"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música"
Friedrich Nietzsche

segunda-feira, dezembro 03, 2007

Instituto Humanitas Unisinos - 03/12/07

A ecologia, no supermercado e na intimidade


A ecologia triunfa por toda parte. Todos os produtos se assumem como ecologicamente corretos. Agora a ecologia está invadindo também o sexo. A análise é de Gilles Lapouge em artigo para o jornal O Estado de S.Paulo, 02-12-2007. O jornalista é correspondente do Estadão na França.

Eis o artigo.

Tive recentemente a idéia de comprar um carro. Como respeito o meio ambiente, sentia escrúpulos ao pensar nas toneladas de CO2 que meu futuro carro lançaria na atmosfera, com o risco de matar bebês, florestas, tigres, abelhas e gaivotas. Aí eu me empenhei em descobrir um “carro limpo”. E fracassei.

Não que todos os veículos sejam “sujos”. Ao contrário. O que me deprimiu é que, consultando a publicidade, fiquei sabendo que todos os carros vendidos hoje na França são “limpos”, maravilhosamente limpos. Não consegui descobrir um único que se proclame “sujo”. Essa constatação me agrada, claro, mas como não conseguia me decidir por um ou por outro, desisti do carro.

O exemplo do carro não é único. A ecologia triunfa por toda parte. Basta circular em um supermercado para constatar, com alívio, que todos os alimentos que nos são oferecidos são isentos de qualquer perigo. A dificuldade é encontrar um iogurte ou leite ricos em gorduras. Todos os produtos são magros, “limpos”. Todos os alimentos são de tal forma depurados que a gente se pergunta como eles ainda conseguem nos nutrir.

Certa vez, percebi numa prateleira de cassoulet, prato tradicional francês de feijões grandes com tiras de ganso bem gordas, com o rótulo “light”. Será que existe chucrute “light”? Porco “light”? Gordura “light”? Toucinho “light”? Feijoada “light”?

A ecologia está invadindo o sexo também. Há 30 anos apenas, quando se queria pescar uma garota, era preciso mostrar bíceps enormes ou pilotar um grande carro esporte. Hoje, é preciso dizer à garota que ficamos tristes com a idéia do martírio dos escargots ou dos ouriços-do-mar , ambos perseguidos pelos inseticidas. Um bom meio é também plantar uma árvore. Na primeira enxadada, nuvens de senhoritas vêm nos beijar. Nos beijar com batom “light” nos lábios.

No Times, uma jornalista nos adverte: “O tipo de homem que nós preferimos é o tipo que faz reciclagem de lixo, que suja as mãos no jardim e que desliga a TV e o DVD de noite antes de se juntar a nós na cama.” Algumas mulheres, para julgar se um homem é sedutor, começam lançando um olhar sobre seu armário do banheiro. Se percebem desodorantes em spray ou loções de barba ricas demais, você está fora. O mesmo se um sujeito come muita carne vermelha. Ele não passa no exame.

Quando se envereda pelas operações eróticas, não se pode relaxar a vigilância. Sobretudo quando se tem a idéia de utilizar engenhocas durante as preliminares. De fato, esses objetos, quando contém ftalato para amolecer o plástico, são antiecológicos no último grau. Eles provocam cânceres e uma rarefação das populações de espermatozóides.

É por essa razão que algumas lojas “pornoecológicas” garantem que todos seus vibradores não contêm ftalatos. A indústria de vibradores está na vanguarda da batalha pela salvação da natureza. Algumas lojas oferecem motores que funcionam, não com pilhas, como os vibradores de nossas avós, mas com energia solar.

O Greenpeace acaba de editar um lindo folheto explicando como se pode continuar fazendo amor sem comprometer a sobrevivência da espécie humana. “Se você gosta de ver seu parceiro quando faz amor, basta fazer amor à luz do dia”. Bem sacado!

Na Noruega, um site assombroso associa o prazer do corpo ao respeito pela natureza. O site chama-se “Fuck for Forest”, o que quer dizer, “Transem pelas florestas!”. A idéia é tão simples quanto comovente: o site propõe encontros um tanto complexos de homens e mulheres e cobra um direito de olhar de outros internautas. As quantias arrecadadas nessa ocasião são integralmente consagradas ao salvamento das florestas tropicais.

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