A fatia da riqueza dos Estados Unidos nas mãos dos americanos mais ricos chegou ao ponto mais alto desde a Segunda Guerra e ultrapassou o pico atingido no auge da bolha de tecnologia dos anos 90 - em mais um sinal da divergência dos destinos econômicos que estaria alimentando a ira da classe trabalhadora no país. A reportagem é do jornal Valor, 15-10-2007.
O 1% de americanos mais ricos ganhou 21,2% de toda a renda nacional em 2005, segundo novos dados do Internal Revenue Service, a Receita Federal dos EUA. É uma alta considerável em relação aos 19% de 2004 e supera o recorde anterior de 20,8% estabelecido em 2000. A metade de baixo da pirâmide ficou com 12,8% da renda, tendo ganhado 13,4% em 2004 e 13% em 2000.
Os dados do IRS referem-se à "renda bruta ajustada" - o que exclui certas deduções como pensão alimentícia e contribuições para certos fundos de aposentadoria - com base numa grande amostragem de declarações de imposto de renda. Embora antiga, muitos acadêmicos preferem essa informação a dados mais recentes de outras agências, porque os dados do IRS segmentam mais os muito ricos - por exemplo, o 0,1% mais rico ou o 1% mais rico, não apenas os 10% - e incluem ganhos de capital, uma fonte importante, embora volátil, de renda para os afluentes.
Acadêmicos atribuem o crescimento da desigualdade a vários fatores, como mudanças tecnológicas que favorecem quem tem mais habilidades, a globalização, e avanços nas telecomunicações que ampliaram os prêmios para quem tem desempenho muito acima da média, seja no mundo dos negócios ou em esportes e entretenimento.
"Tivemos uma tendência de 30 anos de aumento da desigualdade", disse Jason Furman, um acadêmico do Instituto Brookings e conselheiro de políticos do Partido Democrata. "Houve uma redução artificial nessa tendência depois do estouro da bolha das bolsas em 2000."
Os dados do IRS não identificam a fonte do aumento da renda para os ricos, mas o boom recente das bolsas provavelmente contribuiu, assim como o fez nos anos 90. Até meados deste ano, ações em alta e um forte mercado de crédito havia produzido rendimentos espetaculares para administradores de fundos de hedge e de "private equity" e para banqueiros de investimento.
Um estudo de Steven Kaplan e Joshua Rauh, ambos da Universidade de Chicago, conclui que em 2004 o número de profissionais do mercado financeiro entre o 0,5% de maior renda era o dobro do número de executivos de companhias não-financeiras. Rauh disse que "é difícil evitar a idéia" de que a fatia crescente da renda que vai para os mais ricos é, em parte, "uma história ligada a Wall Street, à indústria financeira".
O estudo mostra que o administrador de fundo de hedge mais bem pago ganhou em 2005 o dobro do que o mais bem pago ganhou em 2003, e os 25 administradores de fundo de hedge mais bem-sucedidos ganharam mais do que os presidentes executivos de todas as empresas no índice de 500 ações da Standard & Poor´s juntos. Ele também mostra que os lucros por sócio nas 100 maiores firmas de advocacia dobrou entre 1994 e 2004, para mais de US$ 1 milhão em valores de 2004.
Os dados do IRS mostram que a renda do contribuinte na mediana - metade das pessoas ganha menos que a mediana, metade ganha mais - caiu 2% entre 2000 e 2005 em termos reais, para US$ 30.881. Ao mesmo tempo, a renda do contribuinte que se encaixa no 1% mais rico subiu 3%, para US$ 364.657.
Os dados destacam que o corte de impostos ocorridos na gestão do presidente George W. Bush foi uma faca de dois gumes. Por um lado, os cortes isentaram milhares de famílias de baixa renda, especialmente através de créditos fiscais maiores para dependentes. As famílias pertencentes aos 50% mais pobres tiveram uma queda de cerca de um terço de sua alíquota, de 4,6% em 2000 para 3% em 2005. O 1% mais rico pagou 39% de todo o imposto de renda em 2005, ante 37% em 2000.
Por outro lado, os impostos diminuíram muito mais para os 1% mais rico quando considerados como uma proporção da renda: a alíquota média paga por esse grupo caiu de 27% em 2000 para 23% em 2005.
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