O economista José Roberto Mendonça de Barros está especialmente preocupado com os efeitos do câmbio sobre o emprego. Para ele, os maiores prejudicados pelo dólar barato são os setores intensivos em mão-de-obra, como calçados e têxteis, ao passo que os segmentos que mais se destacam são aqueles que não empregam muito - principalmente os grandes exportadores de commodities. A reportagem é do jornal Valor, 11-04-2007.
Mendonça de Barros não acredita, porém, que esteja em curso um processo de desindustrialização da economia. "É um termo bombástico demais. Eu prefiro classificar como uma mudança na estrutura industrial brasileira", afirma o sócio da MB Associados e ex-secretário-executivo da Câmara de Comércio Exterior (Camex).
Para Mendonça de Barros, há um conjunto claro de ganhadores, formados pelos setores de petróleo e gás, minério e metais, papel e celulose e açúcar e álcool. Eles se beneficiam há anos do bom desempenho da economia global, que jogou às alturas os preços de seus produtos de exportação. Mas não são grandes empregadores.
No extremo oposto estão segmentos como os de têxteis e calçados, que têm dificuldades para exportar com o dólar a R$ 2 e sofrem ao mesmo com a concorrência do produto importado no mercado doméstico. Intensivos em mão-de-obra, vêem o custo de sua folha salarial em dólar disparar com a valorização do câmbio.
Um dos resultados de todo esse cenário é que a criação de empregos se concentra nas faixas de menor qualificação, com salários de até três salários mínimos, diz Mendonça de Barros. "O câmbio valorizada obriga as empresas a aumentar a produtividade, mas há um efeito grande sobre o emprego."
Entre esses dois extremos, há uma série de outros segmentos em que o impacto do real apreciado ainda não é claro. Mendonça de Barros cita o caso da indústria automobilística. O mercado interno vai bem, com demanda muito forte, mas as exportações caem e as importações disparam. Na média móvel de 12 meses encerrada em março, as vendas externas de veículos mostram queda de 9,8%. No mesmo período, as importações cresceram 89%. Ainda é uma incógnita qual será o comportamento das montadoras, diz ele. Não está claro se vão continuar ou não a investir no país.
Observador atento do que se passa na economia real, ele aponta três momentos distintos na atuação das empresas depois que o câmbio começou a se valorizar com mais força, a partir da virada de 2003 para 2004. No primeiro momento, o tombo do dólar era percebido como temporário, porque o país ficou muito tempo acostumado à falta de moeda estrangeira, e não à sobra. Esse período durou até o terceiro trimestre de 2005, quando as empresas passaram a trocar mão-de-obra antiga e cara por mão-de-obra nova e barata e a internacionalizar sua cadeia de suprimentos. Isso aumenta o coeficiente importado nos produtos feitos aqui.
A indústria de eletroeletrônicos, que montava muita coisa com componentes importados, em diversos casos passou a comprar os produtos acabados da China. "Nós estamos no meio desse processo, que está longe de terminar."
O terceiro capítulo da novela começou no ano passado, com o aumento significativo dos investimentos das companhias brasileiras no exterior. É um movimento marcado não apenas pela abertura de escritórios no exterior, mas pela compra ou montagem de fábricas em outros países. Mendonça de Barros diz que essa internacionalização ocorreria naturalmente em muitos casos, mas foi antecipada pela valorização do câmbio.
Mendonça de Barros diz que não vê muito o que pode ser feito para deter a queda do dólar. Reduzir os juros um pouco mais rápido ajudaria. O melhor seria cortar gastos públicos, o que diminuiria a demanda por bens não comercializáveis - em que se concentram as despesas do governo -, ajudando a desvalorizar a taxa real de câmbio. Além disso, isso abriria espaço para a redução da carga tributária, o que aumentaria a competitividade das empresas. O problema é que isso não está na agenda do governo, lamenta Mendonça de Barros. Em breve, a moeda deve cair abaixo de R$ 2, acredita ele.
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