Hiram Reis e Silva, Aveiro, Pará, 30 de outubro de 2013.
Terra Dos Tupinambás
Elísio Eden Cohen e Maria das Graças Pinto Paz
Boim! Boim! Terra dos Tupinambás
Boim! Boim! Não te esquecerei jamais (bis)
Boim dos meus amores
Terra boa de viver
Quero sempre estar bem perto
Pra contigo conviver
Tem festa de Santo Inácio
Que é a grande reflexão
A este Santo Milagroso
Que é nossa proteção
Tem tuas praias encantadas
Igarapés de águas correntes
E a Ponta do Pau-da-letra
Atração p’ra muita gente
Os seringais e os castanhais
Deus deixou foi para nós
E a baia da luz da lua
No majestoso Tapajós
Este povo hospitaleiro
Que em ti vive e reside
Dando prova de amor
Que em ti sempre existe
Digo a Deus muito obrigado
Por viver aqui assim
Com essa gente tão querida
Que é o povo de Boim
Esta terra abençoada
Que Deus, achou por certo
Já, nos deu dois Bispos
Frederico e Gilberto
Quero agradecer a Deus
Por ter dado para nós
O orgulho de teus filhos
Das margens do Tapajós
Volto a reportar informações sobre a região de Boim tendo em vista as conversas que mantive com ribeirinhos e moradores de Aveiro e, em especial, o Sr. Júnior, gerente da Agência do Bradesco em Aveiro.
- Boim
Distrito de Santarém, PA, assentado na Baía do Boim, margem esquerda do Rio Tapajós, a, aproximadamente, noventa quilômetros da sede do Município de Santarém. O termo “Boim” é de origem tupi e significa “cobrinha”, obtido através da conexão dos termos “mboîa” (cobra) e “mirim” (pequeno).
Foi fundada, em 1737, pelo Padre jesuíta José Lopes com o nome de “Aldeia de Santo Inácio de Loiola”. No dia 9 de março de 1758, a Aldeia teve sua denominação alterada para Vila de Boim.
- Relato Pretérito (Rufino Luiz Tavares, 1876)
Boim: foi em outros tempos a Aldeia de São Ignácio, habitada por alguns Índios Tupinambás, que os jesuítas fizeram passar de uma outra existente no Lago Uuicurupá, na margem direita do Rio Tupinambarana. É hoje paróquia do Município de Vila Franca sob o nome de Boim. Acha-se situada sobre terras altas e planas da margem esquerda do Tapajós aos 06°36’05” de Longitude Oeste de Belém e aos 02°25’ de Latitude Sul, 76 quilômetros ao Sul de Santarém.
Os moradores ocupam-se exclusivamente do fabrico de borracha, que extraem das seringa existentes nas vizinhanças. Colhem também algum breu, estopa de castanheira, castanhas, plantam mandioca, da qual fabricam farinha de inferior qualidade que exportam para Santarém e Belém. Não tem a menor importância comercial e sua decadência é manifesta. O aspecto da freguesia é o pior possível, contém apenas uma só casa coberta de telha à margem do Rio, todas as mais em número de 62 são palhoça toscamente construídas. A Igreja, parte coberta de telha e parte de palha, é um barracão impropriamente destinada a tão elevado serviço, está consagrada a Santo Ignácio que é o padroeiro da paróquia, mas não tem pároco. É na verdade para lastimar que, sendo Boim uma das freguesias mais populosas e mais bem situadas do Tapajós, contendo terras produtivas, se ocupem somente seus habitantes da extração da goma elástica e da plantação da mandioca. A população conta de 849 indivíduos, 439 do sexo masculino, 406 do sexo feminino, todos livres com exceção apenas de uma mulher. Acham-se presentemente providos de duas escola de instrução elementar, a do sexo masculino frequentada por 55 alunos, a do feminino apenas por 9. (TAVARES)
- Igreja Católica de Boim
A Igreja de Boim está localizada no centro da Comunidade próxima à Praça Padre António da Fonseca e ao Porto. Tentaram várias vezes, sem sucesso, construí-la de frente para o Rio Tapajós. Os moradores afirmam que cada vez que metade da obra era concluída os temporais a arrasavam. Certa vez um dos operários sonhou que a igreja deveria ser construída na mesma posição em que fosse encontrada a imagem de Inácio de Loiola. No dia seguinte a estátua do Santo foi encontrada de lado para o Rio. Hoje a Igreja de Boim é a única assim posicionada em todo o Tapajós. A versão mais aceita, porém, é a que reproduzimos a seguir.
- Lenda da Igreja
Fonte: Maickson Santos Serrão, 18 de janeiro de 2011.
Em 1895, auge da Revolta dos Cabanos, o povo boinense fugiu para a mata. Um certo homem religioso, todavia, tratou de esconder a imagem de Santo Inácio de Loyola. Embora pesada, escondeu-a atrás de uma árvore de Sapupema e a cobriu com folhas de Piririma e Samambaia. Após o fim da revolta, os moradores retornaram à vila e deram pela falta do Santo. O homem, então, disse o local do esconderijo e os comunitários puderam levá-lo à Igreja.
Entretanto, noutro dia novamente o Santo havia sumido. Dessa vez, ninguém sabia onde encontrá-lo. Resolveram procurar atrás da árvore e, para surpresa geral, lá estava ele. Levaram-no por três vezes à Igreja e em todas ele voltava para trás da Sapupema.
Uma senhora idosa, curandeira, consultou os astros e disse que o Santo queria uma Igreja nova. Começaram, portanto, a construção de um novo templo com a frente para o rio, como é de costume. Quando a construção estava quase finalizando, um forte temporal a destruiu completamente. Não desistiram. Voltaram aos trabalhos e novamente veio a baixo. Fizeram por três vezes e todas caíram. Novamente consultaram a curandeira, que garantiu que deveriam construir a Igreja como tinham encontrado o Santo, ou seja, de lado para o rio. Assim fizeram e a Igreja está até hoje de pé, com algumas remodelações feitas em 1949 e em 2005.
- Flerte de Santo Inácio e Nossa Senhora do Rosário
Fonte: Manuel Dutra baseado na obra de Elísio Eden Cohen
Entronizado pelos jesuítas, Santo Inácio não foi o primeiro padroeiro, cargo que pertencia a Nossa Senhora do Rosário. As duas imagens ficavam lado a lado, no interior da capela e os moradores logo descobriram que havia um flerte entre os dois. De 1910 para cá, Santo Inácio virou padroeiro e ninguém sabe onde foi parar a Nossa Senhora do Rosário. Insatisfeito com a solidão, o santo guerreiro da Espanha basca, como bom cavaleiro que foi na vida terrena, buscou alternativa.
À noite, quando todos dormiam, exceto o boto conquistador, Inácio Lopez de Loyola deixava o seu pedestal e, descendo algumas léguas Tapajós abaixo, em pouco tempo estava ao lado de Nossa Senhora da Saúde, na Vila de Alter do Chão. Não foi uma nem duas vezes que os fiéis, ao chegarem para a reza matinal, assustaram-se ao perceber as vestes do santo úmidas pelo orvalho e a orla de seu manto apinhada dos carrapichos do mato por onde andara na noite anterior. Seja como for, nada diminui a fé de quantos até hoje prometem-lhe mil coisas em troca de outras tantas, sobretudo pistolas. Assistir a uma festa religiosa em Boim é ouvir o estourar dos fogos do começo ao fim.
Por cima de tudo, Santo Inácio é santo mesmo. Não é o tronco de carvalho no qual a imagem de quase um metro e meio foi esculpida. Ele assume a mesma estatura do fiel que, com devoção, se aproximar dele em oração. Antes da última restauração, que deixou a estátua bem vistosa para a festa de 31 de julho, havia um buraquinho entre os lábios, deixado por um antigo restaurador de imagens de Santarém. Porém, não se tratava de um lapso do artista. Era naquele orifício que Inácio colocava o cigarro que fumava em suas sortidas noturnas, para espantar os carapanãs.
- Boim Contra os “ingerados”
Fonte: Maickson Santos Serrão
Desde a infância, sempre nas contações de histórias que ouvimos dos mais velhos da comunidade, nos deparamos com a figura dos “ingerados”, que são pessoas, segundo a crença, demoníacas que se transformam em outros seres, principalmente animais.
De madrugada o fulano se “ingera” para cavalo. O ciclano se “ingera” para uma onça. A beltrana se “ingera” para uma porca. Essa metamorfose acontece devido essas pessoas possuírem “orações feias”, ou seja, pactos demoníacos.
As incertezas pairam entre as pessoas, mas àquelas de mais idade garantem que é real. Afirmam que já viram, presenciaram esse momento macabro. Os “ingerados” circulam geralmente altas horas da noite e perseguem pessoas, principalmente quando estão sozinhas, e cães nas ruas. Mas há aqueles que, talvez, sejam mais “poderosos” ou mesmo “sem vergonha” e resolvem passear cedo da noite mesmo, sempre em locais com pouco movimento.
Um dia desses um senhor da comunidade foi surpreendido por um desses seres. Próximo ao cemitério deparou com uma porca que o fez correr. O senhor acabou passando mal e foi parar na água doce. Alguns comunitários, em solidariedade, foram caçar a tal porca, que é uma pessoa “ingerada”. Não a encontraram. Acabam surgindo suspeitos nas conversas de vizinhança e outros até apostam que sabem quem é a pessoa que se “ingera” para a porca.
A caçada continua. Quarta, dia 16 de outubro de 2013, algumas pessoas a avistaram no bairro do Tucumatuba. Os mais corajosos da comunidade garantem que o fim dos seres “ingerados” está próximo. Será? Existem mesmo? Já imaginou você encontrando um cavalo, uma onça, que o persiga à noite? Prefiro não duvidar e espero nunca encontrá-los em minhas andanças por aí!
Fontes: TAVARES, Rufino Luiz. O Rio Tapajoz – Memória onde se estuda Semelhante Tributário do Amazonas, não só como Elemento de Riqueza e uma das Melhores Vias de Comunicação, como Também Porque Todo o Território que Banha, pelo Primeiro Tenente Reformado da Armada Nacional e Imperial Rufino Luiz Tavares – Brasil – Rio de Janeiro – Typographia Nacional, 1876.
– Livro do Autor
O livro “Desafiando o Rio-Mar – Descendo o Solimões” está sendo comercializado, em Porto Alegre, na Livraria EDIPUCRS – PUCRS. Para visualizar, parcialmente, o livro acesse o link:
Coronel de Engenharia Hiram Reis e Silva
Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
Pesquisador do Departamento de Cultura e Ensino do Exército (DCEx);
Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil (AHIMTB);
Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS);
Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional;
Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
E-mail: hiramrsilva@gmail.com
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