"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música"
Friedrich Nietzsche

quarta-feira, maio 14, 2008

Mapa em Flash da Evolução da Democracia

Milton Santos

Estamos a pouco mais de 2 meses do aniversário de óbito do grande mestre Milton Santos. Publicarei na seguida trechos da sua imperdível entrevista.









Instituto Humanitas Unisinos - 14/05/08

O mistério da lagartixa: em trinta anos uma evolução recorde

Estudada numa ilhota croata, em pouco tempo a lagartixa sofreu metamorfoses que in natura requerem milhões de anos. Os pesquisadores dos EUA: “Agora tem estômago, boca e cabeça muito maior. Não come somente insetos, mas também vegetais”. “A nova espécie é mais agressiva do que a indígena. Com uma mordida está em condições de cortar também uma pequena vara”. A reportagem é do jornal La Repubblica, 23-04-2008.

Um grupo de “lagartixas italianas”, aquelas que normalmente observamos sobre muros ou entre as pedras de nossa casa, introduzido numa pequena ilha ao largo da Croácia, evoluiu em apenas 30 anos, dando origem a uma transformação morfológica e comportamental que, costumeiramente, in natura, ocorre no decurso de milhões de anos. Em apenas três décadas a lagartixa, que tem o comprimento médio de 13 centímetros, desenvolveu uma nova estrutura do próprio intestino (é isto lhe permitiu comer também vegetais, enquanto desde sempre sua alimentação se baseava em pequenos insetos), ampliou a dimensão da cabeça e desenvolveu uma mordida muito mais forte do que no passado.

Em 1971 um grupo de pesquisadores introduziu cinco pares de lagartixas italianas na pequena ilha de Mrcaru, buscando-as na ilha Kopiste, ambas no Mar Adriático meridional. Hoje as cinco mil lagartixas que se encontram na ilhota parecem muito diversas daquelas introduzidas há três anos, mas a análise de seu Dna demonstrou, sem sombra de dúvida, que são todas descendentes precisamente das dez deixadas no início dos anos setenta.

A descoberta da mutação só foi feita recentemente, porque a ilha, desde o momento em que foram introduzidas as lagartixas italianas, não foi mais objeto de estudo por um longo lapso de tempo.

Primeiramente a pesquisa se defrontou com diversos problemas financeiros; depois nos obrigou a guerra que convulsionou a ex-Jugoslávia a manter longe os pesquisadores. Explica Duncan Irschick, da universidade do Massachussetts (EUA), autor da pesquisa publicada em Procedimentos da Academia Nacional de Ciências. “Somente desde 2004 a ilha se tornou uma meta turística e assim pudemos recomeçar as nossas investigação sem problemas. Até aquele ponto não sabíamos sequer se os cinco casais iniciais teriam sobrevivido. O que descobrimos foi, para nós biólogos, realmente chocante”.

Continua o pesquisador: “Nos anos setenta a ilha tinha uma espécie própria de lagartixas, muito menos agressiva do que a introduzida. A nova espécie eliminou quase de todo a indígena. Todavia, no momento não sabemos como isso teria acontecido. Mas, a verdadeira surpresa está no fato de que a lagartixa italiana se adaptou perfeitamente à ilha, graças a uma evolução velocíssima, cuja rapidez não tem comparação”.

Para entender o que ocorreu seja dito que costumeiramente os pequenos répteis não estão em condições de digerir os vegetais, e que na ilha croata há muitíssimas plantas, comida abundantíssima para aqueles insetos sobre os quais se baseava a dieta das lagartixas italianas. Não obstante isso, as lagartixas desenvolveram também outro modo de se alimentar.

Prossegue Irschick: “Surpreendeu-nos descobrir que após somente 30 anos as lagartixas desenvolveram a válvula ileocecal, que conecta o pequeno com o grande intestino e que torna mais lenta a digestão, permitindo-lhes de alimentar-se também de celulose”. Isto quer dizer que agora, além de insetos, as lagartixas podem nutrir-se também de pequenos vegetais. E foi esta mutação que fez que se desenvolvessem nelas mandíbulas mais fortes (em condições de cortar pequenas varas) e, conseqüentemente, também uma cabeça maior. Após as transformações físicas houve também uma evolução da sociedade das lagartixas: a grande quantidade de comida que tinham agora á disposição deu início a uma veloz reprodução da espécie e a um aumento inusitado da densidade de indivíduos.

Mas, como pôde ocorrer tal mutação em tão pouco tempo? Explica Andrei Hendry, da Universidade McGill de Montreal (Canadá): “Existem duas possibilidades. A primeira pode estar ligada a um puro fato genético, a segunda a um caso clássico de “resposta plástica ao ambiente”. Tendo a reter que, porém, algo de genético deva por força existir”.

Instituto Humanitas Unisinos - 14/05/08

Crise alimentar, mercado e debate ideológico. Um artigo de Pedro A. Ribeiro de Oliveira.

"A menos que a tecnologia chegue a formas inteiramente novas de produção, estamos nos aproximando perigosamente da exaustão dos recursos naturais. A atual crise do preço dos alimentos é reveladora desse limite", analisa Pedro A. Ribeiro de Oliveira, professor da PUC-Minas. Agradecemos o envio do artigo e o publicamos na íntegra.

Eis o artigo.

De repente, fomos surpreendidos por notícias sobre a falta de alimentos no mundo. Após trinta anos de relativa estabilidade nos preços, uma súbita elevação gera protestos de populações esfomeadas no Haiti, Indonésia e vários países da África. Quando tudo parecia estar se ajustando no panorama do comércio mundial – onde a China é a fábrica, a Índia o escritório, e o Brasil a fazenda – assistimos a uma crise alimentar que, segundo o Banco Mundial, custará 500 milhões de dólares em ajuda emergencial aos famintos. De fato, os preços subiram enormemente nos dois últimos anos, e os analistas apontam diversos fatores que se somaram para gerar esse aumento. Dois são de ordem física: o crescimento econômico da Ásia, cujas populações se urbanizam, diversificam sua dieta e aumentam a demanda, e a utilização de grãos para a produção de agrocombustíveis. Outros dois são de ordem financeira: o aumento de preço dos fertilizantes e a entrada massiça dos fundos de investimento no mercado futuro de alimentos, para se protegerem contra as perdas financeiras do mercado imobiliário dos EUA. Embora agravada por fatores climáticos localizados, trata-se indiscutivelmente de uma crise provocada pelo mercado e não por más condições do clima, guerras ou doenças, que sempre foram as grandes causadoras da fome em grande escala.

Essa novidade de uma penúria alimentar causada pelos próprios mecanismos do mercado deveria provocar uma reflexão mais alentada do que a reação dos economistas afirmando que a crise será superada pelo próprio mercado auto-regulado. Para eles, a elevação do nível de preços incentivará a produção e trará um novo equilíbrio entre oferta e demanda. Isso implicará também maior exploração da terra (desmatamento) e das águas (irrigação), e portanto o agravamento dos problemas ecológicos – mas este não é um problema de economistas, para quem o mercado ser a instituição reguladora da economia é tão natural quanto ser a família a instituição reguladora da sexualidade.

Para quem se atreve a olhar um pouco mais longe, porém, numa perspectiva histórica e crítica, a crise atual pode ser uma rica fonte de ensinamentos sobre a realidade atual. É o que desejo mostrar neste pequeno artigo, inspirado num estudo clássico de história social e econômica.

E. Thompson fez um pormenorizado estudo das revoltas populares contra o preço do trigo, na Inglaterra do século XVIII. Nesse estudo, o autor mostra como a doutrina do “justo preço” foi sendo substituída pela doutrina do “livre-mercado” que é a base do capitalismo moderno, num longo processo que vai desde o século XVI até o início do século XIX. No sistema tradicional, a compra e venda de cereais e outros gêneros alimentícios, nas cidades inglesas era regulada pelo costume cujo símbolo era o toque dos sinos. Os produtores (camponeses) chegavam cedo à praça do mercado, mas só podiam iniciar as operações de venda após o toque do sino, quando os moradores da cidade adquiriam o necessário para seu consumo. Atendidos os moradores, tocava novamente o sino e os comerciantes, donos de moinho e padeiros locais entravam no mercado como compradores. Só mais tarde, após o novo toque dos sinos, comerciantes de fora podiam comprar as mercadorias que tivessem sobrado. Ficava assim assegurado o abastecimento da população local só sendo exportados os excedentes.

Os grandes negociantes, porém, ganharam peso político cada vez maior e isso resultou em decretos reais suprimindo os empecilhos legais à sua participação nas operações de compra e venda. Mas a oposição de movimentos sociais dos trabalhadores pobres, apoiados na tradição local, impede – inclusive pela força física – que tais decretos sejam aplicados. Aí se dá um longo e acalorado debate ideológico entre os defensores do “paternalismo” na economia e os “liberais”, entre os quais se destaca Adam Smith, que com sua obra A riqueza das nações (1776) inaugura a moderna economia política. Ao iniciar-se o século XIX, as guerras na Europa contra Napoleão dão ao governo as razões que ele precisava para abolir toda regulação do mercado, consagrando então a vitória ideológica do liberalismo e assegurando o funcionamento do mercado autorregulado. Daí em diante, a história é conhecida: o mercado se expande continuamente, incorporando novos contingentes da população, até sua completa mundialização no final do século 20.
A atual crise de alimentos pode então trazer muitos ensinamentos sobre o funcionamento do mercado, que nos dois últimos séculos tem sido a instituição fundamental das sociedades modernas e pós-modernas (que não por acaso se autointitulam “sociedades de mercado”).

É evidente que o mercado incentiva – como nenhum outro sistema até hoje inventado – a produção e o consumo de bens e serviços. O PIB mundial, hoje estimado em US$45 trilhões, é o melhor indicador dessa capacidade de produzir riqueza. (Se fosse dividido pela população mundial, cada família de quatro pessoas teria hoje uma renda bruta mensal de R$3.750). Mas é também evidente que o mercado, por fundar-se na competição, beneficia os fortes e prejudica os fracos. A menos que se submeta a um poder maior que o controle, ele tende a agravar as desigualdades sociais. Isto já foi percebido no século XIX, resultando, no século XX, em políticas de intervenção do Estado: o socialismo e o Estado de bem-estar dos países de capitalismo avançado. O fim da guerra-fria, porém, favoreceu a vitória ideológica do neoliberalismo e, com ele, a desregulamentação externa do mercado. No caso dos alimentos, essa vitória se deu quando a Organização Mundial do Comércio – e não a FAO (organismo da ONU para a regular a Agricultura e os Alimentos) – é incumbida de regular sua distribuição em escala mundial. Tratados como uma mercadoria entre outras, os alimentos tornam-se objeto de transações de compra e venda regidas pela expectativa de lucros. O Estado renuncia assim a seu poder regulador, e limita-se a prestar socorro a pessoas desvalidas, incapazes de assegurar a própria sobrevivência alimentar – são os programas de tipo “Bolsa Família” e “cestas básicas”.

Outra deficiência congênita do mercado, percebida em meados do século 20 e agora cada vez mais clara, é sua índole produtivista. O mercado só alcança o desejado equilíbrio entre oferta e procura, aumentando a produção que, por sua vez, gera novas demandas e o avanço sobre os recursos naturais da Terra que sabemos serem limitados. Aqui está uma barreira aparentemente insuperável ao crescimento econômico: a menos que a tecnologia chegue a formas inteiramente novas de produção, estamos nos aproximando perigosamente da exaustão dos recursos naturais. A atual crise do preço dos alimentos é reveladora desse limite. Basta pensar, por exemplo, no consumo de carnes e o desgaste que ele provoca ao transformar florestas e vegetação do cerrado em pastagens, e por exigir enormes plantações de soja e milho (que entre outros danos ecológicos consomem grande quantidade de água na irrigação) para alimentar animais e aves criados em regime de reclusão. Como, na lógica do mercado, só se reduz a demanda pela elevação dos preços – e não pela mudança de hábitos alimentares, como uma dieta menos devastadora dos recursos naturais – sua única saída é aumentar a produção, ainda que isso implique antecipar a crise ecológica que já esta no horizonte.

Visto isso, chega-se a conclusão que a atual crise de preços de alimentos está pedindo às pessoas de boa-vontade uma séria e alentada reflexão sobre o sistema de produção e consumo baseado no mercado. O pensamento liberal conquistou a vitória no debate ideológico do século XVIII, derrotando o “paternalismo” abençoado pela tradição cristã, e recuperou-se do revés sofrido no século XX (quando os êxitos do Estado de bem-estar e do planejamento socialista o ofuscaram), mas hoje ele encontra-se sem argumentos convincentes diante da crise ecológica e da desigualdade social por ele agravadas. Neste contexto, faz-se necessário um pensamento rigoroso e crítico, que não se contente em propor correções ao sistema de mercado, mas busque alternativas econômicas viáveis para uma população mundial que poderá chegar a dez bilhões de pessoas. Este é um belo desafio aos cristãos e cristãs que não já não temos mais como modelo o “paternalismo” tradicional, aprendemos as lições do socialismo do século XX, e acreditamos que um novo mundo é possível – porque Jesus ressuscitou.

Instituto Humanitas Unisinos - 14/05/08

Após saída de Marina, Câmara aprova MP que pode aumentar desmatamento

Medida Provisória amplia de 500 para 1.500 hectares áreas cedidas sem licitação na Amazônia. Pela lei, proprietários podem desmatar até 20% das terras na Amazônia, para produção. A notícia é do sítio amazônia.org.br 13-05-2008.

No dia em que a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, entregou sua carta de demissão ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a Câmara aprovou uma medida provisória que pode contribuir para o desmatamento na Amazônia, na visão de ambientalistas. Governistas dizem que a MP apenas regulariza uma situação já comum na região.

A MP 422 ampliou de 500 para até 1,5 mil hectares a área que pode ser concedida pela União na Amazônia Legal sem licitação. Aprovada pela Câmara, a proposta vai agora ao Senado.

O líder do PV, Sarney Filho (MA), afirma que a MP pode aumentar o desmatamento, porque permite ao proprietário desmatar até 20% de sua propriedade na Amazônia. "Isso vai aumentar o desmatamento, não tenho dúvidas."

A aprovação da MP no dia da demissão de Marina é simbólica porque o projeto sequer foi discutido com o Ministério do Meio Ambiente, segundo o deputado do PV. "O ministério não foi ouvido, houve muita reclamação", afirmou Sarney Filho.

O relator da MP, deputado Asdrubal Bentes (PMDB-PA), nega que a MP possa aumentar o desmatamento. Ele afirma que o objetivo é apenas regularizar situações de proprietários de terras na Amazônia. "Mais de 92% dessas terras já estão ocupadas, algumas há até 30 anos."

Plágio A MP 422 foi alvo de uma polêmica por se tratar de um plágio de um projeto idêntico de Bentes. Na época da edição, o Congresso chegou a cogitar a devolução da MP e dar prioridade para o projeto do deputado. Por fim, o próprio Bentes assumiu a relatoria e a situação foi solucionada.

"Não estou olhando meu interesse mesquinho de ser o autor do projeto. O que interessa é o objetivo da região, que deseja esse projeto", afirmou o parlamentar.

Instituto Humanitas Unisinos - 14/05/08

Bancada ruralista festeja saída de Marina do cargo

Adversários de Marina Silva em questões como o uso de transgênicos e pecuária extensiva, integrantes da bancada ruralista no Congresso criticaram a atuação da ministra no Meio Ambiente. Mas ela também recebeu elogios no Senado de governistas e da oposição. A reportagem é do jornal Folha de S. Paulo, 14-05-2008.

Vice-presidente da CNA (Confederação Nacional de Agricultura) e produtora agrícola, a senadora Kátia Abreu (DEM-TO) reconheceu a importância política de Marina, mas criticou sua atitude ideológica frente à pasta.

"Sem demagogia, eu tenho admiração pela história e a vida da ministra. Só que ela tem um componente ideológico fortíssimo que atrapalha o Brasil a crescer", afirmou ela. "Quando se exagera no protecionismo você incentiva o crime. Quanto mais punitivo, mais você empurra a pessoa para o crime."

Ronaldo Caiado (DEM-GO), um dos líderes da bancada ruralista na Câmara, lembrou que Marina dificultou os avanços na área tecnológica. "Os problemas que ela criou o próprio governo é que tem de explicar."
Caiado, contudo, disse que preferiria "não crucificá-la". "Afinal, ela não tomou as decisões sozinha. Sempre teve o apoio do presidente", disse. "Até tenho muito respeito por ela. É uma das poucas pessoas no governo que têm posição."

O presidente da Comissão de Agricultura da Câmara, Onyx Lorenzoni (DEM-RS), afirmou que a gestão da ministra representou um atraso para o país e que ela demorou para deixar o cargo. "A saída dela pode fazer com que o bom senso seja retomado nas questões ambientais. Havia uma carga ideológica muito forte, um preconceito contra o agronegócio." "Ela atrasou muito o Brasil com a irracionalidade no trato de questões como os transgênicos."

Para o deputado Marcos Montes (DEM-MG), Marina "tem uma atitude extremamente pontuada na defesa do meio ambiente, mas desconectada do processo produtivo do mundo inteiro". "Acho que ela exagerou nas medidas que tomou. A saída foi muito boa, Lula marcou mais um gol."

Elogios

No Senado, porém, integrantes da oposição e do governo lamentaram a saída da ministra. "É uma perda muito grande. O governo precisa escolher muito bem quem vai substituí-la para não colocar em jogo a soberania da Amazônia", disse o líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM).

"É lamentável, porque ela é uma voz muito forte nos fóruns internacionais", disse o líder do PSB, Renato Casagrande (ES).

A líder do PT, Ideli Salvatti (SC), afirmou que ela será recebida de "braços abertos", mas disse "estar chateada" com a saída de Sibá Machado (PT), suplente de Marina no Senado.

"A senadora é hoje patrimônio da história do Acre e sai de cabeça erguida", disse o senador petista Tião Viana (AC).

Segundo a assessoria do Ministério da Agricultura, o ministro Reinhold Stephanes "lamentou" a decisão de Marina. "Stephanes fez questão de destacar o bom relacionamento mantido entre ambos e reconheceu o papel significativo de Marina Silva na defesa das causas ambientais do país."

Produtores

O presidente da Famato (que representa agricultores e pecuaristas de MT), Rui Ottoni Prado, disse esperar que "seja indicado alguém com capacidade de discutir questão ambiental e desenvolvimento econômico de forma integrada".

O presidente da Associação dos Produtores de Soja de MT, Gláuber Silveira, chamou a saída de "providencial". "Ela vinha prejudicando a imagem do Brasil no exterior, ao divulgar dados errados sobre o desmatamento."

O presidente do Sindicato das Indústrias Madeireiras do Norte, José Eduardo Pinto, disse que a notícia traz "esperança".

O governador Blairo Maggi (PR-MT), que defendeu o desmatamento legalizado para enfrentar a crise global de alimentos, não quis se pronunciar.

terça-feira, maio 13, 2008

Corporation - Documentário

Peço desculpas por ter postado as duas partes do filme sem as legendas, mas tal erro já foi corrigido para quem se interessar em assisti-las.

Instituto Humanitas Unisinos - 13/05/08

Estado retoma papel na economia, diz Delfim

O plano de política industrial anunciado ontem com pompa e circunstância pelo governo, batizado de Política de Desenvolvimento Produtivo, gerou uma discussão que parecia adormecida. Trata-se da importância do papel do Estado como indutor do crescimento econômico. A reportagem é de Guilherme Barros e publicada pelo jornal Folha de S. Paulo, 14-05-2008.

Ex-ministro superpoderoso quando o Estado ainda ditava os rumos da economia durante o regime militar, Delfim Netto considerou bastante positivo o novo plano de política industrial. Para ele, "o governo está reconstruindo um caminho que foi abandonado nos últimos anos".

Delfim, que estava à frente da economia quando o país lançou o Plano Nacional de Desenvolvimento, no final da década de 60, acha que o novo plano irá ser muito criticado, apesar de estar na direção correta.

"O plano deverá ser execrado pelos "estadofóbicos" e considerado insuficiente pelos "estadolatras", diz Delfim. "O importante do plano é que ele recupera a idéia de que o desenvolvimento depende do Estado indutor."

Não há, segundo Delfim, nenhum caso no mundo de desenvolvimento econômico sem a participação do Estado. Delfim também não vê problema no fato de o plano favorecer alguns setores da economia, embora este atual seja mais abrangente do que os anteriores.

"Muitos criticam a idéia de uma política industrial porque encaram um mal a escolha dos vencedores. Talvez prefiram a escolha dos perdedores", diz Delfim.

Ex-presidente do BNDES e ex-ministro das Comunicações no governo Fernando Henrique Cardoso, o economista Luiz Carlos Mendonça de Barros também enxerga com bons olhos o plano anunciado ontem pelo governo.

Mendonça de Barros diz que não vê com preconceito a adoção de uma política industrial. A seu ver, sempre há espaço para uma política industrial que seja inteligente. Ou seja, que incentive os setores nos quais o país apresente vantagens comparativas. No mundo inteiro é assim.

"Faz todo o sentido o Brasil incentivar os setores que vão vender para a China, por exemplo, e não aqueles setores que vão competir com a China", diz o economista.

Mendonça de Barros também acha positivo o fato de o plano promover a redução de impostos, mesmo que seja pequena. Afinal, o governo não está em condições de abrir mão de uma parte significativa da arrecadação tributária sem antes cortar gastos.

Instituto Humanitas Unisinos - 13/05/08

Um oásis de R$ 266 bilhões para os setores produtivo e exportador

Em um cenário de juros altos, dólar em queda e desaquecimento da economia mundial, o governo veio em socorro do setor produtivo brasileiro e anunciou ontem um pacote de medidas de desonerações tributárias, subsídios e financiamentos da ordem de R$ 266,4 bilhões para até 2010. A reportagem é de Eliane Oliveira, Luciana Rodrigues, Cássia Almeida e Liana Melo e publicada pelo jornal O Globo, 13-05-2008.

Grande parte desses recursos, no entanto, já estava prevista no orçamento do BNDES. O valor da política industrial — batizada de Política de Desenvolvimento Produtivo — corresponde a quase R$ 100 bilhões a mais do que os recursos orçamentários para custeio e investimentos em saúde e educação para os próximos três anos. Em dólar, o total, de US$ 160 bilhões, é igual ao Produto Interno Bruto (PIB, soma de bens e serviços produzidos) do Chile.

— Queremos responder, de forma pragmática e criadora, ao nosso grande desafio contemporâneo: assegurar uma trajetória de crescimento sustentável para o Brasil numa economia global competitiva e aberta — afirmou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao lançar o programa, no auditório do BNDES, no Rio, a uma platéia formada por empresários de diversos setores, dez governadores e onze ministros.

— Atravessamos o deserto da estagnação. A terra fértil já está à vista. Só depende de nós alcançála e conquistá-lo.

Lula não cita empregos novos

As medidas afetam diretamente 24 setores. A área econômica concordou em abrir mão de R$ 21,4 bilhões em renúncia fiscal. Destacam-se o fim do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) nas aquisições de máquinas e equipamentos e a redução de até 13,1% da folha de pagamento para empresas de tecnologia da informação, tendo como contrapartida as exportações. Lula, que assinou duas medidas provisórias com as desonerações tributárias, fez um apelo ao Congresso, para que sejam aprovadas logo.

— As medidas têm por objetivo compensar, em parte, a perda das empresas com a valorização do real, ao reduzir custos financeiros e tributários para o setor produtivo. Com as medidas que estamos tomando agora, damos mais competitividade às empresas brasileiras, afirmou o ministro da Fazenda, Guido Mantega.

Ele negou que as medidas sejam contraditórias com a política monetária, tendo em vista que o Banco Central subiu os juros para frear o ritmo acelerado da economia.

— Só conseguimos essas condições tão favoráveis de investimento e de confiança no país porque estamos fazendo uma política fiscal responsável, cumprindo metas de superávit primário e indo além — destacou, confirmando que o governo usará parte de seu superávit fiscal para financiar o fundo soberano (para investimentos no exterior), cuja criação será anunciada hoje.

O BNDES terá R$ 210 bilhões para emprestar, mas esses recursos já contavam no orçamento dos próximos anos. Além disso, há R$ 34 bilhões de fundos de estímulo à pesquisa e desenvolvimento do Ministério da Ciência e Tecnologia. O BNDES também vai baixar o spread (diferença entre quanto o banco paga pelos recursos e o quanto recebe) de 1,4% para 1,1% nas linhas de financiamento e de 1,5% para 0,9% na compra de máquinas. O setor de bens de capital foi contemplado com a ampliação de cinco para dez anos na quitação dos empréstimos.

— É um incentivo sistêmico muito poderoso. Tem um certo impacto sobre o retorno do banco, mas é muito importante — afirmou Luciano Coutinho, presidente do BNDES.

Entre os desafios até 2010, estão aumentar a parcela do país no comércio mundial de 1,18% para 1,25%, levando as exportações a US$ 208,8 bilhões, e expandir a taxa de investimento de 17,6% para 21% do PIB. Lula enfatizou que “o meio ambiente entrou com força na agenda internacional e de cada país”, mas não disse o quanto será aplicado na área. Também não citou a criação de empregos.

Instituto Humanitas Unisinos - 12/04/08

Gol sai mais barato que Big Mac. Segundo a VW, cada quilo do automóvel tem preço menor que o do sanduíche

Buscar o menor custo é o desafio da Volkswagen do Brasil, segundo o diretor de compras da empresa, Thomas Gropp. Ao destacar as três qualidades primordiais para a montadora – qualidade, capacidade e custo – Gropp comparou o preço do carro popular com o de outro sanduíche também bastante popular: o Big Mac.

– Fizemos um índice de custo e descobrimos que um Gol, por quilo, é mais barato que um quilo de Big Mac. Custa R$ 25 por quilo, enquanto um Big Mac custa R$ 28. Ainda assim, queremos que o Gol baixe mais. A meta é reduzir seu custo em R$ 0,50 por quilo, o que resultará na redução de R$ 500 no custo do Gol, objetivo que estamos buscando.

A reportagem é de Ariverson Feltrin e publicada pelo jornal O Globo, 12-05-2008.

O diretor de compras anunciou formalmente, durante a 8ª edição do Supply Awards Qualidade, prêmio destinado aos fornecedores da empresa, que o mercado brasileiro conhecerá em breve o novo Gol, modelo que por muitos anos sustenta a Volkswagen no topo do ranking do setor em vendas. Além do fator custo, a montadora conta com a qualidade para manter o Gol na liderança.

– Nos Estados Unidos e na Europa os japoneses crescem cada vez mais em market share e a qualidade ajuda muito para o salto – completou com um entusiasmado anúncio – Apenas a vitória me interessa. E, para isso, temos que ter qualidade, capacidade e 50 centavos menos no custo por quilo.

Durante o evento, Thomas Gropp mostrou um vídeo dos anos 50 em que um grupo de técnicos alemães visita um designer italiano em Milão à busca de mudanças para o Fusca. Depois de pensar e analisar, o designer propõe apenas aumentar a janela traseira. Só isso, sentencia ele. A mudança foi introduzida em 1958.

"A Volkswagen nunca mudou para ficar diferente, mas para ficar melhor" é a mensagem que aparece no vídeo.

De janeiro a abril, o Gol foi o modelo mais vendido (92.764 unidades), seguido pelo Palio, da Fiat, com 71.119 unidades. Isto, porém, não impediu a dianteira da Fiat no total de carros e comerciais leves. A montadora italiana fechou o quadrimestre com 24,9%, seguida pela Volkswagen com 22,2%.

– Os fabricantes japoneses descobriram o Brasil. Mas, nós, Volkswagen, temos de ganhar este jogo. Vamos aproveitar o mercado quente, aliás, muito quente, para investir em capacidade, pois isto realmente é investir no futuro – sentencia.

Instituto Humanitas Unisinos - 12/04/08

Índios pró-arrozeiros querem bloquear acesso a alimentos

Um grupo de índios contrários à demarcação contínua da Raposa/Serra do Sol (RR) chegou ontem à Vila Surumu. Eles são favoráveis à permanência de arrozeiros na reserva e ameaçam entrar em confronto com indígenas que defendem a saída de fazendeiros. A reportagem é de Hudson Corrêa e publicada pelo jornal Folha de S. Paulo, 12-05-2008.

O macuxi Sílvio da Silva, 42, líder do grupo, disse que 180 índios chegaram a Surumu. A intenção, segundo ele, é bloquear o acesso ao acampamento, montado por indígenas favoráveis à demarcação contínua.
Esse acampamento, com 36 barracas de lona, foi montado em frente à cerca da fazenda de Paulo Cesar Quartiero, o líder dos produtores de arroz preso há seis dias sob acusação de mandar atirar em índios.
Com bloqueio acima e abaixo do acampamento, o grupo pretende impedir a chegada de alimentos e água ao local.

Centro do conflito entre índios e fazendeiros, Vila Surumu está dividida em duas trincheiras à espera da decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) sobre a demarcação da terra.

Do lado esquerdo de quem chega à vila, estão os índios favoráveis à demarcação, que acamparam em frente à fazenda de Quartiero. À direita, os simpatizantes de Quartiero, que também é prefeito pelo DEM de Pacaraima (RR) .

A trincheira esquerda reúne ao menos 200 índios, incluindo os do acampamento próximo.

Foi a 10 km da vila que, há uma semana, um grupo de cem índios ocupou parte da fazenda do prefeito, localizada na reserva. Funcionários de Quartiero são acusados de atirar contra os índios e ferir nove deles.
O STF deve decidir até o fim do mês se os arrozeiros vão ficar ou sair da área de 1,7 milhão de hectares, homologada como terra indígena contínua pelo presidente Lula em 2005.


Os contrários à demarcação são ligados à Sodiur (Sociedade de Defesa dos Índios Unidos do Norte de Roraima). O macuxi Sílvio, presidente da entidade, nega ligação com Quartiero.

Ligado ao CIR (Conselho Indígena de Roraima), que luta pela saída dos fazendeiros, o líder macuxi Djacir da Silva, 38, disse não acreditar em uma grande mobilização dos rivais.

"Os índios [recrutados pela Sodiur] foram enganados por Quartiero em anos anteriores.

Vinham para comer churrasco e beber e acabavam envolvidos em manifestações contra a demarcação. Agora eles viram que foram enganados", diz Djacir.

Vila Surumu é distrito de Pacaraima, a 60 km de distância, e, na demarcação da Raposa, está na terra indígena.

Com Orçamento anual de R$ 150 mil, a vila tem até um subprefeito, Cícero Francisco Araújo, 36, que é pastor da Igreja Assembléia de Deus. Araújo diz que a Funai propôs, no fim de abril, o pagamento de R$ 25 mil de indenização para ele deixar a igreja e se retirar de Vila Surumu. Araújo não aceitou a proposta.

O ministro da Justiça, Tarso Genro, disse ontem que, "enquanto o STF não mudar o entendimento sobre a reserva, o governo continuará a considerar a área "terra indígena'". Segundo ele, a PF continuará a atuar para resguardar o direito dos índios.

Instituto Humanitas Unisinos - 09/05/08

Novos pobres em gestação

Vivemos uma situação paradoxal: “A diminuição das desigualdades entre o Norte e uma parte do Sul poderá ser paga com um aumento das desigualdades no interior do Sul”. O raciocínio é de Philippe Martin, professor na Universidade de Paris-I-Panthéon-Sorbonne, em artigo publicado no Libération, 29-04-2008. A tradução é do Cepat.

A explosão dos preços dos produtos alimentícios, as revoltas provocadas pela fome e que corre o risco de castigar duramente constituem, para alguns, o desenlace dramático de uma história que não foi tão mal iniciada por outros. Primeiramente, é em grande parte ao fato de que milhões de chineses e indianos saem da pobreza e entram numa espécie de classe média que os preços dos gêneros alimentícios subiram. Só podemos nos alegrar com o fato de que eles podem agora comer carne com maior freqüência, o que, por outro lado, reforça a necessidade de mais vegetais para a alimentação animal e aumenta a demanda e os preços dos cereais.

Mas as vítimas desse “aburguesamento” do proletariado são os mais pobres dos países pobres, que consagram mais da metade de seu orçamento à alimentação. Nos países emergentes, um aumento de 10% da renda (é quase o que se produz na China cada ano) produz um aumento de aproximadamente 7% na demanda por produtos agro-alimentares. É muito mais que nos países ricos onde o aumento da renda tem pouco efeito sobre a demanda por alimentação. Ora, sabemos que é nos países emergentes que o crescimento da renda foi mais forte.

A demanda baixa muito pouco em resposta aos aumentos dos preços nos países ricos e um pouco mais nos países emergentes. Por exemplo, quando os preços dos cereais aumentam 10%, a demanda dos consumidores nos países emergentes baixa somente 3%. Para os mais pobres, pode inclusive acontecer que um aumento dos preços de alguns alimentos de base redunde paradoxalmente num aumento da demanda. É o que Giffen havia constatado na fome de 1850 na Irlanda: quando o preço das batatas explodiu, seu consumo aumentou. Tal era o empobrecimento devido ao aumento dos preços, que a batata continuava sendo o único alimento possível de ser comprado.

Talvez não nos encontremos nesta situação hoje, mas, quando a oferta e a procura (ao menos no curto prazo) reagem muito pouco aos preços, é fácil explicar os fortes aumentos dos preços seguidos de um choque de demanda. Lembremos que esse choque da demanda vem em grande parte do fato de que alguns pobres se enriqueceram.

Portanto, assistimos a uma perigosa polarização em que o nascimento de uma classe média (ainda bem modesta) na China e na Índia joga os pobres da África e de outros lugares na extrema pobreza e talvez na fome. A diminuição das desigualdades entre o Norte e uma parte do Sul poderá, portanto, ser paga com o aumento das desigualdades no interior do Sul. A imagem tornou-se mais complexa pelo fato de que os mais pobres nos países pobres (mesmo aqueles que são importadores de produtos agrícolas) são, na maioria, agricultores que vão se beneficiar (mas não todos) com a alta dos preços agrícolas. Se isso for duradouro, seu efeito sobre as desigualdades no mundo é, portanto, nada menos que evidente. Resta outro mistério a ser esclarecido.

Qual é o papel da especulação financeira neste aumento dos preços agrícolas? Observamos uma bolha especulativa, tanto mais inconveniente quanto ela poderia desembocar em situações de fome? Alguns consideram que as taxas de juros baixos que conhecemos até hoje são em parte responsáveis pela especulação sobre as matérias-primas e sobre os produtos alimentares. Seu raciocínio é o seguinte: se os especuladores pensam que os preços vão aumentar no futuro, eles podem se endividar a baixo custo para comprar hoje nos mercados financeiros contratos a prazo de matérias-primas agrícolas e fazer subir os preços hoje. O aumento dos preços valida a antecipação da alta e se forma a bolha.

Esta explicação esbarra na questão do economista Paul Krugman (pouco inclinado a defender os especuladores): onde está o aumento dos estoques? Se a alta dos preços se explica pela especulação, deveríamos ver os estoques dos produtos alimentares aumentarem e os especuladores guardarem os produtos para revendê-los no futuro. Ora, os estoques de produtos alimentares são os mais baixos da história recente e os governos foram incapazes de refazerem as suas reservas. Talvez os dados sobre os estoques sejam pouco confiáveis. Compreendemos porque os especuladores teriam interesse em escondê-los ou falsificá-los. Os estoques são menores porque não há prova de que a especulação tenha exercido um papel crucial na recente alta dos preços. Se isto for verificado, é de fato uma péssima notícia, porque significa que a alta é real e não especulativa e que, portanto, ela veio para ficar.

Instituto Humanitas Unisinos - 08/05/08

Transnacionais de alimentos lucram com aumento da fome

A fome no mundo é a nova grande fonte de lucros do grande capital financeiro e os lucros aumentam na mesma proporção que a fome. Nos últimos meses, os meses do aumento da fome, os lucros da maior empresa de sementes e de cereais aumentaram 83%. Ou seja, a fome de lucros da Cargill alimenta-se da fome de milhões de seres humanos. A análise é de Boaventura de Sousa Santos e publicada pela Agência Carta Maior, 08-05-2008.

Eis o artigo.

Há muito conhecido dos que estudam a questão alimentar, o escândalo finalmente estalou na opinião pública: a substituição da agricultura familiar, camponesa, orientada para a auto-suficiência alimentar e os mercados locais, pela grande agro-indústria, orientada para a monocultura de produtos de exportação (flores ou tomates), longe de resolver o problema alimentar do mundo, agravou-o.

Tendo prometido erradicar a fome do mundo no espaço de vinte anos, confrontamo-nos hoje com uma situação pior do que a que existia há quarenta anos. Cerca de um sexto da humanidade passa fome; segundo o Banco Mundial, 33 países estão à beira de uma crise alimentar grave; mesmo nos países mais desenvolvidos os bancos alimentares estão a perder as suas reservas; e voltaram as revoltas da fome que em alguns países já causaram mortes. Entretanto, a ajuda alimentar da ONU está hoje a comprar a 780 dólares a tonelada de alimentos que no passado mês de março comprava a 460 dólares.

A opinião pública está a ser sistematicamente desinformada sobre esta matéria para que se não dê conta do que se está a passar. É que o que se está a passar é explosivo e pode ser resumido do seguinte modo: a fome do mundo é a nova grande fonte de lucros do grande capital financeiro e os lucros aumentam na mesma proporção que a fome.

A fome no mundo não é um fenômeno novo. Ficaram famosas na Europa as revoltas da fome (com o saque dos comerciantes e a imposição da distribuição gratuita do pão) desde a Idade Média até ao século XIX. O que é novo na fome do século XXI diz respeito às suas causas e ao modo como as principais são ocultadas. A opinião pública tem sido informada que o surto da fome está ligado à escassez de produtos agrícolas, e que esta se deve às más colheitas provocadas pelo aquecimento global e às alterações climáticas; ao aumento de consumo de cereais na Índia e na China; ao aumento dos custos dos transportes devido à subida do petróleo; à crescente reserva de terra agrícola para produção dos agro-combustíveis.

Todas estas causas têm contribuído para o problema, mas não são suficientes para explicar que o preço da tonelada do arroz tenha triplicado desde o início de 2007. Estes aumentos especulativos, tal como os do preço do petróleo, resultam de o capital financeiro (bancos, fundos de pensões, fundos hedge [de alto risco e rendimento]) ter começado a investir fortemente nos mercados internacionais de produtos agrícolas depois da crise do investimento no sector imobiliário.

Em articulação com as grandes empresas que controlam o mercado de sementes e a distribuição mundial de cereais, o capital financeiro investe no mercado de futuros na expectativa de que os preços continuarão a subir, e, ao fazê-lo, reforça essa expectativa. Quanto mais altos forem os preços, mais fome haverá no mundo, maiores serão os lucros das empresas e os retornos dos investimentos financeiros.

Nos últimos meses, os meses do aumento da fome, os lucros da maior empresa de sementes e de cereais aumentaram 83%. Ou seja, a fome de lucros da Cargill alimenta-se da fome de milhões de seres humanos.

O escândalo do enriquecimento de alguns à custa da fome e subnutrição de milhões já não pode ser disfarçado com as “generosas” ajudas alimentares. Tais ajudas são uma fraude que encobre outra maior: as políticas econômicas neoliberais que há trinta anos têm vindo a forçar os países do terceiro mundo a deixar de produzir os produtos agrícolas necessários para alimentar as suas próprias populações e a concentrar-se em produtos de exportação, com os quais ganharão divisas que lhes permitirão importar produtos agrícolas... dos países mais desenvolvidos.

Quem tenha dúvidas sobre esta fraude que compare a recente “generosidade” dos EUA na ajuda alimentar com o seu consistente voto na ONU contra o direito à alimentação reconhecido por todos os outros países.

O terrorismo foi o primeiro grande aviso de que se não pode impunemente continuar a destruir ou a pilhar a riqueza de alguns países para benefício exclusivo de um pequeno grupo de países mais poderosos. A fome e a revolta que acarreta parece ser o segundo aviso. Para lhes responder eficazmente será preciso pôr termo à globalização neoliberal, tal como a conhecemos.

O capitalismo global tem de voltar a sujeitar-se a regras que não as que ele próprio estabelece para seu benefício. Deve ser exigida uma moratória imediata nas negociações sobre produtos agrícolas em curso na Organização Mundial do Comércio. Os cidadãos têm de começar a privilegiar os mercados locais, recusar nos supermercados os produtos que vêm de longe, exigir do Estado e dos municípios que criem incentivos à produção agrícola local, exigir da União Europeia e das agências nacionais para a segurança alimentar que entendam que a agricultura e a alimentação industriais não são o remédio contra a insegurança alimentar. Bem pelo contrário.

Instituto Humanitas Unisinos - 08/05/08

Transgênicos: prós e contras

O debate sobre os transgênicos mobiliza agricultores e cientistas. Dois especialistas em transgênicos apontam razões favoráveis e contrárias aos transgênicos. A reação contrária aos transgênicos é de Víctor González, diretor técnico da Sociedade Espanhola de Agricultura Ecológica. Já a defesa é de Carmen Fenoll, professora de Meio Ambiente na Universidade de Castilla-La Mancha. Elas foram publicadas no El País, 29-04-2008. A tradução é do Cepat.

Por uma agricultura ecológica

Os transgênicos escondem riscos (ecológicos, econômicos e sanitários) imprescindíveis. Mesmo que aqueles que os comercializam afirmem que seu consumo não seja prejudicial à saúde humana, não há estudos que o comprovem. Ao invés, a agricultura ecológica é uma resposta integral a todos estes problemas. Já em relação aos transgênicos, foram observados impactos na biodiversidade, poluição de campos adjacentes e resistência a herbicidas, a criação de vírus, resistências em insetos e plantas, danos à fauna de insetos virtuosos. Supõem uma dependência dos agricultores da agroindústria de sementes e de patentes de plantas e animais, uma maior industrialização da agricultura, perda de empregos, custos de responsabilidade ambiental devido à separação de produções.

Ocasionam a produção de substâncias indesejáveis e inesperadas que modificam a composição e função dos órgãos das plantas, reações alérgicas aos alimentos e maior risco de câncer de mama ou maior facilidade de transferência de resistência a antibióticos. Em animais, foram observados desordens metabólicas e problemas de fertilidade.

Base do atual desenvolvimento

Todas as variedades agrícolas tradicionais são oriundas de modificações genéticas conduzidas pelo homem. Sem elas, não existiria a atual agricultura. As plantas transgênicas simplesmente incorporam novas metodologias que acrescentam precisão às modificações convencionais. Nos mais de 10 anos de emprego destas variedades, não se encontrou um único efeito nocivo para a saúde ou para o meio ambiente. Graças aos controles a que estão submetidos, os transgênicos oferecem mais segurança que qualquer variedade convencional. Sua maior produtividade também reduz a superfície de solo agrícola, contribuindo para a preservação de ecossistemas naturais.

A biotecnologia desenvolve novos cultivos de maneira mais rápida e eficaz, e permite melhorias em variedades locais. Cultivos que requerem menos água, ou que resistem melhor ao frio ou às pragas; variedades que incorporam melhorias nutricionais e aliviam deficiências endêmicas em populações; cereais seguros para os celíacos... Corresponde aos cidadãos decidir se desejam prescindir dos benefícios da biotecnologia. Aos cientistas, garantir que se faça bem.