O zoneamento ambiental da cana-de-açúcar vai proibir o cultivo da planta na Região Amazônica e no Pantanal. O trabalho de zoneamento fica pronto em junho do ano que vem. A decisão, tomada na semana passada, foi o desfecho para o mais recente embate enfrentado pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, depois que o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, admitiu a possibilidade da cultura da cana-de-açúcar nas áreas degradadas da Amazônia. A reportagem é de Lisandra Paraguassú e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 28-10-2007.
O veto foi uma decisão pragmática do governo. Ao mesmo tempo em que o aumento da produção de etanol é um dos projetos mais caros ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a ameaça de que, pela primeira vez em três anos, o desmatamento na Amazônia pode ter voltado a crescer, assusta a quem tenta vender a idéia do Brasil como um País ecologicamente correto.
A última crise enfrentada pela ministra Marina Silva expôs, mais uma vez, a ambigüidade do governo quanto se trata de desenvolver o País e, ao mesmo tempo, proteger o meio ambiente.
O primeiro embate, ainda em 2003, foi em torno do projeto que definiria como seria feita a liberação do plantio de transgênicos no País: enquanto a área agrícola queria liberar os organismos geneticamente modificados (OGMs), alegando que o Brasil iria ficar para trás na pesquisa e na economia, o Meio Ambiente queria tornar mais dura a legislação e ter o poder de veto. Marina perdeu, mas parcialmente, já que a liberação dos transgênicos ainda é um processo trabalhoso no País e pode, como aconteceu recentemente com o milho, ser barrado com ações na Justiça.
O segundo confronto, em relação à demora do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) em conceder licenças ambientais, fez com que boa parte do instituto e vários assessores de Marina perdessem seus cargos. A crise, fomentada pelo próprio presidente Lula - que passou a reclamar em público da demora - levou a uma reestruturação do Ibama, que foi dividido em dois para melhorar a fiscalização e a agilidade.
O fato de algumas commodities, como a soja, terem se valorizado no mercado de grãos faz com que o Brasil volte a enfrentar, pela primeira vez desde o Plano Nacional de Combate ao Desmatamento, em 2005, um mercado internacional aquecido. O panorama que se desenha poderá ser uma prova de fogo para o governo Lula e sua tentativa de manter uma imagem ecologicamente correta.
“A política do governo não é vocacionada para que se faça respeitar a legislação ambiental. É muito mais uma manifestação superficial, nas solenidades. É dirigida muito mais para a destruição”, acusa Sergio Leitão, diretor de políticas públicas da ONG Greenpeace. A ONG viu com preocupação os dados que mostram um aumento no desmatamento desse ano.
A avaliação é que as políticas do governo são muito frágeis para enfrentar o mercado de grãos aquecido. “Nós comemoramos os esforços do governo em aumentar o controle e a fiscalização, mas as iniciativas não são suficientes para tornar permanente a queda no desmatamento. Até agora só enfrentamos um mercado em baixa”, disse Leitão.
Esse é o mesmo temor do deputado federal Fernando Gabeira (PV-RJ), um dos principais integrantes da Frente Ambientalista da Câmara dos Deputados. Gabeira teme que a pressão pela produção de etanol empurre as plantações de soja para dentro da Amazônia, já que a cana ainda não pode ser plantada naquela região. “O discurso do presidente Lula sempre tem garantido que não vai haver desmatamento por causa da cana-de-açúcar, mas a verdade é que já existe. E a capacidade de controle no Brasil está longe de ser o que deveria.”
Depois do anúncio de Stephanes de que o governo iria até mesmo dar incentivos para a plantação de cana-de-açúcar na Amazônia, a reação de Marina terminou por abafar o caso, e o ministro da Agricultura voltou atrás. Mas, dentro do ministério, ainda há resistências contra o veto à cana na Amazônia. Há setores defendendo que a decisão final seja tomada em definitivo quando o zoneamento terminar.
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