MOROSIDADE PARA PUNIR
Após a detenção, a impunidade Das 785 pessoas detidas em 20 grandes operações da PF, 94% já estão nas ruas
Das 785 pessoas detidas pela Polícia Federal em 20 grandes operações de combate à corrupção e repressão a organizações criminosas nos últimos quatro anos, a maioria está nas ruas e sem qualquer punição, segundo levantamento feito pelo GLOBO. Apenas 40 investigados permanecem detidos. Ou seja, o número de presos hoje corresponde a pouco mais de 5% do contingente detido. De 2003 até agora, a PF fez 241 operações e prendeu 4.292 empresários, lobistas e servidores públicos, entre outros. Mas, das 20 maiores operações, apenas sete já resultaram em condenações dos acusados. As operações da PF foram insistentemente lembradas pelo presidente Lula no programa gratuito de TV, durante a campanha eleitoral. Os publicitários do então candidato à reeleição pretendiam transformar as ações policiais num símbolo da luta contra a corrupção supostamente travada pelo presidente.
- As instituições são tolerantes com crimes financeiros. Para ficar preso neste país, o sujeito tem que estuprar, matar e confessar o crime. Isso se não tiver um bom advogado - afirma o procurador da República Mário Lúcio de Avelar.
Nessa lista de 20 investigações, policiais federais e procuradores da República obtiveram sentenças condenatórias dos réus nas operações Anaconda, Praga do Egito, Shogun, Farol da Colina, Cavalo de Tróia, Poeira no Asfalto e Curupira. Os processos das demais operações se arrastam na burocracia da Justiça ou até nos escaninhos do Ministério Público Federal.
Foi o que aconteceu com a operação Albatroz. Em agosto de 2004, a PF prendeu 20 empresários e servidores ligados a organização chefiada pelo então deputado estadual do Amazonas Sebastião Cordeiro. A investigação, batizada de Operação Albatroz, atingiu também cinco secretários do governador Eduardo Braga (PMDB). Pelos cálculos da polícia, o esquema movimentou R$500 milhões em contrabando e fraude em licitações do governo local, ao longo de dez anos.
Mas, apesar do alentado relatório da PF sobre as fraudes, o subprocurador da República Carlos Eduardo de Oliveira só apresentou a denúncia contra os acusados em setembro, dois anos e um mês após o início das investigações. Neste período, Cordeiro teve o mandato cassado, mas recuperou os bens e hoje mora nos Estados Unidos numa casa comprada ano passado. Nem declarou o negócio imobiliário à Receita Federal.
Os sinais da impunidade são também a marca da Operação Vampiro. Com a decisão do Ministério Público de fazer um aditamento da denúncia original para incluir os nomes do ex-ministro Humberto Costa e do ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares no rol dos acusados, o processo, que já estava em fase adiantada, voltou à estaca zero. A primeira denúncia foi feita em 2004.
- Os baixos índices de condenação são, em parte, resultado da desarticulação entre o Ministério Público e a Polícia Federal. Entre as instituições estaduais, essas diferenças são ainda mais graves - afirma o sociólogo Cláudio Beato, especialista em questões de segurança pública.
Condenados à prisão recorrem em liberdade
A impunidade tem sido a tônica até nos processos que resultam em condenação. Depois de mandar à prisão os doleiros Messod Gilberto e Samuel Messod Benzecry, investigados na Operação Farol da Colina, contra crimes de lavagem de dinheiro, a Justiça Federal do Amazonas permitiu que os dois recorressem da sentença em liberdade. A Justiça Federal do Rio concedeu benefício similar a empresários e policiais investigados por adulteração de combustíveis na Operação Poeira no Asfalto. Condenados, eles recorreram e aguardam o desfecho em liberdade.
- É, no mínimo, um contra-senso: condenar uma pessoa à prisão e, logo em seguida, soltar essa pessoa para que recorra em liberdade. É o mesmo que não punir - diz um juiz federal que acompanha de perto as investigações criminais.
O delegado Jorge Pontes, da Divisão de Repressão a Crimes Fazendários da PF, concorda que os índices de punição são baixos. Mas, para ele, as prisões feitas pela PF no início de cada operação não são parâmetros para se medir os resultados de uma investigação. Segundo Pontes, a PF pede as prisões em caráter provisório, apenas para instruir os inquéritos que, mais tarde, são levados à Justiça. Ele diz que, com as prisões, de cinco a dez dias de duração, a polícia obtém confissões e provas para as investigações.
- As prisões provisórias, como o próprio nome indica, são um importante instrumento de investigação, e não de punição - afirma Pontes.
O subprocurador Eduardo Oliveira não foi localizado. Segundo a assessoria da Procuradoria Geral da República, ele viajou para o exterior.
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