"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música"
Friedrich Nietzsche

sexta-feira, outubro 22, 2010

Notas sobre a cimeira franco-alemã-russa

darussia.blogspot.com - Terça-feira, Outubro 19, 2010



Não tenho nada contra as cimeiras internacionais, mas há algumas que me provocam simplesmente perplexidade. Uma delas foi a que reuniu os dirigentes da França, Alemanha e Rússia, respectivamente Nicola Sarkozy, Angela Merkel e Dmitri Medvedev.
Este encontro mostrou uma vez mais que a União Europeia, no seu conjunto, não consegue fazer uma política externa concertada face à Rússia. Silvio Berlusconi, primeiro-ministro italiano ficou descontente por não ter sido convidado, os dirigentes polacos também não ficaram nada contentes por ficarem de fora e, quanto a Durão Barroso, não manifestou opinião nenhuma, ao que eu saiba, mas o certo é que também ficou por Bruxelas.
Se o máximo representante da UE não é convidado para este tipo de cimeiras, pode-se pensar que ele não representa coisa nenhuma, ou se representa, menos do que os dirigentes francês e alemão dentro dessa união.
A Rússia, e mal seria se não o fizesse, aproveita as divergências de uma união que anda completamente desorientada, não sabe para onde ir: se continuar a integrar-se rumo a uma confederação ou federação, ou se manter-se no pântano e acabar por aprodecer como aconteceu com a União Soviética.
Dmitri Medvedev fez questão de só aceitar o convite para participar na Cimeira da NATO em Lisboa, no próximo mês de Novembro, após o encontro trilateral, o que significa que deve ter recebido algumas garantias de que viaja à capital portuguesa não só para ficar na fotografia.
Tudo leva a crer que a Rússia recebeu garantias de que irá participar na criação do sistema de defesa antimíssil em pé de igualdade com a NATO, se a iniciativa avançar.
Além disso, deverá ser discutida a iniciativa de segurança europeia, avançada por Dmitri Medvedev, que prevê, entre outras coisas, assinar um novo acordo pan-europeu de segurança que prevê, entre outras coisas, fixar as fronteiras actualmente existentes na Europa e não permitir a qualquer organização ou Estado que monopolize a segurança do continente.
Moscovo considera também, e com razão, que numerosos dos Estados-membros da UE, colocam os seus interesses económicos e financeiros à frente da coesão europeia, tanto mais quando a Europa se vê afundada numa profunda crise económica e social, sem ideias novas face a problema nenhum. 
Para a Alemanha e a França, as trocas comerciais com a Rússia têm forte peso nas suas contas e podem ser ainda mais significativas. Na política de modernização proclamada pelo Kremlin, quem for mais ágil, mais irá conseguir na Rússia. Por exemplo, Paris tem praticamente garantida a venda de porta-helicópteros Mistral.
Na véspera da cimeira, Dmitri Medvedev fez um "amplo gesto de boa vontade" ao devolver a aldeia georgiana de Perevi às autoridades de Tbilissi, sublinhando que, desse modo, Moscovo cumpriu todos os parágrafos do acordo Sarkozy-Medvedev e retirou as suas tropas de todo o território georgiano.
Sarkozy elogiou este passo, mas recordou que ainda era preciso que os observadores da UE tivessem acesso aos territórios da Ossétia do Sul e da Abkházia, que os dirigentes europeus se "esqueceram" de colocar no território da Geórgia em Agosto de 2008, quando da assinatura do citado acordo. Mas, como se diz na minha terra, "tarde piaste, cantador!".
Falou-se também da abolição dos vistos entre a Rússia e a UE, mas as perspectivas apontam, segundo Sarkozy, para a abertura de fronteiras entre elas dentro de 10-15 anos.
Aqui, acho que as coisas poderiam andar mais depressa. Se a razão do adiamento dessa divisão é o receio de a Rússia se transformar num corredor para a imigração ilegal para a Europa, ela não tem fundamento, pois, já agora, só não entra no Velho Continente quem não quer.
Moscovo tenta forçar esse processo, mas preciso sublinhar que, para os europeus, conseguir um visto de entrada na Rússia e permanecer legalmente nesse país é mais difícil do que os russos fazerem o mesmo nos países da UE.
Neste campo, se me pedissem a minha opinião, eu recomendaria a direcção russa a abolir unilateralmente os vistos de entrada para os cidadãos europeus. Além de tirar proveitos disso, pois irá aumentar o caudal de turistas, homens de negócios, cientistas, etc., mostra que não receia tomar medidas ousadas de encontro à aproximação com a UE. E pouco ou nada tem a perder.
A Ucrânia fez isso há já alguns anos e o resultado foi o aumento de entrada de turistas, homens de negócios, etc., não tendo recebido notícias de que essa medida teve implicações negativas.
Sou um fervoroso adepto da aproximação entre a Rússia e a União Europeia, mas torna-se cada vez mais urgente que Bruxelas defina o que realmente quer das relações com Moscovo.
Quanto à NATO, trata-se de um problema mais complicado, mas também aqui a cooperação está e deve aumentar. A situação no Afeganistão e os perigos potenciais noutras regiões próximas exigem um trabalho estreito entre as partes. Não considero real a entrada da Rússia na Aliança, mas a situação obriga a uma cooperação mais profunda.  

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