"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música"
Friedrich Nietzsche

terça-feira, junho 08, 2010

Contribuição para a História (Jornalista Mário Neves organizou canal de ligação conspirativa entre o Kremlin e o general Spínola através do KGB)

darussia.blogspot - Terça-feira, Junho 08, 2010


Evgueni Pitovranov

Mário Neves, conhecido jornalista português, organizou um canal de ligação conspirativo entre o general Spínola e o Kremlin de Moscovo através do KGB soviético logo após o 25 de Abril, escreve o antigo agente soviético Alexandre Kissilov, num livro de memórias sobre conhecidos espiões do Comité de Segurança do Estado da URSS.

“Nos finais de Abril de 1974, em Portugal teve lugar, de forma bastante inesperada para a opinião pública mundial, a “Revolução dos Cravos”... Os meios e os métodos utilizados para esses fins nobres (libertação da ditadura fascista) – uma conjura de generais e de um levantamento militar -, provocavam algumas dúvidas sobre a sinceridade dos objetivos e valores declarados”, escreve Kissilov nas suas memórias “Etapas de uma grande jornada”.

“Mas nem a Secção Internacional do Comité Central (do Partido Comunista da União Soviética), nem os serviços secretos tinham informação suficiente para a análise objetiva e conclusões precisas, o que provocava irritação visível no Secretário-geral, Brejnev”, continua ele num livro patrocinado pelo Serviço de Espionagem da Rússia.

Segundo Kissilov, Iúri Andropov, que então dirigia o KGB soviético recorreu aos serviços de Evgueni Pitovranov, um dos agentes mais experientes da espionagem soviética.

Pitovranov, que, em 1974, era vice-presidente da Câmara do Comércio e Indústria da URSS e general do KGB, tinha contatos com Mário Neves que, então, ocupava o cargo de comissário da Feira das Indústrias Portuguesas. Por isso, entrou em contato com o português, que lhe prometeu um encontro secreto com o general Sínola, então Presidente de Portugal.

“No dia seguinte à sua chegada a Lisboa, Neves recebeu o seu amigo-parceiro moscovita e, na tarde do dia seguinte, dois generais encontraram-se secretamente no palácio presidencial”, recorda Kissilov.

O agente soviético, continua Kissilov, “transmitiu ao Governo Provisório e ao povo de Portugal felicitações da direção da URSS pelo derrube da ditadura e boa sorte na via das transformações democráticas”.

“Spínola recebeu com evidente interesse a proposta da criação de um canal conspirativo direto entre a direção dos dois países. Ele expôs a sua plataforma política e delineou as vias mais prováveis das transformações futuras”, acrescenta Kissilov.

A amizade entre Neves e Pitovranov continuou depois do primeiro ter sido nomeado Embaixador de Portugal na URSS: “ele (Neves) habituava-se com dificuldade aos nossos frios e a algumas outras coisas, principalmente na organização da vida quotidiana. Pitovranov tornou-se o seu apoio seguro” .

Para Kissilov, “isso preocupou seriamente os serviços secretos portugueses: a conselho dos parceiros da NATO, eles passaram a desconfiar que existisse algo de subversivo numa normal amizade humana. Neves passou a ser seguido, o seu gabinete e apartamento foram cheios de meios de escuta, todas as chamadas telefónicas eram controladas”.

“Porém, as suspeitas evaporaram-se, e não podia ser de outra forma porque Pitovranov, experiente na luta secreta, nunca poria em risco o seu amigo”, conclui.

Mário Neves morreu em 1999. Como diplomata foi o primeiro embaixador de Portugal em Moscovo depois do 25 de Abril de 1974 e como jornalista denunciou a responsabilidade das forças nacionalistas do massacre de Badajoz durante a Guerra Civil de Espanha e é o autor da célebre pergunta ao general Humberto Delgado durante as eleições presidenciais de 1958: «Sr. General o que vai fazer de Salazar se ganhar as eleições?», perguntou Mário Neves na conferência de imprensa do café Chave D´Ouro, em Lisboa. Delgado respondeu: «Obviamente demito-o.»

Nenhum comentário: