Em tempos de crise, o desemprego também revela a sua face nas grandes metrópoles do país. E ela é majoritariamente feminina, preta ou parda, jovem e com pelo menos o ensino médio completo, segundo dados da PME (Pesquisa Mensal de Emprego) levantados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
A reportagem é de Pedro Soares e publicada no jornal Folha de S.Paulo, 01-02-2009.
Sujeitas a um rendimento menor, mais voltadas para o emprego doméstico e com menor inserção no mercado de trabalho, as mulheres representaram, na média de 2008, 58,1% dos desocupados. O percentual em dezembro, quando a crise já havia se instalado, era de 58,4%. Em 2003, ficara em 54,6%. Elas ganhavam cerca de 70% do salário dos homens.
Considerando a escolaridade, cresce a cada ano a parcela de desempregados com mais de 11 anos de estudo. Era de 39,9% em 2003. Passou para 52,9%, sob impacto do maior nível de escolarização no país e do ingresso das mulheres no mercado de trabalho -elas têm mais anos de estudo do que os homens. Em dezembro passado, o percentual avançou um pouco mais: 53,6%.
No retrato do desemprego, cabe ainda um recorte por cor e raça: pretos e pardos, segundo o IBGE, eram a maioria ao final de 2008 - 52,4% do 1,606 milhão de desocupados nas seis principais regiões metropolitanas em dezembro de 2008.
Segundo Cimar Azeredo Pereira, gerente da Pesquisa Mensal de Emprego do IBGE, em dezembro, quando o mercado de trabalho passou a sentir mais a crise, o perfil da desocupação pouco se alterou. Ele diz, porém, que, se a renda ficar comprometida, haverá uma mudança mais forte, com o ingresso de mulheres e jovens no mercado de trabalho, engrossando as filas de agências de emprego. "Quando há crise e o chefe de família perde o emprego, mais pessoas entram no mercado de trabalho para complementar o rendimento familiar. Isso pode se repetir agoa", afirma.
Azeredo Pereira avalia, no entanto, que o rendimento não deve ceder muito neste ano em razão do reajuste real do salário mínimo, importante vínculo dos salários mais baixos. Para ele, não estão claros ainda os impactos da crise sobre o mercado de trabalho, que se mostraram muito sutis na pesquisa do IBGE em dezembro. Ele afirma que a concessão de férias não aumentou fora do padrão histórico em dezembro, diferentemente do que poderia se esperar diante das notícias de férias coletivas em empresas como a Vale e montadoras e fabricantes de autopeças.
Segundo Fábio Romão, economista da LCA especializado em mercado de trabalho, a crise surtiu efeito, primeiro, nos dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), que apurou 655 mil demissões em dezembro. Na pesquisa do IBGE, uma piora só se verá nos dados de janeiro. Romão diz ainda não ter certeza de que a atual crise terá um impacto muito forte no perfil do desempregado. Isso porque o rendimento será de algum modo preservado graças ao reajuste do mínimo. Sofrerá menos, estima, na atual turbulência do que a ocupação, diferentemente do que ocorreu na recessão de 2003, quando o rendimento despencou e a ocupação até subiu na esteira da maior informalidade.
Diante desse cenário, não deve ocorrer, segundo Romão, nem uma explosão da informalidade nem um ingresso expressivo de mulheres e jovens em busca de complementar a renda doméstica. De todo modo, ele espera mais mulheres ocupadas, que devem recuperar o terreno perdido por causa da composição setorial do desemprego na atual crise. É que ela bate com mais força na indústria e na construção civil, setores que empregam mais homens.
Por seu turno, a instabilidade atinge menos o comércio e os serviços, que empregam proporcionalmente mais mulheres do que a indústria e a construção. "Esse cenário pode contribuir para uma inversão da tendência de aumento da desocupação feminina." Segundo Romão, o retrato mais marcante da atual crise é seu impacto no emprego industrial, cujo emprego já registrou queda de 2,4% (90 mil pessoas) em dezembro.
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