resistir info - 12 mar 13
A mutação do sistema de intervenção militar dos Estados Unidos
"As Ilusões desesperadas geram vida em tuas veias"
St. Vulestry
"As pessoas acreditam que as soluções decorrem da sua
capacidade de estudar
sensatamente a realidade perceptível. Na realidade, o mundo já
não
funciona assim. Agora somos um império e, quando actuamos, criamos
nossa própria realidade. E enquanto tu estás a estudar essa
realidade,
actuaremos de novo, criando outras realidades que também podes
estudar. Somos os actores da história, e a vós, todos vós,
só lhes resta estudar o que fazemos".
Karl Rove, assessor de George W. Bush, Verão de 2002
[1]
Guerra e economia
Conceitos tais como "keynesianismo militar" ou "economia da
guerra permanente" constituem bons pontos de partida para entender o longo
ciclo de prosperidade imperial dos Estados Unidos: seu arranque há pouco
mais de sete décadas, seu auge e a entrada recente na sua etapa de
esgotamento abrindo o processo militarista-decadente actualmente em curso.
Em 1942 Michal Kalecki expunha o esquema básico do que posteriormente
ficou conhecido como "keynesianismo militar". Apoiando-se na
experiência da economia militarizada da Alemanha nazi, o autor assinalava
as resistências das burguesias da Europa e dos Estados Unidos à
aplicação de políticas estatais de pleno emprego baseadas
em incentivos directos ao sector civil e sua predisposição a
favorecê-las quando se orientavam para as actividades militares
[2]
. Mais adiante Kalecki, já em plena Guerra Fria, descrevia as
características decisivas do que qualificava como triângulo
hegemónico do capitalismo norte-americano que combinava a prosperidade
interna com o militarismo descrito como convergência entre gastos
militares, manipulação mediáticas da
população e altos níveis de emprego
[3]
.
Esta linha de reflexão, à qual aderiram, dentre outros, Harry
Magdoff, Paul Baran e Paul Sweezy, colocava tanto o êxito a
curto-médio prazo da estratégia de "Manteiga +
Canhões"
("Guns and Butter Economy")
que fortalecia em simultâneo a coesão social interna dos Estados
Unidos e sua presença militar global, como os seus limites e
inevitável esgotamento a longo prazo.
Sweezy e Baran prognosticavam (acertadamente) em meados dos anos 1960 que um
dos limites decisivos da reprodução do sistema provinha da
própria dinâmica tecnológica do keynesianismo militar, pois
o refinamento técnico crescente do armamento tendia inevitavelmente a
aumentar a produtividade do trabalho reduzindo seus efeitos positivos sobre o
emprego e finalmente a cada vez mais custosa corrida armamentista teria efeitos
nulos ou inclusive negativos sobre o nível geral de
ocupação
[4]
.
É o que se tornou evidente a partir de fins dos anos 1990, quando se
iniciou uma nova etapa de gastos militares ascendentes que continua na
actualidade, marcando o fim da era do keynesianismo militar. Agora, o
desenvolvimento nos EUA da indústria de armas e suas áreas
associadas incrementa a despesa pública causando défice
orçamental e endividamento, sem contribuir para aumentar em termos
líquidos o nível geral de emprego. Na realidade, o seu peso
financeiro e a sua radicalização tecnológica contribuem de
maneira decisiva para manter altos níveis de desemprego e um crescimento
económico nacional anémico ou negativo, transformando-se assim
num catalisador que acelera e aprofunda a crise do império
[5]
.
Por outro lado, os primeiros que se referiam à chamada "economia da
guerra permanente" apareceram nos Estados Unidos em princípios dos
anos 1940. Tratava-se de uma visão simplificadora que, em geral,
subestimava os ritmos e atalhos concretos da história, mas que hoje
resulta sumamente útil para compreender o desenvolvimento do militarismo
a muito longo prazo.
Em 1944 Walter Oakes definia uma nova fase do capitalismo onde as despesas
militares ocupavam uma posição central; não se tratava de
um facto conjuntural imposto pela Segunda Guerra Mundial então em curso
e sim de uma transformação qualitativa integral do sistema cuja
reprodução ampliada universal durante mais de um século
havia acabado por gerar massas de excedentes de capital que não
encontravam nas potências centrais espaços de
aplicação na economia civil produtora de bens e serviços
de consumo e produção.
A experiência dos anos 1930, como demonstrava Oakes, assinalava que nem
as obras públicas do New Deal de Roosevelt nos EUA, nem a
construção de auto-estradas na Alemanha, haviam conseguido uma
recuperação significativa da economia e do emprego: só a
colocação e marcha da economia de guerra, primeiro na Alemanha e
a partir de 1940 nos EUA, havia conseguido os referidos objectivos
[6]
. No caso alemão a corrida armamentista terminou com uma derrota
catastrófica, no caso norte-americano a vitória não levou
à redução do sistema militar-industrial e sim à sua
expansão.
Ao reduzirem-se os efeitos da guerra, a economia dos EUA começou a
arrefecer e o perigo de recessão manifestou-se, mas o início da
Guerra Fria e a seguir a guerra da Coreia (1950) afastaram o fantasma abrindo
um novo ciclo de gastos militares. Em Outubro de 1949 o professor da
Universidade de Harvard Summer Slichter, de grande prestígio naquele
momento, assinalava perante uma convenção de banqueiros: "[A
Guerra Fria] incrementa a procura de bens, ajuda a manter um alto nível
de emprego, acelera o progresso tecnológico, tudo o qual melhora o
nível de vida no nosso país... em consequência
deveríamos agradecer aos russos pela sua contribuição para
que o capitalismo funcione melhor do que nunca nos Estados Unidos". Em
1954 surgia a seguinte afirmação na revista
U.S. News & World Report:
"Que significa para o mundo dos negócios a Bomba H?: um longo
período de grandes vendas que serão aumentadas nos
próximos anos. Poderíamos concluir com esta
afirmação: a bomba H lançou a recessão pela
janela"
[7]
.
Como assinalava em princípios dos anos 1950 T. N. Vance, um dos
teóricos da "economia da guerra permanente", os Estados Unidos
haviam entrado numa sucessão de guerra que definiam de maneira
irreversível as grandes orientações da sociedade, depois
da guerra da Coreia só cabia esperar novas guerras
[8]
. No seu texto fundador da teoria, Walter Oakes fazia dois prognósticos
decisivos: a inevitabilidade de uma terceira guerra mundial que situava em 1960
e o empobrecimento dos trabalhadores norte-americanos desde fins dos anos 1940,
provocado pela dinâmica da concentração de rendimentos
estimulada pelo complexo militar-industrial
[9]
. Podemos em princípio considerar incorrectos os referidos
prognósticos. Não houve a terceira guerra mundial ainda que se
haja consolidado a Guerra Fria, que manteve a onda militarista durante mais de
quatro décadas, atravessada por duas grandes guerras regionais (Coreia e
Vietname) e uma densa série de pequenas e médias
intervenções imperiais directas e indirectas. Quando se dissipou
a Guerra Fria, a seguir a um breve interregno nos anos 1990 a guerra universal
do Império prosseguiu contra novos "inimigos" que justificavam
seu desenvolvimento ("guerras humanitárias", "guerra
global contra o terrorismo", etc): a oferta de serviços militares,
o "aparelho militarista" e as áreas associadas ao mesmo
criavam, inventavam, a sua própria procura.
Tão pouco precipitou-se o empobrecimento das classes baixas dos Estados
Unidos; pelo contrário, a redistribuição keynesiana
manteve-se até os anos 1970, o nível de vida dos trabalhadores e
das classes médias melhorou substancialmente, funcionou a
interacção positiva entre militarismo e prosperidade geral. Para
isso contribuíram vários factores, dentre eles a
exploração da periferia ampliada graças à
emergência dos Estados Unidos como super-potência mundial
alavancada pelo seu aparelho militar, o restabelecimento das potências
capitalistas afectadas pela guerra (Japão, Europa Ocidental) que na nova
era encontravam-se estreitamente associadas aos EUA e o enorme efeito
multiplicador a nível interno dos gastos militares sobre o consumo, o
emprego e a inovação tecnológica. Alguns destes factores,
subestimados por Oakes, haviam sido assinalados em meados dos anos 1960 por
Sweezy e Baran
[10]
. Contudo, a chegada de Ronald Reagan à Casa Branca (1980) marcou uma
ruptura na tendência (ainda que já nos anos 1970 haviam surgido os
primeiros sintomas da enfermidade) e iniciou-se um processo de
concentração de rendimentos que foi avançando cada vez
mais rápido nas décadas posteriores.
Entre 1950 e 1980 os 1% mais ricos da população dos Estados
Unidos absorviam cerca de 10% do Rendimento Nacional (entre 1968 e 1978
manteve-se abaixo desse número) mas a partir de princípios dos
anos 1980 essa participação foi ascendendo, em 1990 chegava a 15%
e cerca de 2009 aproximava-se dos 25%. Por sua vez, os 10% mais ricos absorviam
33% do Rendimento Nacional em 1950, mantendo-se sempre abaixo dos 35%
até fins dos anos 1970, mas em 1990 já chegava aos 40% e em 2007
aos 50%
[11]
.
O salário horário médio foi ascendendo em termos reais
desde os anos 1940 até princípios dos anos 1970 em que
começou a descer e, um quarto de século mais tarde, havia baixado
em quase 20%
[12]
. A partir da crise de 2007-2008, com o rápido aumento do desemprego,
acelerou-se a concentração de rendimentos e a queda salarial:
alguns autores utilizam a expressão "implosão salarial"
[13]
. Uma boa expressão da deterioração social é o
aumento dos estado-unidenses que recebem bónus de ajuda alimentar
("food stamps"),
a referida população indigente chegava a quase 3 milhões
em 1969 (em plena prosperidade keynesiana), subiu para 21 milhões em
1980, para 25 milhões em 1995 e para 47 milhões em 2012
[14]
.
Enquanto isso as despesas militares não cessaram de crescer,
impulsionadas por sucessivas ondas belicistas incluídas no primeiro
grande ciclo da guerra fria (1946-1991) e no segundo ciclo da "guerra
contra o terrorismo" e nas "guerras humanitárias" desde
fins dos anos 1990 até o presente (Guerra da Coreia, Guerra do Vietname,
"Guerra das Galáxias" da era Reagan, Guerra do Kosovo, Guerras
do Iraque e do Afeganistão, etc). A seguir à Segunda Guerra
Mundial podemos estabelecer dois períodos bem diferenciados na
relação entre despesas públicas e crescimento
económico (e do emprego) nos Estados Unidos. O primeiro abrange o
período desde meados dos anos 1940 até fins dos anos 1960 em que
os gastos públicos crescem e as taxas de crescimento económico
mantêm-se num nível elevado, são os anos dourados do
keynesianismo militar. Este é seguido por um período em que os
gastos públicos continuam a subir tendencialmente mas as taxas de
crescimento económico oscilam em torno de uma linha descendente,
assinalando a decadência e o fim do keynesianismo: o efeito multiplicador
positivo da despesa pública declina inexoravelmente até chegar ao
dilema sem solução, evidente nestes últimos anos de
crescimentos económicos anémicos, em que uma
redução da despesa estatal teria fortes efeitos recessivos ao
passo que o seu incremento possível (cada vez menos possível)
não melhora de maneira significativa a situação. Assim
como o "êxito" histórico do capitalismo liberal no
século XIX produziu as condições da sua crise, o seu
superador keynesiano também gerou os factores da sua decadência
posterior.
A marcha triunfante do capitalismo liberal terminou com uma gigantesca crise de
superprodução e sobreacumulação de captais que
desencadeou rivalidades inter-imperialistas, militarismo e explodiu sob a forma
de Primeira Guerra Mundial (1914-1918). A "solução"
consistiu na expansão do Estado, em especial sua estrutura militara, a
Alemanha e o Japão foram os pioneiros.
A transição turbulenta entre o velho e o novo sistema durou cerca
de três décadas (1914-1945) e dela emergiram os Estados Unidos
como única superpotência capitalista integrando estrategicamente
na sua esfera de dominação as outras grandes economias do
sistema. O keynesianismo militar norte-americano surgiu então no centro
dominante dos Estados Unidos: o centro do mundo capitalista. Vance assinalava
que "com o princípio da Segunda Guerra Mundial os EUA e o
capitalismo mundial entraram na nova era da Economia da Guerra Permanente"
[15]
. Foi assim se o entendermos como vitória definitiva do novo sistema
antecedida por uma complexa etapa preparatória iniciada na segunda
década do século XX.
Sua génese é marcada pelo nazismo, primeiro ensaio
triunfante-catastrófico de "keynesianismo militar": sua trama
ideológica, que leva até o limite mais extremo o delírio
da supremacia ocidental, continuar a dar ideias às formas imperialistas
mais radicais do Ocidente, como os falcões de George W. Bush ou os
sionistas neonazis do século XXI. Por outro lado, estudos rigorosos do
fenómeno nazi descobrem não só suas raízes
europeias (fascismo italiano, nacionalismo francês, etc) como
também norte-americanas
[16]
. Ainda que logo a seguir à guerra o triunfo da economia militarizada
dos EUA tenha assumido um rosto "civil" e
"democrático", ocultando os seus fundamentos bélicos.
A decadência do keynesianismo militar encontra uma primeira
explicação na sua hipertrofia e integração com um
espaço parasitário imperial mais amplo onde a trama financeira
ocupa um lugar decisivo. Numa primeira etapa o aparelho industrial-militar e
suas ramificações expandiram-se convertendo a despesa estatal em
empregos directos e indirectos, em transferências tecnológicas
dinamizadoras do emprego privado, em garantia blindada dos negócios
imperialistas externos, etc. Mas com o correr do tempo, com a ascensão
da prosperidade imperial, incentivou e foi incentivada por uma multiplicidade
de formas sociais que parasitavam sobre o resto do mundo ao mesmo tempo de
ganhavam cada vez maior peso interno.
Além disso, o crescimento económico contínuo acabou por
provocar saturações de mercados locais, acumulações
crescentes de capital, concentração empresarial e de rendimentos.
O capitalismo norte-americano e global encaminhava-se em fins dos anos 1960
para uma grande crise de superprodução que provocou as primeiras
perturbações importantes sob a forma de crises monetárias
(crise da libra esterlina, fim do padrão dólar-ouro em 1971), a
seguir energéticas (choques petrolíferos de 1973-74 e 1979)
atravessadas por desajustamentos inflacionários e recessivos
("estagflação").
Nas décadas seguintes a crise não foi superada e sim amortecida,
adiada através da super-exploração e do saqueio da
periferia, da financiarização, das despesas militares, etc. Tudo
isso não reinstalou o dinamismo do pós guerra mas impediu a
derrocada, suavizou a enfermidade agravando-a a longo prazo.
A taxa de crescimento real da economia norte-americana percorrendo de maneira
irregular uma linha descendente e, em consequência, suas despesas
improdutivas crescentes foram cada vez menos suportadas pela
arrecadação tributária. E ao défice fiscal somou-se
o défice do comércio externo perpetuado pela perda de
competitividade global da indústria.
O império foi-se convertendo num mega parasita mundial, acumulou
dívidas públicas e privadas entrando num círculo vicioso
já visto em outros impérios decadentes; o parasitismo degrada o
parasita, torna-o cada vez mais dependente do resto do mundo, o que exacerba
seu intervencionismo global, sua agressividade militar.
O mundo é demasiado grande do ponto de vista dos seus recursos concretos
(financeiros, militares, etc) mas o alcançar do objectivo historicamente
impossível de dominação global é a sua única
possibilidade de salvação como Império. As despesas
militares e o parasitismo em geral aumentam, os défices crescem, a
economia estanca-se, a estrutura social interna deteriora-se... o que Paul
Kennedy definia como "excessiva extensão imperial"
[17]
é um facto objectivo determinado pelas necessidades imperiais que
operam como uma armadilha histórica da qual o Império não
pode sair.
Gastos militares
Os gastos militares dos Estados Unidos aparecem subestimados nas
estatísticas oficiais. Em 2012 os gastos do Departamento da Defesa
chegaram a uns 700 mil milhões de dólares. Se aos mesmo forem
adicionados os gastos militares que integrados (diluídos) em outras
áreas do Orçamento (Departamento de Estado, USAID, Departamento
da Energia, CIA e outras agências de segurança, pagamentos de
juros, etc) chegar-se-ia a um número próximo dos 1,3
milhões de milhões de dólares
[18]
. Esse número equivale a quase 9% do Produto Interno Bruto, a 50% das
receitas fiscais previstas, a 100% do défice fiscal.
Esses gastos militares reais representaram quase 60% das despesas militares
globais, apesar de que se lhes somarmos os dos seus sócios da NATO e de
alguns países vassalos extra-NATO, como a Arábia Saudita, Israel
ou Austrália, chegar-se-ia no mínimo a 75%
[19]
. A partir do grande impulso inicial na Segundo Guerra Mundial e da descida no
pós guerra imediato, os gastos militares reais norte-americanos
oscilaram em torno de uma tendência ascendente atravessando quatro
grandes ondas belicistas: a guerra da Coreia em princípio dos anos 1950,
a guerra do Vietname desde os anos 1960 até meados dos anos 1970, a
"guerra das galáxias" da era Reagan nos anos 1980 e as guerras
"humanitárias" e "contra o terrorismo" do pós
guerra fria.
O keynesianismo militar do Império ficou no passado, mas a ideia de que
guerra externa e prosperidade interna estão associadas continua a
dominar o imaginário de vastos sectores sociais dos Estados Unidos,
são restos ideológicos sem base real no presente mas úteis
para a legitimação das aventuras bélicas.
Néstor Kirchner, ex presidente da Argentina, revelou numa entrevista com
o director Oliver Stone, para o seu documentário "South of the
Border", que o ex presidente dos Estados Unidos George W. Busch estava
convencido de que a guerra era a maneira de fazer crescer a economia do seu
país. O encontro entre ambos os presidente verificou-se numa cimeira em
Monterrey, México, em Janeiro de 2004, e a versão oficial do
presidente argentino é a seguinte: "Eu disse que a
solução para os problemas neste momento, disse a Bush, é
um Plano Marshall. E ele aborreceu-se. Disse que o Plano Marshall é uma
ideia louca dos democratas e que a melhor forma de revitalizar a economia
é a guerra. E que os Estados Unidos fortaleceram-se com a guerra"
[20]
.
Recentemente Peter Schiff, presidente da consultora financeira "Euro
Pacific Capital" escreveu um texto delirante amplamente difundido pelas
publicações especializadas cujo título diz tudo. "Por
que não outra Guerra mundial?"
[21]
. Começava o seu artigo
assinalando o consenso entre os economistas de que a Segunda Guerra Mundial
permitiu aos Estados Unidos superar a Grande Depressão e que se as
guerra do Iraque e do Afeganistão não conseguiram reactivar de
modo durável a economia norte-americana isso se deve a que "os
referidos conflitos são demasiado pequenos para serem economicamente
importantes".
Se centrarmos a análise na relação entre gastos militares,
PIB e emprego constataremos o seguinte: os gastos militares passaram de US$2800
milhões em 1940 para US$91 mil milhões em 1944 o que impulsionou
o PIB nominal de US$101 mil milhões em 1940 para US$214 mil
milhões em 1944 (duplicou em apenas quatro anos), a taxa de desemprego
baixou apenas de 9% em 1939 para 8% em 1940 mas em 1944 havia caído para
0,7%, o primeiro salto importante nos gastos militares verificou-se entre 1940
e 1941 quando passaram de US$2800 milhões para US$12799 milhões
equivalente a 10% do PIB
[22]
, proporção bastante parecida à de 2012 (US$1,3
milhões de milhões, aproximadamente 9% do PIB). Isto significa
que o gasto militar de 1944 equivalia a umas sete vezes o de 1941. Se
transferirmos esse salto para números actuais isso significa que o gasto
militar real dos Estados Unidos deveria chegar em 2015 a uns US$9
milhões de milhões equivalentes por exemplo a sete vezes o
défice orçamental de 2012.
A sucessão de saltos na despesa pública entre 2012 e 2015
acumularia uma gigantesca massa de défice que nem os poupadores
norte-americanos nem os do resto do mundo estariam em condições
de cobrir com a compra de títulos de dívida de um império
enlouquecido. Schiftg recorda no seu texto que os poupadores norte-americanos
compraram durante a Segunda Guerra Mundial US$186 mil milhões de
dólares em títulos da dívida pública equivalente a
75% da totalidade das despesas do governo federal entre 1941 e 1945 concluindo
que essa "proeza" é hoje impossível. Simplesmente,
explica-nos Schift levando ao extremo seu raciocínio sinistro,
não há onde obter o dinheiro necessário para por em marcha
uma estratégia militar reactivadora semelhante à de 1940-45.
Na realidade, essa impossibilidade é muito mais forte. A economia dos
EUA de 1940 era dominada por componentes produtivos, principalmente
industriais. Actualmente, o consumismo, toda classe de serviços
parasitários (a começar pelo emaranhado financeiro), a
decadência generalizada da cultura de produção, etc,
indicam-nos que nem mesmo aplicando uma injecção de gastos
públicos equivalente à de 1940-45 seria possível conseguir
uma reactivação dessa envergadura. O parasita é demasiado
grande, sua senilidade está muito avançada, não há
nenhum remédio keynesiana que o possa curar ou que pelo menos seja capaz
de restabelecer uma parte significativa do seu vigor juvenil.
Privatização, informalização e
elitização. Lumpen-imperialismo.
A guerra asiática, a mais ambiciosa da história dos Estados
Unidos, fracassou tanto do ângulo político-militar como do
económico, a estratégia de dominação da faixa
territorial que vai desde os Balcãs até o Paquistão
passando pela Turquia, Síria, Iraque, Irão e a
ex-repúblicas soviéticas da Ásia Central encontra-se hoje
atolada. Contudo, seu desenvolvimento permitiu transformar o dispositivo
militar do Império convertendo sua maquinaria de guerra tradicional num
sistema flexível a meio caminho entre as estruturas formais regidas pela
disciplina militar convencional e as informais agrupando um emaranhado confuso
de núcleos operativos oficiais e bandos de mercenários.
O processo de integração de mercenários às
operações militares tem antecedentes nos trechos finais da guerra
fria, a organização dos "contras" na Nicarágua e
dos "mujaidines" no Afeganistão podem ser considerados como os
primeiros passos nos anos 1970 e 1980 das novas estratégias de
intervenção. Nesses casos dezenas de milhares de
mercenários foram treinados, armados e financiados com resultados com
êxito para o Império.
Segundo diversos estudos sobre o tema, os Estados Unidos e a Arábia
Saudita gastaram uns US$40 mil milhões nas operações
afegãs (onde começou a sua carreira internacional o então
jovem engenheiro Osama Bin Laden) assestando um golpe decisivo à URSS
[23]
. Outro passo importante foram as guerras étnicas na Jugoslávia
durante os anos 1990, onde os Estados Unidos e os seus aliados da NATO,
principalmente a Alemanha, desenvolveram uma complexa tarefa de
desintegração desse país cujo êxito foi apoiado na
utilização de mercenários. O caso mais notório foi
o da guerra do Kosovo onde se destacou o "Exército de
Libertação do Kosovo" (ELK) cujos integrantes eram
recrutados principalmente em redes mafiosas (tráfico de drogas, etc) sob
o comando directo da CIA estendendo suas ligações até o
serviço de inteligência do Paquistão (ISI). Actualmente, o
"estado" kosovar "independente" aparece vinculado à
intervenção da NATO na Síria; em Junho de 2012 o ministro
das Relações Exteriores da Rússia exigia a
cessação das operações de
desestabilização da Síria realizadas a partir do Kosovo
[24]
.
Estas novas práticas de intervenção foram acompanhadas por
um denso processo de reflexão dos estrategas imperiais, disparado pela
derrota no Vietname. A "Guerra de Baixa Intensidade" foi um dos seus
resultados e as teorizações em torno da "Guerra de Quarta
Geração (4GW)" consolidaram a nova doutrina em cujo
documento fundacional (1989) redigido por William Lind e três membros das
forças armadas dos Estados Unidos e publicado no
"Marine Corps Gazete"
[25]
são apagadas as fronteiras entre as áreas civil e militar: toda
a sociedade inimiga, em especial a sua identidade cultural, passa a ser o
objectivo da guerra.
A nova guerra é definida como descentralizada, pondo a ênfase na
utilização de forças militares "não
estatais" (ou seja, paramilitares), empregando tácticas de desgaste
próprias das guerrilhas, etc. A isso acrescenta-se o emprego intenso do
sistema mediático voltado tanto contra a sociedade inimiga como
abrangendo a chamada "opinião pública global" (o povo
inimigo é ao mesmo tempo atacado psicologicamente e isolado do mundo)
combinado com acções de guerra de alto nível
tecnológico. Neste último caso trata-se de aproveitar a
gigantesca brecha tecnológica existente entre o império e a
periferia para golpeá-la sem perigo de resposta, é o que os
especialistas denominam confrontação assimétrica
"high-tech/no-tech".
As estatísticas oficiais relativas aos mercenários são em
geral confusas e parciais. De qualquer forma, alguns dados provenientes de
fontes governamentais, civis ou militares, podem ilustrar-nos acerca da
magnitude do fenómeno. Em primeiro lugar a lista do Departamento da
Defesa, principal contratador de mercenários, seu orçamento
destinado a esses gastos aumentou em cerca de 100% entre 2000 e 2005 empregando
modalidades próprias das grandes empresas transnacionais como a
terciarização e a relocalização de actividades, o
que produziu um gigantesco universo em expansão de negócios
privados consagrados à guerra... financiados pelo Estado e geradores de
intrincadas teias de corrupções e abusos
[26]
.
O chamado "Comando Central" militar dos Estados Unidos (US CENTCOM)
deu a conhecer recentemente alguns dados significativos: os mercenários
contratados reconhecidos na área do Médio Oriente –
Ásia Central chegariam a uns 137 mil a trabalharem directamente para o
Pentágono. Desse total, só uns 40 mil seriam cidadãos
norte-americanos. Ainda que, segundo dados do Departamento da Defesa, somando
os dados do Afeganistão e Iraque estariam nos terreno uns 175 mil
soldados regulares e 190 mil mercenários: 52% do total
[27]
.
A estes números devemos acrescentar em primeiro lugar os
mercenários contratados por outras áreas do governo
norte-americano, como o Departamento de Estado e a seguir os contratos em zonas
do mundo como a África onde o AFRICOM (comando militar norte-americano
nesse continente) aumentou exponencialmente suas actividades durante o
último quinquénio e a seguir devemos incorporar os
mercenários que actuam sob o comando estratégico norte-americanos
mas contratados por países vassalos como as petro-monarquias do Golfo
Pérsico, visíveis nos casos da Líbia e da Síria.
Também têm de ser incluídos os mercenários que
operam em outras regiões da Ásia e na América Latina. Mas
a conta não termina aí, uma vez que a esse universo é
necessários acrescentar as redes mafiosas e/ou paramilitares agrupando
em todos os continente um "pessoal disponível" que se
auto-financia graças a actividades ilegais (drogas,
prostituição, etc) protegidas por diversas agências de
segurança norte-americanas, como a DEA, ou que integram
"agências de segurança privada", muito notórias
por exemplo na América Latina, estabelecidas legalmente nos
países periféricos e estreitamente vinculadas a agências
privadas norte-americanas e/à DEA, à CIA ou outros organismos de
inteligência do Império.
E a lista prossegue... Recentemente foi publicada no
Washington Post
uma investigação relativa à "América ultra
secreta"
(Top Secret America)
das agências de segurança que informa acerca da existência
actual de 3202 agências de segurança (1271 públicas e 1931
privadas) empregando umas 854 mil pessoas que trabalham em assuntos de
"antiterrorismo", segurança interna e inteligência em
geral, instaladas nuns 10 mil domicílios no território dos
Estados Unidos
[28]
.
Somando os diferentes números mencionados e estimando dados ocultos
alguns peritos adiantam um total aproximado global (dentro e fora do
território dos Estados Unidos) próximo ao milhão de
pessoas a combaterem na periferia, a fazerem espionagem, desenvolverem
manipulações mediáticas, a activarem "redes
sociais", etc. Comparemos esse dados com, por exemplo, as aproximadamente
1,4 milhão de pessoas que formam o sistema militar público do
Império.
Pelo seu lado, as tropas regulares sofreram um processo rápido de
informalização, de ruptura em relação às
normas militares convencionais, formando comandos de intervenção
inscritos numa dinâmica abertamente criminosa. É o caso do chamado
Comando Conjunto de Operações Especiais
(Joint Special Operations Command, JSOC).
Comando conjunto secreto em linha de comandos directa com o Presidente e o
secretário da Defesa com autoridade para elaborar sua lista de
assassinatos, tem a sua própria divisão de inteligência,
sua frota de
drones
e aviões de reconhecimento, seus satélites e inclusive seus
grupos de ciber-guerreiros capazes de atacar redes da Internet.
O JSOC dispõe de numerosas unidades operativas. Criado em 1980, ficou
enterrado devido ao seu fracasso espectacular no Irão quando tentou
resgatar pessoal da embaixada norte-americana em Teerão, mas foi
ressuscitado recentemente. Em 2001 dispunha de uns 1800 membros, actualmente
chegariam a 25 mil. Nos últimos tempos realizou operações
letais no Iraque, Paquistão, Afeganistão, Síria,
Líbia e muito provavelmente no México e Colômbia, etc.
Trata-se de um agrupamento de "esquadrões da morte" de alcance
global, autorizado a realizar toda classe de operações ilegais,
desde assassinatos individuais ou maciços até sabotagens,
intervenções próprias da guerra psicológica, etc.
Em Setembro de 2003 Donald Rumsfeld havia ditado uma resolução
colocando a JSOC no centro da estratégia "antiterrorista"
global e desde então sua importância tem crescido, passando hoje a
ser, sob a presidência do prémio nobel da paz Barack Obama, uma
espécie de exército clandestino de claro perfil criminoso sob as
ordens directas do Presidente
[29]
.
As forças de intervenção dos Estados Unidos têm
agora um viés claramente privado-clandestino, em plena "Guerra de
Quarta Geração" funcionam cada vez mais à margem dos
códigos militares e das convenções internacionais. Um
artigo recente de Andrew Bacevich descreve as etapas dessa
mutação durante a década passada que culminam actualmente
no que o autor denomina "era Wickers" (actual subsecretário de
inteligência do Departamento da Defesa) focalizado na
eliminação física de "inimigos", na
utilização dominante de mercenários, de campanhas
mediáticas, redes sociais, tudo isso destinado a desestruturar
organizações e sociedades consideradas hostis. Em
princípios do ano passado a então secretária de Estado
Hillary Clinton pronunciou uma frase que não exige maiores
explicações: "Os Estados Unidos reservam-se o direito de
atacar em qualquer lugar do mundo todo aquele que for considerado uma
ameaça directa para a sua segurança nacional"
[30]
.
Se a esta orientação mercenária-gangsteril do
Império somarmos outros aspectos como a financiarização
integral da sua economia dominada pelo curto-prazismo, sua
desintegração social interna com acumulação
acelerada de marginais, com uma população total que representa 5%
da mundial mas com uma massa de presos equivalentes a 25% do total de pessoas
encarceradas no planeta, etc, chegaremos à conclusão de que
estamos na presença de uma espécie de lumpen imperialismo
completamente dominado por interesses parasitários e embarcado numa
lógica destrutiva do seu ambiente que, ao mesmo tempo, vai degradando as
suas bases de sustentação interna
[31]
.
A ilusão do metacontrole do caos
Poderíamos estabelecer uma convergência entre a hipótese da
"economia de guerra permanente" e a do "keynesianismo
militar". Este último exprimiu a primeira etapa do fenómeno
(aproximadamente entre 1940 e 1970). Foram os anos da prosperidade imperial
cujos últimos êxitos, já misturados com claros sintomas de
crise, prolongaram-se até o fim da guerra fria. A essa etapa florescente
segue-se uma segunda pós keynesiana, caracterizada pela
dominação financeira, pela concentração de
rendimentos, pelo desinchar salarial, pela marginalização social
e pela degradação cultural em geral, em que o aparelho militar
opera como um acelerador da decadência provocando défices
orçamentais e endividamentos públicos.
A opção pela privatização da guerra surge como uma
resposta "eficaz" ao declínio do espírito de combate da
população (dificuldades crescentes no recrutamento forçado
de cidadãos a partir da derrota do Vietname). Contudo, a
substituição do cidadão-soldado pelo
soldado-mercenário ou a presença decisiva deste último
termina tarde ou cedo por provocar danos graves no funcionamento das estruturas
militares: não é o mesmo administrar cidadãos normais ou
uma massa de delinquentes.
Quando o lumpen, os bandidos, predominam num exército, o mesmo
converte-se num exército de bandidos e um exército de bandidos
já não é um exército. O potencial desagregador dos
mercenários é, a longo prazo, de controle quase impossível
e seus fracassos no combate não podem ser compensados senão muito
parcialmente por dispositivos tecnológicos sumamente custosos e de
resultado incerto.
A formação de forças clandestinas
não-mercenárias de elite, apoiadas por um aparelho
tecnológico refinado capaz de efectuar golpes pontuais demolidores
contra o inimigo, como é o caso do JSOC, são bons instrumentos
terroristas mas não substituem as funções de um
exército de ocupação e, a médio prazo (muitas vezes
a curto prazo), terminam por fortalecer o espírito de resistência
do inimigo.
Poderíamos sintetizar de maneira caricatural a nova estratégia
militar do Império a partir do predomínio de diversas formas de
"guerra informal" combinando mercenários (muitos
mercenários) com esquadrões da morte (tipo JSOC), bombardeamentos
maciços, drones, controle mediático global, assassinatos
tecnologicamente refinados de dirigentes periféricos. A guerra
elitiza-se, transforma-se num conjunto de operações mafiosas,
afasta-se fisicamente da população norte-americana e a sua
cúpula dominante começa a percebê-la como um jogo virtual
dirigido por gangsters.
Por outro lado, a adopção de estruturas mercenárias e
clandestinas de intervenção externa como forma dominante tem
efeitos contraproducentes para o sistema institucional do império tanto
do ponto de vista do controle administrativo das operações como
das modificações (e da degradação) nas
relações internas de poder. O comportamento de gangsters, a
mentalidade mafiosa, acaba poder apoderar-se dos altos comandos civis e
militares e traduz-se a princípio em acções externas,
periféricas, e mais adiante (rapidamente) em ajustes de contas, em
condutas habituais no interior do sistema de poder.
O horizonte objectivo (para além dos discursos e
convicções oficiais) da "nova estratégia"
não é o estabelecimento de regimes vassalos sólidos, nem a
instalação de ocupações militares duradouras
controlando territórios de maneira directa e sim, antes, desestabilizar,
quebrar estruturas sociais, identidades culturais, degradar ou eliminar
dirigentes. As experiências do Iraque, Afeganistão, México
e, mais recentemente, as da Líbia e da Síria confirmam esta
hipótese.
Trata-se da
estratégia do caos periférico,
da transformação de nações e regiões mais
amplas em áreas desintegradas, balcanizadas, com estados-fantasmas,
classes sociais (altas, médias e baixas) profundamente degradadas sem
capacidade de defesa, de resistência perante os poderes políticos
e económicos do Ocidente que poderiam assim depredar impunemente seus
recursos naturais, mercados e recursos humanos (residuais).
Este imperialismo tanático do século XXI tem
correspondência com tendências desintegradoras nas sociedades
capitalistas dominantes, em primeiro lugar a dos Estados Unidos. Essas
economias perderam seu potencial de crescimento, em fins de 2012, a seguir a um
quinquénio de crise financeira, oscilavam entre o crescimento
anémico (EUA), o estancamento virando-se para a recessão (UE) e a
contracção produtiva (Japão).
Os estados, as empresas e os consumidores estão esmagados pelas
dívidas. A soma de dívidas públicas e privadas representa
mais de 500% do PIB no Japão e na Inglaterra e mais de 300% na Alemanha,
França e nos Estados Unidos, onde o governo federal esteve em 2011
à beira do incumprimento. E por cima de dívidas e sistemas
produtivos financiarizados existe uma massa financeira global equivalente a uma
vinte vezes do Produto Bruto Mundial, motor dinamizador, droga
indispensável do sistema que deixou de crescer há aproximadamente
cinco anos e cujo desinchar os governos das potências centrais tentam
impedir.
Apresenta-se então a ilusão de uma espécie de metacontrole
estratégico a partir das grandes alturas, a partir das cimeiras do
Ocidente sobre as terras baixas, periféricas, onde pululam milhares de
milhões de seres humanos cujas identidades culturais e
instituições são vistas como obstáculos à
depredação. As elite do Ocidente, o império colectivo
hegemonizado pelos Estados Unidos, estão cada dia mais convencidas de
que a referida depredação prolongará o seu envelhecimento,
afastará o fantasma da morte.
O caos periférico surge ao mesmo tempo como o resultado concreto das
suas intervenções militares e financeiras (produto da
reprodução decadente das suas sociedades) e como a base de
depredações ferozes. O gigante imperial procura beneficiar-se do
caos mas acaba por introduzir o caos entre as suas próprias fileiras, a
destruição desejada da periferia não é outra coisa
senão a auto-destruição do capitalismo como sistema
global, sua perda veloz de racionalidade. A fantasia acerca do metacontrole
imperialista do caos periférico exprime uma profunda crise de
percepção, a crença de que os desejos do poderoso
convertem-se facilmente em factos reais, o virtual e o real confundem-se
formando um enorme pântano psicológico.
Na realidade, a "estratégia" de metacontrole imperial do caos,
suas formas operativas concretas, convertem-na num emaranhado de
tácticas que tendem a formar uma massa cada vez mais incoerente,
prisioneira do curto prazo. O que se pretende converter na nova doutrina
militar, num pensamento estratégico inovador que responde à
realidade global actual facilitando a dominação imperialista do
mundo não é outra coisa senão uma ilusão
desesperada gerada pela dinâmica da decadência. Sob a
aparência de
ofensiva estratégica,
irrompem as bofetadas historicamente defensivas de um sistema cuja
cúpula imperial vai perdendo a capacidade de apreensão da
totalidade real, a razão de estado vai-se convertendo num delírio
criminoso extremamente perigoso dado o gigantismo tecnológico dos
Estados Unidos e seus sócios europeus.
(1) Ron Suskind, "Without a doubt: faith, certainty and the presidency of George W. Bush", The New York Times, 17-10-04.
(2) Sua exposição desenvolvida na Marshall Society (Cambridge) na Primavera de 1942 foi publicada no ano seguinte. Michal Kalecki, "Political Aspects of Full Unemployment", Political Quaterly, V 14, oct.-dec. 1943.
(3) Michal Kalecki, The Last Phase in the transformation of Capitalism, Monthly Review Press, Nueva York, 1972.
(4) Paul Sweezy & Paul Baran, Monopoly Capital, Monthly Review Press, Nueva York, 1966.
(5) Scoot B. MacDonald, "Globalization and the End of the Guns and Butter Economy", KWR Special Report, 2007.
(6) Oakes, Walter J., "Towards a Permanent War Economy?", Politics, February 1944.
(7) Ambas as citações aparecem no texto de John Bellamy Foster, Hannah Holleman e Robert W. McChesney, "The U.S. Imperial Triangle and Military Spending", Monthly Review, October 2008.
(8) Vance, T. N. 1950, "After Korea What? An Economic Interpretation of U.S. Perspectives", New International, November–December; Vance, T. N. 1951, "The Permanent Arms Economy", New International.
(9) Oakes, Walter J, artigo citado.
(10) Paul Sweezy & Paul Baran, livro citado.
(11) Thomas Piketty & Emmanuel Saez, "Top Incomes and the Great Recession: Recent Evolutions and Policy Implications", 13th Jacques Polak Annual Research Conference, Washington, DC-November 8–9, 2012.
(12) Fonte: U.S. Bureau of Labor Statistics.
(13) Lawrence Mishel and Heidi, "The Wage Implosion", Economic Policy Institute, June 3, 2009.
(14) FRAC, Food Research and Action Center- SNAP/SNAP/Food Stamp Participation
(15) Vance T. N, "The Permanent War Economy", New International, Vol 17, Nº 1, January-February 1951.
(16) Doménico Losurdo, "Las raices norteamericanas del nazismo", Enfoques Alternativos, nº 27, Octubre de 2006, Buenos Aires, http://www.resistir.info/eua/raizes_nazismo_eua.html
(17) Paul Kennedy, "Auge y caída de las grandes potencias", Plaza & James, Barcelona, 1989.
(18) Chris Hellman, "$ 1,2 Trillon: The Real U.S. National Security Budget No One Wants You to Know About", Alert Net, March 1, 2011.
(19) Fontes: SIPRI, Banco Mundial y cálculos proprios.
(20) O video da entrevista Kirchner-Stone publicado por Informed Comment/Juan Cole está em: -angrily-said-war-would-grow-us-economy.html&ei=BYYCUYCnC4P88QSX3oGACA
(21) Peter D. Schiff, "Why Not Another World War ?", Financial Sense, 19 Jul 2010.
(22) Vance T. N, 1950, artículo citado en (14).
(23) Dilip Hiro, "The Cost of an Afghan 'Victory'", The Nation, 1999 February 15.
(24) "Una delegación de la oposición siria viajó a Kosovo, en abril de 2012, para la firma oficial de un acuerdo de intercambio de experiencias en materia de guerrilla antigubernamental". Red Voltaire, "Protesta Rusia contra entrenamiento de provocadores sirios en Kosovo", 6 de Junio de 2012.
(25) William S. Lind, Colonel Keith Nightengale (USA), Captain John F. Schmitt (USMC), Colonel Joseph W. Sutton (USA), and Lieutenant Colonel Gary I. Wilson (USMCR), "The Changing Face of War: Into the Fourth Generation", Marine Corps Gazette, October 1989.
(26) David Isenberg, "Contractors and the US Military Empire", Rise of the Right, Aug 14th, 2012.
(27) David Isenberg, "Contractors in War Zones: Not Exactly "Contracting", TIME U. S., Oct. 09, 2012.
(28) Dana Priest and William M. Arkin, "Top Secret America. A hidden world, growing beyond control", Washington Post, July 19, 2010.
(29) Dana Priest and William M. Arkin, "Top Secret America, A look at the military's Joint Special Operations Command", The Washington Post, September 2, 2011.
(30) Andrew Bacevich, "Uncle Sam, Global Gangster", TomDispatch.com, February 19, 2012.
(31) Narciso. Isa Conde, "Estados neoliberales y delincuentes", Aporrea, 20/01/2008, http://www.aporrea.org/tiburon/a49620.html .
Karen DeYoung and Karin Brulliard, "As U.S.-Pakistani relations sink, nations try to figure out 'a new normal'", The Washington Post /National Security, January 16, 2012.
O original encontra-se em marxismocritico.files.wordpress.com/2013/03/beinstein_militarismo.pdf
[*]
Professor da Universidade de Buenos Aires. Conferência pronunciada no
Seminario "Nuestra América y Estados Unidos: desafíos del
Siglo XXI". Facultad de Ciencias Económicas de la Universidad
Central del Ecuador, Quito, 30 e 31 de Enero de 2013,
jorgebeinstein@gmail.com
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