"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música"
Friedrich Nietzsche

terça-feira, janeiro 19, 2010

Reflexões em Barcelos

Por Hiram Reis e Silva, Barcelos, Amazonas, 07 de janeiro de 2010.

“... Um oceano em seu olhar

pelo amigo que se foi

o amor de uma mulher

por tudo o que vier

nesses tempos

marcados pela inquietação

à procura da verdade

e ela se esconde

mas seu barco vai

por onde a sua mão guiar...”

Oceano (Guilherme Arantes)

- O Negro

“(...) vimos uma boca de outro grande rio, à mão esquerda, que entrava no que navegávamos, e de água negra como tinta, e por isso lhe pusemos o nome de Rio Negro. Corria ele tanto e com tal ferocidade que em mais de vinte léguas fazia uma faixa na outra água, sem misturar-se com a mesma”. (Gaspar de Carvajal)

O Negro vem encantando desbravadores, naturalistas, pesquisadores desde que se teve notícia de sua existência, pelos ‘civilizados’ há mais de cinco séculos. A cada um, este portentoso ente aquático impressionou de uma forma. Alguns pela cor de suas águas, outros pela força de sua torrente, outros ainda pelas características físico-químicas...

"No dia 23 entramos no rio Negro, outro mar de água doce que o Amazonas recebe pelo norte. A carta do Padre Fritz (que nunca entrou nesse rio), e a última carta da América de Delisle, feita conforme a do Padre Fritz, fazem correr este rio do norte para o sul, ao passo que é certo, pelo relato de quantos o remontaram, que ele provém do oeste, e que corre para o este, inclinando-se um pouco para o sul. Testemunhei por meus próprios olhos que essa é a sua direção várias léguas acima de sua desembocadura no Amazonas, onde o rio Negro entra tão paralelamente que, sem a transparência das águas que se chamam precisamente `rio Negro´, seria tomado por um braço do próprio Amazonas, separado por alguma ilha”. (Jean Louis Rodolphe Agassiz)

O Negro me envolveu no seu manto de mistério; a alvorada silente, diferente do Solimões, que mais parecia uma Ode à Natureza, torna-o um ser inerte, apático e sem vida. A beleza das paisagens contrasta com a ausência de sons. A calmaria do Alto Solimões e as belas ilhas de pedra foram substituídas, progressivamente, pelas intermináveis praias de areias virgens, pelos banzeiros e fortes ventos de proa que dificultam a progressão de minha equipe de apoio no seu precário ‘bongo’.

- Margens

O efeito devastador das águas do Solimões sobre as margens, golpeando, destruindo, arrastando, reconstruindo, alterando continuamente seu traçado aqui não se vê. O Negro derruba os gigantes da floresta, mas eles permanecem no mesmo lugar em que tombaram. São redesenhados, esculpidos pelas mãos do tempo e das águas. As margens de tabatinga, golpeadas continuamente pelas ondas, formam paredões verticais e as arenosas se espraiam preguiçosamente.

- Vegetação

As terras mais pobres não apresentam a estupenda variedade e portento da bacia do Solimões e as águas carentes de nutrientes não revitalizam a várzea por ocasião das cheias. Talvez, por tudo isso haja uma diferença tão grande na capacidade de trabalhar dos nativos das mais variadas etnias do Alto Rio Negro em relação aos Tikunas do Alto Solimões. A compleição física indica uma carência alimentar ancestral que não conseguiu ser suprida até os dias de hoje, agravada, certamente, pela falta de aptidão para a agricultura. Uma coisa, porém, têm em comum essas comunidades: a bela hospitalidade amazônica.

Acompanhe as fotos e demais artigos da expedição no Diário de Bordo
http://diarioriomar.blogspot.com/


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