editora SM
José Pacheco
Mestre em educação da Criança,
ex-diretor da Escola da Ponte em Portugal
Mestre em educação da Criança,
ex-diretor da Escola da Ponte em Portugal
A verdade padece, mas não perece.
(Santa Teresa d’Ávila)
Conta-se que um filósofo conversava com o diabo, quando passou um
sábio com um saco cheio de verdades, do qual uma caiu. Alguém a apanhou e
saiu correndo, gritando: Encontrei a verdade! Perante esse quadro, o filósofo disse para o diabo: Aquele homem encontrou a verdade e, agora, todos vão saber que você é uma ilusão da mente. Mas o diabo respondeu: Está enganado. Ele encontrou um pedaço da verdade. Com ela, vai fundar mais uma religião. E eu vou ficar mais forte!
Quem sofrer de alguma forma de angústia existencial encontrará
respostas em Kalil Gibran, ou em Antoine Saint Exupéry. Aqueles que
estiverem em situação de dúvida religiosa poderão recorrer à Bíblia, ao
Corão, ou a outro qualquer livro sagrado. Essa experiência pode
constituir-se numa bela harmonia. Certamente, haverá muitas verdades
para a verdade em que acreditamos. Se eu vejo de um modo e o outro vê de
outro modo, que se tente ver os dois modos, ver juntos, como Mahatma
Gandhi fazia: “A minha preocupação não está em ser coerente com as
minhas afirmações anteriores sobre determinado problema, mas em ser
coerente com a verdade.” Não esqueçamo-nos que foi a imposição de uma “verdade” única que levou Espinosa ao exílio e Galileu à retratação.
O José Prat ironiza: “Sempre que alguém afirma que dois e dois são
quatro, e um ignorante lhe responde que dois e dois são seis, surge um
terceiro que, em prol da moderação e do diálogo, acaba por concluir que
dois e dois são cinco”…
Apesar das distorções da informação cometidas pela mídia, a verdade continua sendo verdade. Quando a mentira, tal como a Medusa, contempla o escudo de Teseu e soçobra, é porque reconhece a sua verdadeira face.
Apesar das distorções da informação cometidas pela mídia, a verdade continua sendo verdade. Quando a mentira, tal como a Medusa, contempla o escudo de Teseu e soçobra, é porque reconhece a sua verdadeira face.
Um e-mail recebido de uma professora está escrito:
- Eu estava numa palestra sua e lhe fiz uma pergunta. Me
apresentei como pedagoga e disse que tinha duas dúvidas. O senhor me
respondeu algo assim: Como pode ser pedagoga e ter apenas duas dúvidas?
Acredito que todo o ser humano é uma dúvida, uma “metamorfose
ambulante”. A dúvida e a humildade são companheiras diletas da verdade,
uma mistura sublime. Aceitemos, serenamente, os mistérios por desvendar,
sem necessidade de explicações para o inexplicável.
Venho repetindo que o princípio da veracidade deverá nortear todos os
projetos educativos. Mas, na boca das crianças, a verdade chega a ser
crueldade…
- Ah tia, desculpe! – disse a aluna.
- Por que, minha filha? – quis saber a professora.
- É que chamei a senhora de idiota – esclareceu a criança.
- Eu não escutei nada – disse a professora, sorrindo.
- Foi só em pensamento… – esclareceu a criança.
Ainda que disso não tome consciência, a criança age filosoficamente,
buscando verdades. Verdades como a que reconstitui a história da
filosofia dos adultos: Thales afirmava ser a água o elemento fundamental
da matéria. Anaxímenes acreditou que fosse o ar. Para Xenófanes, o
elemento fundamental era a terra. Heráclito afirmou que era o fogo. E
chegou Empédocles, para explicar que o mundo é combinação da água, ar,
terra e fogo. As crianças e os loucos falam verdades que a sua época
permite vislumbrar. Talvez por isso, os loucos sejam internados em
hospícios e as crianças em escolas. Permite, pois, que vos narre mais um
episódio, confirmação da infantil prática da verdade.
Uma professora tentava convencer os alunos a comprar uma cópia da foto do grupo:
- Imaginai que bonito será, quando vocês forem grandes e todos
digam “ali está a Catarina, é advogada, este é o Miguel e, agora, é
médico”.
Uma vozinha, vinda do fundo da sala, fez-se ouvir:
- E ali está a professora… Que já morreu.
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