"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música"
Friedrich Nietzsche

terça-feira, junho 25, 2013

Wanderley: Dilma não denunciou a manha Golpista

conversa afiada - Publicado em 23/06/2013



Saiu no IG:

A presidenta Dilma Rousseff falou, mas não disse

Em artigo, o cientista político Wanderley Guilherme dos Santos analisa o pronunciamento desta sexta e afirma que o discurso foi ineficaz e que as manifestações revelam o maior ataque à democracia dos últimos 20 anos

Não se cura tuberculose por decreto ao fim de passeatas. Mas as gangues de ladrões e depredadores que desde terça-feira, dia 18 de junho, receberam de presente a mais legítima carona da sociedade – desfiles pacíficos em nome da democracia – estão pouco se lixando. Os articuladores anônimos dos grupos violentos de direita, neo-nazistas inclusive, e dos radicalóides sociopatas, conhecem muito bem o tempo das políticas, mas não é o que os interessa. Para os atraídos de boa fé para a trapaça reivindicatória, enfim, o discurso da presidente Dilma não trouxe novidade. Investimento em saúde e educação, ensino técnico como nunca visto, transparência na administração, através da lei de acesso à informação, apuração de desvios administrativos, com inédita demissão de ministros, são políticas já em vigor e rotineiras, isto é, não há mais discussão sobre se devem ou não devem ser executadas. São políticas de Estado, compromisso do país. Isso para não enumerar sucessivas inovações na política social que, estupidez que o amanhã julgará, passou a ser impudico mencionar em meios de classe de renda mais elevada.

A mensagem da presidente arrisca ser ineficaz, do mesmo modo como são absolutamente vazias as reivindicações marchadeiras: saúde, educação, transparência, ética na política – sem que se indiquem os acusados de objetá-las. Por isso, as provocações tendem a perdurar enquanto os de boa fé não se derem conta de que são equivocadas as manifestações com tanta virulência contra o que de fato já está em execução, obtendo variados graus de sucesso. O cerne da contestação não está nas demandas fragmentadas. Está no ataque à democracia como sistema capaz de prover e operar uma sociedade justa. Em outras palavras: segundo os mentores e comentaristas convertidos os grandes feitos dos últimos governos não seriam tão significativos, antes revelando ser a democracia, pelo menos em sua forma atual, um desastre governativo. Recusa enfática a esse niilismo não constou, mas devia ser crucial, do discurso presidencial.

A mensagem subliminar dos arquitetos da desordem (com exceção do Movimento pelo Passe Livre fora) e dos aproveitadores de todas as idades tem consistido em insinuar que as instituições democráticas – governo representativo, parlamentos, movimentos sociais organizados, partidos políticos – são os obstáculos à construção de uma sociedade mais justa e livre. Golpistas crônicos, anarquistas senis em busca de holofote, muitos jovens anencéfalos e assustados da classe média em geral, formam a retaguarda deste exército do obscurantismo e da violência. A essência desse arremedo intolerante de participação é uma reação à democracia e suas realizações. Faltou ao discurso de Dilma Roussef uma declaração de que reconhecia as manhas dos que se aproveitam das boas intenções para conduzi-las ao inferno. E de que não se submeterá a elas.

Enquanto a empulhação televisa continua a descrever as manifestações “cívicas até aqui pacíficas”, no meio das passeatas, como se as apresentadoras não soubessem o que viria ao fim da encenação, registro que, em minha opinião, se trata do maior cerco reacionário, nacional e internacional, que este país já sofreu nos últimos vinte anos.

Considero Wanderley um dos melhores pensadores da área. Sua análise em Poliarquia em 3D é excelente. Mas, não concordo plenamente com seu texto no tocante ao ataque à democracia, pelo menos no que se entende como democracia de forma geral (não aquela discutida de forma mais profunda como o fez Robert Dahl).
Não consigo dissociar essa democracia da direita por exemplo. Em um retorno de um governo de forte inclinação neoliberal, teríamos vários ingredientes da democracia: voto popular, eleições livres, etc. Mas, teríamos um agravamento das condições sociais. A Suécia (creio que todos são de acordo que o país é uma democracia) por exemplo vem após sucessivos governos neoliberais apresentando aumento nas suas desigualdades internas.
Creio que o grande risco é de surgir do movimento um governo de intensa inclinação neoliberal, que consiga absorver de forma propagandística as bandeiras democráticas de melhoria social.
As políticas de inclusão social realizadas no Governo Lula foram impressionantes. A classe média (não a do imaginário de esquerda, mas a realmente medida) hoje representa mais da metade da população do país.
E como bem disse Juan Arias recentemente em debate sobre as manifestações, a grande diferença entre as manifestações da classe média espanhola e brasileira é que a primeira luta pelo que perdeu, a segunda pelo que ainda não tem.
E isso é algo facilmente manipulado pelas estruturas neoliberais. 
 

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