A barragem de Três Gargantas, a faraônica obra hidrelétrica no rio Yangzi, poderia provocar uma catástrofe ecológica se nada for feito para preveni-la: esta afirmação não procede de estrangeiros pertencentes a organizações de defesa do ambiente, mas de especialistas chineses citados pela imprensa oficial. Esta advertência indica uma nítida mudança de atitude da atual direção do Partido Comunista, que pretende hoje preocupar-se com as conseqüências sobre a ecologia do crescimento econômico desenfreado da República Popular. A matéria é de Bruno Philip e foi publicada no Le Monde, 02-10-2007. A tradução é do Cepat.
A direção do projeto Três Gargantas no Conselho de Estado, Wang Xiaofeng, listou, na semana passada, as ameaças que pesam sobre esse projeto que corresponde a um custo de 20 milhões de euros sobre o ecossistema das regiões que atravessa: erosão de solos, deslizamentos de terras, escassez e poluição da água – sendo esta última provocada especialmente pela sedimentação –, redução das terras aráveis. A isso se acrescentam os conflitos sociais provocados por essas evoluções.
Wang, que fez estas observações durante um seminário consagrado a esta questão na cidade de Wuhan, na Província de Hebei, não longe da barragem, não mencionou um outro custo, mais diretamente humano, e que as autoridades sempre mantiveram em silêncio: o deslocamento forçado de 1,4 milhão de pessoas que viviam às margens do rio Yangtze assim como o desaparecimento de 116 vilas e algumas obras-primas milenares...
Mas a constatação desse responsável foi tão precisa quanto nova em relação aos habituais discursos lenitivos da propaganda. “Não podemos nos permitir baixar a guarda diante das questões de segurança ecológica e ambiental”, preveniu antes de acrescentar: “Nós não podemos sacrificar o nosso ambiente em detrimento das perspectivas de prosperidade de curto prazo”.
Um julgamento que certamente faz eco ao discurso oficial de hoje, mas que contrasta com aquele dos predecessores da atual direção. No momento em que os comunistas chineses estão preparando o seu 17º Congresso, que deverá iniciar no dia 15 de outubro, esta declaração não é inocente: o ex-presidente Jiang Zemin, qualificou o projeto em 1997 de etapa “memorável na história da humanidade” que permitirá “explorar” melhor “os recursos naturais”. Hoje, o presidente Hu Jintao, seu sucessor e adversário, não pára de exaltar “a harmonia social” a fim de humanizar um crescimento que deverá seguir um modelo mais moderado e melhor adaptado de “desenvolvimento científico”.
Em Chongqing, o gigantesco município situado acima da barragem, o ecologista Wu Dengming, durante muito tempo perseguido pelas autoridades por ter criticado o projeto, se alegra com o discurso de Wang Xiaofeng: “Bravo!, politicamente é um passo corajoso à frente em boa direção”. “De agora em diante – acrescentou com uma certa perfídia o presidente da Liga dos Voluntários Verdes de Chongqing –, posso citar as autoridades de Pequim quando tiver que conversar com as autoridades locais...”.
Esta nova tomada de consciência por parte das autoridades mais zelosas na prevenção de uma catástrofe ecológica não resolve, entretanto, a contradição na qual a China corre o risco de se atolar ainda por muito tempo: uma barragem como a de Três Gargantas encerra um fenomenal boom econômico do país, responde às suas enormes necessidades de eletricidade, ajuda na regulação dos ciclos de inundações e de seca na região do rio Yangtze.
Mas Pequim faz bem em se esforçar por antecipar os problemas ligados a uma tal proeza tecnológica; no entanto, não é evidente, mesmo para um regime autoritário, que seja ouvido pelas autoridades locais, cuja psicologia de desenvolvimento a qualquer preço não evoluiu, ou evoluiu muito pouco.
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