"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música"
Friedrich Nietzsche

quarta-feira, outubro 31, 2007

Instituto Humanitas Unisinos - 30/10/07

A economia de mercado é uma fatalidade?

Não é de hoje que o movimento utilitarista e, de maneira mais sólida, o desenvolvimentismo recebem críticas de algumas correntes intelectuais. Embora proponha o crescimento econômico baseado na produção industrial, a política econômica desenvolvimentista também incentiva o consumo e aumenta as desigualdades sociais na sociedade, gerando mais pobreza e discriminação.

No Brasil, o desenvolvimentismo perdurou de 1930, com o governo Getulio Vargas até o conhecido milagre econômico, em 1980. A partir daí, com a crise financeira do País e a implantação da Constituição de 1988, o movimento passou a perder forças. Mas, segundo Prof. Dr. Paulo Henrique Martins, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), o governo brasileiro tenta resgatar esse modelo de política economica.

Para ele, o Estado anda no sentido contrário da crítica antiutilitarista. Isso é visível em programas como o PAC, que tenta “fazer renascer o defunto do desenvolvimentismo”, disse o pesquisador. Segundo ele, o governo poderia ter rompido com o sistema desenvolvimentista, e investido em ousadia e processos de descentralização, “reforçando as práticas associativas municipais e locais”. Assim, explica, é evidente a falta de um debate considerável para combater o utilitarismo, que contamina a sociedade contemporânea.

Contrário também ao utilitarismo, Alain Caillé questiona: por que tudo tem que ter uma função ou utilidade, na sociedade contemporânea? A analise do pensador francês não para por aí. Com uma formação acadêmica diversificada que se estende desde a filosofia a política, Caillé percebe a economia de mercado “como uma fatalidade”. Contra esse processo, explica o pesquisador, ele propõe que “se desnaturalise a economia de mercado para que possa vislumbrar a existência de diversas modalidades de organização da vida econômica que não se identificam com aquela mercantil”.

Seguidor das idéias de Caillé, Martins diz que o pensador francês crê na existência de um certo “fetiche na idéia do desenvolvimento, que é a associação da idéia de crescimento com a idéia de ilimitação, desenvolvimento como expansão ilimitada que é extremamente perigosa para o equilíbrio ecosocial”. Assim, o pensador sugere uma discussão sobre a democracia e aconselha repensar a modernização a partir da experiência participativa.

Essa discussão será ampliada pelo Prof. Dr. Paulo Henrique Martins, na palestra Questionando a hegemonia do determinismo econômico: o movimento antiutilitarista – Alain Caillé (1944), no Instituto Humanitas Unisinos – IHU, na próxima quarta-feira, 31-10-2007. O encontro faz parte do Ciclo de Estudos Fundamentos Antropológicos da Economia, e está marcado para às 19h30min, na sala 1G119.

Instituto Humanitas Unisinos - 30/10/07

29 milhões de trabalhadores estão fora da Previdência

A proporção dos trabalhadores sem direito à aposentadoria e aos demais benefícios previdenciários caiu em 2006. Segundo levantamento do Ministério da Previdência Social, a parcela de trabalhadores sem proteção social caiu de 36,5% em 2005 para 35,9% no ano passado, atingindo o menor nível desde 1995. A reportagem é do jornal Valor, 30-10-2007.

Em números absolutos, no entanto, o total de trabalhadores que não contribuem para a Previdência aumentou de 28,81 milhões, em 2005, para 29,03 milhões em 2006. Segundo o ministério, o aumento se deve à entrada de 2 milhões de brasileiros entre 16 e 59 anos no contingente de trabalhadores, que fechou o ano passado em 80,93 milhões de pessoas.

Para o ministro da Previdência, Luiz Marinho, a diminuição no percentual de trabalhadores sem cobertura previdenciária é resultado do desempenho da economia nos últimos anos. "De 2002 para cá, retomamos um processo de cobertura previdenciária e social, acompanhando a retomada do crescimento com distribuição de renda", avalia. Segundo ele, em três ou quatro anos, o país poderá alcançar os níveis registrados em 1992, quando a falta de cobertura atingiu 33,6% dos trabalhadores.

Segundo o ministério, do total de trabalhadores sem cobertura previdenciária, 13,27 milhões (16,4%) ganham menos de um salário mínimo e 15,42 milhões (19,1%) têm rendimento igual ou superior a um salário mínimo.

Instituto Humanitas Unisinos - 30/10/07

A Copa 2014 e a conta

“Está fresco na memória o Pan 2007. Originalmente orçado em R$ 414 milhões, a maioria em recursos oriundos da iniciativa privada, o custo do evento foi multiplicado por nove: R$ 3,7 bilhões, tudo pago pelo contribuinte. A Copa do Mundo é uma competição muito maior do que o Pan. Se não houver controle, os quase R$ 4 bilhões parecerão brincadeira de criança”, escreve o editorial do jornal Folha de S. Paulo, 30-10-2007. Segundo o editorial, “o Brasil já entra no gramado com o pé esquerdo. O relatório da Fifa que o recomenda como sede parece muito mais um "press-release" do que o resultado dos trabalhos de uma comissão que esteve no país. Não são mencionadas cifras de investimentos necessários. Informalmente, fala-se em R$ 400 milhões para o comitê organizador e R$ 1,1 bilhão para a renovação dos estádios. Difícil acreditar”.

Segundo o jornal “a Alemanha gastou mais de R$ 20 bilhões na Copa de 2006. E o presidente Lula, que lidera a caravana de políticos que foi a Zurique celebrar a "conquista" brasileira, já advertiu que não pretende poupar gastos na Copa”.

Instituto Humanitas Unisinos - 29/10/07

‘Os neocon fracassaram”, constata escritor americano

“A cultura não nos protege de nada. Os nazistas são a prova. Podes sentir uma admiração profunda por Beethoven ou Mozart e ler o Fausto, de Goethe, e ser uma merda de ser humano. Não há conexão direta entre cultura com C maiúsculo e tuas opções políticas”, afirma Jonathan Littell, escritor norte-americano que escreve em francês em entrevista ao jornal El País, 27-102-007.

Jonathan Littell acaba de publicar um livro de quase mil páginas sobre um assassino nazista que se converteu no livro do ano na Europa. Com o livro Las benévolas, Jonathan Littell assegura que quis responder a uma questão: a natureza do crime de Estado.

Segundo ele, “quando Deus desaparece, se nos apresenta um dilema. Os valores devem referir-se a algo, devem vir de algum lugar. Num mundo sem Deus, era difícil implantar um sistema ético e moral. As ideologias vieram e quiseram fazê-lo, a substituir Deus, mas também fracassaram tanto é assim que agora não temos nada. E os iPod não vão construí-lo. Nem a venda, nem a compra ou a publicidade. Estes valores que temos como o consumismo, o ganhar dinheiro, não são nada.Nossa sociedade desliza pela memória que lhe fica de ter formado parte dos bons. Vive dos restos”.

Para Jonathan Littell, “os neocon acabaram”. Segundo ele, Bush arrasou com tudo inclusive com os seus. Os “neocon” são pessoas, descreve o escritor, “que buscaram assaltar o poder já com Nixon, Reagan e Bush pai e fracassaram porque ninguém os tomava a sério. Com Bush filho conseguiram se implantar e sua gestão foi um fracasso estrepitoso. Isso já era. Acabou. Fracassaram”.

E ele continua:

Reagan e Bush eram muito de direita, mas não tanto como os Richard Pearl, Cheney ou Rumsfeld e Wolfowitz. Por isso Bush não contou com as pessoas do círculo do seu pai. Bush Jr e Rove conseguiram uma aliança no Partido Republicano entre os ‘neocon’, os fundamentalistas religiosos e os liberais. Inclusive os fundamentalistas e os ‘neocon’ são diferentes. Os primeiros se interessam pelos comportamentos culturais, abortos, moral, e eles não se interessam pela política externa ou se os EUA invadem outros países ou não. Isso interessa aos ‘neocon’ e são eles que fracassaram totalmente. Eles deixaram o país muito pior do que o encontraram. A questão deles, agora, é como sair do Iraque, do Afganistão o quanto antes”.

E conclui:

“As pessoas temem agora os fundamentalistas religiosos. Os ‘neocon’ eram um punhado de universitários que não representavam ninguém. Pelo contrário, os fundamentalistas teceram uma rede de poder, com muito dinheiro. Eles são mais perigosos. Gente que promove exércitos privados e usa armas. Eles sim, são um perigo”.

Instituto Humanitas Unisinos - 29/10/07

‘Não defendo o narcotráfico. Defendo uma planta que é benéfica”, afirma Evo Morales

“Eu não defendo o narcotráfico. Defendo uma planta que na nossa cultura é benéfica pois ela ajuda a suportar a fadiga e a vida a 400 metros de altura. Nós não consumimos cocaína. Este é um problema de vocês. Nós consumimos uma infusão de folhas. Ou seja, as mastigamos, as usamos na medicina de base e, inclusive, fazemos uma torta”, afirma Evo Morales, presidente da Bolívia, em entrevista ao jornal italiano Repubblica, 27-10-2007, falando da folha de coca.

Evo Morales, em visita à Itália, também afirma que “a Venezuela foi o primeiro país a demonstrar toda a sua amizade concreta quando pela primeira vez na Bolívia foi eleito um presidente indígena. Temos uma situação econômica semelhante, ou seja, temos grandes recursos naturais e partilhamos alguns programas sociais como o da assistência sanitária gratuita das missões dos médicos cubanos e a prospectiva do socialismo. Por outro lado, sem a solidariedade do presidente Chávez eu não teria podido nem viajar para a Itália, pois ele me emprestou o avião presidencial para vir até aqui.”.

Instituto Humanitas Unisinos - 29/10/07

Brasil será desafio para nova equipe econômica

Cristina Kirchner ainda não revelou como vai compor a sua equipe econômica e deu poucas pistas sobre o que será seu plano de governo nesta área. A imprensa argentina especula que o atual ministro da Economia, Miguel Peirano, é candidato a permanecer no cargo, já que teria sido escolhido por Cristina, em julho, para substituir a ex-ministra Felisa Miceli, demitida por seu envolvimento com o caso de uma misteriosa bolsa cheia de dinheiro encontrada escondida no banheiro de seu gabinete no Ministério. A reportagem é do jornal Valor, 29-10-2007.

No início do ano, Peirano deu uma entrevista ao jornal "Clarín" em que dizia que, se há dois países com os quais a Argentina tem que se preocupar, estes são China e Brasil. Não foi solicitado pelo jornal que explicasse por que e ele não atendeu a pedidos da reportagem do Valor para esclarecer a dúvida.

No caso da China, há um consenso de que é hoje um problema em "escala planetária", como definiu o economista Dante Sica, da consultoria Abeceb.com.

Com relação ao Brasil, embora ambos os governos insistam no discurso do excelente relacionamento bilateral, há pelo menos dois temas que incomodam os argentinos: um é o déficit comercial e o outro é a aquisição pelos brasileiros de importantes empresas locais. A Argentina acumula déficit na balança comercial com o Brasil desde 2004, quando o saldo saiu de US$ 1,8 bilhão negativos para US$ 3,6 bilhões em 2006. Neste ano, o déficit ficou em US$ 2,5 bilhões entre janeiro e agosto.

Uma amostra da atenção que o governo Kirchner dá ao incômodo dos empresários e da opinião pública com o que consideram desvantagens da economia argentina em relação ao Brasil foram duas medidas que atingiram em cheio os brasileiros, tomadas nas últimas três semanas. A primeira obrigou os fundos de pensão privados a trazer de volta US$ 2 bilhões em recursos que estão aplicados em ações na Bovespa. A outra foi o envio ao Congresso de um projeto de lei que altera a distribuição da chamada cota Hilton, dando prioridade à distribuição das cotas aos frigoríficos de capital nacional. Negociada no início dos anos 80, durante a Rodada Uruguai do Gatt, a cota Hilton é uma compensação da UE a alguns países que tinham histórico de venda à região (entre eles Argentina, Brasil e Uruguai), antes de levantar barreiras à importação de carne.

Os exportadores destes países podem vender carne no mercado europeu, livre de barreiras, por um preço de até US$ 14 mil a tonelada, mais que o dobro do que se paga pela carne comum. A cota da Argentina é de 28 mil toneladas, bem acima da brasileira, de 5 mil toneladas. Quando, há dois meses, a brasileira Marfrig comprou a mais importante indústria argentina de carne processada, a Quick Food iniciou-se no país um debate sobre a estrangeirização da Cota Hilton. O projeto do governo afeta os frigoríficos brasileiros que investiram alguns milhões de dólares na compra de frigoríficos argentinos, atraídos exatamente por este benefício. Indústrias americanas do setor também seriam atingidas.

Pode ser que as novas medidas tenham sido tomadas no calor da campanha eleitoral, como forma de ganhar votos para Cristina Kirchner. Mas também pode ser um sinal de que os Kirchner pretendem limitar o avanço empresarial brasileiro no país. Aproveitando a queda do valor dos ativos devido à crise de 2002, indústrias brasileiras começaram a adquirir empresas argentinas. Segundo dados da Agência de Promoção de Investimentos do governo argentino (ProsperAr), os brasileiros já investiram US$ 6,7 bilhões em aquisição de empresas na Argentina no período 2002-2007

Instituto Humanitas Unisinos - 28/10/07

‘A Terra está por atingir um ponto de não retorno’, afirma a ONU. A sexta grande extinção em massa

"A Terra está por atingir um ponto de não retorno”. É alarmante a previsão da Agência da ONU para o meio ambiente – Unep – no 4º Relatório sobre as prospectivas globais da terra “Geo-4” realizado à base dos dados recolhidos por 390 especialistas, nos últimos 20 anos. A reportagem é do jornal Corriere della Sera, 27-10-2007.

Unep, em português, ao Pnuma, o Programa das Nações Unidas para o Ambiente.

A tese: a humanidade está mudando o clima tão velozmente e está exaurindo os recursos naturais com tal avidez que coloca em risco a própria sobrevivência e a do Planeta.

Nas 572 páginas do documento, os especialistas levantam a hipótese que depois de cinco extinções em massa que se deram nos últimos 450 milhões de anos – a última foi há 65 milhões de anos – “a sexta está em curso e desta vez causada pelo homem”. Os dados são dramáticos.

Um terço dos anfíbios, 23% dos mamíferos e 12% dos pássaros estão em risco, enquanto que, anualmente, um dos 10 maiores rios do mundo não consegue chegar ao mar pois seca antes. O clima está mudando com uma velocidade maior do que nos últimos 500 mil anos. A temperatura média aumentou 0,74 graus no século passado e crescerá de 1,8 a 4 graus até 2100. A partir de 1850, onze dos anos mais quentes foram registrados nos últimos 12 anos.

A situação alcançará proporções catastróficas quando os atuais 6,5 bilhões de habitantes do planeta chegarão a 11 bilhões, em 2050. “A população humana já é tão grande que os recursos necessários para a sua sobrevivência é superior aos que a Terra consegue produzir”, constata Achim Steiner, diretor executivo do Unep - Pnuma.

Apesar dos índices de saúde do ambiente tenham piorado, desde a disponibilidade de água até à quantidade do aumento do gás estufa na atmosfera, a riqueza dos países desenvolvidos cresceu em um terço. O problema são os países em vias de desenvolvimento. Na ponta está a África, onde a produção de alimentos per capita desceu em 12% e os pobres aumentaram de 47%, em 1985, para 59%, em 2000.

Mas além de afrontar a apatia das pessoas, sempre mais conformada com as notícias alarmantes sobre a Terra, o relatório tenta fazer as contas com os países ricos que mais poluem e que são inertes. Entre os quais sobressaem os EUA, precisamente nesta semana em que a Casa Branca admitiu de ter censurado o relatório sobre “as mudanças climáticas e a saúde pública” redigido pelo Cdc de Atlanta. Numa conferência de imprensa o governo Bush voltou a defender a tese de que “as mudanças climáticas poderão trazer benefícios à saúde das pessoas, diminuindo as mortes causadas pelo frio intenso e as doenças infecciosas”.

Instituto Humanitas Unisinos - 28/10/07

Marina vence batalha e cana será proibida na Amazônia e no Pantanal

O zoneamento ambiental da cana-de-açúcar vai proibir o cultivo da planta na Região Amazônica e no Pantanal. O trabalho de zoneamento fica pronto em junho do ano que vem. A decisão, tomada na semana passada, foi o desfecho para o mais recente embate enfrentado pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, depois que o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, admitiu a possibilidade da cultura da cana-de-açúcar nas áreas degradadas da Amazônia. A reportagem é de Lisandra Paraguassú e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 28-10-2007.

O veto foi uma decisão pragmática do governo. Ao mesmo tempo em que o aumento da produção de etanol é um dos projetos mais caros ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a ameaça de que, pela primeira vez em três anos, o desmatamento na Amazônia pode ter voltado a crescer, assusta a quem tenta vender a idéia do Brasil como um País ecologicamente correto.

A última crise enfrentada pela ministra Marina Silva expôs, mais uma vez, a ambigüidade do governo quanto se trata de desenvolver o País e, ao mesmo tempo, proteger o meio ambiente.

O primeiro embate, ainda em 2003, foi em torno do projeto que definiria como seria feita a liberação do plantio de transgênicos no País: enquanto a área agrícola queria liberar os organismos geneticamente modificados (OGMs), alegando que o Brasil iria ficar para trás na pesquisa e na economia, o Meio Ambiente queria tornar mais dura a legislação e ter o poder de veto. Marina perdeu, mas parcialmente, já que a liberação dos transgênicos ainda é um processo trabalhoso no País e pode, como aconteceu recentemente com o milho, ser barrado com ações na Justiça.

O segundo confronto, em relação à demora do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) em conceder licenças ambientais, fez com que boa parte do instituto e vários assessores de Marina perdessem seus cargos. A crise, fomentada pelo próprio presidente Lula - que passou a reclamar em público da demora - levou a uma reestruturação do Ibama, que foi dividido em dois para melhorar a fiscalização e a agilidade.

O fato de algumas commodities, como a soja, terem se valorizado no mercado de grãos faz com que o Brasil volte a enfrentar, pela primeira vez desde o Plano Nacional de Combate ao Desmatamento, em 2005, um mercado internacional aquecido. O panorama que se desenha poderá ser uma prova de fogo para o governo Lula e sua tentativa de manter uma imagem ecologicamente correta.

“A política do governo não é vocacionada para que se faça respeitar a legislação ambiental. É muito mais uma manifestação superficial, nas solenidades. É dirigida muito mais para a destruição”, acusa Sergio Leitão, diretor de políticas públicas da ONG Greenpeace. A ONG viu com preocupação os dados que mostram um aumento no desmatamento desse ano.

A avaliação é que as políticas do governo são muito frágeis para enfrentar o mercado de grãos aquecido. “Nós comemoramos os esforços do governo em aumentar o controle e a fiscalização, mas as iniciativas não são suficientes para tornar permanente a queda no desmatamento. Até agora só enfrentamos um mercado em baixa”, disse Leitão.

Esse é o mesmo temor do deputado federal Fernando Gabeira (PV-RJ), um dos principais integrantes da Frente Ambientalista da Câmara dos Deputados. Gabeira teme que a pressão pela produção de etanol empurre as plantações de soja para dentro da Amazônia, já que a cana ainda não pode ser plantada naquela região. “O discurso do presidente Lula sempre tem garantido que não vai haver desmatamento por causa da cana-de-açúcar, mas a verdade é que já existe. E a capacidade de controle no Brasil está longe de ser o que deveria.”

Depois do anúncio de Stephanes de que o governo iria até mesmo dar incentivos para a plantação de cana-de-açúcar na Amazônia, a reação de Marina terminou por abafar o caso, e o ministro da Agricultura voltou atrás. Mas, dentro do ministério, ainda há resistências contra o veto à cana na Amazônia. Há setores defendendo que a decisão final seja tomada em definitivo quando o zoneamento terminar.

Uma semana depois das declarações de Stephanes, o Ministério do Meio Ambiente chegou a preparar uma nota a ser assinada pelos dois ministros, declarando que “é decisão do governo não induzir e não permitir a plantação da cana-de-açúcar e a instalação de usinas de álcool em áreas da Amazônia e do Pantanal, por se tratar de ambientes frágeis, com elevados atributos naturais, solos não adaptados e distância dos grandes centros consumidores”. A nota não chegou a ser divulgada.

Instituto Humanitas Unisinos - 27/10/07

‘O Rio exige sacrifícios. Vidas vão ser dizimadas’, afirma secretário de segurança

“O Rio chegou a um ponto que infelizmente exige sacrifícios. Sei que isso é difícil de aceitar, mas, para acabarmos com o poder de fogo dos bandidos, vidas vão ser dizimadas. O quadro é esse”, afirma José Mariano Beltrame, secretário de Segurança Pública do Rio de Janeiro em entrevista à revista Veja, desta semana. E continua: “Ao longo do tempo, as quadrilhas se fortaleceram a tal ponto que hoje têm a audácia de abanar armas para a polícia. Quando 350 policiais entram numa favela, 25 bandidos resolvem encará-los e fazem um estrago terrível. Recentemente, morreram doze pessoas nos confrontos da Favela da Coréia, na Zona Oeste. Mas, se não tivéssemos agido agora, no ano que vem morreriam 24. E, se esperássemos mais dois anos, seriam 36, e assim sucessivamente. É uma guerra, e numa guerra há feridos e mortos”.

Segundo ele, “a violência aqui não é periférica, ela está no seio da sociedade” assim que “quem mora em Copacabana não precisa ir à Rocinha para comprar drogas, pode buscar ali mesmo. Esses mercados usaram a geografia do Rio de Janeiro a seu favor”.

O secretário também analisa como o celular faz parte da logística do traficante e constata que os pobres não são os responsáveis pela violência e são os que mais sofrem com ela.

“No Rio não existe mais o crime famélico. Ninguém mais rouba um celular aqui para trocar por um pedaço de pão. O menino rouba um celular porque a facção criminosa do lugar onde ele mora quer um ou dois aparelhos para usá-los em negócios ilícitos. Uma criança que rouba um celular na rua quer aquilo para quê? Não é para falar com a mãe ou o pai. O celular faz parte da logística do traficante, assim como o carro e o dinheiro obtido em assaltos na saída do banco. Os pobres não são responsáveis pela violência. Eles são, aliás, os que mais sofrem com a ação desses bandidos. É nas favelas que o tráfico impõe a lei do silêncio, exige que as pessoas durmam com os portões abertos, obriga moradores a esconder uma arma em casa ou a abrigar o próprio criminoso lá dentro. O pior é que a permanência dessa situação é favorecida, em parte, por cidadãos comuns, que às vezes nem se dão conta de que seus atos beneficiam os criminosos”.

E o secretário, gaúcho, cita dois exemplos:

“Um cidadão está numa festa cheirando cocaína, chega à rua e vê que seu carro foi roubado. Ele vai à delegacia reclamar, mas não quer saber que roubaram o carro dele para vender as peças e comprar pó. Da mesma forma, não aceito o sujeito que paga propina a um policial. Mas ele prefere pagar 50 reais de propina porque o IPVA, que custa 800 reais, está atrasado. Ou então aquele empresário que se queixa do suborno pago ao agente público para não ser fiscalizado. Ele lucra com a sonegação. No Brasil, e no Rio de Janeiro em particular, a convivência promíscua entre o legal e o ilegal, o formal e o informal, provocou essa situação ambígua. Agora chegamos a um ponto em que precisamos decidir. A sociedade precisa escolher de que lado está. É fundamental acabar com a promiscuidade que torna aceitáveis práticas condenáveis”.

Instituto Humanitas Unisinos - 26/10/07

Brasileiros descobrem 'reservatório' de células-tronco em cordão umbilical

Cientistas brasileiros descobriram uma nova fonte de células-tronco do cordão umbilical humano que poderá alterar a maneira como esse material é tratado nas salas de parto dos hospitais. Muitos serviços já oferecem o congelamento do sangue do cordão, que contém células-tronco hematopoéticas (precursoras das células sanguíneas) e pode ser usado em transplantes de medula para o tratamento de doenças como a leucemia. O cordão umbilical em si é jogado fora. A nova pesquisa, porém, mostra que ele está repleto de células-tronco de outro tipo, chamado mesenquimal, também com grande potencial terapêutico. A reportagem é de Herton Escobar e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 25-10-2007.

“O recado fundamental é ‘não jogue fora o cordão’”, diz a geneticista Mayana Zatz, que coordenou a pesquisa na Universidade de São Paulo (USP). As células-tronco mesenquimais (CTMs) estão entre as mais versáteis das células-tronco adultas (de origem não embrionária). Podem formar osso, gordura, cartilagem, músculo e até neurônios, segundo alguns trabalhos. Muitos cientistas esperam um dia aproveitar essa plasticidade no tratamento de doenças e lesões - por exemplo, na recuperação de corações enfartados e na reconstrução de tendões e ossos.

As pesquisas, porém, necessitam de uma quantidade grande de células. No organismo adulto, as CTMs são encontradas em vários tecidos, mas principalmente na medula óssea e no tecido adiposo (gordura) - tanto que muito material para estudo é obtido em clínicas de lipoaspiração. As células podem também ser obtidas de pacientes por punção da medula óssea, mas este é um método invasivo e com possíveis complicações.

O cordão umbilical aparece agora como uma opção farta, indolor e de fácil obtenção. Bastam 10 centímetros (o cordão humano tem em média 40 cm) para obter uma grande quantidade de células-tronco mesenquimais, segundo Mariane Secco, primeira autora do trabalho, que fez a pesquisa como parte de seu doutorado no Centro de Estudos do Genoma Humano da USP.

Os resultados da pesquisa, anunciados ontem, foram publicados na revista Stem Cells, uma das mais prestigiadas da área. Os pesquisadores trabalharam com dez cordões e conseguiram estabelecer linhagens de CTMs a partir de todos eles. Já no caso do sangue de cordão, o rendimento foi muito inferior: das mesmas dez amostras, só uma apresentou células-tronco mesenquimais (o que não invalida seu potencial como fonte de células-tronco hematopoéticas).

Assim como o sangue de cordão é congelado após o parto, afirma Mayana, seria importante guardar também o cordão - ou, mais especificamente, as células-tronco mesenquimais contidas nele. O processo não requer tecnologia avançada e poderia ser praticado em qualquer hospital.

Estudos passados já haviam mostrado a presença de CTMs no tecido do cordão, mas não em número suficiente para justificar o congelamento ou como uma fonte viável para pesquisa. “Estamos falando, literalmente, de aproveitamento de lixo”, afirma Mayana, referindo-se à maneira como o cordão é descartado após o parto. “Estamos jogando fora a fonte mais rica de células-tronco mesenquimais.”

Ela ressalta que ainda são necessárias muitas pesquisas para transformar essas células em ferramentas terapêuticas de fato. O estudo apenas identifica o cordão umbilical como fonte de CTMs. Ainda assim, as perspectivas são grandes. Enquanto as células do sangue podem ser aplicadas apenas no tratamento de doenças sanguíneas, as mesenquimais oferecem um cardápio maior de aplicações. Equipes da USP já estão testando as células em camundongos e cachorros, incluindo vários modelos de distrofias musculares.