O país precisa fazer uma reforma do Estado e ganhar capacidade de acompanhar as políticas públicas, como a construção de infra-estrutura e a expansão do atendimento educacional e de saúde, defendeu o novo presidente do Ipea, Márcio Pochmann, ao tomar posse, ontem, na principal instituição da Secretaria de Planejamento de Longo Prazo, comandada pelo filósofo Roberto Mangabeira Unger. "Não há razões técnicas que possam justificar a existência de um Estado raquítico", discursou Pochman, ao defender "gestão e coordenação" para o governo. A reportagem é de Sergio Leo e publicada pelo jornal Valor, 15-08-2007.
"Atualmente o corpo de funcionários públicos não chega a constituir 8% do total da população ocupada, enquanto em 1980 ultrapassava 12%", comentou o economista, para informar que, nos Estados Unidos, essa proporção chega a 18%, e é de 25% na Europa. Nos países escandinavos, "modelo de democracia com Justiça social e competitividade avançada", esse índice é de 40%, lembrou. "Não se trata de necessidade de contatar pessoal", ressalvou Pochmann, ao ser perguntado se estava defendendo aumento do funcionalismo público.
Pochmann lembrou o acidente com as obras do metrô de São Paulo, para argumentar que faltam engenheiros para acompanhar com qualidade as obras previstas nos planos oficiais e professores e escolas para atender a objetivos de inclusão de jovens nas escolas. "Temos um programa de sucesso que é o Saúde da Família, médicos, paramédicos, todos contratados fora do Estado", exemplificou. "Como justificar isso? Não sei se o custo é equivalente, superior ou inferior ao que seria se estivessem na função pública. Esse é um debate que precisa ser revisitado."
Pochmann recebeu elogios da única ministra presente à posse (além de Mangabeira Unger), Marta Suplicy, do Turismo, que o elogiou pela "capacidade de planejamento a longo prazo, com experiência prática". Pochmann, segundo Marta Suplicy, "montou, do nada, uma secretaria" para administrar o bem-sucedido programa de renda mínima em São Paulo. Mangabeira elogiou Pochmann como um "visionário realista", e explicou: "É fácil ser realista, se se aceita tudo e ser visionário quando não se realiza. O Ipea deverá aceitar pouco e enfrentar muito."
Segundo Mangabeira Unger, o Ipea não poderá ter uma "agenda interna que se sobreponha às forças políticas e às correntes da vida nacional". No seu discurso e em reuniões que tem feito com os dirigentes do Ipea, ele tem tentado eliminar os temores de que subordinará o instituto a suas visões políticas e deu garantias de que quer manter a independência dos técnicos do órgão.
"Temos de encontrar uma maneira de definir uma vocação republicana: não servir a um consenso, mas organizar o dissenso de que precisa o país", discursou, em uma das inúmeras frases de efeito com que saudou o novo auxiliar. "Que o Brasil desbrave o caminho do novo conflito ideológico, centrado no contraste entre formas alternativas de economia de mercado, de democracia política e da sociedade civil livre", defendeu.
Unger elogiou Márcio Pochmann, por ser livre do "fatalismo", que na opinião dele, domina discussão intelectual no país. O Ipea precisa ser "muito mais que uma assessoria técnica" ao governo no poder, mas não é viável que tenha uma agenda própria, descolada das forças políticas, acredita o secretário, que tem status de ministro. Ele elogiou a capacidade do Ipea de fornecer quadros técnicos para o governo e disse ver condições de levar o instituto "ao centro do debate nacional". Antecipou que pretende aproveitar o instituto para buscar colaborações intelectuais de todas as regiões do país.
Mangabeira Unger deu autonomia a Márcio Pochmann para fazer as trocas que considerar necessárias no instituto. Pochmann afirmou pretender uma gestão "de continuidade" e afirmou não ter planos de mudança, mas informou que passará os próximos dias em reuniões com os diretores, discutindo os planos para o órgão.
Pochmann, no seu discurso, disse que não será possível obter a modernização do Estado brasileiro sem a federalização e a alteração da fragmentação setorial "consolidada pela rigidez do processo orçamentário público". Ele criticou a divisão das ações públicas em "caixinhas" nos ministérios e informou que quer "descentralizar" as ações do Ipea, para acompanhar mais de perto as ações nos Estados e municípios. Ele pretende reunir-se com os ministros do governo, para ouvir avaliações e propostas sobre a atuação do Ipea.
Professor da Unicamp, com longa militância em causas sociais e políticas ativas de de redistribuição de renda e acesso a serviços públicos, Márcio Pochmann foi recebido com apreensão por alguns grupos de economistas do Ipea, de linha mais liberal. Ele garantiu que deseja trabalhar com diversidade e pluralidade de opiniões e que dará liberdade às manifestações pessoais dos pesquisadores. Mas indicou que quer discutir, com os técnicos do Ipea, as posições oficiais da instituição.
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