resistir info - 06 mar 10
Islândia vota hoje o pagamento do banco Icesave
Entrevistado por Charles Hawley
Os eleitores da Islândia vão votar hoje, sábado, no referendo sobre o plano de reembolso reclamado pela Grã-Bretanha e Holanda devido ao colapso do banco Icesave.
Os eleitores islandeses votarão acerca de um plano do governo para pagar 3,8 mil milhões de euros decorrentes de perdas de investidores privados na Grã-Bretanha e Holanda após o colapso do banco online privado Icesave, subsidiário do Landesbanki falido em 2008.
A indemnização acordada pelo governo de Reykjavik sob a pressão da Grã-Bretanha e Holanda, e aprovada pelo parlamento, despertou intensa oposição do povo islandês. Cerca de 23 por cento dos islandeses assinaram uma petição a fim de forçar um referendo nacional sobre o assunto. O presidente islandês, Olafur Ragnar Grimsson, recusou-se a assinar a lei e decidiu submetê-la a referendo. Os inquéritos mostram que 75 por cento votarão pela rejeição deste plano imposto por credores leoninos.
Nesta entrevista, Olafur Eliasson, que organizou a campanha contra o plano de pagamento e fundou o movimento Indefence, defende veementemente a rejeição do acordo de Dezembro acordado pelo governo e aprovado pelo parlamento.
SPIEGEL ONLINE: O sr. e seu grupo Indefence forçaram um referendo à lei que exigiria à Islândia pagar €3,9 mil milhões para reembolsar 340 mil britânicos e holandeses que perderam as suas poupanças quando o banco online Icesave entrou em colapso em Outubro de 2008. Por que é contra este pagamento?
Eliasson: Este acordo foi imposto sobre nós por coerção pelos britânicos e holandeses com a ameaça de bloquear a nossa entrada para a União Europeia. Este acordo é incrivelmente unilateral.
SPIEGEL ONLINE: Mas certamente aqueles que perderam o seu dinheiro deveriam ser compensados.
Eliasson: As obrigações do Icesave não são uma dívida da responsabilidade da Islândia e não há qualquer exigência legal de a Islândia pagar este dinheiro. Tratava-se de um banco privado, a operar num país estrangeiro. Quando ele faliu, o esquema de seguro de depósito que era suposto cobrir as contas de poupança cumpria plenamente os regulamentos europeus. Tais esquemas não exigem que eles sejam suportados pelos contribuintes. Isto é chantagem. Como se pode descrever de outra maneira quando a Grã-Bretanha utiliza leis anti-terroristas contra a Islândia?
SPIEGEL ONLINE: Muitos temem que, se a Islândia votar pela anulação da indemnização neste sábado, isso poderia retardar a sua recuperação. Será que isto o preocupa?
Eliasson: Nem um pouco. Você tem perguntar-se: Se a Grã-Bretanha e a Holanda fizerem o que estão a ameaçar fazer – isto, bloquear a ajuda do Fundo Monetário Internacional e bloquear a nossa entrada na Europa – será que a Europa irá apoiá-las? Pensa você que os alemães permaneceriam passivos e observariam como dois grandes países intimidam um país pequeno com uma reivindicação que não tem apoio legal?
€347/MÊS POR FAMÍLIA DURANTE OITO ANOS
SPIEGEL ONLINE: Se a Islândia fosse forçada a pagar, quais seriam as consequências?
Eliasson: As melhores estimativas são que, uma vez que se considere activos que poderiam ser vendidos, a Islândia teria de pagar algo em torno dos €2,5 mil milhões. Se dividir este número por 75 mil – o número de famílias na Islândia – acabará com cada família a dever perto de €33.500. Eles supõem que pagaremos isto até 2018, o que significa que cada família pagaria €347 por mês durante oito anos, com base numa frágil afirmação de que eu, como contribuinte na Islândia, deveria pagar pela falência de um banco privado que estava a fazer negócios além-mar. Ora, por favor!
SPIEGEL ONLINE: Ainda assim, é claro que os bancos da Islândia não estavam exactamente a seguir as melhores práticas de negócios.
Eliasson: A Islândia reconheceu que uma parte do problema era que estes bancos não estavam muito bem regulados – nem pelo lado islandês nem por qualquer outro. Por causa disso, temos sido razoáveis quanto a encontrar uma solução que funcione para todas as partes. Mas a Grã-Bretanha não pareceu interessada em cooperação. Eles disseram que querem o seu dinheiro de volta e que ficam bastante felizes em utilizar a força para obtê-lo.
SPIEGEL ONLINE: Qual é, então, o caminho de saída? O que deveria ser feito?
Eliasson: O que é realmente louco é que os activos do Landesbanki são suficientes para cobrir as garantias de seguro no valor de €3,9 mil milhões. O problema é que os britânicos e holandeses decidiram, por sua própria iniciativa e sem qualquer exigência legal para assim fazer, pagar aos seus próprios cidadãos um bocado mais do que o exigido pelos esquemas de protecção de depósitos padrão.
SPIEGEL ONLINE: Será que o referendo de sábado vai ser uma manifestação da ira islandesa quanto ao modo como a situação foi manipulada pelos britânicos e holandeses?
Eliasson: Não penso que as pessoas estejam necessariamente iradas. Elas apenas estão fartas – e estão estarrecidas com o modo como estes sujeitos estão a comportar-se. Temos um bocado de credores por toda a parte que realmente nos deram dinheiro real quando precisámos dele. O perigo é que, se escolhermos pagar bons dólares à Grã-Bretanha e Holanda na base destes frágeis direitos, o que faremos nós com os nossos outros credores quando tivermos de pagá-los?
SPIEGEL ONLINE: Ainda assim, se a Islândia votar não no sábado, ela arrisca-se ao isolamento internacional. Da mesma forma, no último Verão, o parlamento islandês votou a favor de colocar o país na fila para aderir à União Europeia. Estará o povo preocupado em que a questão do Icesave possa descarrilar este esforço?
Eliasson: Temos estado a tentar comportar-nos como um país civilizado, mas só nos deparamos com coerção e intimidação. Os islandeses são um povo independente e ficamos bastante OK em sermos isolados por algum tempo. Uma grande maioria nem mesmo quer entrar na União Europeia. A questão do Icesave consolidou este cepticismo. Toda a gente está a dizer que precisamos nos comportar de um certo modo para sermos parte da comunidade internacional. Bem, se este é o modo como a comunidade internacional se comporta – intimidar um pequeno país para pagar algo que não lhe cabe pagar – então não queremos fazer parte dela.
Nenhum comentário:
Postar um comentário