Hiram Reis e Silva, Itaituba, Pará, 21 de outubro de 2013.
Rio Tapajós
(Helvecio Santos)
Verde Rio bravio de minha terra natal, p’ra quem canta o rouxinol do nascer ao por do sol. Verde Rio que brilha como líquida esmeralda aos raios do sol nascente, ao longo das alvas praias em seu correr indolente. Verde Rio que encrespado, soprado pelo vento Leste, brabo que nem filho da peste, brilha e rebrilha quando a luz do Sol nele se dá.
Verde Rio que ameaça o Augusto Montenegro, o Lauro Sodré, o negro navio do Loyde, desafiante no rebojo, apavora o novel marujo. Verde Rio de faceta amiga e branda p’ro famoso Macambira, seu amado pescador, que em frágil montaria retorna ao final do dia com sua colheita de amor.
Verde Rio de alvas pérolas na crista de suas ondas, subindo, descendo, renovando em eterno chua! chuá! Descanso da vista cansada ou mesmo só pra alongar. Serenai, verde Rio! Por piedade, serenai! O valente caboclo se entrega em teus braços, navega em teu leito estufando o peito. Aonde vai? (...)
– 12.10.2013 – Enseada da Pedra Branca/Igarapé Moratuba
A nostálgica tranquilidade de nossa permanência na bela Enseada da Pedra Branca só fora parcialmente quebrada, ao longe, pela frenética preparação da praia que abrigaria, no dia seguinte, os folguedos do Dia da Criança. Partimos ao alvorecer, e eu, sem saber, levava comigo algumas aborrecidas e birrentas parceiras – pequenas espículas de cauxi, que infestavam as areias e as águas da região, cravadas em minha pele. Encontramos, no decorrer do dia, diversos ribeirinhos, de comunidades próximas, que se deslocavam ansiosos para participar da festa montada na Pedra Branca. Os ventos oriundos do quadrante Este eram menos intensos que no dia anterior e fomos incomodados apenas pelo calor abrasivo do verão amazônico. Aportamos na foz do Igarapé Moratuba onde montamos acampamento e a partir da tarde comecei a sentir os intensos pruridos das espículas de cauxi que persistente e cruelmente me acompanhariam durante toda a jornada.
– 13 a 17.10.2013 – Igarapé Moratuba/Itaituba
Mantivemos nossa rotina diária e pude verificar a localização completamente equivocada de comunidades e cidades como Bom Fim e Pinhel em todos os mapas disponíveis. No dia 16, aportarmos, depois de um extenuante dia de navegação de sol a pino no Tabuleiro Monte Cristo onde o IBAMA possui confortáveis instalações. Fomos gentilmente recebidos, convidados para acantonar e participar de um saboroso jantar à base de peixes.
– Tabuleiro Monte Cristo
O IBAMA implantou o projeto CENAQUA, na área do Tabuleiro Monte Cristo, há quase 20 anos. O Projeto tem como objetivo preservar tartarugas, tracajás, pitiús e aves como o talhamar, a gaivota, o bacurau dentre outras.
Localizado a 6 km ao Norte de Barreiras, Distrito de Itaituba. O Tabuleiro está incrustado numa extensa região formada por lagos, ilhas e praias banhadas pelas cristalinas águas do Rio Tapajós. Anualmente, nesta época, normalmente na mudança de lua, tartarugas, tracajás e pitus desovam na praia protegida pelos olhos vigilantes e atentos dos fiscais do IBAMA. Cada animal chega a botar, por vezes, mais de 100 ovos por cova.
– Festival de Barreiras
Partimos às cinco horas do dia 17, pois a jornada até Itaituba era muito longa, quase 50 km. Passamos antes do alvorecer pela comunidade de Barreiras que tem sua economia baseada no extrativismo e na pesca artesanal. O grande evento cultural da cidade baseia-se na história dos peixes Aracu e Piau que é manifestado com toda pujança no Festival que acontece no mês de julho apresentando a disputa entre os dois cardumes. O evento inclui danças e evoluções diversas, procurando representar os contos e as lendas do imaginário caboclo. A disputa empolgante entre os peixes Aracu e Piau é realizada no “peixódromo”.
Engarupado na anca da história, lembrei-me de Barcelos, AM, quando desci o Rio Negro. Lá, como aqui, ocorre uma festa semelhante denominada “Festival do Peixe Ornamental”. O Festival de Barcelos, instituído em 1994, homenageia a cultura e o dia-a-dia dos pescadores conhecidos como “piabeiros”. Na época da festa, os cardumes fazem evoluções graciosas e as torcidas e os turistas elegem o cardume mais original.
Cardinal x Acará-Disco: E a piaba doida? Bem, quem não torce nem para um nem para outro, certamente é visitante. É turista! É piaba doida! O turista desavisado chega à cidade e acaba descobrindo um festival surpreendente quanto à organização dos grupos, numa região com tão poucos recursos! Na arquibancada, entre duas grandes torcidas ou “cardumes”, o visitante não sabe para que lado correr. Daí o apelido (...) (Maraísa Ribeiro)
– Itaituba, PA
Chegamos em Itaituba, por volta das 14h00, e aportamos junto ao empurrador comandado pelo dinâmico Ten MB Moreira, do 8º Depósito de Suprimento (8º D Sup). Em Fordlândia o Cb Mário já tinha conseguido, com o pessoal do 8º D Sup, um quilo de farinha e desta feita fomos recepcionados com um belo lanche a bordo e a possibilidade de tomar um banho antes de realizar contatos em terra.
Fui direto ao quartel da PM verificar se através deles poderia contatar o arisco pessoal da Prefeitura de Itaituba. Antes mesmo de sair de Porto Alegre, RS, já me comunicara com eles, via e-mail, tentando viabilizar algum tipo de apoio e me informaram que já tinham apresentado minhas pretensões à Prefeita.
Estava entrando no aquartelamento da PM quando o Major Paulo Correia Lima Neto, que estava respondendo pelo comando do 53º Batalhão de Infantaria de Selva (53º BIS), telefonou-me dizendo que tinha condições de apoiar-me com a instalação e combustível para a lancha de apoio. O Major Correia Lima tinha sido informado de minha presença pelo Tenente Coronel Miranda, Sub-Comandante do 8º BEC, Santarém, PA.
Foi um apoio providencial. Caso contrário iríamos acampar, como até então vínhamos fazendo, e iniciar nossa volta para Santarém sem poder contar como devido e necessário conforto e repouso. Estávamos cansados depois de remar durante oito dias consecutivos sob sol escaldante.
É interessante observar que foi a primeira vez que um Prefeito não se dispôs a apoiar-nos. Na descida pelos ermos sem fim do Rio Juruá, nos Estados do Acre e Amazonas, contamos sempre com apoio irrestrito do poder público. Aqui no Pará mesmo, já fomos devidamente apoiados em Juriti, Oriximiná, Óbidos e Alenquer. De Itaituba levamos conosco saudades apenas do “Braço Forte, Mão Amiga” de nosso sempre pronto Exército Brasileiro.
À noite fomos convidados pelo Ten MB Moreira a jantar em um restaurante da cidade e passamos uma noitada extremamente agradável ouvindo causos interessantes e hilários deste formidável e simpático grupo fluvial do 8º D Sup. O Moreira foi convidado e aceitou ser instrutor da Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN), tenho certeza de que este jovem oficial saberá desincumbir-se desta nova missão com o mesmo entusiasmo e galhardia que vem desempenhando como Comandante do Empurrador Yauaretê.
– Área de Lazer dos Oficiais (ALO) do 53ºBIS
Infelizmente, ante a falta de apoio da Prefeitura local, minhas pretensões de conhecer Jacareacanga, conversar com algumas lideranças locais a respeito do Complexo Hidrelétrico do Tapajós não foram concretizadas. Felizmente na ALO tive a ventura de conhecer o Sr. Nilton Luiz Godoy Tubino, Coordenador-Geral de Movimentos do Campo e Territórios subordinado à Secretária Geral da Presidência da República. Tubino foi bastante esclarecedor em relação a algumas de minhas indagações sobre o aproveitamento Hidrelétrico do Tapajós e conseguiu-me mapas das Barragens Jatobá e São Luiz do Tapajós.
Mais uma vez estamos partindo para estudos de viabilidade de barragens descurando da mobilidade fluvial. Não se pode pensar em represar um Rio para geração de energia sem levar em conta a possibilidade de viabilizar a transposição das barragens por meio de eclusas. A Hidrovia Tapajós / Teles Pires / Juruena precisa ser concretizada e estes estudos de viabilidade e construção precisam e devem ser tratados concomitantemente e não de maneira estanque. É um erro histórico que continua a ser cometido pelos governos que se sucedem.
– Potenciais Hidrelétricos em Terras Indígenas (TI)
(...) Será que o governo quer acabar todas as populações da Bacia do Rio Tapajós? Se apenas a barragem de São Luís for construída, vai inundar mais de 730 Km². E daí? Onde vamos morar? No fundo do Rio ou em cima da árvore? Não somos peixes para morar no fundo do Rio, nem pássaros, nem macacos para morar nos galhos das árvores. Nos deixem em paz. Não façam essas coisas ruins. Essas barragens vão trazer destruição e morte, desrespeito e crime ambiental, por isso não aceitamos a construção das barragens... (Missão São Francisco do Rio Cururu, 06 de novembro de 2009)
A Constituição Federal de 1988 autoriza a exploração dos potenciais hidrelétricos em TI desde que haja autorização do Congresso Nacional e ouvidas as comunidades envolvidas. Logicamente este dispositivo legal se refere tão somente a projetos que causem interferência direta nas terras indígenas o que não ocorre, por exemplo, na UHE São Luiz do Tapajós a mais de 40 km de qualquer terra indígena. Infelizmente os Mundurucus tem sido usados como peça de manobra para se opor à construção da barragem sem ao menos saber do que se trata e à mídia sensacionalista só se interessa em apresentar imagens de nativos devidamente paramentados (fantasiados) com o intuito de causar o maior impacto possível às massas ignaras.
Infelizmente, as populações afetadas não estão sendo devidamente esclarecidas, propiciando que “talibãs verdes” (inocentes úteis ou a soldo de interesses inconfessos) tentem fazer prevalecer sua visão distorcida sem levar em conta as reais necessidades da nação. A questão não é mais se a construção é necessária ou não e sim a necessidade de minimizar os impactos ao meio ambiente e às populações do entorno. A discussão tem um viés importante que é o sustentável, todos os empreendimentos na Amazônia vão gerar, sem dúvida, polêmica dos “ambientalistas” e “mercenários apátridas”. Não há interesses por parte das potencias hegemônicas que surja um “tigre asiático” ao Sul do Equador. Precisamos reconhecer que nossa engenharia hidrelétrica e nossa legislação ambiental são as melhores do mundo, e que atendendo às normas vigentes e, utilizando nossa capacidade tecnológica estaremos, certamente, evitando que o país enfrente um caos energético na década que se avizinha. A carta dos Mundurucus foi redigida por mal informados e/ou mal intencionados “guardiões da floresta” que omitem, intencionalmente, os benefícios auferidos pelas populações atingidas pelas barragens.
Vejam um exemplo: http://www.youtube.com/watch?v=a7thskORns8
– Vídeos
01 Santarém / Lago Maripá (10.10.2013)
02 Lago Maripá / Igarapé Moratuba (11 a 12.10.2013)
03 Igarapé Moratuba / Praia do Escrivão (13 a 14.10.2013)
04 Praia do Escrivão / Itaituba (15 a 17.10.2013)
– Livro do Autor
O livro “Desafiando o Rio-Mar – Descendo o Solimões” está sendo comercializado, em Porto Alegre, na Livraria EDIPUCRS – PUCRS. Para visualizar, parcialmente, o livro acesse o link:
http://books.google.com.br/books?id=6UV4DpCy_VYC&printsec=frontcover#v=onepage&q&f=false
Coronel de Engenharia Hiram Reis e Silva
Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS);
Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional;
Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
E-mail: hiramrsilva@gmail.com
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