"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música"
Friedrich Nietzsche

sábado, abril 18, 2015

Os caluniadores de Sócrates

megalupa - Número 31 Março-Abril/2015

Leitor compulsivo, não vivo apenas de leituras, mas, também de releituras. À minha frente um velho conhecido: “Apologia de Sócrates”, um dos quatro diálogos em que Platão narra a vida e os ensinamentos do “Pai da Filosofia.
No ano de 399, antes de Cristo, em Atenas, aconteceu um dos julgamentos mais tristemente célebre da História. O filósofo Sócrates, um homem já velho, compareceu diante do tribunal da cidade, para responder acusação de ensinar falsas doutrinas, corrompendo os jovens. Condenado, sua pena foi a morte, obrigado a tomar cicuta, um veneno.
Três foram os acusadores: Meleto, Aneto ou Âneto e Lícon. O primeiro deles foi o acusador oficial. Tratava-se de um poeta trágico. Sócrates não o poupa e nem aos outros. Afirma com todas as letras, conforme a versão perpetuada por seu discípulo Platão.
Quanto ao acusador-mor afirma que é um poetastro, um subliterato, um intelectualoide. 
Seguramente, o ciúme, a impossibilidade de chegar perto da cultura e da inteligência do filósofo se constituiu no motivo principal de tê-lo levado às barras do tribunal.
Para que Sócrates fosse julgado precisava do concurso de outras duas testemunhas de acusação. E encontrou.
Em primeiro lugar serviu-se do poder econômico, na pessoa de Âneto ou Anito, um endinheirado curtidor. Conheço muito bem o que representa curtume. É uma das indústrias mais poluidora que existem. O outro apoio encontrou em Lícon, um tribuno, um orador. Em suma: um político profissional.
Sócrates também desmascara o poder econômico e o poder político do seu tempo. Mostra que a procura da verdade, preconizada por ele, nega as práticas costumeiras, baseadas nos interesses pessoais e na mentira.
Dois mil, trezentos e tantos anos depois do julgamento que condenou o “Pai da Filosofia” à morte, o concurso entre aquelas mesmíssimas três forças continuam em pleno vigor contra os homens que procuram a verdade. Filho de uma parteira, que trazia crianças à luz, Sócrates se identificava como um parteiro de homens.
O principal acusador foi um poetastro, vaidoso, imbecil metido a culto. Os “parteiros de homens” continuam ante a oposição, a algaguetagem e a mentira desses energúmenos e mentecaptos. E os energúmenos e mentecaptos de hoje encontram apoio nos Anitos e Líncos atuais. Especialmente os verdadeiros homúnculos liliputianos que são os Meletos de província.

(Paulo Monteiro é membro da Academia Passo-Fundense de Letras)

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