viomundo - publicado em 26 de outubro de 2013 às 14:46
sugerido pelo leitor Claudius, nos comentários, ao qual Francisco Pereira Neto acrescentou:
25/10/2013
AS LIÇÕES DE LIBRA
A mobilização de várias organizações, e a greve dos petroleiros, com a
apresentação de dezenas de ações na justiça, não conseguiu impedir que o
Leilão de Libra fosse realizado, com a vitória de duas estatais
chinesas, duas multinacionais européias, e participação, em 40%, da
Petrobras.
Obviamente, do ponto de vista do interesse nacional, o ideal seria
que o negócio tivesse ficado totalmente com a Petrobras, ou melhor, com
outra empresa, 100% estatal e brasileira (a PPSA não tem estrutura de
produção própria) que fosse encarregada de operar exclusivamente essas
reservas.
Não podemos esquecer que a Petrobras – por obra e arte sabe-se muito
bem de quem – não é mais uma empresa totalmente nacional. Os
manifestantes que enfrentaram a polícia, nas ruas do Rio de Janeiro,
ontem, estavam – infelizmente – e muitos nem sabem disso, defendendo não
a Petrobras do “petróleo é nosso”, mas uma empresa que pertence, em
mais de 40%, a capitais privados nacionais e estrangeiros, que irão
lucrar, e muito, com o petróleo de Libra nos próximos anos.
De qualquer forma, a lei de partilha, da forma como foi aprovada,
praticamente impedia que a Petrobras ficasse com 100% do negócio. Além
disso, institucionalmente, a empresa tem sido sistematicamente sabotada,
nos últimos anos, pelo lobby internacional do petróleo. E cometeram-se,
no Brasil, diversos equívocos que a enfraqueceram empresarialmente, o
mais grave deles, o incentivo dado à venda de automóveis, sem que se
tivesse assegurado, primeiro, fontes alternativas – e, sobretudo
nacionais – de combustível.
A questão geopolítica é, também, bastante delicada. O Brasil
lançou-se, com determinação e talento, à pesquisa de petróleo na zona de
projeção de nosso território no Atlântico Sul, antes de estar
militarmente preparado para defendê-la.
O embate entre certos segmentos da reserva das Forças Armadas –
principalmente aqueles que fazem lobby ou estão ligados a empresas de
países ocidentais – e militares nacionalistas que propugnam que se
busque tecnologia onde ela esteja disponível, como os BRICS, tem
atrasado o efetivo rearme do país, que, embora necessário, deve ser
conduzido com cautela, para não provocar nem atrair demasiadamente a
atenção de nossos adversários.
O mundo está mudando, e o Brasil com ele. Seria ideal se pudéssemos
simplesmente virar as costas para os países ocidentais – que sempre
exploraram nossas riquezas e tudo fizeram para tolher nosso
desenvolvimento – e nos integrarmos, de uma vez por todas, ao projeto
BRICS, e a países como a China e a Índia, que estarão entre os maiores
mercados do mundo nas próximas décadas.
Esse movimento de aproximação com os maiores países emergentes –
lógico e inevitável, do ponto de vista histórico – terá que ser feito,
no entanto, de forma paulatina e ponderada. Parte da sociedade ainda
acredita – por ingenuidade, interesse próprio ou falta de brio, mesmo –
que para sermos prósperos e felizes basta integrarmo-nos e
sujeitarmo-nos plenamente à Europa e aos Estados Unidos. E que temos que
abandonar toda veleidade de assumir um papel de importância no contexto
geopolítico global, mesmo sendo a sexta maior economia e o quinto maior
país do mundo em território e população.
É essa contradição e esse embate, que vivemos hoje, em vários
aspectos da vida nacional, incluindo a defesa e a exploração de
petróleo. É preciso explorar o petróleo do pré-sal e nos armar, para, se
preciso for, defendê-lo. Mas, nos dois casos, não podemos esperar para
fazê-lo nas condições ideais.
O resultado do Leilão de Libra reflete, estrategicamente, essa
contradição geopolítica. Mesmo que esse quadro não tenha sido ponderado
para efeito da negociação, ele sugere que se buscou uma solução feita,
na medida, para agradar a gregos e troianos. Sem deixar de mandar um
recado aos norte-americanos.
Independente da questão de capital e de tecnologia – a da Petrobras
é superior à dos outros participantes do consórcio – poderíamos dizer
que:
a) Os chineses entraram porque, como membros do BRICS, e parceiros
antigos em outros projetos estratégicos, como o CBERS, não poderiam
ficar de fora.
b) Os franceses foram contemplados porque são também parceiros
estratégicos, no caso, na área bélica, por meio do PROSUB, na construção
de nossos submarinos convencionais e atômico.
c) Os anglo-holandeses da Shell – mais os ingleses que os holandeses
– entraram não só para reforçar a postura de que o Brasil não estava
fechando as portas ao “ocidente”, mas também para tapar a boca de quem,
no país e no exterior, dizia que o leilão estaria fadado ao fracasso
devido à ausência de capital privado.
O lobby internacional do petróleo, no entanto, não descansa. Antes e
depois do resultado do leilão, já podia ser lido em dezenas de jornais,
do Brasil e do exterior, que o modelo de partilha, do jeito que está, é
insustentável e terá que ser mudado.
Apesar da declaração do Ministro de Minas e Energia de que o governo
não pretende alterar nada – e da defesa dos resultados do leilão feita
pela Presidente da República na televisão – já se fala na pele do urso e
as favas se dão por contadas.
Os argumentos são de que não houve concorrência – interessante, será
que o “mercado” pretendia que o governo ficasse com mais petróleo do que
ficou? – que a Petrobras não tem escala para assumir os poços que serão
licitados no futuro – uma “consultoria” estrangeira disse que a
Petrobras já está com “as mãos cheias” com Libra, e as exigências de
conteúdo local.
Isso tudo quer dizer o seguinte: a guerra pelo petróleo brasileiro
não acaba com o leilão de Libra. Ela está apenas começando, e vai ficar
cada vez pior. Já que não podemos ter o ideal, fiquemos com o possível.
Os desafios para a Petrobras, daqui pra frente, serão tremendos, tanto
do ponto de vista institucional, quanto do operacional, na formação e
contratação de mão de obra, no gerenciamento de projetos, no
endividamento, no conteúdo nacional.
É hora de cerrar fileiras em torno daquela que é – com todos os seus problemas – a nossa maior empresa de petróleo.
A sorte está lançada. A partir de agora, os adversários do Brasil, e
da Petrobras, vão fazer de tudo para que ela se dê mal no pré-sal.
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