“Que se vai fazer com os sacos plásticos?” é o que pergunta Washington Novaes, em artigo publicado em 10 de agosto de 2007 no jornal O Estado de São Paulo. O Brasil está num verdadeiro impasse quanto à utilização desse material. Enquanto o Estado de São Paulo vetou projeto que exigia a adoção de sacolas plásticas oxibiodegradáveis afirmando que se tratava de uma “marotice política”, a Câmara Municipal de Curitiba aprovou um projeto semelhante e em Lajeado, no Rio Grande do Sul, a prefeitura promoveu uma campanha para substituir as sacolas de plástico por sacolas de pano. Washington Novaes trata, neste artigo, sobre esta controvérsia.
Confira o artigo.
A controvérsia está sobre a mesa. O governador José Serra vetou projeto aprovado pela Assembléia Legislativa que exigia a adoção, pelo comércio, de sacolas plásticas oxibiodegradáveis, que, segundo o deputado Sebastião Almeida, autor da proposição, aceleram a decomposição do material numa velocidade até cem vezes maior (o plástico comum levaria dezenas de anos para se degradar).
Segundo o secretário estadual de Meio Ambiente, tratava-se de um 'engodo plastificado e uma marotice política' (Folha de S. Paulo, 27/7), também já vetado antes pelo prefeito paulistano. Porque, diz ele, a tecnologia que produz essas sacolas, se permite que o plástico modificado se degrade mais rapidamente que o plástico comum, em contrapartida contamina o meio ambiente 'de forma agressiva, em razão dos catalisadores empregados, derivados de metais pesados como níquel, cobalto e manganês'; e as partículas produzidas no processo de decomposição, quando atacadas 'pela ação de microorganismos, irão liberar, além de gases do efeito estufa, como CO2 e metano, metais pesados e outros compostos inexistentes no plástico comum; pigmentos de tintas, utilizados nos rótulos, também se misturarão ao solo'. Já os fabricantes das sacolas usadas atualmente acrescentam que as partículas do plástico fragmentado 'infiltram-se no solo e contaminam lençóis freáticos'. Segundo eles, há outros plásticos que poderiam ser utilizados em substituição aos atuais sacos - mas são mais caros.
O autor do projeto vetado retruca que o plástico oxibiodegradável já é utilizado em mais de 40 países, entre eles Inglaterra, França e Portugal. Que o argumento da liberação de gases não pode ser invocado, já que o plástico comum, derivado do petróleo, também se decompõe em moléculas de carbono e hidrogênio no solo. E que o preço mais alto dos oxibiodegradáveis é compensado por suas vantagens, já que eles economizam aterro - e os sacos plásticos seriam hoje responsáveis por 18% do lixo paulistano, segundo o secretário do Meio Ambiente (e menos de 1% desse lixo é reciclado em usinas).
Mas a controvérsia não é só paulista. No mês passado, a Câmara Municipal de Curitiba aprovou projeto semelhante. Na discussão, lembrou-se que o Estado do Paraná consome 80 milhões de sacos de plástico por mês (que equivaleriam a 'uma montanha de 20 toneladas'). No Rio de Janeiro, o secretário estadual de Meio Ambiente já enviou ao governador projeto da mesma natureza (com substituição gradativa dos sacos pelo comércio, que em princípio não se opõe a ela). Também lá um dos argumentos mais fortes é numérico: o Estado consome 1 bilhão de sacos plásticos por ano e 900 milhões de garrafas PET; o governo gasta R$ 15 milhões por ano para dragar rios entupidos por lixo, grande parte de sacos plásticos. No Rio Grande do Sul, a prefeitura de Lajeado lançou, com apoio do comércio, campanha para substituir o plástico por sacolas de pano.
Nem é só brasileiro o tema. Em São Francisco, nos Estados Unidos, foi proibida a utilização desses sacos em supermercados e farmácias. Igual caminho está sendo discutido em Boston, Oakland, Portland, Santa Mônica, Annapolis. Na Europa, vários países - Alemanha e Dinamarca, entre outros - já evitam a entrega gratuita de sacos pelos supermercados à clientela.
Segundo estimativas, o consumo anual de plásticos no Brasil está em 19 quilos por habitante (100 nos Estados Unidos, 70 na Europa). Diz o deputado autor do projeto vetado pelo governador paulista que o consumo do País está em 210 mil toneladas de plástico filme por ano, a matéria-prima dos sacos, que representariam 10% do lixo total do País.
O ex-superintendente do Meio Ambiente do Paraná, Cícero Bley Jr., autor dos planos diretores de limpeza urbana de várias cidades (Vitória, Brasília e Angra dos Reis, entre outras), uma das pessoas que mais entendem do tema no País, acha que os sacos oxibiodegradáveis podem ser vantajosos, já que ao material hoje usado - polietileno de alta densidade - se adicionam agentes primários que aumentam a resistência, mas impedem a reciclagem. A nova tecnologia não abre caminho para a reciclagem, mas permite que o plástico se degrade muito mais rapidamente. E quanto aos metais pesados que se espalhariam na decomposição, diz ele que 'só se forem usados nas tintas; se usar tinta solúvel ou não usar tinta nenhuma, o problema não existirá'.
Seja como for, é um tema muito relevante para São Paulo. A capital paulista está gerando 13 mil toneladas diárias de lixo domiciliar e comercial (fora lixo industrial, resíduos da construção, lixo de estabelecimentos de saúde, lixo tecnológico e outros). Só não está em situação mais grave graças aos catadores de lixo, que, segundo as estimativas, encaminham às recicladoras 30% do papel e papelão e 20% dos plásticos e dos vidros.
Se o plástico de fato significar 18% do lixo total, evitar que vá para os aterros (graças a sacolas degradáveis) significará uma economia significativa. Não apenas de aterros, mas do próprio custo da coleta. Mesmo com a atual disputa entre a Prefeitura e as concessionárias da limpeza urbana, o poder público está pagando R$ 16 milhões por mês pela coleta (quase R$ 40 por tonelada), ou cerca de R$ 500 mil por dia (Estado, 23/3); 18% disso significará quase R$ 100 mil economizados por dia.
E, no final das contas, ainda será apenas uma pequena contribuição para que se reduza o incrível total de sacos plásticos descartados no mundo - 1 milhão por minuto, ou quase 1,5 bilhão por dia, mais de 500 bilhões por ano. Que são um dos fortes componentes do entupimento da drenagem urbana e dos rios e córregos. Além de contribuírem poderosamente para a formação de zonas mortas de até 70 mil quilômetros quadrados no fundo dos oceanos.
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