Você
provavelmente não tomou conhecimento, não ao menos por meio dos
principais veículos da imprensa nacional, das duas notícias seguintes. A
primeira: a pesquisa coordenada pelo professor André Trindade, da
Unopar (Universidade do Norte do Paraná), a respeito do grau de
conscientização social e política de alunos do ensino médio de escolas
públicas de Londrina (PR), Chapecó (SC) e Passo Fundo (RS).
Citada
pelo colega Zé Beto no blog (http://zebeto.jornale.com.br/), a sondagem
revelou números assustadores, ainda que estejamos falando de jovens. De
acordo com a pesquisa, em um universo de 1.012 entrevistados, 70% não
sabem quais são seus direitos sociais; 78% desconhecem o que é a
Constituição Federal de 1988; 40% ignoram os Três Poderes; 68% não têm
muita noção do que faz um deputado estadual; e 70% não sabem o que é a
democracia, muito menos como exercê-la.
A segunda notícia também é uma sondagem, desta vez encomendada pelo jornal Gazeta do Povo, feita
pelo Instituto Paraná Pesquisas. O jornal quis conhecer o humor dos
paranaenses sobre os governos da presidenta Dilma Rousseff e do
governador do Estado, o tucano Carlos Alberto Richa.
Os
dois dados mais significativos deste levantamento são igualmente
assustadores, assim como os da pesquisa anterior: 70% dos entrevistados
não souberam dizer ou não citaram nenhuma realização dos dois
governantes nos oito primeiros meses de mandato. Mesmo assim, 80% deles
avaliaram as duas administrações como ótimas/boas ou regulares.
Não
é o caso de se fazer juízo de valor a respeito das opiniões dos jovens
sobre temas complexos, que muitas vezes gente desta idade ainda não
compreende direito, como o arcabouço constitucional do País ou a
organização política do sistema federativo. Nem de se analisar se os
adultos que compõem a amostragem da segunda pesquisa têm ou não razão no
seu posicionamento favorável aos governos Dilma e Richa.
O
eixo deste artigo é outro: o desinteresse e a desinformação de parte
expressiva da sociedade brasileira a respeito dos atores da política
nacional e, por extensão, pela própria democracia representativa. E
mais: a recusa da imprensa em debater este tema com a seriedade e a
profundidade que o assunto merece.
En passant, já abordamos este assunto em outro texto, no mesmo espaço generoso que a Carta Capital
nos concede. Voltamos ao tema para lembrar que estamos a um ano das
eleições municipais de 2012 e que, mantido o atual grau de ojeriza da
sociedade brasileira em relação aos políticos, teremos mais do mesmo nas
câmaras municipais e prefeituras. Ou coisa ainda pior. Em bom
português: o desprezo da sociedade pelos profissionais da desonestidade
travestidos de homens públicos não atende a nenhum interesse, senão dos
próprios políticos.
Mas
não é apenas nisto que reside nossa preocupação. O papel assumido por
grande parte da mídia neste processo também é deplorável. Não que tenha
causado estranheza o fato de a grande imprensa nacional ter praticamente
ignorado as duas notícias. E não se diga que o motivo foi o fato de as
informações terem origem no Paraná. Afinal, ao sabor das conveniências, a
imprensa é célere na conversão de assuntos locais em notícias
nacionais.
A
verdade é que notória a repulsa de grande parte da mídia à divulgação
de temas que reportem a questões de fundo, sobretudo quando exigem que
se trave um debate sobre assuntos delicados, como o baixo grau de
conscientização política da Nação. Para esta gente, melhor mesmo é
tratar de perfumarias no menu de notícias que oferecem á patuléia. E
enfiar goela abaixo das pessoas os escândalos envolvendo celebridades
instantâneas, atletas e políticos, que dão mais audiência – e sobretudo
mais dinheiro.
É
hora de a sociedade brasileira levar a política mais a sério. Não
exatamente pelos políticos que possui, mas por si própria. Ignorar a
política, baseada na falsa premissa de que todo governante e legislador é
corrupto, é pura insensatez.
Igualmente,
porém, está na hora de a grande imprensa cosmética brasileira deixar de
ser omissa na execução do seu papel de promover um debater sério e
consistente sobre a Política, os políticos, a cidadania e a democracia.
Boa
parte da atual cepa de políticos faz por merecer o tratamento raivoso
que recebe da imprensa, mas converter suas maldades em espetáculo de
horrores para levantar a audiência não basta para tornar esta Nação
melhor. Ainda que defensável, há uma boa dose de canalhice na prática de
se ganhar dinheiro às custas do denuncismo. Como diria o colega Ricardo
Kotscho, imprensa não é polícia e nem juiz, ainda que uma das suas
atribuições seja denunciar as mazelas do Estado.
Para
cumprir sua função social, a imprensa precisa ir além da
espetacularização da notícia. Precisa usar seu poder de multiplicação
para estimular a reflexão e o debate – sobretudo à base da pirâmide
social – sobre o País que somos e desejamos.
A Carta Capital
tem feito isso, aliás, ao veicular – seja na edição impressa, seja na
internet – textos que vão muito além do registro factual dos
acontecimentos. E, ainda, ao desenvolver o projeto Diálogos Capitais,
uma série de encontros regionais, envolvendo diversos setores da
sociedade civil, destinados ao debate e à apresentação de propostas
sobre as grandes questões das agendas política e econômica nacional.
A
conquista da cidadania é um processo lento e doloroso, como ensinava o
mestre Raymundo Faoro. Não será obtida, portanto, a curto prazo e sem
sacrifícios de todos – sociedade e mídia.
Não
encarar este necessário desafio nos compara aos passageiros da “nau dos
insensatos”, alegoria citada tantas vezes por literatos e artistas para
descrever os habitantes do planeta que passam pela vida sem saber
exatamente a razão de estarem aqui. A eles, tudo o que importa é viver
por viver, mesmo que sem sentido. O desafio que compete ao Brasil que
desejamos é se recusar a este destino.
Aurélio Munhoz no Twitter: http://twitter.com/aureliomunhoz
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