"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música"
Friedrich Nietzsche

segunda-feira, fevereiro 26, 2007

Instituto Humanitas Unisinos - 26/02/07

Migração de latino-americanos para os EUA dobra em dez anos

A proliferação de cemitérios para indigentes no sul da Califórnia reflete, de forma mórbida, a tragédia política e social que toma conta da região. Esses cemitérios vêm recebendo um número cada vez maior de corpos. Ninguém sabe quem são, o governo americano não consegue identificar as famílias e as autoridades de seus países de origem raramente pedem a devolução dos corpos. A maioria é de imigrantes latino-americanos, vítimas do sonho de tentar entrar nos Estados Unidos, ainda que ilegalmente, em busca de uma vida melhor. A reportagem é do jornal O Estado de S. Paulo, 26-02-2007.

De acordo com o Instituto de Política de Imigração dos EUA, o número de latino-americanos cruzando a fronteira hoje é duas vezes maior que há dez anos, atingindo quase 300 mil por ano. Dois terços desse contingente são de mexicanos.

O governo dos EUA endureceu as medidas contra a imigração ilegal nos últimos meses, o que estaria por trás da queda da quantidade de detenções de imigrantes tentando entrar ilegalmente no país: entre julho de 2006 e janeiro deste ano, o número caiu 27% em comparação ao mesmo período de 2005. Foram presas 36,3 mil pessoas em San Diego e outras 92 mil em postos de fronteira do Arizona. Hoje, pela lei, a polícia pode extraditar um imigrante sem que o caso passe por um juiz. Em dezembro, mil trabalhadores mexicanos foram descobertos em açougues no sul e enviados de volta para seu país.

Mas os críticos dizem que o que se vê é mais violência, militarização e mal-estar na área de fronteira mais movimentada do mundo - entre Tijuana, no México, e San Diego, nos EUA -, por onde passam 75 mil pessoas por dia. Quem ganha, segundo os próprios imigrantes entrevistados pelo Estado, são os traficantes (conhecidos como'coiotes'), que em apenas um ano dobraram o valor do serviço para levar uma pessoa de um lado ao outro da fronteira.

No cemitério de Holtville, a 200 quilômetros de San Diego, 400 pessoas foram enterradas em cerca de um ano. São vítimas do frio, dos escorpiões do deserto, das ações da polícia ou baleadas pelos próprios traficantes de gente para evitar que a polícia descubra suas rotas.

Segundo organizações de direitos humanos, o aumento do número de mortes é conseqüência da política adotada pelo governo de George W. Bush em relação à entrada ilegal de imigrantes . Nos últimos meses verdadeiras bases militares foram montadas em vários pontos da fronteira. Em Tecate, cidade dividida entre os EUA e o México, soldados vestidos percorrem as montanhas em busca de ilegais. Barreiras ainda são colocadas a cada 30 quilômetros nas estradas e os carros são vistoriados. O governo está pedindo mais 3 mil militares para reforçar o contingente atual de 6 mil homens e US$ 1 bilhão para construir um muro na fronteira, que tem quase 1.100 quilômetros de extensão.

Especialistas advertem que a militarização agravará a violência e os riscos que os imigrantes terão de passar. Um dos novos fenômenos na região é a luta entre as gangues que organizam a passagem dos ilegais. Há quem pague até US$ 4 mil para ser levado de um lado ao outro e acaba sendo seqüestrado pelo cartel inimigo e só é liberado depois que a família, no México, paga fiança.

Segundo a polícia americana, em 2006 foram registrados 65 seqüestros de 'cargas'. Em muitos casos, essa disputa entre gangues acaba em mortes. Os traficantes estão usando túneis cada vez mais sofisticados, mas acabam entrando em guerra com os cartéis de droga, que não aceitam a invasão de suas rotas e atiram para matar.

Diante dos perigos, os coiotes não hesitam em cobrar mais por seus serviços. Maria Alvarez, de 57 anos, diz que saiu do México há dez anos pagando 'apenas' US$ 500. 'Hoje, meus sobrinhos têm de vender tudo o que têm e pegar dinheiro emprestado para pagar a passagem da fronteira. E não têm a garantia de que vão conseguir.'

NÚMEROS

300 mil
latino-americanos cruzam anualmente a fronteira dos EUA com o México - duas vezes mais do que há 10 anos

75 mil
pessoas passam diariamente pela fronteira de San Diego e Tijuana - a mais movimentada do mundo

500
pessoas morreram em 2006 ao tentar cruzar a fronteira

Nenhum comentário: