Os gêmeos gaúchos Pedro e Alexandre Grendene construíram dois gigantes dos calçados e já falam em se unir. A reportagem é da revista quinzenal Exame – edição nas bancas nesse final de semana.
Eis a reportagem.
Poucos empresários sofrem tanto com a concorrência dos produtos chineses quanto os fabricantes de calçados. Nada menos que 75% dos 12 bilhões de pares consumidos no mundo anualmente são produzidos na China, a um custo que pode chegar a um terço do dos fabricados no Brasil. Em meio a esse cenário desolador, em que representantes do setor optam por choramingar e pedir a proteção do governo, destoam as figuras dos irmãos gêmeos Pedro e Alexandre Grendene, de 57 anos e donos, respectivamente, de Vulcabrás e Grendene.
Cada um à sua maneira, os Grendene desenvolveram a musculatura de suas empresas para enfrentar a competição com a China. Alexandre construiu marcas poderosas, como Rider, Melissa e Ipanema, e abriu o capital da Grendene há dois anos, quando a empresa já era uma das grandes do setor. Já o empreendimento de Pedro cresceu aos saltos. O maior deles foi dado em julho, quando a Vulcabrás comprou a Azaléia, maior fabricante de calçados femininos e tênis do Brasil, por um valor estimado em 350 milhões de reais. Com a aquisição, triplicou seu tamanho e se tornou o segundo maior fabricante de calçados do país, com faturamento de 1,2 bilhão de reais por ano, atrás apenas da São Paulo Alpargatas, que fatura 1,3 bilhão.
Para empresas como a Vulcabrás, crescer deixou de ser uma opção. Isso porque a economia de custos proporcionada por aquisições -- e pela escala atingida com elas -- é crucial para que sobrevivam na disputa com um concorrente tão poderoso quanto a indústria chinesa. Estima-se que, com a compra da Azaléia, a Vulcabrás conseguirá descontos de até 15% na compra de matéria-prima. Essa economia pode fazer diferença. Tome como exemplo um tênis de preço médio de 50 dólares importado da China. Nesse valor, estão diluídos o salário médio de 45 dólares por mês, os encargos sociais de 20%, o custo de cerca de 10% do frete de navio e a taxa de 35% de importação.
No Brasil, o mesmo tipo de produto pode ter o dobro do preço, já que o salário médio de um funcionário é de 250 dólares e os encargos sociais chegam a 100%. Por isso, a saída encontrada pelas empresas nacionais é a obtenção de tamanho para ganhar eficiência. "Isso torna a briga com os chineses mais saudável", diz o analista Rafael Andréas Weber, da corretora Geração Futuro. "A Vulcabrás conseguirá cobrar menos por seus produtos sem sacrificar sua rentabilidade."
Hoje concorrentes, os gêmeos Pedro e Alexandre começaram ligados nos negócios. A primeira empresa dos dois foi uma fabricante de embalagens de plástico para garrafões de vinho na cidade gaúcha de Farroupilha, onde nasceram. Em 1972, eles decidiram começar a produzir sandálias de plástico. O negócio andou de lado por anos, até que fizeram a aposta na marca Melissa, que se tornou um sucesso nos anos 80. Começou, então, um período de crescimento acelerado, em que os Grendene diversificaram os negócios de forma surpreendente -- fazendas, hotéis, usinas de álcool e botas de borracha. Foi quando os dois decidiram se separar. "A idéia era manter a Grendene, o maior negócio, independente", diz Milton Cardoso, um veterano executivo da Vulcabrás. A Grendene foi dividida. Alexandre ficou com o controle, e Pedro, com 20% das ações. A Vulcabrás, então um negócio pequeno, permaneceu com Pedro.
Embora tenham construído empresas de porte semelhante e genes idênticos, Alexandre e Pedro têm estilos de vida antagônicos. Apaixonado por festanças, Alexandre tem sete filhos com sete mulheres diferentes e é figura fácil em colunas sociais gaúchas (ele é casado há sete anos com uma mulher com a qual não tem filhos). Um de seus hobbies é a compra de carros esportivos caros, como a Mercedes SLR, que custa 2,6 milhões de reais. Além disso, é tido como o mais bem-sucedido nos negócios: construiu uma empresa que aposta na criação de marcas sólidas para combater os chineses. Pedro é seu oposto. Pouco aparece em eventos sociais. Sob sua gestão, a Vulcabrás não deu saltos de produtividade -- a empresa sempre alternou lucros e prejuízos anuais.
No ano passado, teve lucro de 78 milhões de reais. Agora que a Vulcabrás atingiu porte semelhante ao da Grendene, aumentaram as especulações sobre uma possível união de forças entre os gêmeos. Uma eventual união dos dois não representaria economia significativa em compras de fornecedores. Isso porque os calçados da Grendene são feitos de plástico, e os modelos da Vulcabrás, de couro e derivados de petróleo. Uma empresa de mais de 2 bilhões de reais de faturamento, porém, ganharia fôlego para a construção de marcas globais, algo que a Grendene vem começando a fazer com as sandálias Ipanema. "Se entendermos que pode haver sinergia entre as operações da Vulcabrás e da Grendene, podemos nos unir, sim", diz Alexandre Grendene. "Quanto mais pudermos crescer e nos unir, mais fácil será disputar mercado com os chineses."
Nenhum comentário:
Postar um comentário