"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música"
Friedrich Nietzsche

quarta-feira, fevereiro 22, 2012

A nova presidente da Petrobrás

A maior estatal do Brasil e uma das duas maiores empresas do país troca de Presidente, saindo do cargo o professor José Sérgio Gabrielli. Assume o cargo Maria das Graças Foster.

Maria das Graças Foster, segundo e-mail que recebi é bastante próxima de Dilma, trabalharam juntas quando Dilma era secretária de Energia do Rio Grande do Sul.

O problema surge quando a proximidade entre a Presidente Dilma e a presidente da Petrobrás pode avalizar um possível conflito de interesses.

A Petrobrás alega que não houve conflito de interesses entre a posição de Maria das Graças Foster e a multiplicação (isso me lembra outro petista) dos contratos do seu marido com a estatal. Em investigação interna afirmou-seu que a área dirigida por Maria das Graças Foster não interferiria nos contratos da empresa de seu marido.

Tudo bem, aceito que não havia ligação legal que comprovasse o conflito de interesses, mas no mínimo existia uma questão ética. E agora na condição de presidente da Petrobrás, tal conflito ético e agora também legal (afinal de contas ela não é mais apenas diretora de uma área restrita e sim presidente da empresa) deveriam impedir que Maria da Graças Foster assumisse o cargo, uma vez que, os negócios com a empresa do marido já foram consumados ou estão em andamento.

Creio que a quebra de contrato com a empresa C Foster Serviços e Equipamentos deve vir com uma multa a ser coberta pela estatal. Não é o caso. A melhor saída (pelo menos a ética), seria o impedimento de Maria das Graças Foster de assumir a presidencia da empresa e ao final dos contratos, a não renovação de serviços por parte da Petrobrás com a C Foster Serviços e Equipamentos enquanto Maria das Graças permanecesse na empresa.

Abaixo acrescentei uma reportagem de Ricardo Noblat.

Ricardo Noblat – 14 nov 2010
Petrobras tem 43 contratos com marido de ministeriável

Negócios saltaram em 2007, quando Graça Foster assumiu diretoria da estatal

Engenheira é cotada para assumir cargo no 1º escalão do governo Dilma; Petrobras nega que haja favorecimento

Fernanda Odilla

A empresa do marido de Maria das Graças Foster, nome forte para o primeiro escalão do governo Dilma Rousseff, multiplicou os contratos com a Petrobras a partir de 2007, ano em que a engenheira ganhou cargo de direção na estatal.

Nos últimos três anos, a C.Foster, de propriedade de Colin Vaughan Foster, assinou 42 contratos, sendo 20 sem licitação, para fornecer componentes eletrônicos para áreas de tecnologia, exploração e produção a diferentes unidades da estatal.

Entre 2005 e 2007, apenas um processo de compra (sem licitação) havia sido feito com a empresa do marido de Graça, segundo a Petrobras.

A C.Foster, que já vendeu R$ 614 mil em equipamentos para a Petrobras, começou na década de 1980 com foco no setor de óleo e gás, área hoje sob a responsabilidade de Graça Foster.

Funcionária de carreira da Petrobras, Graça é cotada para um cargo no primeiro escalão do governo dilmista, como a presidência da Petrobras, a Casa Civil, a Secretaria-Geral da Presidência ou outro posto próximo da presidente eleita, de quem ganhou confiança.

Foi por indicação de Dilma que Graça ganhou, a partir de 2003, posições de destaque no Ministério de Minas e Energia, Petroquisa e BR Distribuidora e, há três anos, assumiu a diretoria de Gás e Energia da Petrobras.

Antes de a C.Foster firmar esses 42 contratos com a Petrobras, a relação de Graça com a empresa do marido, Colin Vaughan Foster, já havia gerado mal-estar.

Em 2004, uma denúncia contra a engenheira, relacionada ao suposto favorecimento à empresa do marido, foi encaminhada à Casa Civil.

O então ministro José Dirceu pediu esclarecimentos ao Ministério de Minas e Energia, sob o comando de Dilma. A fonte da denúncia não é identificada nos documentos obtidos pela Folha.

Sondagem independente não dá vitória a Putin na primeira volta das presidenciais

darussia.blogspot.com – teça-feira, fevereiro 21, 2012

JOSE MILHAZES EM 18:58

Uma sondagem realizada pela “Opinião Aberta”, organização de sociólogos independentes, mostra que Vladimir Putin poderá conseguir 48 por cento dos votos nas eleições presidenciais de 04 de março e terá de participar numa segunda volta.

Este resultado difere muito do prognóstico apresentado pelo Centro de Estudo da Opinião Pública da Rússia, financiado pelo Estado, que dá a Putin 58,6 por cento.
Segundo o estudo da “Opinião Aberta”, Putin “vencerá obrigatoriamente na segunda volta com 54 por cento dos votos”.
Guennadi Ziuganov, líder comunista, conquistará, na primeira volta, 6 por cento dos votos; Vladimir Jirinovski, líder ultranacionalista, e Mikhail Prokhorov, magnata russo conseguirão 3 por cento e Serguei Mironov, dirigente do Partido Rússia Justa, terá 2 por cento.

A "crise do capitalismo global" – Crise de quem? Quem lucra?

resistir info – 22 fev 2012

 

por James Petras [*]

Porta giratória: privado-público-privado.Desde o Financial Times até à extrema-esquerda, toneladas de tinta têm sido gastas a escrever acerca de alguma variante da "Crise do capitalismo global". Se bem que os autores divirjam quanto às causas, consequências e curas, de acordo com as suas luzes ideológicas, há um acordo comum em que "as crises" ameaçam acabar o sistema capitalista tal como o conhecemos.
Não há dúvida de que, entre 2008 e 2009, o sistema capitalista na Europa e nos Estados Unidos sofreu um choque severo que abalou os fundamentos do seu sistema financeiro e ameaçou levar à bancarrota seus "sectores principais".
Contudo, argumentarei que as "crises do capitalismo" foram transformadas em "crises do trabalho". O capital financeiro, o principal detonador do crash e da crise, recuperou-se, a classe capitalista como um todo foi fortalecida e, acima de tudo, ela utilizou as condições políticas, sociais e ideológicas criadas em resultado das "crises" para mais uma vez consolidar sua dominação e exploração sobre o resto da sociedade.
Por outras palavras, a "crise do capital" foi convertida numa vantagem estratégica para promover os interesses mais fundamentais do capital: a expansão de lucros, a consolidação do domínio capitalista, a maior concentração da propriedade, o aprofundamento de desigualdades entre capital e trabalho e a criação de enormes reservas de trabalho para promover o aumento dos seus lucros.
Além disso, a noção de um crise global homogénea do capitalismo passa por alto as profundas diferenças em desempenho e condições entre países, classes e grupos etários.
A tese da crise global: O argumento económico e social
Os advogados da crise global argumentam que começando em 2007 e continuando até o presente, o sistema capitalista mundial entrou em colapso e a recuperação é uma miragem. Eles mencionam a estagnação e a recessão contínua na América do Norte e na Eurozona. Eles apresentam dados do PIB que variam entre o crescimento negativo e o zero. A sua argumentação é apoiada por dados que mencionam dois dígitos de desemprego em ambas as regiões. Frequentemente corrigem os dados oficiais que minimizam a percentagem desempregada através da exclusão de trabalhadores desempregados em tempo parcial e a longo prazo. O argumento da "crise" é fortalecido com a citação dos milhões de proprietários de casas que foram despejados pelos bancos, pelo aumento agudo da pobreza e da penúria que acompanha perdas de emprego, reduções de salário e a eliminação ou redução de serviços sociais. A "crise" também é associada ao aumento maciço de bancarrotas, principal de pequenos e médios negócios e bancos regionais.
A crise global: A perda de legitimidade
Críticos, especialmente na imprensa financeira, escrevem acerca de uma "crise de legitimidade do capitalismo" citando inquéritos que mostram maiorias substanciais a questionarem a justiça do sistema capitalista, as vastas e crescentes desigualdades e as regras manipuladas pelas quais bancos exploram a sua dimensão ("demasiado grande para falir") a fim de atacar o Tesouro a expensas de programas sociais.
Em suma, os advogados da tese de uma "Crise global do capitalismo" apresentam uma argumentação convincente, demonstrando os efeitos profundos e generalizados do sistema capitalista sobre a vida da grande maioria da humanidade.
O problema é que uma "crise da humanidade" (mais especificamente dos trabalhadores assalariados) não é o mesmo que uma crise do sistema capitalista. De facto, como argumentaremos adiante, a adversidade social crescente, o declínio do rendimento e do emprego tem sido um factor importante que facilitou a recuperação rápida e maciça das margens de lucro da maior parte das corporações de grande dimensão.
Além disso, a tese de uma crise "global" do capitalismo combina economias, países, classes e grupos etários díspares com desempenhos agudamente divergentes em diferentes momentos históricos.
Crise global ou desenvolvimento irregular e desigual?
É absolutamente louco argumentar a existência de uma "crise global" quando várias das maiores economias na economia mundial não sofreram uma grande baixa de actividade e outras recuperaram-se e expandiram-se rapidamente. A China e a Índia não sofreram sequer uma recessão. Mesmo durante os piores anos do declínio europeu-estado-unidense, os gigantes asiáticos cresceram a uma média de cerca de 8%. As economias da América Latina, especialmente os maiores exportadores agro-minerais (Brasil, Argentina, Chile) com mercados diversificados, especialmente na Ásia, detiveram-se brevemente (em 2009) antes de assumirem crescimento moderado a rápido (entre 3% e 7%) entre 2010 e 2012.
Ao agregar dados económicos da eurozona como um todo os advogados da crise global ignoraram as enormes disparidades de desempenho dentro da zona. Enquanto a Europa do Sul afunda-se numa depressão profunda e constante, por qualquer medida, desde 2008 até o futuro previsível, as exportações alemãs em 2011 estabeleceram um recorde de um milhão de milhões (trillion) de euros; seu excedente comercial atingiu 158 mil milhões de euros, depois de excedentes de 155 mil milhões de euros em 2010. (BBC News, Feb. 8 2012).
Enquanto o desemprego agregado da eurozona atinge os 10,4%, as diferenças internas desafiam qualquer noção de uma "crise geral". O desemprego na Holanda é 4,9%, na Áustria 4,1% e na Alemanha 5,5% com reclamações do patronato de escassez de trabalho qualificado em sectores chave para o crescimento. Por outro lado, no explorado Sul da Europa o desemprego caminha para níveis de depressão, Grécia 21%, Espanha 22,9%, Irlanda 14,5% e Portugal 13,6% (FT 1/19/12, p.7). Por outras palavras, "a crise" não afecta adversamente algumas economias, que de facto lucram com a sua dominação de mercado e fortaleza tecno-financeira em relação a economias dependentes, devedoras e atrasadas. Falar de uma "crise global" obscurece as relações fundamentais dominantes e exploradoras que facilitam a "recuperação" e o crescimento das economias de elite sobre e contra os seus competidores e estados clientes. Além disso os teóricos da crise global erradamente amalgamam economias financeiras-especulativas cavalgadas pela crise (EUA, Inglaterra) com economias produtivas exportadoras (Alemanha, China).
O segundo problema com a tese de uma "crise global" é que ela ignora profundas diferenças internas entre grupos etários. Em vários países europeus a juventude desempregada (16-25) chega a estar entre 30 e 50% (Espanha 48,7%, Grécia 47,2%, Eslováquia 35,6%, Itália 31%, Portugal 30,8% e Irlanda 29%) ao passo que na Alemanha, Áustria e Holanda o desemprego juvenil vai dos 7,8% para a Alemanha, 8,2% para a Áustria e 8,6% para a Holanda (Financial Times 2/1/12, p2). Estas diferenças fundamentam a razão porque não há um "movimento juvenil global" de "indignados" e "ocupantes". Diferenças de cinco vezes entre juventude desempregada não são propícias à solidariedade "internacional". A concentração dos números do alto desemprego juvenil explica o desenvolvimento desigual dos protestos de rua em massa centrados especialmente no Sul da Europa. Também explica porque o movimento "anti-globalização" no Norte euro-americano é em grande media um fórum sem vida que atrai explicações académicas pomposas sobre a "crise capitalista global" e a impotência dos "Fóruns sociais" que são incapazes de atrair milhões de jovens desempregados do Sul da Europa. Eles são mais atraídos para a acção directa. Teóricos globalistas ignoram o modo específico pelo qual a massa de jovens trabalhadores desempregados é explorada nos seus países dependentes cavalgados pela dívida. Eles ignoram o modo específico pelo qual são dominados e reprimidos por partidos capitalistas de centro-esquerda e de direita. O contraste é mais evidente no Inverno de 2012. Trabalhadores gregos são pressionados a aceitar um corte de 20% nos salários mínimos ao passo que trabalhadores da Alemanha estão a exigir um aumento de 6%.
Se a "crise" do capitalismo se manifesta em regiões específicas, ela igualmente afecta diferentes sectores etários/raciais das classes assalariadas. As taxas de desemprego da juventude aos trabalhadores mais velhos variam enormemente. Na Itália a proporção é 3,5/1, na Grécia 2,5/1, em Portugal 2,3/1, na Espanha 2,1/1 e na Bélgica 2,9/1. Na Alemanha é 1,5/1 (FT 2/1/12). Por outras palavras, devido aos níveis de desemprego mais altos entre os jovens eles têm maior propensão para a acção directa "contra o sistema", ao passo que trabalhadores mais velhos com níveis de emprego mais altos (e benefícios de desemprego) têm mostrado uma maior propensão para confiar na urna eleitoral e comprometer-se em greves limitadas sobre questões relacionadas com o emprego e o pagamento. A vasta concentração do desemprego entre jovens trabalhadores significa que eles constituem o "núcleo disponível" para a acção constante; mas também significa que só podem alcançar limitada unidade de acção com a classe trabalhadora mais velha que experimenta desemprego de um algarismo.
Contudo, também é verdadeiro que a grande massa da juventude desempregada proporciona uma arma formidável, nas mãos dos patrões, para ameaçar substituir trabalhadores empregados mais velhos. Hoje, os capitalistas recorrem constantemente à utilização dos desempregados para reduzir salários e benefícios e intensificar a exploração (baptizada como "aumento de produtividade") para aumentar margens de lucro. Longe de serem simplesmente um indicador da "crise capitalista", os altos níveis de desemprego têm servido juntamente com outros factores par aumentar a taxa de lucro, acumular rendimento, ampliar desigualdades de rendimento as quais aumentam o consumo de bens de luxo para a classe capitalista: as vendas de automóveis e relógios de luxo estão florescentes.
Crise de classe: A contra-tese
Contrariando os teóricos da "crise capitalista global", emergiu uma quantidade substancial de dados que refuta suas suposições. Um estudo recente informa "Lucros corporativos estado-unidenses estão mais altos em proporção do produto interno bruto do que em qualquer momento desde 1950" (FT 1/30/12). Os saldos de caixa de companhias dos EUA nunca foram maiores, graças à exploração intensificada dos trabalhadores e a um sistema de salários multi-estratificado no qual novos contratados trabalham por uma fracção do que os trabalhadores mais velhos recebiam (graças a acordos assinados por líderes sindicais capachos).
Os ideólogos da "crise do capitalismo" ignoraram os relatórios financeiros das principais corporações estado-unidenses. Segundo o relatório de 2011 da General Motors destinado aos seus accionistas, eles celebraram o maior lucro de sempre, revelando um lucro de US$7,6 mil milhões, o que ultrapassa o recorde anterior de US$6,7 mil milhões em 1997. Uma grande parte destes lucros resulta do congelamento dos seus fundos de pensão subfinanciados e da extracção de maior produtividade do menor número de trabalhadores – por outras palavras, da intensificação da exploração – e do corte pela metade dos salários horários dos novos contratados. (Earthlink News 2/16/12)
Além disso, a importância agravada da exploração imperialista é evidente pois a proporção de lucros das corporações estado-unidenses que é extraída além-mar mantém-se em ascensão a expensas do crescimento do rendimento dos empregados. Em 2011, a economia dos EUA cresceu em 1,7%, mas a mediana dos salários caiu em 2,7%. Segundo a imprensa financeira, "as margens de lucro das S&P 500 saltaram de 6% para 9% do PIB nos últimos três anos. A última vez que foi alcançada tal proporção foi há três gerações. Em linha gerais um terço, a fatia estrangeira destes lucros, mais do que duplicou desde 2000" (FT 2/13/12 P9. Se isto é uma "crise capitalista", então quem é que precisa de um boom capitalista?
Inquéritos a corporações de topo revelam que companhias estado-unidenses possuem US$1,73 milhão de milhões em cash, "os frutos do recorde de altas margens de lucro" (FT 1/30/12 p.6). Estas margens de lucro recorde resultam de despedimentos em massa os quais levaram à intensificação da exploração dos restantes trabalhadores. Taxas de juro federais desprezíveis e acesso fácil ao crédito também permitem aos capitalistas explorarem amplos diferenciais entre a contracção de empréstimos e a concessão dos mesmos e o investimento. Impostos mais baixos e cortes em programas sociais resultam numa crescente acumulação de cash das corporações. Dentro da estrutura corporativa, o rendimento vai para o topo onde executivos seniores pagam a si próprios bónus enormes. Dentre as principais corporações S&P 500 a proporção de rendimento que vai para dividendos de accionistas é a mais baixa desde 1900 (FT 1/30/12, p.6).
Uma crise capitalista real afectaria adversamente margens de lucro, ganhos brutos e a acumulação de cash. Lucros ascendentes estão a ser amontoados porque quando capitalistas se aproveitam da exploração intensa o consumo das massas estagna.
Os teóricos da crise confundem o que é claramente a degradação do trabalho, a degradação das condições de vida e de trabalho e mesmo a estagnação da economia, com uma "crise" do capital: quando a classe capitalista aumenta suas margens de lucros, arrecada milhões de milhões, ela não está em crise. O ponto-chave é que a "crise do trabalho" é um grande estímulo para a recuperação de lucros capitalistas. Não podemos generalizar de uma para a outra. Não há dúvida de que houve um momento de crise capitalista (2008-2009) mas graças à maciça transferência de riqueza, sem precedentes no estado capitalista, do tesouro público para a classe capitalista – bancos da Wall Street em primeiro lugar – o sector corporativo recuperou, ao passo que os trabalhadores e o resto da economia permaneceu em crise, foi à bancarrota e ficou sem trabalho.
Da crise à recuperação de lucros: 2008/9 a 2012
A chave para a "recuperação" de lucros corporativos tem pouco a ver com o ciclo de negócios e tudo com a tomada de poder em grande escala da Wall Street e a pilhagem do Tesouro dos EUA. Entre 2009-2012 centenas de antigos executivos da Wall Street, administradores e conselheiros de investimento apoderaram-se de todas as principais posições decisiva no Departamento do Tesouro e canalizaram milhões de milhões de dólares para os cofres das principais financeiras e corporações. Eles intervieram em corporações financeiramente perturbadas, como a General Motors, impondo grandes cortes salariais e demissões de milhares de trabalhadores.
Os homens da Wall Street no Tesouro elaboraram a doutrina do "Demasiado grande para falir" a fim de justificar a transferência maciça de riqueza. A totalidade do edifício especulativo construído em parte por um aumento de 234 vezes no volume de transacções cambiais entre 1977-2010 foi restaurado (FT 1/10/12, p.7). A nova doutrina argumentou que a primeira e principal prioridade do estado é devolver a lucratividade ao sistema financeiro a qualquer custo para a sociedade, os cidadãos, os contribuintes e os trabalhadores. O "Demasiado grande para falir" é um repúdio completo dos mais básicos princípios do sistema capitalista de "mercado livre": a ideia de que aqueles capitalistas que perdem arquem as consequências; que cada investidor ou presidente de empresa é responsável pela sua acção. Os capitalistas financeiros já não precisam justificar sua actividade em termos de qualquer contribuição para o crescimento da economia ou da "utilidade social". De acordo com os que agora dominam a Wall Street deve ser salva porque é a Wall Street, mesmo se o resto da economia e o povo afundarem (FT 1/20/12, p.11). Os salvamentos e financiamentos do estado são complementados por centenas de milhares de milhões em concessões fiscais, levando a défices fiscais sem precedentes e ao crescimento de desigualdades sociais maciças. O pagamento de um presidente de empresa (CEO) como um múltiplo do trabalhador médio passou de 24 para 1 em 1965 para 325:1 em 2010 (FT 1/9/12, p.5).
A classe dominante exibe a sua riqueza e poder com a ajuda conivente da Casa Branca e do Tesouro. Face à hostilidade popular à pilhagem do Tesouro pela Wall Street, Obama chegou ao fingimento de pedir ao Tesouro para impor um tecto aos bónus de muitos milhões de dólares que os presidentes de bancos salvos concediam-se a si próprios. Os homens da Wall Street no Tesouro recusaram-se a impor a ordem executiva, os CEOs obtiveram milhares de milhões em bónus em 2011. O presidente Obama continuou, pensando que enganava o público estado-unidense com o seu gesto falso, enquanto arrecadava milhões de fundos de campanha junto à Wall Street!
A razão porque o Tesouro foi capturado pela Wall Street é que nas décadas de 1990 e 2000 os bancos se tornaram uma força dominante nas economias ocidentais. Sua fatia do PIB subiu drasticamente (de 2% na década de 1950 para 8% em 2010" (FT 1/10/12, p.7).
Hoje é "procedimento operacional normal" para o presidente nomear homens da Wall Street para todas as posições económicas chave e é "normal" para estes mesmos responsáveis prosseguirem políticas que maximizam lucros da Wall Street e eliminam qualquer risco de fracasso, não importa quão aventurosos e corruptos sejam os seus praticantes.
A porta giratória: Da Wall Street para o Tesouro e retorno
A relação entre a Wall Street e o Tesouro tornou-se efectivamente uma "porta giratória": da Wall Street para o Departamento do Tesouro para a Wall Street. Banqueiros privados assumem compromissos no Tesouro (ou são recrutados) para assegurar que todos os recursos e políticas que a Wall Street são concedidas com o máximo esforço, com o mínimo obstáculo de cidadãos, trabalhadores ou contribuintes. Os homens da Wall Street no Tesouro dão a mais alta prioridade à sobrevivência, recuperação e expansão dos lucros da Wall Street. Eles bloqueiam quaisquer regulamentações ou restrições a bónus ou a repetições das fraudes do passado.
Os homens da Wall Street "ganham reputação" no Tesouro e então retornam ao sector privado em posições mais altas, como conselheiros sénior e sócios. Uma nomeação no Tesouro é uma escada para subir na hierarquia da Wall Street. O Tesouro é um posto de abastecimento para a Limusine da Wall Street: o ex homens da Wall Streets enchem o tanque, verificam o óleo e então salvam para o assento da frente e correm para um emprego lucrativo, deixando o posto de abastecimento (público) pagar a conta.
Aproximadamente 774 responsáveis saíram do Tesouro entre Janeiro de 2009 e Agosto de 2011 (FT 2/6/12, p. 7). Todos eles proporcionaram "serviços" lucrativos para os seus futuros patrões da Wall Street, descobrindo uma grande maneira de re-entrar nas finanças privadas numa posição lucrativa mais alta.
Uma notícia no Financial Times Fev. 6, 2012 (p. 7) adequadamente intitulada "Manhattan Transfer" proporcionava ilustrações típicas da "porta giratória" Tesouro-Wall Street.
Ron Bloom passou de banqueiro júnior no Lazard para o Tesouro, ajudando a engendrar um salvamento de um milhão de milhões de dólares da Wall Street e retornou ao Lazard como conselheiro sénior. Jake Siewert foi da Wall Street tornando-se ajudante principal do secretário do Tesouro Tim Geithner e então graduado na Goldman Sachs, tendo servido para solapar qualquer tecto nos bónus da Wall Street.
Michael Mundaca, o mais sénior responsável fiscal no regime Obama veio da Street e então passou par um posto altamente lucrativo na Ernst and Young, uma firma corporativa de contabilidade, tendo ajudado a reduzir impostos corporativos durante o seu período no "gabinete público".
Eric Solomon, um responsável fiscal sénior na infame isenção de impostos corporativos da administração Bush, fez a mesma comutação. Jeffrey Goldstein que Obama encarregou da regulação financeira e teve êxito em solapar exigências populares, retornou ao seu patrão anterior, Hellman and Friedman, com a adequada promoção pelos serviços prestados.
Stuart Levey que dirigiu as sanções da AIPAC contra políticas do Irão a partir da chamada "agência anti-terrorista" do Tesouro foi contratado como advogado geral pelo HSBC para defendê-lo de investigações de lavagem de dinheiro (FT 2/6/12, p. 7). Neste caso Levey passou da promoção dos objectivos de guerra de Israel para a defesa de um banco internacional acusados de lavar milhares de milhões do cartel mexicano. Levey, a propósito gastou tanto tempo a insistir na agenda iraniana de Israel que ignorou totalmente a lavagem de dinheiro dos carteis mexicanos da droga com operações transfronteiriças durante quase uma década.
Lew Alexander, conselheiro sénior de Geithner na concepção do salvamento de mil milhões de dólares, é agora responsável sénior no Nomura, o banco japonês. Lee Sachs passou do Tesouro para o Bank Alliance (sua própria "plataforma de concessão de empréstimos"). James Millstein foi do Lazard para o Tesouro, salvou a seguradora AIG dirigida abusivamente por Greenberg e então estabeleceu a sua própria firma privada de investimento tomando consigo um conjunto de responsáveis do Tesouro bem conectados.
A "porta giratória" Goldman Sachs-Tesouro continua ainda hoje. Além do passado e actual chefes do Tesouro, Paulson e Geithner, Mark Patterson, antigo sócio da Goldman, foi recentemente nomeado "chefe de equipe" de Geithner. Tim Bowler, antigo administrador director foi nomeado por Obama para chefe da divisão de mercados de capital.
Deveria ser perfeitamente claro que eleições, partidos e os mil milhões de dólares de campanhas eleitorais têm pouco a ver com "democracia" e mais a ver com a selecção dos presidente e dos legisladores que nomearão homens não eleitos da Wall Street para tomarem todas as decisões económicas estratégicas para 99% dos americanos. Os resultados da porta giratória Wall Street-Tesouro são claros e proporcionam-nos uma estrutura para entender porque a "crise do lucro" desvaneceu-se e a crise do trabalho aprofundou-se.
Os "alcances políticos" da porta giratória
O conluio Wall Street-Tesouro (CWST) tem desempenhado um trabalho hercúleo e audacioso para o capital financeiro e corporativo. Face à condenação universal da Wall Street pela vasta maioria do público pelas suas fraudes, bancarrotas, perdas de empregos e arrestos hipotecários, o CWST apoiou publicamente os trapaceiros com um salvamento de um milhão de milhões de dólares. Um movimento ousado face a isto, como se maiorias e eleições contassem para alguma coisa. Igualmente importante é que o CWTS lançou ao lixo toda a ideologia do "livre mercado" que justificava lucros dos capitalistas com base nos seus "riscos", pela imposição do novo dogma do "demasiado grande para falir" pelo qual o tesouro do estado garante lucros mesmo quando capitalistas enfrentam a bancarrota, desde que sejam firmas de milhares de milhões de dólares. O CWST também deitou ao lixo o principio capitalista da "responsabilidade fiscal" em favor de centenas de milhares de milhões de dólares de isenções fiscais para a classe dominante corporativo-financeira, provocando défices orçamentais recordes em tempo de paz e tendo então a audácia de culpar os programas sociais apoiados pelas maiorias populares. (Será de admirar que estes ex-responsáveis do Tesouro obtenham ofertas tão lucrativas no sector privado quando abandonam o gabinete público?)
Em terceiro lugar, o Tesouro e o Banco Central (Federal Reserve) proporcionam empréstimos a juro próximo de zero que garantem grandes lucros a instituições financeiras privadas as quais tomam emprestado a juro baixo do Fed e concedem empréstimos a juro alto (incluindo o Governo!) especialmente na compra de governos além mar e títulos corporativos. Eles recebem em qualquer lugar de quatro a dez vezes as taxas de juro que pagam. Por outras palavras, os contribuintes proporcionam um monstruoso subsídio à especulação da Wall Street. Com a condição acrescentada de que hoje estas actividades especulativas são agora assegurados pelo governo federal, sob a doutrina do "Demasiado grande para falir".
Sob a ideologia da "recuperação da competitividade" a equipe económica de Obama (desde o Tesouro até o Federal Reserve, o Departamento do Comércio e o do Trabalho) encorajaram o patronato a empenhar-se no mais agressivo despedimento acelerado (shedding) de trabalhadores da história moderna. A produtividade e a lucratividade aumentadas não é o resultado de " inovação" como proclamam Obama, Geithner e Bernache; é um produto de uma política de estado quanto ao trabalho que aprofunda a desigualdade pela manutenção de salários baixos e margens de lucro em ascensão. Menos trabalhadores a produzirem menos mercadorias. Crédito barato e salvamentos para os bancos de milhares de milhões de dólares e nenhum refinanciamento para casas e firmas de pequena e média dimensão que levam a bancarrotas, absorções (buyouts) e nomeadamente "consolidação", maior concentração de propriedade. Em resultado o mercado de massa estagna mas os lucros corporativos e dos bancos alcançam níveis recorde. Segundo peritos financeiros, sob a "nova ordem" do CWST "os banqueiros são uma classe protegida que desfruta de bónus sem relação com o desempenho, enquanto confia no contribuinte para socializar suas perdas" (FT 1/9/12, p.5).
Em contraste, o trabalho, sob a equipe económica de Obama, enfrenta a maior insegurança e a mais ameaçadora situação da história recente: "o que é inquestionavelmente novo é a ferocidade com que os negócios nos EUA sangra o trabalho agora que o pagamento dos executivos e os esquemas de incentivo estão ligados a objectivos de desempenho a curto prazo" (FT 1/9/2012, p. 5).
Consequências económicas de políticas de estado
Por causa da captura pela Wall Street das posições estratégicas no governo quanto à política económica podemos entender o paradoxo de margens de lucro recordes em meio à estagnação económica. Podemos compreender porque a crise capitalista, pelo menos a curto prazo, foi substituída por uma profunda crise do trabalho. Dentro da matriz de poder da Wall Street-Departamento do Tesouro retornaram todas as velhas e corruptas práticas de exploração que levaram ao crash de 2008-2009: bónus multi-bilionários para banqueiros de investimento que conduziram a economia ao crash; bancos "a apanharem rapidamente milhares de milhões de dólares de produtos hipotecários empacotados que recordam a dívida fatiada e jogada aos dados que alguns (sic) culpam pela crise financeira" (FT 2/8/12, p.1). A diferença hoje é que estes instrumentos especulativos são agora apoiados pelo contribuinte (Tesouro). A supremacia da estrutura financeira da economia estado-unidense anterior à crise está em vigor em próspera ... "só" a força de trabalho dos EUA afundou no maior desemprego, declínio de padrões de vida, insegurança generalizada e profundo descontentamento.
Conclusão: O processo contra o capitalismo e pelo socialismo
A crise profunda de 2008-2009 provocou um jorro de questionamentos do sistema capitalista, mesmo entre muitos dos seus mais ardentes advogados a crítica abunda (FT 1/8/12 a 1/30/12). "Reforma, regulamentação e redistribuição" eram o cardápio de colunistas financeiros. Mas a classe dominante na economia e no governo não lhe presta atenção. Os trabalhadores são controlados por líderes sindicais capachos e falta-lhe um instrumento político. Os pseudo populistas de direita abraçam uma agenda pró capitalista ainda mais virulenta, clamando pela eliminação total de programas sociais e impostos corporativos. Dentro do estado verificou-se uma grande transformação que efectivamente esmagou qualquer ligação entre capitalismo e estado previdência, entre a tomada de decisões pelo governo e o eleitorado. A democracia foi reatada por um estado corporativo, fundamentado na porta giratória entre o Tesouro e a Wall Street, a qual canaliza riqueza pública para cofres dos financeiros privados. A brecha entre o bem-estar da sociedade e as operações da arquitectura financeira é definitiva.
A actividade da Wall Street não tem utilidade social, seus praticantes enriquecem-se sem actividade que os redima. O capitalismo demonstrou conclusivamente que prospera através da degradação de dezenas de milhões de trabalhadores e rejeita as súplicas infindáveis por reforma e regulamentação. O capitalismo real existente não pode ser arreado para elevar padrões de vida ou assegurar emprego livre do medo de despedimentos em grande escala, súbitos e brutais. O capitalismo, como experimentámos ao longo da última década e no futuro previsível, está em oposição polar à igualdade social, à tomada de decisões democráticas e ao bem-estar colectivo.
Lucros capitalistas recordes são ampliados pela pilhagem do tesouro publico, negando pensões e prolongando "trabalho até que você morra", levando famílias à bancarrota com exorbitantes custos corporativos de medicina e educação.
Mais do que nunca na história recente, maiorias recordes rejeitam o domínio por e para os banqueiros e a classe dominante corporativa (FT 2/6/12, p. 6). Desigualdades entre os 1% do topo e a base dos 99% atingiram proporções recordes. Presidentes de empresas ganham 325 vezes mais do que um trabalhador médio (FT 1/9/12, p.5). Desde que o estado tornou-se um "fundamento" da economia dos predadores da Wall Street, e desde que a "reforma" e regulamentação fracassaram tristemente, é tempo de considerar uma transformação sistémica fundamental que abra caminho a uma revolução política a qual forçosamente expulsará as elites financeiras e corporativas não eleitas que dirigem o estado para os seus próprios exclusivos interesses. A totalidade do processo político, incluindo eleições, está profundamente corrompida: cada nível de gabinete tem o seu próprio preço inflacionado. A actual disputa presidencial custará US$2 a US$3 mil milhões de dólares para determinar qual dos servidores da Wall Street presidirá sobre a porta giratória.
O socialismo já não é a palavra assustadora do passado. O socialismo envolve a reorganização em grande escala da economia, a transferência de milhões de milhões dos cofres das classes predadoras de nenhuma utilidade social para o bem-estar público. Esta mudança pode financiar uma economia produtiva e inovadora baseada no trabalho e no lazer, no estudo e no desporto. O socialismo substitui o terror diário da demissão pela segurança que traz confiança, segurança e respeito ao lugar de trabalho. A democracia no lugar de trabalho está no cerne da visão de socialismo do século XXI. Começamos por nacionalizar os bancos e eliminar a Wall Street. As instituições financeiras são redesenhadas para criar emprego produtivo, servir o bem-estar social e preservar o ambiente. O socialismo começaria a transição, de uma economia capitalista dirigida por predadores e trapaceiros e um estado sob o seu comando, rumo a uma economia de propriedade pública sob controle democrático.

[*] O seu livro mais recente é The Arab Revolt and the Imperialist Counter Attack, Clarity Press, 2012, 2ª edição.
O original encontra-se em
http://www.globalresearch.ca/index.php?context=va&aid=29388

Alemanha, Grécia e a Segunda Guerra Mundial

Enviado por luisnassif, qua, 22/02/2012 - 10:10

Por Sérgio Lamarca

De Le Monde

Teria a Alemanha uma dívida de guerra com a Grécia?

Chris Hondros/Getty Images/AFP

Angela Merkel, chanceler alemã, discursa na sede da ONU em Nova York em 21.09.2010

Angela Merkel, chanceler alemã, discursa na sede da ONU em Nova York em 21.09.2010

“Os alemães, que estão relutando em financiar um segundo plano de socorro para a Grécia, deveriam se lembrar de tudo aquilo que eles pilharam nesse país durante a Segunda Guerra Mundial [...] Com os juros, são 81 bilhões de euros que eles devem a Atenas. Essa é uma outra maneira de ver a Europa e sua história”.

mem que diz isso não é um ex-resistente grego, nem mesmo um membro da oposição grega - ele nem grego é. Trata-se do eurodeputado Daniel Cohn-Bendit, interpelando na quarta-feira (15) os dirigentes alemães no Parlamento europeu após a recusa da troika europeia em conceder um segundo plano de ajuda de 130 bilhões de euros a Atenas.

Protestos na Grécia

Foto 45 de 48 - 17.fev.2012 -Estudantes atiram objetos contra policiais que fazem guarda em frente ao Parlamento grego, durante manifestação contra as medidas de austeridade Thanassis Stavrakis/AP

“Eles tomaram o dinheiro grego e nunca mais o devolveram”

Teria a Alemanha uma dívida de guerra em aberto com a Grécia? A pergunta pode parecer absurda, mas ela tem o mérito de reposicionar a crise da dívida que tem atravessado o continente europeu em um longo período. Acusados de maus pagadores, sufocados por vários planos de rigor, enervados pelas decisões alemãs, há cada vez mais gregos relembrando o passado de Berlim.

No início de 2010, durante uma viagem pela Alemanha, Theodoros Pangalos, então vice-premiê, havia lançado uma bomba nas ondas da BBC: “Eles tomaram as reservas de ouro do Banco da Grécia, eles tomaram o dinheiro grego e nunca devolveram. É um assunto que deverá ser abordado algum dia”. Em dezembro do mesmo ano, o ministro grego das Finanças, Philippos Sahinidis, foi mais longe ao calcular a dívida alemã para com seu país em 162 bilhões de euros, comparando com o montante da dívida grega que chegava a 350 bilhões de euros no final de 2011.

Mais recentemente, foi a vez do herói da Resistência Manolis Glezos, 89, conhecido por ter retirado a bandeira nazista da Acrópole em 1941, de pedir pelo pagamento do empréstimo imposto à Grécia pelo regime nazista. “Com os prejuízos de guerra”, que Atenas ainda se reserva o direito de reivindicar, “São 162 bilhões de euros, sem juros”, calcula.

Quanto deve a Alemanha? 81 bilhões, como diz Cohn-Bendit? 162 bilhões, de acordo com as reivindicações gregas? 68 bilhões, como afirma o “Le Point”? Ou nada, como sustenta Berlim? A batalha de números que cerca esta questão é proporcional à complexidade da situação.

Estamos em 1941. No dia 6 de abril, a Wehrmacht invadiu a Grécia. Ela permaneceria ali até 1944. Em sua obra “Na Grécia de Hitler” [“Inside Hitler’s Greece”], o historiador Mark Mazower afirma que a Grécia talvez seja o país que mais sofreu com o jugo nazista - depois da Rússia e da Polônia - e que ela passou por uma “pilhagem sistemática de seus recursos”. Em 1941, os nazistas impuseram ao Banco Central grego, assim como fizeram em outros países, um empréstimo de 476 milhões de reichsmarks a título de contribuição para o esforço de guerra.

Esse “empréstimo” nunca foi pago, pela simples razão de que ele não figura no acordo de Londres de 1953 que determina o montante das dívidas externas contraídas pela Alemanha entre 1919 e 1945. Para não repetir os erros do tratado de Versalhes e poupar esse novo aliado do Oeste diante da ameaça comunista, os Estados Unidos consentiram em reduzir a dívida da Alemanha pela metade. Solicitou-se às vítimas da Ocupação que elas esquecessem seus pedidos de reparação. O objetivo estratégico dos aliados era edificar uma Alemanha forte e serena, e não arruinada pelas dívidas e humilhada.

Washington conseguiu sobretudo dos países beneficiários do Plano Marshall que eles desistissem de exigir imediatamente o que lhes era devido, adiando possíveis reparações para um reunificação da Alemanha como parte de um “tratado de paz”. “A partir daí, a Alemanha teve plena saúde, enquanto o resto da Europa sofria para curar as feridas deixadas pela guerra e pela ocupação alemã”, resume o historiador da Economia Albrecht Ritschl, professor alemão da London School of Economics, em uma entrevista ao “Der Spiegel” (em versão francesa no “Courrier International”).

A Alemanha deu o calote três vezes

Esse adiamento permitiu que a República Federal da Alemanha vivesse um verdadeiro “milagre econômico”, o famoso Wirtschaftswunder, durante quatro décadas. E na hora de pagar a conta, Bonn deu um jeito de não honrar seus compromissos. O chanceler Helmut Kohl conseguiu de fato que o Tratado de Moscou de 1990 ratificando a reunificação não trouxesse a menção “tratado de paz”, uma das condições que figuravam no acordo de 1953 para possíveis pagamentos. “Era uma forma de continuar fugindo das reparações. “Na prática, o acordo de Londres de 1953 liberava os alemães da obrigação de pagar suas dívidas de guerra”, resume o jornal alemão.

Em outras palavras, o atual campeão econômico da zona do euro deu o calote três vezes ao longo do século 20: nos anos 1930, em 1953 e em 1990. “A Alemanha não pagou suas reparações após 1990 - com exceção das indenizações pagas aos trabalhadores forçados”, diz Albrecht Ritschl ao “Der Spiegel”. “Os créditos obtidos à força nos países ocupados durante a Segunda Guerra Mundial e os gastos associados à Ocupação tampouco foram pagos. À Grécia também não.” Mas “ninguém na Grécia se esqueceu de que a República Federal devia sua boa forma econômica aos favores consentidos por outras nações”, ele diz.

A República Federal indenizou a Grécia uma única vez: 115 milhões de marcos alemães (cerca de 58 milhões de euros). Foi em 1960, como parte de um acordo global com diversos países europeus e Israel. Desde então, a Alemanha acredita ter quitado sua dívida. Melhor ainda, ela não hesita em lembrar que ela “pagou desde 1960 cerca de 33 bilhões de marcos alemães em ajuda à Grécia, tanto de maneira bilateral como parte da União Europeia”. A isso se deve acrescentar que a Grécia recebeu mais de US$ 700 milhões da época como parte do Plano Marshall.

Cohn-Bendit: uma questão “moral”

Só que nesse período de crise continental, nem todo mundo, inclusive na Alemanha, se satisfaz com os imensos favores concedidos a Berlim após a guerra. Sufocados por suas dívidas e pressionados por Berlim a aplicar os planos de austeridade, há cada vez mais gregos querendo dividir parte de seu fardo com seus antigos invasores.

A soma de 162 bilhões de euros mencionada vai bem além do pagamento do empréstimo forçado, estimado entre 54 bilhões e 81 bilhões de euros. Além disso, ela engloba os 108 bilhões avaliados durante a Conferência Internacional de Paz em Paris para a reparação dos prejuízos causados pelas tropas nazistas à infraestrutura econômica do país.

Já Daniel Cohn-Bendit se coloca em um “plano moral”: “Os alemães, que se dizem virtuosos, acreditam que os gregos pecaram e que eles devem pagar. Ora, os que mais pecaram foram justamente os alemães, cuja dívida foi apagada porque os americanos viram ali um interesse estratégico. Por que não considerar que salvar a Grécia é algo estratégico, em vez de fazer esse país se pôr de joelhos?”

Tradutor: Lana Lim

The Independent: a Europa em liquidação

Enviado por luisnassif, qua, 22/02/2012 - 09:50

Por Gilberto .

De The Independent

CRISE DA ZONA EURO

A grande venda relâmpago na Europa

Grosse Kinigat (Áustria), floresta irlandesa, Praia Caprera (Itália), o pavilhão de caça real em la Muette (França), o sol grego, helicópteros MoD (Reino Unido).
Grosse Kinigat (Áustria), floresta irlandesa, Praia Caprera (Itália), o pavilhão de caça real em la Muette (França), o sol grego, helicópteros MoD (Reino Unido).

Presseurop

Em toda a Europa, os países procuram uma maneira rápida de arranjar dinheiro. E todos eles parecem ter a mesma ideia: vender bens do Estado.

Tom Bawden | Charlie Cooper

O que têm em comum as festas de Carnaval de Portugal, o sol da Grécia, o National Stud [coudelaria nacional] da Irlanda e a lotaria nacional de Espanha?

Resposta: estão a ser vendidos ou cancelados por Governos europeus, que tentam desesperadamente pôr em ordem as respetivas finanças públicas, ao fim de uma década em que viveram acima das suas possibilidades. Um número considerável de países está a fazer o equivalente a vender as pratas da família, numa venda relâmpago, à escala europeia e sem precedentes evidentes, de bens do Estado.

A Grécia talvez seja o maior leiloeiro do continente, ao pôr à venda bens com um valor estimado de 50 mil milhões de euros. Mas outros tiveram a mesma ideia.

Estas medidas desesperadas podem parecer ambiciosas quando tudo corre bem – mas, neste momento, as coisas não estão a correr bem. E, se toda a gente puser coisas à venda ao mesmo tempo, os preços tendem a baixar. A Grécia, por exemplo, angariou apenas 180 milhões da sua meta declarada de 50 mil milhões de euros.

No entanto, não deverá haver falta de compradores. A China procura investir a sua riqueza em tudo e mais alguma coisa que haja por esse mundo e os governos do Médio Oriente continuam a tentar gastar os proventos do petróleo.

É difícil saber se devemos sentir-nos animados ou deprimidos perante esta perspetiva. Por um lado, qualquer coisa que possa acelerar o alívio das nossas dívidas deve ser bem-vinda. Por outro, uma vez vendidas, as pratas da família continuam vendidas. À medida que as nossas economias vão sendo gradualmente marginalizadas pela China e pela Índia, aumenta o perigo de as coisas nunca mais voltarem a ser o que eram dantes.

1. Irlanda

Florestas, serviços, uma companhia aérea, o National Stud

O Estado irlandês está a vender participações numa série de bens públicos, entre os quais a companhia de gás, a Aer Lingus, a empresa de desenvolvimento florestal Coillte e o famoso National Stud (avaliado em cerca de mil milhões de euros). A Bord Gais, a companhia de [distribuição de] gás irlandesa foi avaliada em 2,5 mil milhões de euros. O Ministério dos Transportes confirmou, na semana passada, que se registara um "forte interesse" pela participação estatal de 123 milhões de euros na Aer Lingus.

2. Portugal

Infraestruturas de energia

Um dos primeiros participantes nas vendas relâmpago e, por conseguinte, um dos melhores sucedidos. Parte da rede nacional de energia elétrica portuguesa é agora propriedade dos chineses e da Oman Oil. O negócio rendeu a Portugal 592 milhões de euros. Um negócio ainda melhor, no valor de oito mil milhões de euros, consistiu na compra de 21% da Energias de Portugal, a empresa nacional de energia, pela Three Gorges Corporation, da China.

3. Holanda

Equipamento militar

No ano passado, o Ministério da Defesa holandês angariou vários milhões de euros – como parte das medidas de austeridade de mil milhões de euros – com a venda de um lote de 18 aviões de combate F-16 ao Chile. Foram igualmente postas à venda algumas embarcações militares.

4 Reino Unido

Embaixadas, edifícios governamentais, equipamento militar

O Reino Unido espera transformar em dinheiro vivo a participação estatal de 49% na National Air Traffic Services. Está igualmente projetada a venda de centenas de embaixadas e residências que são propriedade do Foreign Office em vários países do mundo, num valor total de cerca de 240 milhões de libras [289 milhões de euros].

O Ministério da Defesa pôs à venda as instalações militares [conhecidas como] Deepcut Barracks – e vários equipamentos militares supérfluos. Setenta e duas aeronaves Harrier jump jet "na reforma" foram vendidas recentemente aos EUA por 116 mil libras [140 mil euros] e o porta-aviões desativado "HMS Ark Royal" foi posto em leilão no ano passado. Entre os outros bens do Ministério da Defesa à venda incluem-se helicópteros, Land-Rovers e relógios de luxo.

5. Espanha

Infraestruturas (incluindo o Metro de Madrid?)

O plano de angariar milhares de milhões de euros com a privatização parcial da lotaria nacional espanhola foi posto de lado em setembro, quando o Ministério das Finanças considerou demasiado baixa a avaliação do mercado. No entanto, o Governo, sobrecarregado pela dívida, continua a planear vender bens em Madrid, e está em curso o processo de alienação de uma participação minoritária, no valor de 3,5 mil milhões de euros, na companhia das águas da cidade, Canal Isabel II. O Metro de Madrid, avaliado em 2 mil milhões de euros, poderá também ser vendido.

6. França

Imobiliário de alta qualidade

A França tem estado a vender, há vários anos, bens imobiliários estatais. Em 2010, foi anunciada a venda de mais de 1700 propriedades, para ajudar a reduzir a enorme dívida do país. Castelos históricos, mansões em Paris e até o pavilhão de caça dos reis de França, em la Muette, avaliado em 10 milhões de libras, foram postos no mercado.

7. Áustria

Alpes (quase)

Em junho, o Governo causou uma vaga de indignação, ao pôr à venda duas montanhas, pelo montante global de 121 mil euros. A oposição local ao plano de venda de Rosskopf (2600 m) e da vizinha Grosse Kinigat (2700 m) levaram o Executivo a recuar. Contudo, um ministro disse que as montanhas poderiam voltar a ser postas à venda no futuro.

8. Itália

Edifícios? Praias? Ouro? Partes de edifícios antigos?

Em 2010, o Governo iniciou a venda de 9 mil edifícios, praias, fortes e até ilhas, para ajudar a pagar a dívida nacional. O seu valor global foi avaliado em mais de 3 mil milhões de libras [3,6 mil milhões de euros]. Não se sabe ao certo se muitas destas alienações se concretizaram, mas dúzias de palácios venezianos foram vendidos para hotéis. A venda do direito a colocar anúncios no Coliseu de Roma rendeu igualmente algum dinheiro. Mais recentemente, o país foi pressionado pela Alemanha a vender as suas substanciais reservas de ouro, enquanto o preço se mantém alto.

9. Letónia

Uma cidade não desejada

Em 2010, uma cidade inteira foi arrematada em leilão por uma empresa russa pela soma de 1,9 milhões de libras [2,3 milhões de euros]. Skrunda-1, em tempos uma base militar russa, encontrava-se ao abandono desde a queda da União Soviética.

10. Grécia

Praticamente tudo (exceto a Acrópole)

O Governo grego está a tentar angariar a espantosa soma de 50 mil milhões de euros, através da venda ou aluguer de bens nacionais, entre os quais o Aeroporto Internacional de Atenas (e 38 outros aeroportos), companhias petrolíferas e de gás, os portos de Tessalónica e do Pireu, o Hellenic Post Bank, autoestradas, a organização estatal de corridas de cavalos e 35 grandes edifícios estatais. O Hellenikon – uma faixa da linha costeira maior do que o Mónaco e que, em tempos, albergou um aeroporto internacional – está agora ao alcance de qualquer um, tal como uma pequena área de Corfu de cerca de 18 hectares e, alegadamente, várias outras partes da bela faixa costeira. Até se diz que a Grécia está a vender a luz do sol, numa altura em que decorrem negociações entre Atenas e Berlim sobre exportação de energia solar.

Afeganistão: Ecos do Vietnã

Azenha - 20 de fevereiro de 2012 às 1:56

 

O relatório sobre o Afeganistão que o Pentágono não quer que você leia

Por Michael Hastings*

do site da Rolling Stone, tradução de Heloisa Villela

No começo da semana, Scott Shane, do New York Times, publicou uma matéria bombástica sobre o coronel Daniel Davis, um veterano do exército com 17 anos de experiência que voltou há pouco de uma segunda missão no Afeganistão.

De acordo com o Times, Davis, de 48 anos, escreveu um relatório de 84 páginas, que não é secreto, e também um segundo relatório, secreto, onde apresenta sua avaliação a respeito da guerra que já leva uma longa década. A avaliação, essencialmente, é de que a guerra é um desastre e que o alto comando militar não disse ao público norte-americano quão ruim ela tem sido.

“Quantos mais precisarão morrer dando apoio a uma missão que não está tendo sucesso?” Davis pergunta abertamente no artigo em que resumiu suas ideias, publicado no jornal das Forças Armadas.

No mês passado Davis submeteu o relatório – intitulado “Dereliction of Duty II: Senior Military Leader’s Loss of Integrity Wounds Afghan War Effort” – para revisão interna no Exército. Assim, o relatório poderia ser divulgado para o público. Porém, de acordo com oficiais militares que acompanharam de perto a história, o Pentágono se recusa a divulgar o documento.

A Rolling Stone conseguiu uma cópia da versão de 84 páginas, não secreta, que está circulando dentro do governo norte-americano, inclusive na Casa Branca. Decidimos publicar na íntegra; vale a pena ler por conta própria.

Na minha avaliação, é um dos documentos mais significativos já publicados por um oficial da ativa nos últimos dez anos.

Aqui estão as primeiras linhas do relatório: “Os oficiais militares mais graduados dos Estados Unidos, quando se comunicaram com o Congresso ou com o povo norte-americano, distorceram a verdade a respeito das condições no Afeganistão de uma maneira que a verdade se tornou irreconhecível. Essa enganação prejudicou a credibilidade dos Estados Unidos entre nossos aliados e nossos inimigos, limitou severamente nossa habilidade de alcançar uma solução política para a guerra do Afeganistão”.

Davis segue em frente para explicar que tudo no relatório vem de “fontes abertas”, ou seja, informação não secreta. De acordo com Davis, o relatório secreto, que ele submeteu legalmente ao Congresso, é ainda mais devastador.

“Se o público tivesse acesso a esses relatórios secretos ele veria o abismo dramático que existe entre o que os nossos principais líderes dizem em público e o que é realmente verdadeiro por trás dos panos”, escreve Davis.

“Seria ilegal, da minha parte, discutir ou citar material secreto em um meio aberto, por isso não vou adiante; não sou o cara do WikiLeaks Part II.”

De acordo com a reportagem do Times, Davis deu um briefing a quatro congressistas e dezenas de funcionários do Congresso e mandou o relatório secreto para o inspetor geral do Departamento de Defesa e, claro, falou com o repórter do jornal; somente depois de tudo isso ele informou ao comando o que estava fazendo.

Evidentemente, a campanha de Davis pela verdade chacoalhou o Pentágono, levando oficiais anônimos a ameaçarem com a possibilidade de instaurar investigações por “possíveis violações de segurança”, de acordo com a [rede de televisão] NBC.

Apesar dos críticos tentarem desmerecer as afirmações de Davis como apenas opiniões de um “reservista” – como disse Max Boot – o relatório dele tem várias revelações, análises e dados que comprovam cada uma de suas afirmações.

Ele detalha o grande desastre do programa de treinamento do exército afegão, como o exército cruza a fronteira entre relações públicas e “operações de informações” (significa, essencialmente, propaganda), e a manipulação da mídia norte-americana por parte do Pentágono. (Ele contrasta, com conhecimento, as declarações públicas de altos oficiais militares com a realidade aguda no Afeganistão).

Davis conclui: “Minha recomendação é de que o Congresso dos Estados Unidos – as comissões das Forças Armadas da Câmara e do Senado, em particular – deve conduzir uma investigação bipartidária sobre as várias acusações de desonestidade e fraude contidas nesse relatório e audiências públicas também”, ele escreve.

“Essas audiências devem incluir os generais mais graduados e generais reformados aos quais me refiro neste relatório, para que possam ter todas as chances de dar ao público a versão deles.” Em outras palavras, colocar os generais sob juramento e, aí sim, ver que história eles contam.

*Michael Hastings é editor contribuinte da Rolling Stone e autor de “The operators: The Wild and Terrifying Inside Story of America’s War in Afghanistan”.

Aqui, para quem quiser baixar, o relatório completo em inglês:

http://www1.rollingstone.com/extras/RS_REPORT.pdf

“Os mercados estão acima de todos os homens”

Azenha - 21 de fevereiro de 2012 às 2:57

“O capital financeiro usa a arma da dívida para abolir o Estado e escravizar a população europeia”

16/02/2012

Carta aberta de Mikis Theodorakis e Manolis Glezos, reproduzida parcialmente no site da CUT

Leia abaixo os principais trechos da carta aberta divulgada pelo renomado maestro e compositor grego Mikis Theodorakis, e por  Manolis Glezos, herói grego que arrancou a bandeira nazista da Acrópole. Ambos têm mais de 80 anos e continuam nas ruas, sofrendo ao lado de seu povo a brutalidade e a covardia da repressão. Um exemplo para as novas gerações:

“Em tempos antigos, o perdão de Solón das dívidas que obrigavam os pobres a ser escravos dos ricos – a chamada reforma Seisachtheia, assentou as bases para a aparição, na antiga Grécia, das ideias da democracia, cidadania, política e Europa: os fundamentos da cultura europeia e mundial.

Lutando contra a classe dos ricaços, os cidadãos de Atenas assinalaram o caminho para a constituição de Péricles e a filosofa política de Protágoras, que disse: “O homem está muito acima de todo o dinheiro”.

Hoje em dia, vemos a vingança dos endinheirados: “Os mercados estão muito acima de todos os homens” é o lema que nossos líderes políticos abraçam com tanto gosto, aliados ao demônio dinheiro como novos Faustos.

Um punhado de bancos internacionais, agências de informação, fundos de investimento, numa concentração mundial de capital financeiro sem precedentes históricos, reivindica o poder na Europa e em todo o mundo e prepara a abolição de nossos estados e nossa democracia, com a arma da dívida, para escravizar a população europeia, colocando no lugar das imperfeitas democracias que temos a ditadura do dinheiro e a banca, o poder do império totalitário da globalização, cujo centro político está fora da Europa continental apesar da presença de poderosos bancos europeus no coração do império.

Começaram com a Grécia, utilizada como cobaia para deslocar-se a outros países da periferia europeia e, pouco a pouco, até o centro. A esperança de alguns países europeus para escapar eventualmente demonstra que os líderes europeus se enfrentam a um novo “fascismo financeiro”, não fazendo melhor do que quando se enfrentaram à ameaça de Hitler no período entreguerras.

Não é uma casualidade que grande parte dos meios de comunicação controlados pelos bancos tratem os países da periferia da Europa como “porcos – pigs” e sua campanha midiática, sádica e racista, vá tingida de desprezo. Seus meios de comunicação não se dirigem somente contra os gregos, mas também contra a herança grega e a antiga civilização grega. Esta opção mostra os objetivos profundos e ocultos daa ideologias e dos valores do capital financeiro, promotor de um capitalismo de destruição.

A tentativa dos meios de comunicação alemães de humilhar símbolos, como a Acrópole ou a Vênus de Milo, monumentos que foram respeitados até mesmo pelos oficiais de Hitler, nada mais é senão expressão do profundo desprezo dos banqueiros que controlam os meios de comunicação, já não tanto contra os gregos, mas sobretudo contra as ideais de liberdade e democracia que nasceram neste país.

O monstro financeiro produziu quatro décadas de isenção de impostos para o capital, todo tipo de “liberalização de mercado”, uma ampla desregulação, a abolição de todas as barreiras aos fluxos financeiros e às especulações, os constantes ataques contra o Estado, a compra de partidos e meios de comunicação, a apropriação do excedente por um punhado de vampiros: os bancos mundiais de Wall Street. Agora, este monstro, um verdadeiro “Estado por trás dos Estados” parece preparado para acertar um “golpe de Estado permanente” financeiro e político, e para mais de quatro décadas.

Necessitamos criar uma frente de resistência potente contra “o império totalitário da mundialização” que está em marcha, antes que seja tarde demais.

A Europa somente pode sobreviver se apresenta uma resposta unida contra os mercados, um desafio maior que o deles, um novo “New Deal” europeu.

Devemos deter de imediato o ataque contra a Grécia e aos outros países da União Europeia na periferia, precisamos por fim a esta política irresponsável e criminosa de arrocho e privatização, que conduz diretamente a uma crise pior que a de 1929.

As dívidas públicas devem ser reestruturadas de forma radical na Eurozona, especialmente às expensas dos gigantes da banca privada. Os bancos devem voltar a ser avaliados e o financiamento da economia europeia deve estar sob controle social, nacional e europeu. Não é possível deixar a chave financeira da Europa nas mãos dos bancos, como Goldman Sachs, JP Morgan, UBS, Deutsche Bank, etc …

Temos que proibir os excessos financeiros incontrolados que são a coluna vertebral do capitalismo financeiro destrutivo e criar um verdadeiro desenvolvimento econômico em lugar de ganâncias especulativas.

A arquitetura atual, baseada no Tratado de Maastricht e nas regras da OMC, instalou uma máquina na Europa para fabricar dívida. Necessitamos uma mudança radical de todos os tratados, a submissão do BCE ao controle político da população europeia, uma “regra de ouro” para um mínimo de nível social, fiscal e meio-ambiental da Europa.

Necessitamos urgentemente uma mudança de paradigma, um retorno ao estímulo de crescimento através da demanda de novos programas de investimento europeus, as novas regulações, os impostos e o controle do capital internacional, uma nova forma de protecionismo suave e razoável numa Europa independente seria protagonista na luta por um mundo multipolar, democrático, ecológico e social.

Chamamos às forças e pessoas que compartilham estas ideias a convergirem, o mais rapidamente possível, numa ampla frente de ação europeia para produzir um programa de transição, para coordenar nossa ação internacional, com o objetivo de mobilizar as forças do movimento popular, para reverter o atual equilíbrio de forças e derrotar aos atuais líderes dos nossos países, historicamente irresponsáveis, com o fim de salvar a nosso povo e a nossa sociedade antes que seja demasiado tarde para a Europa”.

Safatle: escravos da modernidade. Na Av. Paulista e na Grécia

conversa afiada – publicado em 20/02/2012

Foto da obra suspeita de utilizar trabalho escravo em SP

O Conversa Afiada recomenda o artigo de Vladimir Safatle:


Escravos da modernidade

Na semana passada, a imprensa veiculou a notícia de que uma construtora servia-se de trabalho escravo.

A obra não era uma hidrelétrica na região Norte ou em algum lugar de difícil acesso, onde sempre é mais complicado descobrir o que se passa. Na verdade, a obra encontrava-se quase na esquina com a avenida Paulista.

Trata-se da reforma de um dos mais conhecidos hospitais da capital paulista, o Hospital Alemão Oswaldo Cruz. Ironicamente, a empresa responsável pela obra chama-se “Racional” Engenharia.

Como não podia deixar de ser, a empresa afirmou que os trabalhadores respondiam a uma empresa terceirizada e que os dirigentes desconheciam realidade tão irracional. Este foi o mesmo argumento que a rede espanhola de roupas Zara utilizou quando foi flagrada servindo-se de mão de obra escrava boliviana empregada em oficinas terceirizadas no Bom Retiro.

É muito interessante como empresas que gastam fortunas em publicidade e propaganda institucional são tão pouco cuidadosas no que diz respeito às condições aviltantes de trabalho das quais se beneficiam por meio do truque tosco da terceirização. Quando se contrata uma empresa terceirizada, não é, de fato, complicado averiguar as reais condições a que trabalhadores estão submetidos, se seus turnos são respeitados e se seus alojamentos são decentes.

Há de se perguntar se tal desenvoltura não é resultado da crença de que ninguém nunca perceberá o curto-circuito entre imagens institucionais modernas, requintadas, “racionais”, e sistemas medievais de exploração.

No fundo, essa parece ser mais uma faceta de um velho automatismo brasileiro de repetição: discursos cada vez mais elaborados e modernos, práticas cada vez mais arcaicas. Afinal, tal precariedade foi feita em nome de novas práticas trabalhistas, mais flexíveis e adaptadas aos tempos redentores que, enfim, chegaram.

Não mais a rigidez do emprego e do controle dos sindicatos, mas a leveza do paraíso da terceirização, onde todos serão, em um horizonte próximo, empresas. Cada trabalhador, um empresário de si mesmo.

Que essa flexibilidade tenha aberto as portas para uma vulnerabilidade que remete trabalhadores à pura e simples escravidão, isto não retiraria em nada o brilho da ideia. Pois apenas os que temem o risco e a inovação poderiam querer ainda as velhas práticas trabalhistas. Pena que o novo tenha uma cara tão velha.

Pena também que, como os gregos mostrem a cada dia, quem paga o verdadeiro preço do risco sejam, como dizia o velho Marx, os que já perderam tudo.

VLADIMIR SAFATLE escreve às terças-feiras nesta coluna.

Como Cerra, Malan e FHC iam vender BB, CEF e BNDES

conversa afiada - Publicado em 19/02/2012




No post “CPI da Privataria – PiG vai matar o PT com o mensalão” o amigo navegante Rafael deu a pista para se chegar à íntegra do documento pelo qual FHC, Cerra e Malan prometem ao FMI vender o Banco do Brasil, a Caixa e o BNDES (a Petrobrax eram favas contadas):

Rafael Reis

PHA, faltou o link do Ministério da Fazenda com o documento:

http://www.fazenda.gov.br/portugues/fmi/fmimpe02.asp

Agora, sim, podemos saber que o recorte da página é legítimo.

Como diria o Delfim, o FHC vendeu as jóias da familia e aumentou a dívida. E preste atenção ao item 18 da brilhante exposicão, onde se vê por que esses tucanos de São Paulo não sobrevivem à blogosfera:

Ajuste Fiscal

08/03/1999

Memorando de Política Econômica

Ajuste Fiscal
08/03/1999
Memorando de Política Econômica
I. Antecedentes
1. Os desenvolvimentos econômicos que levaram à formulação do programa do governo brasileiro apoiado pelo FMI Banco Mundial BID BIS e pela maioria dos países mais industrializados foram delineados no memorando de políticas econômicas anexo à carta de 13 de novembro de 1998 em que se solicita um Acordo Stand-By junto ao Fundo. O Governo brasileiro reafirma o seu compromisso com as referidas políticas que foram modificadas na forma indicada abaixo de modo a adaptá-las ao novo regime cambial.

2. O Governo logrou inicialmente implementar com sucesso os elementos do pacote fiscal que constituiam o núcleo do seu programa. Antes da aprovação do arranjo stand-by pela Diretoria Executiva do FMI em 2 de dezembro de 1998 o Governo havia promulgado ou conduzido pelos trâmites legislativos a emenda constitucional relativa à reforma da seguridade social bem como uma medida visando aumentar a alíquota da COFINS – uma contribuição vinculada calculada com base no giro das empresas. No entanto no início de dezembro a proposta que visava aumentar a contribuição dos servidores públicos em atividade ao sistema da previdência social e estender a referida contribuição aos servidores inativos não foi aprovada pela Câmara enquanto os esforços do Governo para aprovar o imposto sobre movimentações financeiras (CPMF) sofreram atrasos. Durante o mês de dezembro o Banco Central reduziu progressivamente a taxa de juros (overnight) (que havia alcançado mais do que 40% em meados de novembro de 1998) para 29 por cento ao final do ano.

3. Não obstante o pronto anúncio de que o Governo continuaria a envidar esforços para aprovar a CPMF no prazo mais rápido possível e a curto prazo submeteria novamente ao Congresso as medidas fiscais inicialmente rejeitadas e não obstante a divulgação em dezembro de um conjunto de medidas fiscais compensatórias adicionais a confiança do mercado continuou a deteriorar em janeiro de 1999 refletindo também preocupações a respeito do compromisso de alguns Estados importantes com o ajuste de suas finanças. Após fortes pressões sobre as reservas de divisas externas em 13 de janeiro de 1999 o Banco Central ampliou a banda de flutuação cambial e aumentou a frequência de suas intervenções nos mercados à vista e de futuros. No entanto as pressões não diminuiram e em 15 de janeiro o Banco Central deixou que o real flutuasse livremente. A taxa média de câmbio alcançou R$ 1 52/US$ em janeiro e R$ 1 91/US$ em fevereiro comparada a R$ 1 21/US$ antes da mudança do regime.

4. Esses percalços não impediram a aprovação do programa fiscal em janeiro. Mais especificamente as medidas referentes às contribuições dos servidores públicos ativos e inativos foram apresentadas novamente e aprovadas rapidamente pelo Congresso assim como o aumento da contribuição social sobre o lucro das empresas e o aumento do IOF proposto pelo Governo para compensar a demora na aprovação do aumento da CPMF. A CPMF foi aprovada em duas votações no Senado e foi remetida à Câmara havendo a expectativa de que ela seja votada em segundo turno até o final do mês de março. Finalmente o orçamento para 1999 foi aprovado em 25 de janeiro de 1999.

II. Perspectivas Econômicas para 1999
5. Prevê-se agora que a atividade econômica projetada em 1999 será menor do que a prevista há poucos meses com uma redução média da ordem de 3 5% a 4% do PIB para o ano. Isso reflete uma queda no último semestre de 1998 mais pronunciada do que a inicialmente projetada e uma provável redução adicional da demanda interna no primeiro semestre de 1999 que será apenas parcialmente compensada por uma recuperação de exportações líquidas. O declínio econômico deverá atingir seu ponto mais baixo em meados do ano com recuperação gradual a partir da segunda metade de 1999 e que ganhará maior ímpeto no ano 2000 na medida em se recupere a confiança diminuam as restrições impostas ao financiamento externo e a taxa de juros reais se reduza.

6. O novo regime de câmbio flutuante exigirá uma nova âncora nominal para a política econômica. A política monetária combinada com o fortalecimento do ajuste fiscal e uma política salarial firme no setor público será fundamental para impedir o retorno d espiral inflacionária e assegurar uma rápida desaceleração da taxa de inflação uma vez absorvido o impacto da desvalorização do real sobre os preços dos bens comercializáveis (“tradeables”). O índice de preços ao consumidor poderá alcançar mais de 10 por cento na primeira metade de 1999 mas a taxa de crescimento do índice deverá então reduzir-se gradativamente refletindo a firme condução da política monetária e a ausência de pressões internas de demanda. Ao final do ano a taxa mensal de inflação projetada deverá estar na faixa dos 0 5-0 7 por cento.

7. A desvalorização do real gerou um significativo incremento da competitividade brasileira. Como consequência e também em razão de um maior diferencial cíclico entre o Brasil e seus parceiros comerciais estima-se que a balança comercial tenha uma melhoria ainda mais acentuada passando de um déficit de US$ 6 4 bilhões para um superávit próximo a US$ 11 bilhões em 1999. O déficit em conta corrente deverá também reduzir-se sensivelmente caindo de 4 5 por cento do PIB para algo em torno de 3 por cento do PIB aproximadamente equivalente às entradas esperadas de investimentos diretos estrangeiros. Apesar da melhoria em conta corrente o balanço de pagamentos global deverá continuar a apresentar déficits nos próximos meses em razão de elevadas amortizações e do fato de que os fluxos de capitais para o Brasil deverão ser recuperados apenas gradualmente. Com o fortalecimento da confiança um aumento dos influxos deverá levar as contas externas a uma posição superavitária na a segunda metade do ano.

III. Política Fiscal
8. A desvalorização do real gerou impactos sobre a dívida pública externa e a indexada ao câmbio externo e resultou num aumento de 11 por cento do PIB no valor da dívida elevando-a para mais de 53 por cento do PIB. O Governo tenciona reduzir paulatinamente a relação dívida pública/ PIB para algo em torno de 50 por cento ao final de 1999 e para um nível menor do que o inicialmente projetado para o final de 2001 no programa de novembro de 1998 (46 5 por cento). Esse resultado seria obtido por meio de superávits primários do setor público consolidado nos próximos três anos maiores do que os originalmente fixados como meta. Outro fato que contribuirá para esse resultado será a queda da taxa de juros reais decorrente do fortalecimento do ajuste fiscal e da mudança para o regime de câmbio flutuante. Projeções da evolução da relação dívida/PIB – baseadas em hipóteses plausíveis de crescimento do PIB taxas de juros reais e taxa real de câmbio – indicam que superávits primários de 3 por cento ao ano no período 1999-2001 seriam suficientes para atingir aquele objetivo. Contudo prevendo a possibilidade de um cenário menos favorável do que o projetado o Governo pretende criar uma margem de segurança aumentando o superávit primário para no mínimo 3 1 por cento do PIB em 1999 3 25 por cento em 2000 e 3 35 por cento do PIB em 2001. Essas metas serão revistas para cima (pelo equivalente a até 0 15 por cento ao ano) para refletir as receitas adicionais (líquidas de transferências constitucionais) que seriam obtidas pelo governo federal na eventualidade de decisões favoráveis por parte do Supremo Tribunal Federal em casos pendentes que tratam da eliminação de certas isenções da Cofins e do imposto de renda sobre ganhos de capital.

9. A grande contribuição para alcançar a meta de ajuste fiscal virá do Governo federal. Nesse sentido o superávit primário deverá aumentar de 0 6 por cento do PIB em 1998 a pelo menos 2 3 cento do PIB em 1999 (em comparação com a meta original de 1 8 por cento do PIB). Para atingir esse objetivo o Governo manterá as despesas nominais com bens e serviços abaixo do resultado para 1998. Ao estabelecer prioridades orçamentárias o Governo pretende resguardar ao máximo os programas dirigidos às faixas mais pobres da população e tem buscado apoio financeiro junto ao Banco Mundial e ao BID para programas específicos que formam a assim chamada rede social de segurança.

10. Com o objetivo de melhorar o saldo primário as seguintes medidas adicionais às já aprovadas ou anunciadas ao final de 1988 foram ou serão anunciadas proximamente: (i) aumento nos preços internos de energia e das outras tarifas públicas por uma margem suficiente para assegurar o repasse dos custos dos “inputs” importados aos usuários finais; (ii) suspensão até o final do ano dos créditos referentes aos impostos vinculados ao giro de empresas exportadoras (PIS e COFINS); (iii) aumento da alíquota do IOF sobre créditos ao consumidor; (iv) apresentação ao Congresso de legislação que aumenta a contribuição dos militares à seguridade social; (v) redução (equivalente a 0 15 por cento do PIB) dos gastos orçamentários federais com o pagamento de salários e rendimentos a ser alcançada inter alia com a redução de novas contratações postergação de aumentos salariais automáticos e de promoções. Dentre as novas medidas somente o aumento da contribuição previdenciária dos militares requer nova legislação. As outras medidas podem ser implementadas por Decreto ou por Medida Provisória sendo que esta opção exige ratificação subsequente pelo Congresso.

11. A meta para as empresas estatais federais é de um superávit de 0 6 por cento do PIB em 1999 que será parcialmente neutralizado por um pequeno déficit consolidado registrado pelas empresas estaduais e municipais (em torno de 0 2 por cento do PIB). Para alcançar esse objetivo os programas de investimento das empresas federais sofreram cortes equivalentes a 0 9 por cento do PIB. Pode-se esperar uma redução do superávit primário das empresas federais ao longo do tempo em consequência da privatização de algumas das empresas mais rentáveis.

12. Vários governos estaduais (incluindo alguns dos maiores Estados) precisam de ajustes fiscais adicionais. Conforme explicitado no Memorando de Políticas Econômicas anterior os acordos de reestruturação de dívida entre o Governo federal e os estados determinam que estes gerem superávits primários para poderem pagar o serviço das dívidas reestruturadas. O Governo se compromete a continuar a fazer cumprir esses acordos nos seus termos originais utilizando-se os remédios previstos nos mesmos como já teve oportunidade de fazer em diversas ocasiões. As reformas administrativa e da previdência social recentemente aprovadas proporcionam aos estados o arcabouço legal para começar a reduzir seus gastos com pessoal condição indispensável para a geração de superávits primários em muitos estados. Nesse contexto o Governo está negociando com o Banco Mundial um empréstimo de ajuste estrutural para financiar os custos de uma reformulação dos quadros funcionais dos estados e assim facilitar o cumprimento das exigências da reforma administrativa. Nossas projeções indicam que permanece viável a meta contida no programa “stand-by” de um superávit primário consolidado dos Estados e municípios de 0 4 por cento do PIB em 1999.

13. Enquanto muitos municípios brasileiros são saudáveis financeiramente (como demonstrado pelo fato que o resultado primário dos governos municipais tem registrado superávits nos últimos anos) algumas das maiores municipalidades acumularam dívidas contratuais e securitizadas significativas sobretudo com o sistema bancário doméstico e não vêm pagando o serviço de tais dívidas há vários anos (portanto com capitalização dos juros não pagos). Estima-se a dívida total dos municípios no final de 1998 em R$ 24 bilhões (em torno de 2 5 por cento do PIB) já incluída no cálculo da dívida pública. Com a Medida Provisória de 26 de fevereiro de 1999 o governo federal propôs o refinanciamento da dívida bancária contratual e securitizada dos municípios com prazo de 30 anos e juros equivalentes a 9 por cento acima da inflação. Os acordos de reestruturação de dívida serão baseados nos acordos firmados com os Estados e terão os mesmos tipos de garantias para o serviço da dívida reestruturada e aplicarão penalidades na forma de juros em casos de não cumprimento das exigências da Lei Camata referentes aos limites impostos aos gastos com pessoal. O acesso dos municípios a novos financiamentos continuará severamente restrito. Estima-se que os acordos de reestruturação de dívida produzirão um impacto favorável no saldo primário consolidado do setor público equivalente a cerca de 0 1 por cento do PIB em 1999 considerando que os acordos obrigarão os municípios participantes a gerarem superávits primários que lhes permitam manter em dia o serviço da dívida reestruturada.

IV. Políticas Financeira e Monetária
14. O objetivo primordial da política monetária é garantir índices baixos de inflação. O Banco Central pretende adotar um sistema viável de metas inflacionárias formais com a maior brevidade possível. Como primeiro passo nesse processo o Governo fará uma revisão do anteprojeto de lei agora em discussão no Congresso Nacional que trata do Banco Central e outras instituições financeiras com vistas a fortalecer a independência operacional do Banco Central no desempenho de sua missão anti-inflacionária. A proposta revisada incluirá: procedimentos para a definição de uma meta anual de inflação bem como para a prestação de contas ao Congresso a respeito dos progressos alcançados nessa tarefa; mandatos fixos para o Presidente e diretores do Banco Central; e uma forma apropriada de quarentena para os membros da Diretoria do Banco ao se desligarem de suas funções. Além disso o Banco Central pretende beneficiar-se de experiências estrangeiras relevantes no estabelecimento da infraestrutura técnica necessária ao sistema de definição de metas formais para a inflação. Com esse propósito solicitou a assistência do Departamento de Assuntos Monetários e Cambiais do FMI para organizar (em cooperação com os bancos centrais de países que utilizam sistemas similares) um seminário em Brasília no mês de abril para discutir os principais assuntos nessa área.

15. Como a passagem para um modelo de metas formais para a inflação levará algum tempo no período de transição o Banco Central utilizará um sistema quantitativo com base no qual definirá metas para seus créditos domésticos líquidos. A trajetória proposta para os créditos domésticos líquidos apresentada no memorando técnico de entendimento anexo é fundamentada nas projeções para a inflação PIB real e reservas internacionais líquidas mencionadas nos parágrafos 6 e 8 acima presumindo um provável aumento inicial na velocidade da moeda em consequência dos aumentos de preços provocados pela desvalorização do câmbio seguido por um gradual declínio na medida em que as expectativas inflacionárias forem revertidas no decorrer do ano. No atual clima de expectativas ainda indefinidas projeções de demanda de moeda serão inevitavelmente marcadas por um alto grau de incerteza. Essas incertezas se tornam ainda mais complexas devido à dificuldade de quantificar o impacto prospectivo de alterações nas alíquotas do IOF e da CPMF na composição das carteiras financeiras de consumidores e empresas. Será necessário portanto monitorar cuidadosamente a evolução dos agregados monetários e estar prontos para alterar as metas do programa no caso de desvios significativos da taxa de câmbio (um dos indicadores principais das pressões inflacionárias) ou da taxa de inflação das suas trajetórias previstas pois tais acontecimentos poderiam sinalizar que a demanda por moeda fora superestimada ou subestimada.

16. A atenção maior que será dada pelo Banco Central à inflação e aos agregados monetários requererá flexibilidade apropriada na administração das taxas de juros. Como passo nessa direção em 4 de março o Banco Central eliminou a banda para as taxas de redesconto (TBC e TBAN) vinculando a TBAN à taxa do overnight. Ao mesmo tempo elevou a sua taxa de referência para o mercado overnight em 6 pontos percentuais para 45 por cento. Além disso com o intuito de reduzir a liquidez bancária o Banco Central já havia aumentado as reservas remuneradas sobre depósitos a prazo em 3 de março de 1999 de 20 por cento para 30 por cento. Também se esforçará para reduzir o seu estoque de “repos” junto aos bancos ampliando seus vencimentos e começará a oferecer títulos de renda fixa de curto prazo ao mercado. Ao longo do tempo o Banco Central pretende reduzir o estoque dos seus próprios títulos no mercado utilizando papéis do Tesouro para as suas operações no mercado interbancário. Para esse objetivo o Tesouro aumentará gradativamente suas emissões líquidas de títulos nos próximos meses com vistas à substituição parcial dos papéis do Banco Central na medida dos seus vencimentos.

17. O sistema financeiro tem resistido relativamente bem ao impacto da queda de atividade econômica e da elevação das taxas de juros. Embora a parcela de créditos de liquidação duvidosa na carteira de empréstimo dos bancos tenha subido de 6 por cento em junho de 1997 para 9 2 por cento em novembro de 1998 (de 3 por cento para 5 por cento no caso dos bancos privados) refletindo até um certo ponto padrões de classificação mais rígidos provisões permaneceram acima de 120 por cento do volume dos créditos de liquidação duvidosa até novembro de 1998 e informações preliminares indicam que a rentabilidade dos bancos continuou a seguir uma curva fortemente ascendente em 1998. Testes de “stress” sugerem que os principais bancos privados continuariam a superar as relações de adequação de capital exigidas mesmo no caso da duplicação de sua relação de créditos de liquidação duvidosa. O Banco Central monitorará cuidadosamente a evolução das carteiras dos bancos privados e públicos nos próximos meses e fará o necessário para garantir que as exigências de adequação de capital sejam rigorosamente cumpridas. O Banco Central também fortalecerá sua supervisão da exposição do sistema bancário em moeda por intermédio da emissão a curto prazo de uma regulamentação mais efetiva visando limitar o grau de exposição baseada nos padrões de Basiléia. Até o final de 1999 o Banco Central com assistência técnica do Banco Mundial emitirá regulamentação a respeito dos riscos de mercado dos bancos. A regulamentação será fundamentada no padrões da Basiléia e implementará um sistema moderno de classificação de créditos.

18. Com determinação o governo dará continuidade à sua política de modernização e redução do papel dos bancos públicos na economia. O Banco Meridional uma instituição federal foi privatizado em 1998 e em 1999 o sexto maior banco brasileiro o BANESPA agora sob administração federal será privatizado. Ademais o Governo solicitou à comissão de alto nível encarregada do exame dos demais bancos federais (Banco do Brasil Caixa Econômica Federal BNDES BNB e BASA) a apresentação até o final de outubro de 1999 de recomendações sobre o papel futuro dessas instituições tratando de questões como possíveis alienações de participações nessas instituições fusões vendas de componentes estratégicos ou transformação em agências de desenvolvimento ou bancos de segunda linha. Essas recomendações serão analisadas e decisões serão tomadas pelo Governo antes do final do ano sendo que as determinações serão implementadas no decorrer do ano 2000. O Governo já se decidiu sobre a privatização da administradora de ativos afiliada ao Banco do Brasil (BB/DTVM) e do Instituto de Resseguros do Brasil (IRB BRASIL-RE). Ao mesmo tempo continuará o processo de privatização fechamento ou transformação dos bancos estaduais restantes em agências de desenvolvimento. A privatização dos bancos dos grandes estados especialmente os da Bahia e do Paraná deverá ocorrer em 1999 dando seguimento às privatizações bem sucedidas dos bancos estaduais do Rio de Janeiro Minas Gerais e Pernambuco entre outros nos últimos dois anos.

V. Setor Externo
19. Sob o novo regime de câmbio flutuante vendas de moeda estrangeira no mercado pelo Banco Central serão efetuadas regularmente para atender as necessidades projetadas de financiamento do balanço de pagamentos. Intervenções limitadas e não esterilizadas poderão ocorrer ocasionalmente em resposta a condições de desordem no mercado. O Banco Central deixará de intervir no mercado de futuros de câmbio a partir de março 1999. A adoção de um regime de câmbio flutuante facilitou a eliminação a partir de 1º de fevereiro de 1999 dos dois mercados cambiais paralelos (comercial e de taxa livre). Tal medida abre caminho para o Brasil aceitar no futuro próximo as obrigações contidas no artigo VIII seções 2 3 e 4 dos Artigos de Acordo do FMI. Com a finalidade de identificar quaisquer obstáculos que possam ainda impedir a finalização desse processo solicitou-se a assistência dos Departamentos Jurídico e de Assuntos Monetários e de Câmbio do Fundo.

20. O Governo pretende buscar um compromisso voluntário junto aos bancos estrangeiros para que mantenham e com o passar do tempo aumentem gradualmente sua exposição no Brasil. Empresas brasileiras que captam recursos no exterior continuaram a ter acesso ao mercado externo de capitais nos últimos meses com emissões pequenas de notas e “commercial papers” e esperamos que essa tendência se acelere nos próximos meses com a reconquista da confiança internacional. Estamos também planejando uma ou mais emissões de bônus do governo mais adiante no ano na medida em que as condições do mercado melhorarem. É intenção do Governo no entanto manter a dívida externa pública e a dívida garantida pelo setor público dentro dos limites especificados no memorando técnico de entendimento bem como limitar a parcela de dívida de curto prazo no total da dívida externa pública.

21. O Governo mantém seu compromisso com a política de liberalização comercial adotada no primeiro mandato do Presidente Fernando Henrique Cardoso (resumida no Memorando de Políticas Econômicas de novembro de 1998). Com vistas a proporcionar aos exportadores brasileiros condições iguais de competição o Governo executa um programa limitado de financiamento de exportações e equalização de taxas de juros semelhante aos programas implementados por outros membros da OCED e compatível com o consenso da União de Berna e em conformidade com a regulamentação da OMC. A apropriação para equalização de juros no orçamento de 1999 é equivalente a menos do que 0 1 por cento do PIB e a maior parte desse valor já está comprometida. Dado o aumento de competitividade e levando em consideração as altas taxas de juros internos e a contração do crédito o Governo pretende limitar o escopo do programa de equalização de juros às exportações de produtos com ciclos de produção longos tais como bens de capital. Conforme indicado no parágrafo 10 acima o Governo suspendeu a restituição de pagamentos de PIS e COFINS aos exportadores.

VI. Políticas Estruturais
22. O memorando de políticas econômicas anterior forneceu uma visão abrangente da agenda de reformas estruturais do Governo no curto e médio prazos. Este memorando descreve o progresso obtido nos últimos três meses no cumprimento dessa agenda assim como algumas modificações planejadas na referida agenda.

23. Um marco importante foi a aprovação final pelo Congresso da emenda constitucional da reforma da Previdência Social em novembro de 1998. Tal reforma estabelece os princípios gerais – aplicáveis aos sistemas públicos de previdência tanto para os funcionários do setor público quanto para os do setor privado – que regem questões como o equilíbrio atuarial dos sistemas o número mínimo de participantes e às contas nocionais de contribuição individual. Para os sistemas públicos a reforma impõe um teto na relação de contribuições empregador/empregado de 2:1 e exige que as contribuições dos empregados aumentem sempre que o valor de despesas com pensões (líquido de contribuições) em qualquer nível de governo exceder a 12 por cento da receita líquida daquele Governo (em todos os níveis). O Congresso também aprovou em 28 de janeiro de 1999 leis que aumentam o limite da taxa de contribuição dos servidores civis de 11 por cento para 20-25 por cento dependendo do nível salarial e introduziu um sistema de contribuições escalonadas para os servidores civis aposentados que recebem mais do que R$ 600 por mês. Nos próximos meses o Governo apresentará ao Congresso legislação mais detalhada com o objetivo de implementar os princípios contidos na reforma constitucional da previdência para trabalhadores dos setores público e privado bem como uma nova legislação para regulamentar os fundos de previdência privada.

24. A regulamentação da Reforma Administrativa (emenda constitucional aprovada em 1998) está em tramitação no Congresso. O projeto de lei que estabelece as modalidades de aplicação da Lei Camata – que limita despesas com pessoal a uma percentagem de receita líquida – foi aprovado pela Câmara dos Deputados em janeiro e no momento está em discussão no Senado juntamente com as regras que governarão dispensas de funcionários públicos em caso de excesso de pessoal. Uma lei que regulamenta a demissão por falta de desempenho e outra que permite maior flexibilidade na contratação de servidores públicos já foram encaminhadas ao Congresso.

25. Em dezembro de 1998 o Governo apresentou uma proposta de reforma tributária ao Congresso com a finalidade de reformular o sistema atual de tributação indireta que tem se mostrado altamente complexo e ineficiente. A proposta engloba: (i) a substituição da maior parte dos atuais impostos indiretos (incluindo um tributo federal e outro estadual (IPI e ICMS) que têm características de tributos sobre valor adicionado (IVA) bem como algumas contribuições sociais vinculadas ao giro das empresas (PIS e COFINS) ou cobradas sobre o lucro das empresas (CSLL) com um novo IVA nacional cujas alíquotas e base de cálculo seriam determinadas pelo governo federal mas que seriam administrados pelos estados com as receitas sendo compartilhadas entre os governos federal estadual e municipal; (ii) a criação de impostos seletivos a nível federal; e (iii) a utilização do imposto sobre transações financeiras (CPMF) como um imposto mínimo deduzível de outros tributos federais (possivelmente o imposto de renda). Essa proposta visa eliminar as atuais distorções do sistema tributário simplificando significativamente sua estrutura e limitando a margem de evasão e erosão da base de tributação indireta. A reforma é concebida para ser ex-ante neutra do ponto de vista de receita mas sua implementação bem sucedida deverá gerar dividendos fiscais com o decorrer do tempo especialmente pelo fato de facilitar a cobrança.

26. Uma minuta da Lei de Responsabilidade Fiscal proposta que segue a orientação explicitada no parágrafo 15 do Memorando de Políticas Econômicas anterior foi anunciada pelo governo em dezembro de 1998. O objetivo do governo foi de solicitar comentários dos governos estaduais e municipais da própria sociedade e de organizações internacionais. Uma minuta revisada incorporando tais comentários será enviada ao Congresso brevemente.

27. O Governo pretende acelerar e ampliar o escopo do programa de privatização – que já se configura como um dos mais ambiciosos do mundo. Em 1999 o Governo pretende completar a privatização das companhias federais geradoras de energia e no ano 2000 iniciará o processo de privatização das redes de transmissão de energia. No âmbito dos Estados espera-se que a maioria das companhias estaduais de distribuição de energia seja privatizada ainda em 1999. O Governo também anunciou que planeja vender ainda em 1999 o restante de sua participação em empresas já privatizadas (tais como a Light e a CVRD) bem como o restantes de suas ações não-votantes na PETROBRAS. O arcabouço legal para a privatização ou arrendamento dos sistemas de água e esgoto está sendo preparado. O Governo também pretende acelerar a privatização de estradas com pedágios e a venda de suas propriedades imobiliárias redundantes. Estima-se que a receita total do programa de privatização para o ano de 1999 seja de R$ 27 8 bilhões (quase 2 8 por cento do PIB) (do total cerca R$ 24 2 bilhões serão gerados no nível federal) com mais R$ 22 5 bilhões no período 2000 – 2001.

28. Conforme explicado no Memorando de Políticas Econômicas de novembro de 1998 em muitos aspectos as estatísticas econômicas e financeiras brasileiras são muito bem desenvolvidas. No entanto há deficiências em certas áreas particularmente na contabilidade das contas nacionais e o Governo pretende solucionar esse problema. Nesse sentido já solicitou a assistência do Departamento de Estatísticas do Fundo para a elaboração de um diagnóstico das deficiências juntamente com assessoria a respeito das melhorias necessárias para o país aderir ao SDDS. Uma missão deverá ocorrer na primeira metade deste ano.

A notícia pode ser vista aqui tambem:http://www.redebrasilatual.com.br/temas/politica/2010/04/documento-de-1999-mostra-que-psdb-pretendia-privatizar-bb-e-caixa


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