Nu'man: O muro do apartheid na Cisjordânia converteu uma vila palestina em prisão-dormitório para 200 moradores
6/5/2009, Rory McCarthy [de Nu'man, Palestina], Guardian, UK
Os moradores da vila de Nu'man, na Cisjordânia, vivem no alto de sua colina há gerações, rodeados terraços onde sempre cultivaram as milenares oliveiras da Palestina. Mas o local está mudando dramaticamente, e eles temem que não haverá mais lugar para eles na nova paisagem.
A vila, perto de Belém, está cercada, em três lados, pelo gigantesco muro do apartheid, aqui uma sólida parede de aço. Há uma entrada, controlada por soldados israelenses que têm ordens de não deixar passar ninguém senão os cerca de 200 moradores que ainda vivem em Nu'man. Bem perto dali, na direção oeste está a enorme colônia de Homa, exclusiva para judeus, onde já vivem cerca de 15 mil colonos e cuja expansão já planejada deverá ocupar mais uma parte da terra que pertence a moradores de Nu'man.
Na vila, só há uma loja, funcionando precariamente, e nenhuma escola, nenhuma mesquita, nenhuma clínica de atendimento médico. Não há transporte público e ninguém é autorizado a construir, sequer os casais que se formam e queiram construir suas casas.
Para as autoridades israelenses, Nu'man é parte de Jerusalém, na porção que foi anexada na guerra de 1967 – anexação considerada ilegal por toda a comunidade internacional.
Israel confiscou a terra e, de fato, também os direitos dos moradores da vila. Ninguém recebeu certificado de residência em Jerusalém e, portanto, ninguém tem acesso aos serviços públicos. E as autoridades israelenses confiscaram os documentos de identidade da Cisjordânia – o que significa que os moradores de Nu'man não podem viajar a Jerusalém e explicar por que acontece de serem detidos, não raras vezes, pelo inacreditável 'crime' de viverem onde sempre viveram e em suas próprias casas.
Por praticamente 40 anos, moradores de Nu'man, como Ibrahim Darawi, 62, viveram na Cisjordânia, obrigados a atravessar as colinas até as vilas próximas para comprar comida, trabalhar e rezar. Mas, a partir de 2002, quando Israel começou a construir o muro da separação, a situação piorou rapidamente. "A vila ficou cercada dentro dos limites do muro", diz Darawi. "Querem nos forçar a sair. Estão-nos expulsando. "
Israel insiste em que o muro é crucialmente importante para fazer parar os ataques contra Israel. Contudo, quase todo o muro está localizado dentro da Cisjordânia e é instrumento importante para anexar terras palestinas ao território de Israel, para novas colônias. A Corte Internacional de Justiça já apresentou parecer, segundo o qual o muro da separação é ilegal em todos os pontos em que invade a Cisjordânia e tem de ser demolido.
Nenhuma construção é permitida em Nu'man – as que foram construídas sem alvará já foram demolidas ou serão demolidas a qualquer momento. Os moradores também não podem ampliar as casas existentes. Darawi não pode ampliar o apartamento de dois dormitórios onde vive com a família de onze pessoas. Seus oito filhos estudam na cozinha e, quando concluírem a universidade deixarão Nu'man para trabalhar em outra cidade.
"É uma tragédia", diz ele. "Acho que a estratégia é conseguir que, em 15 anos, a cidade esteja completamente desabitada. Os velhos morrerão e os jovens partirão." Os proprietários, donos de casas e terrenos em Nu'man já por duas vezes recorreram à Suprema Corte de Israel, pedindo que Nu'man fosse reconhecida como território da Cisjordânia, ou que os moradores recebessem certificados de residência em Jerusalém. A questão, pela segunda vez, está sendo julgada.
A ONU, em novo relatório no qual alerta para a crescente fragmentação da região de Belém, por ação da ocupação israelense, descreve Nu'man como "vila que vive no limbo".
Partes do território da vila foram confiscadas, diz a ONU, para a construção do muro, de uma base da polícia israelense de fronteira, para um grande ponto de controle e para uma estrada de uso exclusivo dos colonos judeus, que liga Jerusalém a outras colônias localizadas na área central da Cisjordânia ocupada, como Nokdim, cidade natal do primeiro-ministro israelense, o sionista Avigdor Lieberman.
"A combinação de vários tipos de restrições acabou por segregar a vila, isolando-a das comunidades vizinhas e obstruindo a vida normal das famílias", diz o relatório da ONU, da coordenação de assuntos humanitários. "Os casais jovens que constituam família são impedidos de construir casas, porque não obtêm alvarás de construção."
Para Niveen Darawi, 20, não há alternativa. Está cursando o terceiro, dos cinco anos de seu curso de engenharia de computadores e ainda mora com a família em Nu'man. Quando concluir os estudos, terá de sair. "Terei de sair da cidade. É o que acontecerá", diz ela. "Não há como construir casas. Todos são obrigados a partir. É exatamente o que Israel deseja que aconteça."
O artigo original pode ser lido em:
http://www.guardian.co.uk/world/2009/may/06/israel-palestinian-territories
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