Os pré-candidatos do PT e do PSDB à Presidência da República, Dilma Rousseff e José Serra, respectivamente, entram na disputa pelo apoio do setor sucroalcooleiro em situação desigual. Beneficiado com refinanciamento de dívidas no Banco do Brasil e com crédito farto no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) no governo Luiz Inácio Lula da Silva, o setor da cana-de-açúcar está satisfeito com o presidente, considerado garoto-propaganda do etanol no mundo. De 2002 ao ano passado, a produção de álcool subiu 140% e a exportação do combustível ficou nove vezes maior.
A reportagem é de Ana Paula Grabois e publicado pelo Valor, 05-04-2010.
Parte do setor confia na continuidade da política lulista por Dilma. "Não poderia dizer que tem unidade, mas existe um reconhecimento do governo Lula. Com toda certeza, vai ter uma parte que vai apoiar e outra que não vai apoiar", diz o presidente executivo da União dos Produtores de Bioenergia (Udop), Antonio Cesar Salibe.
Serra foi cauteloso com o setor ao manter a redução da alíquota de ICMS sobre o etanol de 25% para 12%, adotada no governo anterior. Por outro lado, os produtores não veem com bons olhos as medidas de proteção ambiental adotadas pelo seu governo em São Paulo. O Estado produz 75% do etanol brasileiro, o equivalente a 25% da produção mundial.
Em junho de 2007, a Secretaria Estadual de Meio Ambiente de São Paulo assinou protocolo com os produtores para diminuir o prazo do fim da queimada da cana-de-açúcar, o que obriga a mecanização na colheita e a recapacitação dos trabalhadores do corte. A chamada "cana verde", que não é queimada, só pode ser colhida por meio de máquinas substituindo a colheita manual.
Em terrenos com declividade, o prazo para a eliminação da queimada da cana foi reduzido de 2017 para 2013, conforme o protocolo do governo estadual. Nas áreas planas, o prazo, previsto por lei estadual para 2021, foi antecipado para 2014. "Em 2017, a prática da queima estará abolida e 90% estarão fazendo a mecanização", afirmou o gerente do projeto "Etanol Verde" e diretor de sustentabilidade da secretaria de Meio Ambiente, Ricardo Viegas.
O diretor da secretaria argumenta que 90% dos canaviais são mecanizáveis. No Estado, 70% das plantações são de propriedade de usineiros de álcool e açúcar. O restante está nas mãos dos fornecedores de cana. "A queima representa prática de cultivo ultrapassada. Os produtores estão ganhando com isso, tem pressão externa para ser ambientalmente correto e não dá mais para admitir essa qualidade de trabalho do corte da cana", afirmou Viegas.
Os resultados do protocolo são positivos, afirma o diretor de sustentabilidade do governo estadual. Em 2007, apenas 30% dos canaviais eram mecanizados em São Paulo. Três anos depois, a participação já é majoritária e saltou para 56%, mesmo com o aumento da área colhida no período. "No início, houve resistência, principalmente em relação aos investimentos necessários, mas hoje os empresários donos de 94% da produção já assinaram o protocolo", disse Viegas.
O documento foi assinado pela União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica) - que representa 119 empresas de açúcar e álcool - e por alguns fornecedores de cana. A maior dificuldade está entre os produtores pequenos, sem capacidade de investimento em máquinas, mas que devem, segundo prevê Viegas, ser incorporadas pelas grandes empresas de etanol nos próximos anos.
Um empresário do setor avalia que a entrada do capital estrangeiro no negócio do etanol produzido no Brasil forçou a modernização da colheita e das relações de trabalho, além do aumento do investimento. Os novos usineiros do exterior, que ainda não enfrentaram uma eleição presidencial brasileira, aguardam sinalização dos candidatos sobre as políticas propostas para o negócio e especialmente em relação aos movimentos sociais no campo, como o MST.
A modernização, no entanto, não resolveu o que fazer com os cortadores de cana, sem qualificação para exercer outras atividades, embora o corte seja considerado trabalho exaustivo. "Botaram muita pressão sobre as condições de trabalho e ambiental. A velocidade foi muito grande e não vamos conseguir recapacitar 1,5 milhão de pessoas no prazo exigido, incluindo os que vem e voltam do Nordeste. Tenho medo de parecer retrógrado, mas não é isso. Teria que ter mais tempo para requalificar e empregar os trabalhadores", afirma um usineiro que não quis ser identificado.
A Unica estima em 500 mil o total de trabalhadores no corte da cana no país, sendo 140 mil no Estado de São Paulo. A entidade iniciou no fim de fevereiro programa de requalificação profissional. O projeto "Renovação" vai investir R$ 2,5 milhões com patrocínio do grupo Case e das empresas John Deere e Syngenta e apoio do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).
O objetivo é requalificar 7 mil trabalhadores ao ano por meio de cursos profissionalizantes voltados para o próprio segmento, como motoristas canavieiros, operadores de colheitadeira, eletricistas e mecânicos, e para outros segmentos da economia, como avicultura, jardinagem, construção civil, horticultura e costura.
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