O governador do Rio, Sérgio Cabral Filho (PMDB), defendeu ontem o aborto como método de redução da violência no Estado e disse que a Favela da Rocinha, na zona sul, é uma “fábrica de produzir marginal”. “Você pega o número de filhos por mãe na Lagoa Rodrigo de Freitas, Tijuca, Méier e Copacabana, é padrão sueco. Agora, pega na Rocinha. É padrão Zâmbia, Gabão. Isso é uma fábrica de produzir marginal”, disse o governador ao site G1. A reportagem é de Natália Zonta e Fabiane Leite e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 25-10-2007.
Ao ser questionado sobre a afirmação mais tarde, Cabral mostrou irritação e tentou amenizar o discurso. “Hoje no Rio, em áreas mais nobres, como na Tijuca, se encontram taxas de natalidade de países civilizados, onde as pessoas têm consciência. Infelizmente, nas comunidades mais carentes daqui as mulheres não têm orientação do governo sobre planejamento familiar e têm taxas equivalentes aos países mais atrasados da África. Tem tudo a ver com violência”, disse.
Entidades não-governamentais e moradores de favelas acusaram o governador de criminalizar a miséria e de distorcer o discurso do movimento pró-aborto, que defende a interrupção da gravidez como direito da mulher de ter autonomia sobre seu corpo, não como forma de combate à violência.
“Com essas declarações o governo escancara que defende a criminalização da pobreza. Como o Estado não tem política para incorporar o pobre, melhor que nem nasça. A política é de extermínio”, disse Camilla Ribeiro, da ONG Justiça Global. “Para os mais ricos, o Estado se faz protetor; para os mais pobres, predador. Para se justificar, faz uma representação do favelado como o outro, de onde emana todo o mal”, afirmou o professor Rodrigo Torquato da Silva, morador da Rocinha há 36 anos.
Cabral destacou que a idéia de que a legalização do aborto teria relação com a diminuição da criminalidade foi comprovada pelos americanos Steven Levitt e Stephen J. Dubner, autores do livro Freakonomics. Num dos tópicos do livro, eles relacionam a legalização do aborto nos Estados Unidos à queda da criminalidade em áreas pobres, embora ressaltem que essa associação suscita um debate ético.
Segundo Adriana Gragnani, do núcleo de Estudos da Mulher e Relações de Gênero da Universidade de São Paulo, Cabral baseou-se em idéias ultrapassadas, dos anos 60. “Essa tese de diminuir o número de pobres para combater a violência, seja por aborto ou contraceptivos, é antiga. Na verdade você diminui a pobreza elevando o nível de vida da população.”
As declarações de Cabral ocorreram um dia depois de o secretário da Segurança, José Beltrame, dizer que “um tiro em Copacabana é uma coisa e na (favela da) Coréia é outra”. Beltrame afirmou ontem que não iria polemizar mais sobre um assunto.
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