"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música"
Friedrich Nietzsche

terça-feira, julho 27, 2010

A DISNEYLAND SOCIALISTA


Texto traduzido e enviado pela leitora Cristina Mestre:

"Reportagem de uma jornalista russa na Bielorrússia
No voo Moscovo – Minsk costumam dar jornais bielorrussos aos passageiros. Ao lê-los, mergulhamos num mundo fantástico de ordenhas e ordenhadoras, de heróis da produção agrícola, da luta pelas colheitas e pelo conhecimento, de êxitos desportivos e laborais.
Estes jornais alimentam-nos de moral em grandes doses. Na sociedade bielorrussa de gente boa também aparecem uns meliantes, condenados ao fracasso: uns burocratas maus, com os quais esta mesma sociedade leva a cabo uma permanente luta vitoriosa.
Não sei, de facto, que relação têm estes jornais com o jornalismo mas o facto é que acalmam espantosamente os nervos.
No mundo das futuras crises financeiras mundiais, os médicos deveriam receitar imprensa bielorrussa a todos os que estão aflitos, em vez de calmantes e soporíferos.
A Bielorrússia é a última ilusão de estabilidade e regresso da infância soviética, quando não havia publicidade nem engarrafamentos nas estradas, quando todos tinham a confiança tranquila que o futuro seria …igual ao presente.

Em frente rumo ao passado
No restaurante “Déjà vu”, no centro de Minsk, há esculturas de mármore de jovens comunistas com cornetas, vagueiam imponentes empregadas sonolentas, nas paredes estão pendurados retratos do Politburo e carpetes gastas (tal como na minha infância, quando colocar carpetes no chão era considerado um hábito burguês e uma bofetada à moral pública).
Os altifalantes difundem com entusiasmo: “Nada de tristezas, temos toda a vida pela frente!”. Parece que os bielorrussos não têm razões para estarem tristes. Têm um TSUM e um GUM, ruas de Lenine e de Karl Marx, avenidas largas e direitas. A criminalidade, pelos vistos, não existe: as crianças andam na rua até altas horas da noite. As pessoas são amigáveis e um bocado inibidas, os taxistas são bem-educados e dão troco de acordo com o taxímetro, os bêbados andam a direito, em geral mantendo a direcção, e não são brutos. As mulheres são moderadamente bonitas, os homens são moderadamente feios.
Pela discrição nas cores, pela fleuma e moderação no comportamento, a Bielorrússia está mais próxima da Europa do que a Rússia.
O lema do presidente “um prato de torresmos e um cálice de vodka” é rigorosamente respeitado: nas ruas não há mendigos e um naco de toucinho e um cálice de vodka estão garantidos a todos.
Acrescente-se a isso a natural sovinice camponesa dos bielorrussos. “Quando compro toucinho na loja, levo fresco e vez de salgado, que é mais barato, e salgo-o em casa”, explica-me uma minha conhecida. “Nós, bielorrussos somos poupados, gostamos de guardar coisas como os hamsters. Todos têm qualquer coisa escondida em casa para o que der e vier”.
A popular rede de lojas “Rubliovski”, que eu erradamente tomei por um oásis de luxo e produtos gourmet, está antes vocacionada para as pessoas que gostam de poupar. “Isto não é a vossa Rubliovka”, explicaram-me os bielorrussos ligeiramente ofendidos. “Rubliovka vem da palavra rublo. É uma loja para quem cada rublo conta”.
O bielorrusso não é só uma nacionalidade mas uma mentalidade.
“Trata-se de um fenómeno de um país de camponeses, ou melhor, de um país de camponeses migrantes não adaptados”, diz o politólogo bielorrusso Leonid Zaiko.
É daqui que vem a sua prudência de pessoas do campo, a capacidade de se adaptar a uma realidade pobre, a baixa emigração, a astúcia amenizada por uma gentileza faladora e uma irremediável hostilidade em relação a qualquer ideia revolucionária que tenham ouvido nos últimos 20 anos.
Em Moscovo há muito menos trabalhadores imigrantes bielorrussos do que tajiques, moldavos ou ucranianos.
Os bielorrussos ficaram presos à terra dos seus campos. Eles sentem nostalgia em relação ao seu passado soviético, basta-lhes o seu presente e têm medo do amanhã.
Neles está há muito tempo escondida uma desconfiança em relação ao enriquecimento rápido, aos novos-ricos. Não é tanto uma assumida consciência de classe mas sim uma secreta inveja de camponês. Quando há umas semanas, um carro velhinho embateu num Bentley em Minsk, os cidadãos viram-se a braços com um complexo sentimento: por um lado, orgulho de na Bielorrússia terem surgido os primeiros Bentley, por outro, o embate satisfez-lhes o seu sentido de justiça social (“é bem feito, para o Bentley não andar a fazer-se de fino!)
“No nosso país é indecente ser rico”, diz Viktor Lobkovich, um empresário local.
“Não se pode mostrar o dinheiro que tens: para quê irritar as pessoas? Aqui não há um fosso tão grande entre os pobres e os ricos, como na Rússia”.
“Então vocês gostam de serem todos nivelados?”, perguntei.
“Gostamos da estabilidade”.
“Estabilidade na pobreza?”
“Ainda que assim seja. Não temos pessoas MUITO pobres, mas também não há bielorrussos na Forbes.”
A elite russa gosta de ter o Abramovich, que pode comprar iates ou um submarino, gosta dos oligarcas”, diz o politólogo Leonid Zaiko. “Quando eu olho para essas caras tenho a impressão que estou no futebol: andam 20 jogadores no campo e os outros estão sentados a ver. Na Bielorrússia não há um único iate. É perigoso tê-los. Se alguém aparece com algum, o presidente “privatiza-o” logo e mete o dono na prisão. No nosso país gostam de prender as pessoas.
Se um empresário começa a ter dinheiro, é convidado para uma “conversa” com as autoridades locais e estas propõem-lhe afavelmente que patrocine alguma escola ou hospital (conforme os rendimentos).
Esta é uma proposta que pode ser recusada mas que é melhor não recusar já que na Bielorrússia há cerca de 70.000 leis e actas normativas e não será difícil encontrar uma razão para prender um empresário renitente.
O patrocínio é uma espécie de imposto moral: se tu tiveste sorte, faz favor de ajudar a sociedade.
“É mais fácil para mim dar uns computadores e equipamento desportivo todos os anos à escola, do que pôr em risco a minha liberdade”, explicou-me um empresário conhecido.
(continua)

http://kp.by/daily/24344/534140 "

E por aqui temos medo de taxar as grandes fortunas.

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