darussia.blogpost.com - Quarta-feira, Abril 27, 2011
Texto escrito para o Nº1 da revista do Centro de Investigação Transdisciplinar Cultura, Espaço e Memória da Faculdade de Letras da Universidade do Porto
"Terminado o processo de centralização das terras russas em torno do Reino de Moscovo, os czares russos colocam a abertura de saídas para os mares navegáveis durante todo o ano como uma das suas prioridades da política externa. Isso tornou-se mais premente com o estabelecimento de contactos comerciais entre a Inglaterra e o Reino de Moscovo em 1553.
O czar Ivan IV, o Terrível, cujo reinado se estendeu de 1545 a 1584, manteve prolongadas guerras contra a Suécia, Polónia e Lituânia para conseguir fixar-se nas costas do Mar Báltico, mas sem êxito. Essa tarefa foi bem realizada mais tarde pelo czar Pedro I, o Grande, que reinou entre 1695 e 1725, com a vitória na longa Guerra do Norte contra a Suécia, que se prolongou entre 1700 e 1721 e terminou com a conquista pela Rússia de parte significativa das costas do Báltico e da construção aí da nova capital do império: São Petersburgo.
Ao mesmo tempo que se afirmava no Báltico, o Império Russo alargava-se até para o Pacífico a Leste e para o Mar Negro a Sul.A necessidade de ligações marítimas entre as várias regiões do Império, a luta contra os turcos, não só por terra, mas também através do Mar Mediterrâneo, e a instalação de colónias russas nas costas orientais da América do Norte, a procura de novos mercados comerciais levaram a Rússia a empreender viagens marítimas de circum-navegação. Os navios russos passaram a utilizar portos do extenso Império Colonial Português para se reabastecerem e estabelecerem contactos comerciais, estudos em vários ramos da ciência.
Antes de passarmos à análise das várias viagens, é importante assinalar que neste estudo foram empregues, no fundamental, fontes escritas em russo: diários de bordo, memórias de viagens, cartas, etc.
A primeira viagem de circum-navegação russa foi realizada entre 1803 e 1806 em dois navios: “Nadejda” e “Neva”, sob o comando do almirante Ivan Kruzenshtern (1770-1846).
Depois de deixar para trás o Continente Europeu e as Ilhas Canárias, os navios russos chegam à ilha de Santa Catariana a 21 de Dezembro de 1803.
Kruzenshtern legou-nos um pormenorizado diário de bordo, onde fixou observações importantes sobre a passagem por terras brasileiras, nomeadamente a boa recepção de que foi alvo pelas autoridades locais: “O governador, Dom José de Currado, coronel português, com quem eu, Lissianski e vários oficiais fomos ter para apresentar cumprimentos, recebeu-nos com extrema simpatia. Mostrou-se imediatamente pronto em prestar-nos toda a ajuda possível. Enviou um sargento para cada um dos nossos navios e ordenou-lhes para estarem à nossa disposição. Pegou na lista de todos os víveres de que necessitávamos e deu ordem a um oficial para adquiri-los o mais rapidamente possível em diferentes lugares da ilha e no continente. Ele foi tão atencioso que obrigou os seus homens a partirem lenha para nós; o que eu lhe tinha pedido especialmente, porque esse trabalho, devido ao forte calor, era extremamente penoso, podia prejudicar a saúde dos nossos serviçais. Ele permitiu-nos montar, na pequena ilha de Atomirice, o nosso observatório, que nos era bastante necessário, tanto para verificar o funcionamento dos cronómetros, que, durante a nossa viagem de Tenerife, divergia em todos, como para outras observações úteis, que o doutor Gorner esperava realizar no Hemisfério Sul do céu, ao qual os astrónomos têm acesso raramente”(1).
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