"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música"
Friedrich Nietzsche

segunda-feira, maio 05, 2014

A guerra soft da OTAN contra a Rússia




Data de publicação em Tlaxcala: 04/05/2014




Pobre OTAN. Malditos soviéticos. A generosa Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) gastou duas décadas “tentando construir uma parceria” com a Rússia. Mas agora, “claramente os russos declararam a OTAN adversária deles. Assim sendo, temos de começar a ver a Rússia, não mais como parceira, como adversária” – nas palavras do vice-secretário-geral da OTAN, Alexander Vershbow, ex-diplomata norte-americano/empregado do Pentágono.
A lava ardente que pinga da boca de um abutre do Pentágono, a gemer que “a Rússia claramente está tentando reimpor a hegemonia”, é de dar vergonha no Vesúvio. Mas é só uma virada menor de roteiro, em Os Descartáveis (filme), [1]da OTAN. 
A OTAN – ainda no processo de ser diariamente humilhada, humilhação épica, por um bando de pashtuns armados com Kalashnikovs no Afeganistão – começa agora a considerar “novas medidas defensivas” para deter a “Rússia-do-mal” e impedir que “agrida” membros da OTAN, principalmente os estados do Báltico. E implicará deslocar “número mais substancial de forças de combate aliadas para a Europa Oriental” – principalmente para a Polônia. Permanentemente. Ou, em pentagonês: “em rotação semipermanente de unidades em treinamento”. Como se ainda restasse alguma dúvida de que a Guerra Fria 2.0 aqui está para ficar. 
A OTAN vai “debater” a questão – àquela maneira lá dela, de só agir em lama densa –, durante o verão; e os resultados serão anunciados numa reunião no País de Gales, em setembro, presidida por Imperador Barack Obama, em pessoa. 
Qualquer analista esperto, não digerido pela matrix pentagonal, sabe que potências europeias chaves, Alemanha e França, que têm sólidas relações econômicas e de negócios com a Rússia, jamais entrarão nessa conversa fiada de Guerra Fria 2.0. Quanto a outros membros consideráveis da OTAN, estão simplesmente falidos e/ou têm melhor peixe (econômico) para fritar, em casa. 
A opinião bem informada também sabe que, caso a Guerra Fria 2.0 por acaso progrida, o revide será lindo. Por exemplo, para começar: a Rússia fecha a Rede Norte de Distribuição, rota pela qual a OTAN está tentando fugir da vergonha que passou, está passando e passará, no Afeganistão.

Vlad, o Contemplator

Apesar disso tudo, a boataria pró-OTAN nunca para; não se vê “sinal algum” de retirada das tropas russas da fronteira ucraniana; os EUA estão fornecendo ajuda militar “não letal” à Ucrânia (estão mandando o quê? Tacos de beisebol?; forças terrestres norte-americanas estão sendo enviadas para a Polônia. E tudo isso, para combater militantes “separatistas” e “pró-Rússia” no leste da Ucrânia. 
Lixo e mais lixo. Esse pessoal precisa estudar geografia, para nem falar do quanto precisam estudar a Carta da OTAN. A Ucrânia sequer é membro da OTAN, para começo de conversa. E a maioria dos ucranianos do leste não querem se autoanexar à Federação Russa. Querem ser províncias autônomas fortes, livres da interferência de Kiev, num quadro de Ucrânia federal, finlandizada. Basta alguém perguntar àqueles ucranianos que já controlam 23 cidades – e o número está aumentando – no Donbass, que produz 1/3 do PIB da Ucrânia. 

Ao mesmo tempo, os adultos continuam a conversar – diferente do que fazem os servidores de Obama e de sua escola de diplomacia de delinquentes juvenis.[2] O presidente russo Vladimir Putin e a chanceler alemã Angela Merkel conversaram pelo telefone no Dia do Trabalhador. Putin mais uma vez repetiu que Kiev tem de pôr fim às repetidas investidas “antiterroristas” e cuidar de fazer amplo diálogo nacional. Mas não parece provável que façam. 
O ministro da Defesa da Rússia, Sergei Shoigu também se sentiu no dever de recordar ao chefe do Pentágono Chuck Hagel que a Rússia não “invadirá” coisa alguma, se Kiev não usar força militar contra civis desarmados – exatamente do que trata a mais recente provocação, por Kiev, em Slavyansk. 
A think-tankelândia nos EUA está freneticamente tentando mascarar a histeria da OTAN sobre“agressividade russa”, como se fosse “resposta ponderada”. Só enganam os desinformados. Depois de terem produzido um estado falido na Líbia, e fiasco no Afeganistão, o Robocop OTAN-global, está à procura de “propósito” e significado: não pode parar de fabricar inimigos. 
Aplica-se um verniz ao nada, com o que está sendo descrito como mudança “do ponto focal estratégico” – do Afeganistão? – para os países Bálticos plus Polônia, Eslováquia, Hungria e República Tcheca. O Pentágono, como o vice-presidente Joe Biden, prometeu “treinamento ampliado” com “parceiros orientais da OTAN”. 
Putin, entrementes, aplica Sun Tzu. Pode deixar-se ficar também, calmamente, pernas cruzadas, a contemplar as águas do Volga. Bem longe da loucurada sobre Moscou invadir “agressivamente” os estados do Báltico. Seria facílimo. Poderia ser feito num estalar de dedos; e a OTAN jamais saberia o que a atingiu. Mas Moscou não quer, ou não precisa, de escalada desse tipo. 

Resumo: o Robocop OTAN-global só sobrevive se enfrenta ameaça mortal. Assim sendo, que melhor plataforma para ‘harmonizar’ a OTAN, que uma Rússia “hostil”? É isso, ou, então, a OTAN ficará lá, lambendo as feridas que os pashtuns abrem nela, no Hindu Kush.


Notas

[1] Orig. The Expendables (filme do herói Rambo, 2010, http://www.imdb.com/title/tt1320253/). No Brasil e em Portugal foi exibido como “Os mercenários”. Optamos por “descartáveis”, mais próximo do sentido de expendables [NTs].

[2] 29/4/2014, Pepe Escobar: ‘Estratégia’ de Obama contra Rússia ‘pária’, Asia Times Online

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