Os imigrantes, segundo estudo do Escritório Econômico Moncloa, são 8,8% da população espanhola, mas absorvem apenas 5,4% do gasto público. Consomem 4,6% do gasto em saúde e 6,6% em educação. Mas sua contribuição é de 6,6% dos ingressos totais. No total, sua presença na Espanha representa um benefício líquido para o país de cerca de cinco bilhões de euros.
Segue a íntegra do artigo de Pablo Ximénez de Sandoval, publicado no El País, 16-06-2008. A tradução é do Cepat.
Na Espanha, um imigrante de um país pobre, em situação irregular, sem trabalho, vivendo na rua, tem acesso a serviços que não poderia ter em seu próprio país trabalhando normalmente. A saúde e a educação são universais e gratuitas. Se tem atestado de residência, pode, além disso, obter uma pensão, auxílio desemprego, moradias de proteção oficial... o que não o diferencia em nada de um espanhol, naquilo que se refere a ajudas.
Nos principais países de origem (Marrocos, Romênia ou Equador), a classe média sofre para alcançar um nível de atenção social que na Espanha é acessível inclusive aos indocumentados. É evidente que o sistema gasta nos imigrantes. Um estrato social de espanhóis percebe que os serviços públicos estão sendo tomados pelos recém-chegados. Alguns partidos políticos europeus já fazem campanha aos gritos de “Não cabem todos!”. Não cabem todos no Estado de bem-estar social? A resposta é sim.
Philippe Legrain, autor do livro Immigrants: your country needs them (Imigrantes: teu país necessita deles) realizou recentemente um estudo para o Conselho da Globalização, da Suécia. O Governo sueco se propõe, ao contrário de meia Europa, a estudar formas de atrair mais cidadãos extracomunitários. Legrain analisou o impacto da imigração no sistema sueco de proteção social, provavelmente o mais generoso do mundo, com este ponto de partida: a imigração livre é compatível com o Estado de bem-estar social europeu?
Dentro deste quadro geral, Legrain se pergunta se os benefícios proporcionados pelos países ricos não acabam sendo um ímã para imigrantes. Quer dizer, se se vive melhor dos benefícios nos países ricos do que trabalhando nos países pobres, acaba sendo uma boa razão para emigrar. E se muitos emigram, num dado momento esse Estado benfeitor será insustentável.
Para que isso aconteça, explica, teriam que se dar certas condições: os emigrantes devem estar tão desesperados que os supostos benefícios compensem o tremendo custo econômico e psicológico da migração; de todos os destinos possíveis, têm que escolher a Suécia; os ingressos pelos benefícios suecos devem ser maiores do que trabalhando em seus países; e, por último, devem se conformar com os benefícios, em vez de aspirar a maiores ingressos trabalhando na Suécia.
Os imigrantes são “uma minoria seleta” de seus países, explica Legrain. São os jovens com mais vontade de trabalhar e maior espírito empreendedor. Mas, se o que querem é viver dos benefícios, a Suécia seria o melhor país para isso. Segundo dados da OCDE de 2005, um imigrante sem permissão de trabalho recebe do sistema sueco 103.000 coronas (11.030 euros) ao ano. Se tem dois filhos, 18.000 euros. O dado é três vezes superior ao salário médio no Marrocos e quatro vezes ao do Paquistão.
A principal razão para que não haja “imigrantes de benefício” é que, inclusive se estão melhor com subsídios na Suécia do que trabalhando em seu país, estão ainda melhor trabalhando na Suécia. Devem pagar sua viagem, devem enviar dinheiro aos seus países e devem garantir um futuro.
Pode-se fazer esse debate na Espanha. A atenção pública e gratuita é uma atração? “Não existe nenhuma prova de que a Suécia, que provavelmente tem o sistema de benefícios mais generoso do mundo, atue como um ímã benéfico, assim que é extremamente pouco razoável que isso ocorra na Espanha, inclusive se elevasse seu nível de proteção social”, assegura Legrain por correio eletrônico.
Josep Oliver, professor de Economia Aplicada da Universidade Autônoma de Barcelona, acredita que as ajudas representam uma atração, mas não na Espanha. “No norte da Europa existe esse ímã”, disse Oliver. “Há uma parte do que chama seekers [buscadores], atraídos por esse Estado de bem-estar social muito generoso. No nosso caso, não vêm para buscar ajudas, que não existem como nos países nórdicos. Vêm buscando trabalho, o que tem”.
Oliver destaca que “até a aposentadoria dos imigrantes, toda a literatura econômica mundial aponta que, se entram indivíduos jovens, contribuem mais do que levam. O saldo é positivo. Sua contribuição excede os benefícios desse Estado de bem-estar. Cobrarão as pensões apenas quando se aposentarem”. Isso significa que, por enquanto, “os imigrantes pagam sua permanência”.
Na Espanha havia 2.357.000 estrangeiros legais no final de 2007. Desses, 1.316.000 estavam filiados ao regime de Seguridade Social. Só com sua contribuição se pagam 900.000 pensões. Os imigrantes contribuem com 7,4% das cotizações da Seguridade Social e recebem apenas 0,5% do gasto em pensões.
O Escritório Econômico de Moncloa elaborou um relatório em 2006 muito revelador sobre este ponto. Os imigrantes, segundo esse estudo, são 8,8% da população espanhola, mas absorvem apenas 5,4% do gasto público. Consomem 4,6% do gasto em saúde e 6,6% em educação. Mas sua contribuição é de 6,6% dos ingressos totais. No total, sua presença na Espanha representa um benefício líquido para o país de cerca de cinco bilhões de euros.
A situação é semelhante em todos os países, também com um baixo nível de proteção social. Nos Estados Unidos, um estudo da National Academy of Sciences concluiu que um imigrante recebe cerca de 3.000 dólares do Governo norte-americano em toda a sua vida. Seus filhos serão contribuintes do sistema na razão de aproximadamente 80.000 dólares cada um ao longo de sua vida.
“Nossos imigrantes têm entre vinte e quarenta anos”, explica Oliver. “Nos próximos 20 anos começaremos a ter que pagar uma parte do que nos adiantaram. Isto tendo em conta sua vida individual. Mas, é preciso ver também o que deixam atrás de si. Se deixam filhos com formação mais elevada, ganharão mais dinheiro que eles” e contribuirão mais para o sistema. Há muita probabilidade de que isso aconteça, já que “os filhos não têm que se adaptar, como fez o pai”.
Mas os estrangeiros também envelhecem. E ficam sem trabalho quando as coisas não vão bem. Nestes casos não contribuem para o sistema e começam a ser receptores de ajudas: pensões e subsídios para desempregados. O sistema de bem-estar social sofre? “Têm direito às ajudas, porque pagaram impostos e contribuíram para a economia e a sociedade quando as coisas iam bem”, opina Legrain. Atualmente, com o desemprego em alta, a taxa de atividade é 19% mais alta entre os estrangeiros.
Mas, afora o fato de ter direitos, “em geral, a literatura econômica sugere que mesmo considerando o pagamento de pensões, o saldo final é favorável para aquele país que recebe a imigração”, assegura Oliver, ainda que reconheça que “o debate sobre o que acontecerá quando se aposentarem é muito complexo”.
A suposta crise de pensões acontecerá em torno de 2025. “Num sistema em que os velhos vivem da poupança dos jovens, o que acontecerá quando houver mais velhos que jovens? A imigração é uma entrada de população jovem e trabalhadora. Em geral, a crise não será superada apenas com a imigração, ainda que contribua para atenuá-la”, opina Oliver.
Admitindo que os imigrantes não abandonam sua família e sua cultura e dão a vida em troca de um sanduíche da Cruz Vermelha e saúde gratuita, e que não são uma carga para o sistema, muito pelo contrário, cabe uma última pergunta: está justificada a percepção de que tomam todos os serviços sociais? Na Espanha, isto tem muito a ver com um tema tão atual quanto labirintístico para o grande público: o financiamento autônomo.
“A parte relativa aos serviços é parcialmente certa”, admite Oliver. “É um erro do sistema de financiamento que agora está se discutindo. Não se pode ter, como em Madri e na Catalunha, aumentos de população de 15% e manter os mesmos ingressos. O gasto público para a imigração está muito concentrado geograficamente, mas os ingressos que essa imigração gera vão para o Estado central. O Estado fica com as entradas e os outros com os gastos. Os benefícios são macroeconômicos e os problemas, microeconômicos”.
Carlos Clemente, vice-conselheiro de Imigração da Comunidade de Madri, apresenta os dados: “Na integração dos imigrantes nós investimos 1,5 bilhão de euros e o Estado 40 milhões. Os estrangeiros estão contribuindo com oito bilhões de euros para o Estado. Apenas 200 milhões vão para as comunidades, que somos os que damos educação, saúde, moradia etc.”.
Clemente esclarece que “os imigrantes não tomam os serviços públicos, são as camadas mais baixas que tomam os serviços públicos. Imigrantes e espanhóis”. Especialmente quando a imigração já não é um fenômeno novo. “Há 10 anos era mais assim, mas não agora. Alguns já estão empregados, por exemplo. Ao final, são como os que vêm a Madri de outras províncias”.
A coordenadora da Direção Geral de Assistência Sanitária da Junta de Andaluzia, Carmen Escalera, assegura que “com os dados de 2006, os atendimentos à população imigrante não regularizada são de 0,8% das consultas de atendimento primário” em Andaluzia. “É falso dizer que arruínam os serviços sociais. Representam 0,6% das visitas domiciliares e 2,5% das urgências. Representam 4,6% dos partos. Isso é até bom, porque é seiva nova”.
E quando vão envelhecendo? “Teremos que ir adaptando o sistema”, admite Escalera. Mas “estão acontecendo reagrupações familiares que assumem a vida daqui. A partir desse momento, não se distinguem em nada da população autóctone. Consomem os mesmos recursos e geram a mesma riqueza”.
O Conselho Econômico e Social se ocupa deste assunto em seu Memória 2007. O responsável pelo estudo, Jesús Cruz, disse que a Espanha deve incrementar seus serviços sociais para toda a população a fim de responder a “um imprevisível, rápido e intenso crescimento, e é composta por 10% de estrangeiros”.
Porque, como disse Josep Oliver, “para o nativo que vê seu bairro se degradar devido a um impacto migratório muito grande”, não se pode explicar que a imigração é boa para a economia. O professor dá toda razão às comunidades que reclamam maior financiamento: “A garantia para que a imigração se integre e permaneça, da qual necessitamos, é que se atendam os gastos onde são produzidos, para que o bem-estar dos nativos não seja afetado. O dinheiro da imigração deve ser para aquele que o ganha e para aquele que sofre esse impacto”.
Numa entrevista concedida a este jornal, o novo ministro do Trabalho e Imigração, Celestino Corbacho reconhecia que “um país em que existe um contingente importante de imigrantes não pode subsistir com um Estado de bem-estar social desenhado para outra realidade”.
Corbacho dizia que o desenvolvimento econômico “não é suficiente” para sustentar o sistema, “porque o desenvolvimento econômico necessita de amplos contingentes de imigração para se sustentar. Quando chega um amplo contingente de imigrantes a um país, o Estado de bem-estar social se debilita, a não ser que o Estado lhe injete mais economia. Caso contrário, pode correr o risco de que aquele que chega leve a parte do Estado de bem-estar porque sua situação é pior que a daquele que está aqui e cuja situação econômica não mudou, e este deixe de receber o que o Estado de bem-estar lhe estava dando. Disso ao conflito, são apenas alguns passos”. A solução, para Corbacho, é uma só: “Injetar mais dinheiro”.
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