"O darwinismo é, filosoficamente, o ateísmo mais elegante que existe, nada prova sobre Deus, mas pelo menos não incorre no elementar erro do marxismo, que confunde representações sociais com o problema da ordem cósmica. Diante desse ruído, ainda que me considerem cético demais, confesso: prefiro Fernando Pessoa e Deus", escreve Luiz Felipe Pondé, filósofo, professor da PUC-SP e da FAAP, e autor de, entre outros títulos, "Crítica e Profecia - Filosofia da Religião em Dostoiévski" (ed. 34) e "Do Pensamento no Deserto - Ensaios de Filosofia, Teologia e Literatura" (Edusp, no prelo), em artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo, 1-09-2007. Pondé comenta o livro "Deus, um delírio" de Richard Dawkins.
Eis o artigo.
"Falta nessas pessoas que teimam em ser profetas um pouco daquela sabedoria discreta que encontramos em gente como Fernando Pessoa: o improvável Deus nos protege da fé grosseira em ídolos com cabeça de bicho, como o culto da Humanidade, "mera idéia biológica".
Pouco céticas e muito dogmáticas, elas confundem coisas como a salutar disciplina cética com o ateísmo. Como diria Chesterton, quando deixamos de acreditar em Deus, acabamos crendo em qualquer bobagem. A humanidade é mais infeliz do que imagina nossa vã filosofia da emancipação.
O novo livro de Richard Dawkins (que parece ser aquele tipo de cara que ainda acha que o ateísmo mete medo em gente grande), "Deus, um Delírio", não é ciência, mas mero libelo político (ateísmo científico é um contra-senso, Deus é uma variável sem controle epistemológico), uma recaída na velha fúria jacobina, requentada com máximas evolucionistas.
Lembremos que não existem cosmologias de laboratório.
Afirmações como "tenha orgulho de ser ateu e olhe o futuro com confiança" soam bem num workshop para auto-estima.
Seu foco são as utopias modernas de salvação: não é por acaso que flerta com alguns dos totalitarismos mais sofisticados de nossa época, entre eles, aqueles, aliás, que "melhoraram muito" as relações entre homens e mulheres, esmagado-as sob a bota do ressentimento típico da desconstrução social genérica.
O livro vende o darwinismo como teoria "progressista" (grande intuição marqueteira), por isso suas alusões a "sair do armário", tentando convencer a sensibilidade de esquerda que o darwinismo não é mais perigoso. A alma desassossegada indaga: além da parada dos ateus, serei processado se disser em público que acredito em Deus? Quem é o bobo que acredita que, sem Deus, o ser humano mataria menos? Sem o fundamentalismo islâmico (supõe-se), as torres gêmeas estariam lá, mas e os milhões de mortos em nome da ciência, da humanidade e da história nos séculos 18, 19 e 20?
De Stálin a Fidel, de Robespierre a Mao Tse-tung, todos seduziram a "inteligência atéia". O ateísmo político domina a sensibilidade "pop-inteligente" há décadas, questões como a alegre legalização do aborto, a "revolta poético-científica do desejo", a metafísica materialista e a ignorância filosófico-religiosa provam isso.
Ateísmo mais elegante
Quase todos crêem no "produto emancipação". Deus não garante o "Bem" (nenhuma teologia séria pensa isso), nem o ateísmo a inteligência ou a ética.
Gostamos de matar e pronto.
Dawkins procura seduzir exatamente o tipo de pessoa covarde que não gosta de saber disso sobre si mesma e, com isso, minimiza uma grande qualidade do darwinismo filosófico: sua percepção trágica da vida na qual somos areia que um dia abriu os olhos e que balbucia sozinha diante da indiferença furiosa de um universo mudo e sonambúlico imerso no acúmulo de design cego (supremo conceito que descreve a emergência da "ordem" em meio à cegueira da matéria).
Todavia, reconheçamos que ele acerta ao dizer que a "religião inteligente" pouco tem feito diante da violência fundamentalista e do Mac-Jesus. Mas seria Deus que nos faz gostar de matar e sermos banais como qualquer animal que se arrasta no pó?
2 comentários:
Ainda bem que eu não estudo aí...
quanta bobagem!
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