Enviado por luisnassif, ter, 25/09/2012 - 08:42
Da Folha
ANDRÉ DELFINO DA SILVA E RAIMUNDO BONFIM
Incêndios ocorrem ao lado de operações urbanas, em áreas cobiçadas. E
quando não há fogo, há a violência policial nas reintegrações de posse
O incêndio na favela Moinho, na região central da capital paulista,
no último dia 17, foi mais um de uma série de tragédias na cidade.
Estão se tornando rotina os incêndios nas favelas da cidade de São
Paulo. É muito triste assistir chamas destruírem lares, ainda mais
estes, tão simples, muitas vezes de madeira, construídos com muito suor e
sacrifício por famílias que não tiveram apoio do poder público no
acesso à moradia digna.
Os incêndios causam efeitos nefastos. Além de deixar a família sem um
teto para se proteger do sol e da chuva, eles causam a perda de vaga
nas creches e escolas dos filhos e, na maioria dos casos, a perda total
dos bens materiais, conquistados após muitos anos de trabalho.
Com o incêndio da favela Moinho, já são 34 somente neste ano. Isso
tem causado enorme angústia para aproximadamente dois milhões de pessoas
que habitam as 1.565 favelas da cidade de São Paulo.
A prefeitura de São Paulo argumenta que tantos incêndios aconteceram
em um período tão curto por causa do tempo seco e da baixa umidade do
ar. Mas nos demais municípios da região metropolitana também existem
favelas. Lá também há tempo seco e baixa umidade do ar. Esses fenômenos
só provocam incêndio nas favelas da capital?
É muita coincidência a existência de uma onda de incêndio em favelas
paulistanas em um momento de enorme valorização imobiliária. E os
incêndios ocorrem justamente nas proximidades das operações urbanas, nos
locais mais cobiçados pelo mercado imobiliário.
Um estudo realizado pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas
(Fipe) aponta nove incêndios recentes na cidade de São Paulo que
aconteceram em locais de grande valorização imobiliária.
Não temos dúvida em afirmar que essa onda de incêndios serve a uma
política de higienização. Além dos incêndios, estamos vivenciando uma
onda de reintegração de posses, despejos e remoções de favelas e de
áreas debaixo de viadutos, principalmente nos locais que estão passando
por um "boom imobiliário".
Assistimos diariamente ao uso violento da força policial nas
reintegrações de posse contra famílias de sem teto que ocupam prédios
vazios -prédios que não cumprem a função social prevista na Constituição
Federal e no Estatuto das Cidades.
Temos em São Paulo cerca de 3,5 milhões de pessoas que sobrevivem, em
condições precárias, em favelas, cortiços e loteamentos irregulares.
No entanto, em vez de constituir um projeto de planejamento urbano
participativo e assegurar o direito à moradia, o processo de
verticalização em São Paulo avança com a leniência da atual gestão, sem o
mínimo de planejamento urbano, sendo que há suspeita de que vários
empreendimentos imobiliários foram aprovados mediante corrupção.
A prioridade no processo de urbanização de favelas não passa do
discurso. Dos R$ 574 milhões previsto no orçamento deste ano para
urbanização de favelas, até o dia 31 de agosto foram empenhados apenas
R$ 131 milhões e liquidados somente R$ 82 milhões -ou seja, 14,2% do
total previsto.
A falta de compromisso político com a população mais carente da
cidade está evidenciada na falta de projetos e de investimentos em
habitação popular.
Essa ausência de projetos, como causa e efeito, pode explicar melhor o
fenômeno dos incêndios nas favelas de São Paulo, além das condições
climáticas elencadas pela gestão Gilberto Kassab.
ANDRÉ DELFINO DA SILVA, 35, é coordenador do Movimento de Defesa dos Favelados (MDF)
RAIMUNDO BONFIM, 48, advogado, é vice-presidente da Associação Nova Heliópolis e coordenador-geral da Central de Movimentos Populares do Estado de São Paulo (CMP-SP)
RAIMUNDO BONFIM, 48, advogado, é vice-presidente da Associação Nova Heliópolis e coordenador-geral da Central de Movimentos Populares do Estado de São Paulo (CMP-SP)
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Isso é algo que deve ser profundamente investigado. As urbes crescem em cima da especulação imobiliária. Nesse setor não existe ingenuidade.
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