viomundo - publicado em 4 de agosto de 2013 às 15:54
O enigma das pirâmides no Brasil
por Leonardo F. Nascimento*
O episódio da Telexfree e, mais recentemente, a prisão do dirigente
de mais uma pirâmide econômica, a Priples, extrapolam uma simples
questão de crime financeiro que deverá ser tratada com rigor pela
Polícia Federal.
Se tivermos a oportunidade de participar das reuniões destes grupos,
de conversar com os seus participantes, se indagarmos boa parte daqueles
que, por diversos motivos, concordam em participar de esquemas
financeiros como estes, vamos nos surpreender com os resultados.
A melhoria generalizada das condições de vida, o ingresso de uma
grande parte da população — que durante anos permaneceu às margens — do
mercado consumidor, revela problemáticas associadas com o crescimento de
fraudes financeiras, a adesão a jogos de azar e, principalmente, ao
consumismo desenfreado.
A transformação das pessoas em consumidores, o acesso à energia
elétrica através do programa Luz para Todos, a disseminação do crédito e
das empresas de empréstimo, a internet cada vez mais presente nas
pequenas cidades, são fatores que deixaram uma gigantesca parcela da
população brasileira diante de um dos elementos mais poderosos do
capitalismo: a pressão para o consumo.
Estamos diante de um complicado enigma.
É, sem sombra de dúvida, melhor que todos tenham uma renda mínima.
Que seja assegurado o acesso às condições materiais dignas para todos.
Entretanto, se este processo não vier acompanhado de uma maior
formatação intelectual e a disseminação de uma educação crítica,
poderemos produzir uma situação no mínimo desesperadora.
As exigências de portar celulares, roupas, carros e de consumir
determinados tipos de bebidas alcoólicas, que não apenas são vistas como
de “elite” ou de “rico”, mas que chegam a determinar a aceitação social
e a lógica do desejo entre parcelas da população — em especial,os
adolescentes — e isto de modo totalmente acrítico, poderá se converter
em um impulso de desespero, de querer “virar a mesa” da noite para o
dia, de “tirar a sorte grande”, etc.
Destituídas, por uma educação deficiente, de mecanismos críticos de
percepção da realidade social, esses consumidores desesperados precisam,
e rápido, de dinheiro para poder consumir. Eles já sabem intuitivamente
que estudar não vai garantir “subir na vida”.
A situação é ainda mais absurda pois não se trata de ter uma vida
econômica média de um europeu ou norte-americano. De ter uma casa
simples, um carro econômico e de economizar bastante para poder viajar e
comprar coisas mais caras.
Não, os parâmetros de consumo são pautados pela mídia perversa e
pelas redes sociais que apresentam padrões de consumo e disputas
simbólicas que beiram a guerra sangrenta.
A roupa comprada em determinada grife, a refeição realizada em
restaurante recomendado, a presença em determinadas badaladas “prive”,
rapidamente ganham a rede por fotos e mensagens e em questão de poucos
minutos sabe-se o que deve ser consumido e onde deveríamos estar para
“estar bem na fita”.
A vida dos jogadores de futebol e das dançarinas seminuas dos
programas de auditório tornou-se o modelo destes novos consumidores. Um
padrão econômico, bem o sabemos, impossível de ser atingido pelos meios
“normais”, pela formação escolar e pelo trabalho assalariado.
Daí aquele desespero de ter dinheiro rápido e à qualquer custo.
Aderir às fraudes das pirâmides financeiras não é somente um problema de
falta de cautela pessoal, é consequência de uma condição onde cada vez
mais há um descompasso entre as expectativas econômicas de consumo e as
condições reais de satisfação.
*Doutorando em Sociologia – IESP/UERJ
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