viomundo - publicado em 3 de julho de 2013 às 10:23
Para onde?
por Adriano Benayon*, via e-mail
01.07.2013
1. Por que milhões de pessoas vão às ruas manifestar-se, mesmo sem
ter tido conhecimento dos passos mais recentes dados pelos poderes do
Estado no sentido da destruição do País?
2. Claro que para revoltar-se nem precisam estar bem informados.
Basta sentir os sofrimentos decorrentes de problemas que continuam
agravando-se: 1) transporte público insuportável e, além disso, nas
grandes cidades, transporte particular inviabilizado pelo excesso de
veículos; 2) acesso difícil ou inexistente a serviços públicos de
saúde e de educação, de alguma qualidade, além de, no âmbito privado,
preços absurdos sem qualidade correspondente; 3) salários baixos; 4)
preços elevados, em mercados dominados por empresas e bancos
concentradores; 5) impostos e taxas numerosos e custosos.
3. Credita-se ter desencadeado a faísca ao Movimento do Passe Livre
(MPL), baseado em São Paulo e outras cidades, organizado há anos e
voltado para objetivos justos, embora limitados
4. O momento em que surgiram os protestos devidos ao aumento das
passagens de ônibus em São Paulo, coincidiu com os jogos da Copa das
Confederações, a qual expôs os superfaturamentos e outros absurdos
ligados à construção dos estádios.
5. É compreensível que associem esses gastos suntuários às carências no atendimento das necessidades da população.
6. Falta, porém, elevar mais o número dos manifestantes e motivá-los a
lutar pela erradicação das verdadeiras causas das desditas do povo.
Para isso é urgente disseminar, para dezenas de milhões de brasileiros,
as informações econômicas e políticas relevantes.
7. Dizer-lhes, por exemplo: Os gastos com a dívida pública absorveram
43,98% dos recursos federais em 2012. Mais de R$ 750 bilhões. Para a
saúde foram destinados somente 4,17% desses recursos;3,34% à educação;
0,7 aos transportes; 0,39% à segurança e 0,01% à habitação.
8. Os R$ 750 bilhões para a dívida equivalem a quase o total dos
investimentos públicos e privados no mesmo ano. Significa que se esse
dinheiro fosse investido produtivamente, em vez de dilapidado em
despesas financeiras, poderiam ser dobrados os gastos realizados na
produção e na geração de empregos.
9. Desde 1988 foram gastos 10 trilhões de reais com a dívida pública.
Um trilhão é mil vezes um bilhão, e um bilhão é mil vezes um milhão,
que é mil vezes mil.
10. De onde veio isso: A indústria e os mercados são controlados por
empresas estrangeiras, que remetem dinheiro ao exterior de mais de
quinze modos. Os bens e serviços que vendemos são subfaturados, e os que
compramos são superfaturados.
11. Então se acumulam as dívidas. O produto de nosso trabalho, os
nossos minérios, a produção agrícola, tudo é mandado para o exterior por
quase nada, e o governo ainda premia os exportadores e os isenta de
ICMS e contribuições sociais.
12. Por que é assim? Os políticos recebem dinheiro das empresas e
bancos concentradores para as eleições e dependem também das TVs
comerciais e imprensa, tudo ligado aos concentradores financeiros.
13. Por isso o problema dos investimentos produtivos não é só serem
poucos, mas serem mal escolhidos e realizados. Tudo é desenhado,
orientado para o ganho dos concentradores: transportes, educação,
saúde, telecomunicações e energia.
14. E também: O transporte está ruim? Lógico, as ruas estão
entulhadas com veículos produzidos por montadoras estrangeiras, às quais
o governo federal, os estaduais e os municipais dão prêmios e isenções
de centenas de bilhões de reais. E não construíram linhas de metrô. Por
isso o trabalhador se desgasta durante cinco horas por dia dentro das
conduções. Não se fazem tampouco hidrovias nem ferrovias para
transportar passageiros e cargas.
15. A corrupção tem efeitos muito mais graves que os percebidos pela
grande maioria dos brasileiros. Esta se indigna diante dos casos de
enriquecimento, na ordem de milhões de reais, dos políticos e agentes
públicos, que a grande mídia resolve expor, poupando os corruptos mais
ligados aos interesses estrangeiros.
16. O povo não protesta, ainda, com a devida força, contra as lesões
praticadas pelo atual governo ao patrimônio público nos leilões de
petróleo — trilhões de dólares entregues praticamente de graça a
petroleiras estrangeiras — nem contra a gradual destruição da Petrobrás.
17. Ainda por cima Executivo e Legislativo fazem demagogia decretando
que 75% dos royalties do petróleo sejam carreados para a educação e 25%
para a saúde. Ora, esses percentuais incidem sobre praticamente nada,
além de a produção ainda demorar, os royalties são 10% das receitas
subdeclaradas (o governo não controla o que sai).
18. Ainda se manifesta pouco contra as concessões de ferrovias,
portos e aeroportos financiadas pelo BNDES. Igual com os empréstimos de
grande vulto para empresas concentradoras e para as parcerias
público-privadas nos investimentos de infra-estrutura, em que o setor
privado tem lucros garantidos pelo Estado, sem sequer investir.
19. Não se mostra ao povo de que modo os bancos obtêm ganhos
colossais. Apenas três bancos privados – Itaú, Bradesco e Santander –
somam lucros anuais de R$ 30 bilhões, emprestando e aplicando dinheiro
dos depositantes. E o art. 164 da Constituição obriga o Banco Central a
financiar somente os bancos, proibindo-o de financiar o próprio Tesouro
Nacional.
20. Ignoram-se, ainda, os prejuízos de trilhões de reais que
resultaram das privatizações de FHC, como a da Vale, a do BANESPA, dado
ao Santander, e as das siderúrgicas. E as de serviços públicos
extorsivos e deficientes, como a eletricidade e as telecomunicações.
21. Nem falam das antigas estradas construídas com dinheiro público,
mal conservadas e entregues a concessionárias, que se cevam através de
absurdos pedágios. E ninguém constroi novas.
22. Está, pois, na hora de o povo ser informado do que precisa saber
para exigir instituições que revertam a lastimável situação do País.
23. Conscientizá-lo de que a luta é árdua. A mídia condenará as
manifestações quando focarem no que interessa, e recrudescerá a
repressão policial, inexistente para vândalos e assaltantes.
24. Mas o povo terá de enfrentar isso tudo, se não quiser, mais uma
vez, servir de massa de manobra para os interesses que o têm mantido sem
perspectivas de se libertar. Libertar-se das imposições de potências
estrangeiras, brutais embora ocultadas.
25. Em suma, ter-se-á de ir ao fundo da questão: exigir
autodeterminação, só possível num sistema político em que os governantes
não sejam escolhidos, cooptados, corrompidos nem acuados pelos
concentradores.
26. Os obstáculos são muitos. Um dos principais é o tradicional jogo
do império anglo-americano, de incitar o ódio ideológico. Para vencê-lo,
os brasileiros têm de se unir em torno de questões concretas pautadas
pelo interesse nacional.
27. Por exemplo, os manipuladores qualificam o governo de socialista
ou neocomunista, quando as políticas dele privilegiam a oligarquia
financeira imperial. Enquanto isso, partidos como o PT e PCdoB espalham o
mito de serem de esquerda.
28. O programa de reconstrução do Brasil deve priorizar a
reindustrialização sob capital nacional e dar ênfase à defesa do País. O
oposto do que acabam de fazer lideranças da Câmara dos Deputados
desengavetando o acordo que cede aos EUA, potência balística, nuclear e
imperial, a base de lançamento de foguetes em Alcântara.
*Adriano Benayon é doutor em economia e autor do livro Globalização versus Desenvolvimento.
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