-las revelam como tal. Não podemos desfrutá-la diretamente. Os destinatários de uma catedral gótica viviam esse espaço simultaneamente como uma experiência religiosa, mística, artística sem necessidade de explicação.

Não precisavam do suplemento ou da revista especializada.

Não necessitavam ler nenhum Cicerone que os explicasse. Ao contrário, hoje sabemos que para desfrutar de Joseph Wilson, ou esses artistas tão modernos, necessitamos que um experto nos venha dizer que realmente isso que estamos vendo é arte e não simplesmente uma "bronca".

Por outro lado, estamos buscando o último fio, o gesto vanguardista mais radical.

Mais que uma revelação de fundo de nosso destino como seres humanos, creio que tem uma dimensão de jogo, de experimento mais leviano. Hoje é difícil que alguém realmente creia que uma obra de arte está revelando um destino; revela antes uma forma de expressão, um caráter do artista, nada mais.

Seu ensaio também termina recorrendo à arte: um poema de William Butler Yeats, "A morte", e outro de Tadeusz Rózewicz, "Medo".

São poemas muito bonitos sobre medos muito profundos, muito arraigados. O medo não é algo mau a ser erradicado, mas, em muitas ocasiões, um princípio de prudência. Mas, que seja considerado o ponto de partida adequado para uma reflexão, isso já é outra coisa.