A Cocamar Cooperativa Agroindustrial decidiu, há cinco anos, apostar na certificação sócio-ambiental para incrementar a rentabilidade. Neste ano, ela já fechou contratos para exportar 2 mil toneladas de suco de laranja orgânico com o selo "Fair Trade" de comércio internacional justo em 2008, o dobro do volume exportado em 2007. "A demanda está crescendo, mas esse mercado justo ainda é relativamente pequeno. Não dá para produzir 100% com esse critério", afirma Luiz Lourenço, presidente da Cocamar. A reportagem é de Cibelle Bouças e publicada pelo jornal Valor, 5-12-2007.
Obter o selo de comércio justo (Fair Trade) não é um processo simples. Demanda uma série de requisitos, como cultivo orgânico de alimentos, manejo do solo para evitar perdas ambientais e programas de desenvolvimento educacional para empregados. Como recompensa, países desenvolvidos como Estados Unidos, países da Europa e Japão oferecem bônus que são pagos à empresa que desenvolve os projetos e aos empregados - nesse caso, os valores são revertidos em projetos sociais. Em média, esses países pagam pelo suco de laranja certificado US$ 1.500 por tonelada FOB e US$ 100 de bonificação, dividida entre empresa e funcionários. Para o maracujá, o valor pago é de US$ 2.800, com prêmio de US$ 280. Para o café, US$ 1,15 por libra-peso, com prêmio de 50 centavos de dólar.
A Cocamar faz parte de um grupo de 17 empresas do Brasil que vivem da produção de commodities, mas buscaram a certificação para obter melhores preços e ingressar no mercado de comércio justo, que cresce fortemente sobretudo em países do Hemisfério Norte. Segundo a Fair Trade Labelling Organization International (FLO, na sigla em inglês), entidade com sede na Alemanha e que monitora o comércio justo entre países, o comércio internacional justo cresce em média 40% ao ano. O dado mais recente é de 2006, quando os negócios entre empresas sócio-ambientalmente responsáveis aumentaram 42%, gerando receita de ? 1,609 bilhão (ver gráfico).
Os negócios referem-se, sobretudo, ao comércio de produtos agrícolas, como banana, cacau, algodão, café, flores, mel e açúcar, produzidos em 59 países em desenvolvimento e vendidos para Europa, Japão, Estados Unidos, Canadá, Austrália e Nova Zelândia. No Brasil, afirma Verónica Rubio, presidente-executiva da Fair Trade Brasil, as negociações ainda são incipientes e concentradas em café, suco de laranja, frutas e produtos têxteis. A entidade não possui dados consolidados sobre a participação do país no comércio global justo. Segundo ela, mais da metade do que o Brasil exporta é café e, em 2006, os embarques do grão totalizaram 49,1 mil toneladas, gerando receita de US$ 30,8 milhões.
Segundo o levantamento da Fair Trade, das 17 empresas certificadas no Brasil, nove são exportadoras de café. O país está em nono lugar em número de produtores certificados entre os países da América Latina, onde 317 grupos foram certificados. No mundo, o total chega a 569. "O Brasil ainda tem uma participação muito pequena neste mercado e tem se mantido estável nos últimos cinco anos. Mas existe um grande interesse em criar projetos para expandir os negócios a partir do Brasil", observa Verónica.
De acordo com a executiva, a pequena participação do Brasil no mercado internacional do comércio justo deve-se basicamente a três fatores. Um deles é o fato de o país manter uma agricultura altamente desenvolvida e geradora de renda, se comparada a outros países em desenvolvimento. A diferença de idiomas é um segundo problema, mas outro fator - talvez o mais determinante - é a inexistência de um "mercado interno justo" fortalecido.
Em 2005, o governo federal deu início a um plano para estimular a produção e o consumo responsáveis. Parte do planejamento consistiu na realização de um mapeamento dos chamados "empreendimentos solidários", no qual foram identificadas 14.954 empresas com operações com esse modelo de negócios.
De acordo com dados da Secretaria Nacional de Economia Solidária (Senaes), vinculada ao Ministério do Trabalho, a geração de renda desses empreendimentos é estimada em R$ 491,4 milhões, tendo se mantido estável nos últimos três anos. Conforme a pesquisa, 44% desses negócios estão concentrados na região Nordeste, seguida por Sul (17%), Sudeste (14%), Norte (135) e Centro-Oeste (12%).
"No Brasil, o comércio justo ainda está na sua infância. Os dados existentes são apenas do comércio certificado, mas estima-se que o tamanho do mercado seja bem maior", diz Raissa Rositer, gerente da unidade de acesso a mercados do Sebrae. Segundo ela, a consciência sobre o consumo responsável começa a ganhar força no Brasil, o que tem estimulado empresas a investirem em programas de certificação.
É o caso da Cooperativa Agroextrativista de Xapuri (Caex), que reúne 400 famílias do Acre na produção de borracha e castanha. A castanha orgânica é produzida na Reserva Extrativista Chico Mendes, no município de Xapuri (AC) e exportada à Cooperativa Chico Mendes, sediada em Milão, na Itália. Em 2006, a cooperativa exportou 20 toneladas e, neste ano, 86 toneladas de castanha orgânica. Luiz Íris de Carvalho, presidente da Caex, agora quer alçar um vôo mais alto. "Estamos criando uma tríade com cooperativas do Brasil, Peru e Bolívia para exportar a castanha certificada e, para isso, está sendo criada a cooperativa International Liberation, que vai organizar a parte comercial", afirma.
Na área de frutas, a BrasilFruit, trading exportadora de frutas com sede em São Paulo, também já acelerou o processo de certificação para entrar no mercado justo. "Trabalhamos com produtores que já obtiveram o selo e precisavam que toda a cadeia fosse certificada para entrar no mercado internacional justo. A previsão é que até o fim deste ano possamos finalizar o processo para começar a exportar manga, limão e goiaba produzidas na Bahia", diz Elthon Novas, analista de comércio exterior da trading.
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