"Trata-se, em síntese, de preparar o país para a reorganização de sua economia nesse período pós-neoliberal. A prevalência de uma economia mista pressupõe a reinvenção do mercado, capaz de possibilitar a ampliação do setor privado (nacional e transnacional) com a revisão do papel do Estado", escreve Marcio Pochmann, presidente do Ipea em artigo publicado no jornal Valor, 4-10-2007. E ele propõe que "o país precisa contar com a implantação de uma nova rodada de geração de empresas estatais". Segundo ele, "Nos dias de hoje, cabe repensar o que seria estratégico ao desenvolvimento nacional", pois, "no curso da nova revolução tecnológica, em que se destacam a nanotecnologia, a biotecnologia, a nova matriz energética, os novos materiais, entre outros, o Brasil precisa se reposicionar".
Eis o artigo.
"O Brasil não está condenado à mediocridade, embora tenha recebido contribuições nesse sentido. A pequenez do pensamento neoliberal parece ser um bom exemplo disso, especialmente quando difunde a equivocada visão acerca da falsa disjuntiva entre mais Estado e menos setor privado ou vice-versa.
Como se sabe, a implementação dessa orientação no país não resultou numa economia maior, pelo contrário. O esvaziamento do Estado foi acompanhado pelo abandono da capacidade do país de planejar seu futuro, bem como pela contínua deterioração da infra-estrutura nacional, comprometedora da expansão do setor privado.
Veja-se, por exemplo, a trajetória apática dos investimentos. Lembre-se que um dos principais argumentos adotados na defesa da privatização do setor produtivo estatal durante a década de 1990 seria a ampliação, por conseqüência, dos investimentos no Brasil. Essa promessa do neoliberalismo, entre outras, terminou não sendo cumprida, mesmo com a transferência de 15% do Produto Interno Bruto do Estado para o setor privado.
Após a privatização, em 2002, a taxa de investimento atingiu a vergonhosa situação de 15,3% de todo o Produto Interno Bruto. Em outras palavras, a Formação Bruta de Capital Fixo da década de 1990 conseguiu ser ainda menor que a vigente nos anos 80, a chamada década perdida.
Essa concepção "hidráulica" acerca de menos Estado, mais setor privado, não contribuiu para o engrandecimento da economia nacional, apenas condenou o país a sucessão de apagões decorrentes da inépcia dos investimentos. Na realidade, assistiu-se a prevalência de uma asfixia do setor privado na dinâmica de curto prazo, simultânea à lógica de financeirização da riqueza e à desatualização de novos e sofisticados projetos de modernização e expansão econômico-financeira nacional. O resultado disso tudo não poderia ser outro: a defasagem brasileira em relação ao conjunto do mundo.
Ademais, o desmanche do setor estatal não levou ao fortalecimento do setor privado nacional. O vazio deixado pelas estatais terminou sendo ocupado imediatamente pelas empresas transnacionais. Em 2006, por exemplo, as estatais respondiam por menos de uma a cada grupo de cinco grandes empresas que operavam no país, enquanto em 1990 eram responsáveis por mais de um quarto do total.
Nesse mesmo sentido, percebeu-se a evolução do enfraquecimento do capital privado nacional. Entre 1990 e 2006, por exemplo, o peso da empresa privada nacional no interior das grandes empresas em operação no país caiu 15%. Se aliada à participação do Estado na economia, constata-se que o capital transnacional, que era representado por menos de uma empresa a cada grupo de três grandes empresas no Brasil em 1990, aproximou-se de quase a metade na primeira metade da década de 2000.
Por conseqüência do esvaziamento do Estado na economia nacional, ocorreu o encolhimento do setor privado nacional sem que o capital transnacional tivesse capacidade de potencializar a ampliação do investimento produtivo, pedra angular do crescimento econômico sustentado. Diante da desaceleração e da contida taxa de investimento no Brasil, observa-se que o importante ingresso de mais de US$ 300 bilhões proporcionados pelos Investimentos Diretos do Exterior nos últimos 16 anos não se mostrou suficiente nem mesmo para ocupar o espaço anteriormente preenchido pelas estatais e pelas empresas privadas nacionais.
Embora a internacionalização do parque produtivo nacional na década de 1990 somente possa ser comparável à abertura empresarial ocorrida durante o Plano de Metas de JK (1956-1960), não se observou, como naquela oportunidade, o engrandecimento do país. Aqui, evidentemente, não se trata de um posicionamento contrário ao capital transnacional, tampouco antagônico ao setor privado nacional, mas, pelo contrário, o reconhecimento a respeito da necessidade de recuperação do papel do Estado enquanto possibilidade de abandono da condenação à mediocridade imposta pelo pensamento neoliberal no Brasil.
Trata-se, em síntese, de preparar o país para a reorganização de sua economia nesse período pós-neoliberal. A prevalência de uma economia mista pressupõe a reinvenção do mercado, capaz de possibilitar a ampliação do setor privado (nacional e transnacional) com a revisão do papel do Estado.
Para isso, inclusive, o país precisa contar com a implantação de uma nova rodada de geração de empresas estatais. Nas décadas de 1950 e 1960, o país demonstrou maturidade política tanto para privatizar o que seria função do setor privado (setor automobilístico) como para fortalecer com recursos públicos o que deveria ser estratégico ao desenvolvimento nacional (elétrico, petróleo, telefonia, entre outros).
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