viomundo - publicado em 24 de junho de 2013 às 10:47
Foto: Marcelo Camargo/ABr
CARTA ABERTA DO MOVIMENTO PASSE LIVRE SÃO PAULO À PRESIDENTA
À Presidenta Dilma Rousseff,
Ficamos surpresos com o convite para esta reunião. Imaginamos que
também esteja surpresa com o que vem acontecendo no país nas últimas
semanas.
Esse gesto de diálogo que parte do governo federal destoa do
tratamento aos movimentos sociais que tem marcado a política desta
gestão. Parece que as revoltas que se espalham pelas cidades do Brasil
desde o dia seis de junho tem quebrado velhas catracas e aberto novos
caminhos.
O Movimento Passe Livre, desde o começo, foi parte desse processo.
Somos um movimento social autônomo, horizontal e apartidário, que jamais
pretendeu representar o conjunto de manifestantes que tomou as ruas do
país. Nossa palavra é mais uma dentre aquelas gritadas nas ruas,
erguidas em cartazes, pixadas nos muros. Em São Paulo, convocamos as
manifestações com uma reivindicação clara e concreta: revogar o aumento.
Se antes isso parecia impossível, provamos que não era e avançamos na
luta por aquela que é e sempre foi a nossa bandeira, um transporte
verdadeiramente público. É nesse sentido que viemos até Brasília.
O transporte só pode ser público de verdade se for acessível a todas e
todos, ou seja, entendido como um direito universal. A injustiça da
tarifa fica mais evidente a cada aumento, a cada vez que mais gente
deixa de ter dinheiro para pagar a passagem.
Questionar os aumentos é questionar a própria lógica da política
tarifária, que submete o transporte ao lucro dos empresários, e não às
necessidades da população.
Pagar pela circulação na cidade significa tratar a mobilidade não
como direito, mas como mercadoria. Isso coloca todos os outros direitos
em xeque: ir até a escola, até o hospital, até o parque passa a ter um
preço que nem todos podem pagar.
O transporte fica limitado ao ir e vir do trabalho, fechando as
portas da cidade para seus moradores. É para abri-las que defendemos a
tarifa zero.
Nesse sentido gostaríamos de conhecer o posicionamento da presidenta
sobre a tarifa zero no transporte público e sobre a PEC 90/11, que
inclui o transporte no rol dos direitos sociais do artigo 6o da
Constituição Federal.
É por entender que o transporte deveria ser tratado como um direito
social, amplo e irrestrito, que acreditamos ser necessário ir além de
qualquer política limitada a um determinado segmento da sociedade, como
os estudantes, no caso do passe livre estudantil.
Defendemos o passe livre para todas e todos!
Embora priorizar o transporte coletivo esteja no discurso de todos os
governos, na prática o Brasil investe onze vezes mais no transporte
individual, por meio de obras viárias e políticas de crédito para o
consumo de carros (IPEA, 2011). O dinheiro público deve ser investido em
transporte público!
Gostaríamos de saber por que a presidenta vetou o inciso V do 16º
artigo da Política Nacional de Mobilidade Urbana (lei nº 12.587/12) que
responsabilizava a União por dar apoio financeiro aos municípios que
adotassem políticas de priorização do transporte público. Como deixa
claro seu artigo 9º, esta lei prioriza um modelo de gestão privada
baseado na tarifa, adotando o ponto de vista das empresas e não o dos
usuários.
O governo federal precisa tomar a frente no processo de construção de
um transporte público de verdade. A municipalização da CIDE, e sua
destinação integral e exclusiva ao transporte público, representaria um
passo nesse caminho em direção à tarifa zero.
A desoneração de impostos, medida historicamente defendida pelas
empresas de transporte, vai no sentido oposto. Abrir mão de tributos
significa perder o poder sobre o dinheiro público, liberando verbas às
cegas para as máfias dos transportes, sem qualquer transparência e
controle. Para atender as demandas populares pelo transporte, é
necessário construir instrumentos que coloquem no centro da decisão quem
realmente deve ter suas necessidades atendidas: os usuários e
trabalhadores do sistema.
Essa reunião com a presidenta foi arrancada pela força das ruas, que
avançou sobre bombas, balas e prisões. Os movimentos sociais no Brasil
sempre sofreram com a repressão e a criminalização. Até agora, 2013 não
foi diferente: no Mato Grosso do Sul, vem ocorrendo um massacre de
indígenas e a Força Nacional assassinou, no mês passado, uma liderança
Terena durante uma reintegração de posse; no Distrito Federal, cinco
militantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) foram presos
há poucas semanas em meio às mobilizações contra os impactos da Copa do
Mundo da FIFA. A resposta da polícia aos protestos iniciados em junho não destoa do
conjunto: bombas de gás foram jogadas dentro de hospitais e faculdades;
manifestantes foram perseguidos e espancados pela Polícia Militar;
outros foram baleados; centenas de pessoas foram presas arbitrariamente;
algumas estão sendo acusadas de formação de quadrilha e incitação ao
crime; um homem perdeu a visão; uma garota foi violentada sexualmente
por policiais; uma mulher morreu asfixiada pelo gás lacrimogêneo. A
verdadeira violência que assistimos neste junho veio do Estado – em
todas as suas esferas.
A desmilitarização da polícia, defendida até pela ONU, e uma política
nacional de regulamentação do armamento menos letal, proibido em
diversos países e condenado por organismos internacionais, são urgentes.
Ao oferecer a Força Nacional de Segurança para conter as
manifestações, o Ministro da Justiça mostrou que o governo federal
insiste em tratar os movimentos sociais como assunto de polícia. As
notícias sobre o monitoramento de militantes feito pela Polícia Federal e
pela ABIN vão na mesma direção: criminalização da luta popular.
Esperamos que essa reunião marque uma mudança de postura do governo
federal que se estenda às outras lutas sociais: aos povos indígenas,
que, a exemplo dos Kaiowá-Guarani e dos Munduruku, tem sofrido diversos
ataques por parte de latifundiários e do poder público; às comunidades
atingidas por remoções; aos sem-teto; aos sem-terra e às mães que
tiveram os filhos assassinados pela polícia nas periferias.
Que a mesma postura se estenda também a todas as cidades que lutam
contra o aumento de tarifas e por outro modelo de transporte: São José
dos Campos, Florianópolis, Recife, Rio de Janeiro, Salvador, Goiânia,
entre muitas outras.
Mais do que sentar à mesa e conversar, o que importa é atender às
demandas claras que já estão colocadas pelos movimentos sociais de todo o
país. Contra todos os aumentos do transporte público, contra a tarifa,
continuaremos nas ruas! Tarifa zero já!
Toda força aos que lutam por uma vida sem catracas!
Movimento Passe Livre São Paulo
24 de junho de 2013
Considero uma grande palhaçada a estória generalizada contada pelos diversos prefeitos sobre a redução do preço da passagem via redução de impostos. A estória de que não existe almoço de graça, e que o Governo vai ter que retirar isso de algum lugar. Bom, pergunta básica. Existe algum empresário do ramo dos transporte disposto a "largar o osso"? Dúvido. Então dá para reduzir as margens de lucro e consequentemente o valor da passagem sem que isso reverbere na arrecadação do Estado. O que temos em falta é uma política de Governo que taxe de forma diferenciada as grandes fortunas e o lucro exorbitante do setor financeiro que nada produz. Tarifa zero? Bom, isso é utopia do mais alto nível. Talvez, para que seja crédulo, no paraíso exista.
Não é uma constituinte que vai dar solução a esses problemas.
Outra coisa, o Movimento deve também deixar de inocência. Eles estão em uma manifestação, não procissão. Se querem que não ocorra reação da polícia, no mínimo, terão que evitar as ações de depredação que ocorrem na esteira das manifestações. Se essas são praticadas por infiltrados, que o movimento se posicione e os denuncie, pois só assim poderão dissociar suas reivindicações de tais ações.
Para encerrar, não existe policia desarmada. A ONU é um órgão político, quanto mais cedo vocês enxergarem isso, mais fácil poderão ver o que está por trás das mais variadas boas intenções do da instituição.